Em manutenção!!!

sexta-feira, 30 de março de 2018

Todos os homens do presidente





“O passado não perdoa

POR MERVAL PEREIRA

Não é preciso ser um especialista para entender que tantos presos em torno do presidente da República significam que há provas suficientes para uma ação policial dessa envergadura. Todos os homens do presidente estão envolvidos, de uma maneira ou de outra, em investigações policiais. Um terceiro processo contra Michel Temer parece claramente delineado, ainda mais porque foi a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, quem pediu as prisões, que não seriam autorizadas pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luis Roberto Barroso se não houvesse bons motivos.

Quase impossível imaginar que se trate de um equívoco, ou uma perseguição política. Impressionante como o passado não perdoa Temer e seus associados. As denúncias feitas se referem a atos no exercício da presidência da República, mas estão ligados à prática política de uma vida toda. A foto do coronel Lima fardado na posse do jovem Michel Temer na Secretaria de Segurança Pública de São Paulo é exemplar.

Se vier um novo pedido para processar o presidente da República, deve ter o mesmo destino dos anteriores, pois, no final do mandato, abandoná-lo não representaria ganho político para sua base, logo no início da campanha eleitoral.

Mas o dano político está feito, Temer entra na eleição sem a menor condição de ser um participante competitivo, e nem mesmo os partidos da base do governo se dispõem a defendê-lo. Mais um problema para a tentativa de encontrar um candidato de centro que se contraponha às posições extremas.

O governador Geraldo Alckmin, na busca de uma posição que neutralize a ascensão visível de Jair Bolsonaro, deu uma de radical como primeira reação ao denunciado atentado contra a caravana de Lula: “O PT colhe o que plantou”. Nada parecido com Bolsonaro simulando um tiro na cabeça de um boneco de Lula presidiário, mas uma tentativa desastrada de mostrar-se capaz de enfrentar o ex-presidente.

Recuou depois, voltando ao perfil de estadista. Mas infelizmente o eleitor parece que não está em busca de estadistas. E os que posam de tal, como Temer e o próprio Alckmin, não correspondem ao perfil, nem têm liderança que o país necessita neste momento.”

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Nesta data máxima da cristandade, (ou a segunda máxima porque às vezes se coloca o Natal com sendo a maior), quando Jesus morreu para nos salvar, eu sempre procurava um texto religioso para publicação neste blog.

Quase sempre, a escolhida era nossa amiga Lucinha Peixoto, que tinha a religiosidade à flor da pele, ou mesmo do amigo Zezinho de Caetés relembrando de alguma procissão em sua terra natal. Eu mesmo ainda relembrei muito nossa Paixão em e por Bom Conselho, em outras sextas-feiras da paixão.

Mas, na época atual com a bagunça política em que se encontro nosso religioso país, como manter a tradição? Trouxemos então o imortal Merval Pereira, onde ele aborda a prisão de quase “todos os homens do presidente”, referindo-se ao presidente Temer. Óbvio que lembramos do velho e bom filme que retratava a causa da renúncia do Richard Nixon, pelas safadezas que ele fez no processo eleitoral americano.

E a pergunta que se faz é se teremos um processo aqui, que levará nosso presidente à saída, como ocorreu por lá. Eu já sei que a renúncia não passa pela cabeça do Temer, pois significaria quase a cadeia, e ele sempre tentou respeitar a fila sabendo que Lula tem que ir primeiro. E a renúncia, em termos de presidentes, só passou na cabeça do Jânio por que não batia bem da bola.

Aqui, mesmo com a comprovação de todos os malfeitos do mundo, é bom esperar pelo julgamento do STF, pois, como se sabe é a perder de vista.  Então seria muito difícil alguma crucificação por aqui nesta data. Pelo contrário. Nossa Suprema Corte, celebra o feriado triste para alguns, para torna-lo alegre para outros, como para o Lula que continua em casa comendo seus ovos de páscoa.

De qualquer forma, espero que chegue o Domingo de Páscoa e que todos sejam felizes neste dia, o que não aconteceu para “todos os homens do presidente”.

terça-feira, 27 de março de 2018

Os órfãos de Lula





“Os órfãos de Lula
        
Por Vera Magalhães

Lula ganhou algum tempo no Supremo Tribunal Federal e pode até ter a prisão postergada indefinidamente caso os ministros lhe concedam habeas corpus após o longo feriado da Páscoa Suprema. Mas dificilmente será capaz, também, de engavetar a Lei da Ficha Limpa e estar na cédula em outubro. E para onde irá um patrimônio de espantosos quase 30% dos votos já declarados?

