Por Zezinho de Caetés
Semana passada houve uma troca de gentilezas entre a
presidenta e um ex-presidente. Sem dizer nada, todos pensarão, ora, isto é a
rotina diária entre Dilma e Lula. Que novidade tem? Só fica estranho quando se
menciona que o ex-presidente é o Fernando Henrique Cardoso. Todos já sabiam do
seu prestígio crescente com a presidenta desde que eles quase se amaram em
eventos anteriores, que culminou com uma nota dela parabenizando-o pelo seu
aniversário.
No entanto, nesta semana, o FHC escreveu um texto em que,
incautamente, diz a verdade sobre a herança que Lula deixou para ela e para o
Brasil, e que eu transcrevo abaixo. Eu concordo que o FHC gosta de pavonear, de
se exibir, principalmente agora em idade provecta. Mas, não se pode desconhecer
de que os rumos corretos que beneficiaram este país neste início de milênio
foram dados no seu governo. O Lula não fez nada, a não ser manter aquilo que
ele tinha feito, e o que fez de novo vai levar este país a um desastre no longo
prazo. O melhor feito por ele foi a tomada elétrica exclusiva, de três pinos, exclusiva
do Brasil, que levará os turistas ao caos na Copa de 2014. Ou seja, a única indústria
que cresce no Brasil é de fabricantes de adaptadores de tomada.
Por isso, e talvez por não ter estudado como deveria, o Lula
nunca o perdoa. E, depois de ler, com grande esforço o texto abaixo, o meu
conterrâneo apedeuta deve ter ligado para o poste presidencial e deve ter dito:
- Olha, se você não
der uma resposta a este texto, eu apago sua luz!
E a presidenta, pasmem, abandonando a liturgia do cargo,
escreve uma nota oficial de contestação ao FHC. Ele deve ter dado uma gaitada
daquelas, pela importância que o poste lhe deu, só com medo de apagar a luz. A
Dilma não surpreende mais nem em seu despreparo para o cargo nem pelo seu
servilismo ao Lula, ao exercê-lo. Sendo ameaçado de ficar no escuro, a nota do
poste, quer mostrar por A mais B que o Lula deixou uma herança tão boa para
ela, que em seu primeiro ano de governo ela teve que demitir 7 ministros por
corrupção e quejandos. Que a herança que ela teve foi bendita e não maldita com
diz o agora “maldito” FHC.
E o Lula não ficou satisfeito. Deve ter ligado para ela
outra vez e dito:
- Foi pouco. Você deve
aproveitar o discurso de 7 de setembro para mostrar quão grande eu deixei este
Brasil para você.
Não deu outra. Na última sexta-feira tive que ouvir uma
xaropada de mais de 10 minutos, cujo teor só acredita mesmo quem não vive no
Brasil, ou aqueles que estão no programa Bolsa Família. Parecia um sonho bom,
onde o Brasil surfava pelas ondas do desenvolvimento rumo à supremacia mundial.
Nem os candidatos a prefeito do Recife chegaram a este ponto de tantas
promessas. Parecia que a Dilma era candidata a prefeita, num município onde só
tem doidos. E assim caminham os governos petistas.
Porém, o que vemos agora é que a herança mais maldita que o
Lula deixou para o poste, não foi a tomada de 3 pinos genuinamente brasileira,
e sim o mensalão. Os réus estão sendo condenados na fila. Chega dá pena. Queira
Deus, o STF esteja guardando o porrete maior para o chefe da quadrilha.
Leiam agora o texto do Fernando Henrique, que mesmo se
afogando na vaidade, e tentando ser gentil com um poste cuja luz vem do Lula,
escreve bem e com precisão sobre nosso momento atual.
“A presidenta Dilma Rousseff recebeu uma herança pesada de seu
antecessor. Obviamente, ninguém é responsável pela maré negativa da economia
internacional, nem ela nem o antecessor. Mas há muito mais do que só o
infortúnio dos ciclos do capitalismo.
Comecemos pelo mais óbvio: a crise moral. Nem bem completado um ano de
governo, e lá se foram oito ministros, sete dos quais por suspeitas de
corrupção. Pode-se alegar que quem nomeia ministros deve saber o que faz. Sem
dúvidas, mas há circunstâncias. No entanto, como o antecessor jogou papel
eleitoral decisivo, seria difícil recusar de plano seus afilhados. Suspeitas,
antes de se materializarem em indícios, são frágeis diante da obsessão por
formar maiorias hegemônicas, enfermidade petista incurável.
Mas não foi só isso: o mensalão é outra dor de cabeça. De tal desvio de
conduta, a presidenta passou longe e continua se distanciando. Mas seu partido
não tem jeito. Invoca a prática de um delito para encobertar outro: o dinheiro
desviado seria “apenas” para o caixa dois eleitoral, como disse Lula em
tenebrosa entrevista dada em Paris, versão recém-reiterada ao “New York Times”.
