Editorial do O Estado de S. Paulo - 21 Junho 2017
O ministro do Supremo Tribunal
Federal Gilmar Mendes foi bastante preciso ao dizer, numa palestra feita no
Recife, que a luta contra a corrupção não pode ser “uma meta em si mesma” nem
pode constituir o único norte para a organização institucional do País. “Nenhum
país se organiza social e politicamente com o objetivo de combater a
corrupção”, afirmou o magistrado. Sem deixar de enfatizar a importância da Lava
Jato e de outras operações semelhantes para punir os que se dedicam a pilhar os
cofres públicos, a fala do ministro Gilmar Mendes serve como um necessário
alerta para os rumos equivocados que a luta contra a corrupção pode
eventualmente tomar, especialmente se for mantido o clima de guerra declarada
contra os políticos em geral, como se estes fossem, por definição, inimigos da
pátria. Nesses termos, em nome de tal combate, muitas vezes se pode ceder à
tentação do arbítrio – e o resultado não é a regeneração da democracia, como se
deseja, mas sua destruição.
A esse propósito, o ministro
Gilmar Mendes disse que há risco de o País “despencar para um modelo de Estado
policial”, numa referência a certos métodos empregados por procuradores e
investigadores. O magistrado citou os “arranjos” e as “ações controladas” –
caso da armação de flagrante que o empresário Joesley Batista fez contra o
presidente Michel Temer e o senador Aécio Neves, para basear sua delação
premiada ao Ministério Público – como exemplos de “investigações feitas na
calada da noite”, isto é, sem respeitar a lei. Para Gilmar Mendes, está claro
que, quando isso acontece, “as investigações devem ser questionadas e devem ter
limites”.
A advertência do ministro do
Supremo deveria servir como um chamamento à prudência, artigo um tanto raro em
meio à crispação generalizada que causa toda e qualquer crítica ao
comportamento de certos procuradores e juízes, inclusive de tribunais
superiores, que se deixam entusiasmar excessivamente pela missão de combater a
corrupção.
Tome-se o exemplo do
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que, no mesmo dia da palestra do
ministro Gilmar Mendes, disse a seus pares num seminário do Conselho Nacional
do Ministério Público que os críticos dos eventuais abusos da Lava Jato ou
“militam na ignorância” ou “não têm compromisso verdadeiro com o País”.
Rodrigo Janot, portanto, recorreu
ao lamentável expediente de dividir o Brasil entre “nós” (os bons que aplaudem
tudo o que se fizer em nome da luta contra a corrupção) e “eles” (os que só
podem ter más intenções quando fazem reparos a alguns métodos empregados pelos
procuradores). Para deixar claro esse embate, o procurador-geral bradou: “Basta
de hipocrisia! Não há mais espaço para a apatia. Ou caminhamos juntos contra
essa vilania que abastarda a política ou estaremos condenados a uma eterna
cidadania de segunda classe, servil e impotente contra aqueles que deveriam nos
representar com lealdade”.
Por “caminhar juntos” entenda-se
jamais discordar das atitudes de Rodrigo Janot, mesmo que, em nome do combate à
corrupção, o procurador-geral da República tenha concedido perdão ao empresário
Joesley Batista depois que este confessou mais de duas centenas de crimes, um
recorde que deveria ser suficiente para fazê-lo enfrentar a Justiça.
A intenção declarada de Rodrigo
Janot e de outros procuradores e juízes é purgar o mundo político daqueles que,
segundo seu entendimento, não são puros o bastante para o exercício de mandato
eletivo. Ora, essa é, ou deveria ser, uma prerrogativa exclusiva do eleitor.
Mas, como lembrou o ministro Gilmar Mendes, alguns promotores “expandiram as
investigações para situações talvez até de mera irregularidade” – isto é, tudo
o que envolve algum político se tornou automaticamente sintoma de corrupção –,
pois a intenção é “mostrar que não há salvação no sistema político”.
Ao agirem dessa maneira, os
cruzados anticorrupção estão a fazer política, e da pior espécie – Gilmar
Mendes chegou a dizer que o resultado disso pode ser “uma ditadura de
promotores ou de juízes”. E ele arrematou: “Vão confiar a essa gente, que viola
o princípio da legalidade, a ideia de gerir o País?”.
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AGD Comenta:
Hoje pela manhã, falei sobre
cenários para o Brasil. Agora, lendo o texto anterior de um veículo de
comunicação importante no país, já me vem outro cenário, para sonhar com ele.
O Gilmar Mendes, o Ministro do
STF que agora se tornou o maior político do Brasil, depois de enxovalhar o nome
do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), inocentando a chapa Dilma/Temer, por
“excesso” de provas contra, vem ao Recife e diz o que vocês leram acima.
Principalmente, quando diz que agora teremos uma ditadura do judiciário.
E aí temos outro cenário para
comentar. Os juízes mandando na República. Claro que ninguém pensaria em algo
assim. Mas, o Gilmar Mendes pensou. E eu pergunto se certos pensamentos não são
o resultado de 500 anos de impunidade, e por isso, a não Justiça, para com
classe que usa colarinho colorido?
Hoje, realmente, soa estranho que
logo nas manchetes matinais nos jornais vejamos que o Aécio, o Temer, o Lula
(que se tornou um colarinho branco e finge que é marron), a Dilma, e tantos
outros figurões, possam serem presos.
Parece até um outro mundo.
E daí para os delírios daqueles
que defendem seus apaniguados é um passo. No fundo, tudo é política e a luta
pelo poder. O que uma democracia tenta fazer, desde que foi idealizada na
Grécia antiga, é tirar o poder das mãos de um homem só, ou de um grupo,
diluindo-o na sociedade.
Esta diluição, no Brasil, apesar
de tentarmos há muito tempo, só começou bem recentemente com prisões de
notáveis como o José Dirceu. E isto devemos agradecer ao PT, que tornou os
crimes políticos um instrumento de poder e de enriquecimento ilícito, desde o
mensalão, de forma tão escandalosa, que não houve jeito para não se desconfiar.
Para quem ler sobre o que
aconteceu em Cuba e na Venezuela, mais recentemente, isto não é novidade. Mas,
o importante é que a Lava Jato descobriu o caminho e está cada dia mais
ameaçando os poderosos. E haja choradeira como a do Gilmar Mendes. Por quem
chora o Gilmar?
Enquanto escrevia estas simples
linhas, vi que o presidente do UBER, sim, aquela empresa que criou um
aplicativo para nos livrar do julgo dos motoristas de taxi, renunciou depois de
um escândalo em sua empresa, que não sei qual foi. Então fico pensando, por que
alguns figurões da república, depois de pegos de calças curtas não seguem o
exemplo?
Como nossa cultura é diferente eu
nem pensaria no “haraquiri” japonês, mas, uma renúncia seria
extremamente recomendável para certas figuras.
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