Para responder à pergunta que parece açular a cobiça de pré-candidatos de A a Z – alguns tão inebriados pelo próprio sonho que desconhecem a completa inviabilidade de sua postulação – é preciso entender melhor quem é esse renitente eleitor lulista.

Grupos focais de classes C, D e E em pesquisas qualitativas mostram que trata-se de alguém que vota no petista porque obteve, em seus governos, algum ganho pessoal: colocou o filho na universidade, obteve uma casa, comprou bens de consumo antes inacessíveis. E perdeu esse status depois.

Esse eleitor não considera Lula um guerreiro do povo brasileiro, perseguido pelas instituições ou vítima de um golpe. Pelo contrário: nos grupos de pesquisas, é comum as pessoas dizerem que sabem que Lula é responsável pela corrupção na Petrobrás e em outras áreas do governo, que acham que se beneficiou pessoalmente de propinas, mas ainda assim votam nele.

O lulista pragmático não é de esquerda. Portanto, não vai olhar para as várias opções de candidatos de esquerda que se colocam como eventuais herdeiros de Lula – e só essa expectativa explica o espetáculo da multiplicação de candidaturas nesse campo.

Há uma boa parcela dos órfãos de Lula querendo ser adotada por Jair Bolsonaro, o que deve fundir a cabeça do militante de boné e camiseta que se emociona ao postar #freelula em suas redes.

Esse segmento enxerga no candidato da extrema-direita qualidades que também atribui ao caudilho da esquerda: cabra-macho, fazedor, corajoso, nacionalista, capaz de “enfrentar” os poderosos etc.

Segundo Maurício Moura, do Ideia Big Data, desde 2017, quando o instituto começou a tentar ver para onde iria o voto lulista, há sempre uma parcela entre 10% e 15% que migra para Bolsonaro. “No Rio de Janeiro, esse número sobe para 40%”, diz ele à coluna.

Esse híbrido de lulista e bolsonarista é majoritariamente homem, de até 35 anos, morador de grandes centros urbanos e de classe C. Muito concentrado no Sudeste.

Há ainda outra migração improvável: de Lula para Joaquim Barbosa, que até aqui ainda pena para viabilizar sua candidatura. O algoz de PT no mensalão aparece em pesquisas do próprio PT como um candidato capaz de abiscoitar os votos do chefe. Pela origem humilde, a história de vitória pelo mérito e, de novo, o voluntarismo/coragem. Tanto é assim que Barbosa foi apontado como candidato forte por ninguém menos que José Dirceu, em recente jantar com deputados, como informei no BR18.

Para pirar ainda mais os que só conseguem ter uma visão polarizada e binária da política: Barbosa pode entrar com sucesso no eleitorado de…Bolsonaro. Disputaria com ele o título – equivalente a uma carta de “saída livre da prisão” no Banco Imobiliário – de “candidato não citado na Lava Jato”, com um plus em relação ao candidato do PSL: é novo na política e deu uma contribuição real e pessoal no combate à corrupção, no mensalão.

Num pleito em que o eleitorado vai às urnas indignado, como ficou muito claro com as reações ao espetáculo dantesco do STF na semana que passou, tentar “blocar” os candidatos e projetar o segundo turno segundo métricas passadas, como esquerda x direita ou PT x PSDB, parece não só redutor da realidade como um caminho certo para erros. De partidos e analistas políticos, jornalistas incluídos.”

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AGD comenta:

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segunda-feira, 26 de março de 2018

Vamos nos fantasiar de bandidos?





“Todos por um
        
Por Eliane Cantanhêde

A garantia de liberdade para o ex-presidente Lula foi adiada por mais treze dias, porque os ministros do Supremo tinham pressa para pegar o avião, mas é só uma questão de tempo. Resultado do plenário não se arrisca de véspera, mas tudo indica que o habeas corpus será concedido em 4 de abril, livrando Lula da cadeia e abrindo a avenida que leva ao fim da prisão em segunda instância e a uma encruzilhada para a Lava Jato.

Em vez de esperar a boa notícia sentado, de camarote, Lula aproveita para fazer o que mais gosta: campanha eleitoral. Em Brasília, ministros do Supremo se estapeavam por causa do HC de Lula. No Sul, ele seguia em caravana e, apesar de alguns percalços e vaias, fingia que não era com ele. Provavelmente já sabendo que, fizesse sol ou chuva, a conclusão do julgamento no TRF-4, amanhã, não o levaria para cadeia.