Pouco a pouco, vai-se formando o consenso jurídico, de resto já formado na
sociedade, de que desviar dinheiro é crime, tanto para caixa dois como para
comprar apoio político no Congresso. Houve mesmo busca de hegemonia a peso de
ouro alheio.
Mas não foi só isso que Lula deixou como herança à sucessora. Nos anos
de bonança, em vez de aproveitar as taxas razoáveis de crescimento para tentar
aumentar a poupança pública e investir no que é necessário para dar
continuidade ao crescimento produtivo, preferiu governar ao sabor da
popularidade. Aumentou os salários e expandiu o crédito, medidas que, se
acompanhadas de outras, seriam positivas.
Deixou de lado as reformas politicamente custosas: não enfrentou as
questões regulatórias para acelerar as parcerias público-privadas e retomar as
concessões de certos serviços públicos. A despeito da abundância de recursos
fiscais, deixou de racionalizar as práticas tributárias, num momento em que a
eliminação de impostos poderia se fazer sem consequências negativas: a oposição
conseguiu suprimir a CPMF, cortando R$ 50 bilhões de impostos, e a derrama
continuou impávida.
É longa a lista do que faltou fazer quando seria mais fácil. Na questão
previdenciária, o único “avanço” não se concretizou: a criação de uma
previdência complementar para os funcionários públicos que viessem a ingressar
depois da reforma. A medida foi aprovada, mas sua consecução dependia de lei
subsequente, para regulamentar os fundos suplementares, que nunca foi aprovada.
As centenas de milhares de recém-ingressados no serviço público na era
lulista continuaram a beneficiar-se da regra anterior. Foi preciso que novo
passo fosse dado pelo governo atual para reduzir, no futuro, o déficit da
Previdência.
Que dizer, então, de modificações para flexibilizar a legislação
trabalhista e incentivar o emprego formal? A proposta enviada pelo meu governo,
com esse objetivo, embora assegurando todos os direitos trabalhistas previstos
na Constituição, foi retirada do Senado pelo governo Lula em 2003. Agora é o
próprio Sindicato Metalúrgico de São Bernardo do Campo que pede a mesma
coisa...
Mas o “hegemonismo” e a popularidade à custa do futuro forçaram outro
caminho: o dos “projetos de impacto” como certos períodos do autoritarismo
militar tanto prezaram. Projetos que não saem do papel ou, quando saem, custam
caríssimo ao Tesouro e têm utilidade relativa.
O exemplo clássico foi a formação a fórceps de estaleiros nacionais para
produzir navios-tanque para a Petrobras (pagos, naturalmente, pelos
contribuintes, seja através do BNDES, seja pelos altos preços desembolsados
pela Petrobrás). Depois do lançamento ao mar do primeiro navio, com fanfarras e
discursos presidenciais, passaram-se meses para descobrir-se que o custo não
fez jus a tanta louvação.
Que dizer dos atrasos da transposição do São Francisco ou da
Transnordestina, ou ainda da fábrica de diesel à base de mamona? Tudo relegado
aos restos a pagar do esquecimento.
O que mais pesa como herança é a desorientação da política energética.
Calemos sobre as usinas movidas “a fio d água”, cuja eletricidade para
viabilizar o empreendimento terá de ser vendida como se a produção fosse firme
o ano inteiro e não sazonal. Foi preciso substituir o companheiro que dirigia a
Petrobras para que o país descobrisse o que o mercado já sabia, havendo
reduzido quase pela metade o valor da empresa.
O custo da refinaria de Pernambuco será dez vezes maior do que o
previsto; há mais três refinarias prometidas que deverão ser postergadas ad
infinitum. O preço da gasolina, controlado pelo governo, não é compatível com
os esforços de capitalização da Petrobras. Como consequência de seu
barateamento forçado — que ajuda a política de expansão ilimitada de carros com
a coorte de congestionamentos e poluição —, a produção de etanol se
desorganizou a tal ponto que estamos importando etanol de milho dos Estados
Unidos!
Com isso tudo e apesar de estarmos gastando mais divisas do que antes
com a importação de óleo, o presidente Lula não se pejou em ser fotografado com
as mãos lambuzadas de petróleo para proclamar a autossuficiência de produção,
no exato momento em que a produtividade da extração se reduzia.
No rosário de desatinos, os poços secos, ocorrência normal nesse tipo
de exploração, deixaram de ser lançados como prejuízo, para que o país
continuasse embevecido com as riquezas do pré-sal, que só se materializarão
quando a tecnologia permitir que o óleo seja extraído a preços competitivos,
que poderão se tornar difíceis com as novas tecnologias de extração de gás e
óleo dos americanos.
É pesada como chumbo a herança desse estilo bombástico de governar que
esconde males morais e prejuízos materiais sensíveis para o futuro da nação.”