A história, porém, não acaba aí. Toda essa tempestade sobre o STF é por causa de uma só condenação de Lula, mas o triplex do Guarujá é apenas a primeira ação contra o ex-presidente, que responde ainda pelo sítio de Atibaia (aquele que tem a cozinha igualzinha à do triplex), o Instituto Lula, a Zelotes e... o que mais? São tantas que a gente nem consegue lembrar.

E tem mais: o front penal é um, o eleitoral é outro e Lula passa a ser tecnicamente ficha suja a partir de amanhã, confirmando que a sua candidatura à Presidência é pouco mais de uma ficção e que estará pronta para ser impugnada assim que registrada.

Dado o salvo conduto para Lula e os ministros atravessarem a Páscoa em paz e confirmada daqui a pouco a vitória dele no julgamento do mérito do HC, estarão dadas as condições para a votação, mais cedo ou mais tarde, de uma Ação Direta de Constitucionalidade (ADC) que confirme a liberdade de Lula e a amplie para os demais condenados em segunda instância.

Vem aí uma enxurrada de HCs, mas o Supremo terá tempo para eles, já que o ato seguinte desse script será o fim do foro privilegiado no dia 26. A partir daí haverá uma movimentação frenética: no Supremo, os HCs salvadores, não da Pátria, mas de quem foi condenado por espoliá-la; nos Estados, deputados, senadores e ministros avaliando seus juízes. Eles são ou não da turma do Moro, do Bretas e do Vallisney?

Quem for do Paraná, do Rio e do DF reza pela manutenção do foro privilegiado. E quem não é? Deve ter muito político acendendo velas pelo contrário, para sair do Supremo e cair no seu hábitat natural, onde ele costuma nadar bem mais à vontade. Vai virar uma loteria. Cada juiz uma sentença.

Isso, porém, não é o fim, é só o começo. Vem a primeira instância, vem a segunda, fase crucial, a das provas. E aí? Aí, depende. Se mantido o atual entendimento do Supremo, o sujeito e a sujeita, se condenados, já poderão ser presos. Se esse entendimento mudar, como preveem o mundo político e o jurídico, não acontece nada. O (a) condenado (a) esperneia, culpa a imprensa, xinga a justiça, diz que é golpe e vai curtir a vida, livre, leve e solto (a), enquanto seus advogados vão em frente, por anos e anos, de recurso em recurso, até que o processo dê a volta ao mundo e acabe de volta ao lugar de partida, o Supremo. Só que... vinte anos depois.

Resumo da ópera: como já dito aqui, neste mesmo espaço, a combinação de fim da prisão em segunda instância e fim do foro privilegiado é explosiva. Até porque deverá haver uma explosão de fogos e de champanhe para os réus da Lava Jato. Uma festa, o melhor dos mundos.

Por falar nisso, o fim do mundo será quando Collor virar candidato à Presidência e quando o ex-senador Luís Estevão entrar com um HC exigindo equiparação com o caso Lula. São casos diferentes, mas se o STF é camarada com um, por que não seria com os outros?”

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AGD comenta:

São tantos os textos que falam do mal comportamento do nosso Supremo Tribunal Federal que passei um longo tempo escolhendo o acima, da Eliane Cantanhêde, para este simples comentário. Deste jeito, quem sabe, formar-me-ei em Direito e aprendendo “juridiquês”.

Imaginem aqueles que leram o texto se pensarem ainda que, ao invés de julgarem o HC de Lula no dia 4 de abril (não sei porque não marcaram para o primeiro de abril, o que seria muito mais adequado, por ser o dia da mentira), que algum do ministro peça vista e só volte com o processo em 2030. Até lá o Lula ficaria solto e provavelmente presidente por mais 12 anos, como o Chávez na Venezuela.

É triste até de pensar, mas, temos que encarar todas as hipóteses, inclusive as boas como a possibilidade de negarem o HC e acabarem com a pouca vergonha que o próprio STF começou. Deus me ouça ou me leia!

No entanto, a hipótese do artigo da Eliane é muito mais plausível, e, se acontecer, teremos tantos bandidos soltos pela rua, que devemos todos nos comportarmos como tal. Que tal uma fantasia do Capitão Gancho?

sexta-feira, 23 de março de 2018

O que será do amanhã? ....




“A clara encruzilhada
         
Por William Waack

Parece bem distante de nós o Brasil do comecinho de 1975, quando escrevi pela primeira vez para o Estadão. Mas é fácil voltar no tempo graças às excelentes ferramentas do Acervo do jornal. E duas manchetes de março daquele ano – quando comecei como freelancer do jornal na então Alemanha Ocidental – chamaram minha atenção: “Geisel diz que o Brasil introduziu o planejamento estatal”. E a outra: “Sarney pede estabilidade institucional”.

Quarenta e três anos depois, diante de decisivas eleições em outubro de 2018, este é o País que ainda convive com clãs políticos como o do Sarney, e carrega também a figura quase mítica da intervenção estatal na economia, simbolizada pelo general Geisel?

Experimentamos nestas mais de quatro décadas a tentativa, levada adiante por mais de uma geração, de democratizar o Brasil, torná-lo menos desigual e construir nele um Estado de bem-estar social – que quebrou. E, lá fora, no mundo que continua tão distante para nós, passamos pelo fim da ideia (o fim do fim da História) de que prevaleceria no planeta a ordem democrática liberal – que está sendo quebrada.

Fui correspondente internacional em várias fases por 21 anos na Europa e Estados Unidos e me acostumei a ter de explicar nosso país para públicos estrangeiros. Acabei sendo surpreendido, semana passada, pela pergunta aparentemente simples feita por um alto executivo de uma multinacional alemã, que veio pela primeira vez a São Paulo com a missão, atribuída pela diretoria da empresa dele, de escrever um relatório sobre megatendências nos países emergentes. “Onde o senhor acha que o Brasil estará daqui a 20 anos?”, foi a pergunta.

A ouvi-la quase engasguei com a carne da excelente churrascaria (afinal, somos uma extraordinária potência agrícola, que a gente adora demonstrar para estrangeiros). Olhando para os últimos 40 anos, também para os últimos 20, e tentando enxergar adiante, minha tentação inicial era dizer pro alemão, que acabara de chegar a São Paulo vindo de Xangai: “Seremos mais do mesmo”. Um país aquém do que poderia ser, mas com bolsões de excelência. Grande e rico em recursos, mas pequeno no cenário internacional. Democrático e seguindo mais ou menos as regras de um estado de direito, mas com instituições sempre sob ameaça. Cheio de vigor e criatividade, mas sufocado por regulação, burocracia e corrupção. Já não tão jovem.

“Depende”, acabei dizendo, “daquilo que os brasileiros decidirem no final do ano”. A encruzilhada é clara: vamos seguir a trilha rumo a um país mais aberto, mais justo, que facilita e dá mais oportunidades a qualquer um de empreender, crescer, prosperar? Ou deixaremos que o corporativismo (não só estatal), o populismo fiscal irresponsável (não importa a coloração política) continuem mandando como fizeram particularmente nos últimos anos? O eleitorado entendeu a gravidade das escolhas – e o apego a ideias erradas – que nos levaram ao desastre?

Boa parte do debate no momento está dominada pela selvageria e boçalidade que fizeram de redes sociais sobretudo o lugar da gritaria organizada. E capenga por conta da percepção de que faltam lideranças capazes de criar narrativas políticas mais abrangentes do que o debate circular dentro de tribos de já convertidos. O que torna as próximas eleições particularmente perigosas é o fato de estarem abertas e imprevisíveis.

Há, sim, transformações profundas de cultura política e mentalidades acontecendo no País, mas não há garantia de que elas progridam simplesmente pelo fato de cofres públicos vazios imporem claros limites a qualquer projeto populista. Indignação frente à corrupção também não é suficiente. Não existe inevitável em História, aprendi como repórter. Mas escolhas trazem consequências.”

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AGD comenta:

No texto abaixo o William Waack  confessa que quase engasgou com uma pergunta de um gringo sobre o que ele espera do Brasil daqui a 20 anos. Ora, se no Brasil não se sabe nem quando Lula será preso, como encarar o horizonte de 20 anos?

Neste período, seria de perguntar se o Lula ainda estaria preso, Aécio já teria ido para prisão ou se o Zé Dirceu já voltou à cadeia.

Digo isto porque, atualmente, quando acordo, não sei mais o que encontrar nas manchetes dos jornais, a não ser nas páginas de variedades que mostram a Jojo Todinho e o Pablo Vittar fazendo sucesso. É realmente triste que isto esteja ocorrendo.

Vejam que se cogitou anteontem que a Ministra Cármem Lúcia, presidente do STF poderia até renunciar, pela pressão exercida sobre ela para que as pessoas só sejam presas quando, no linguajar jurídico se passar o “trânsito em julgado”, que, para mim, quase um leigo na matéria, é uma forma de não se prender ninguém que possa recorrer à nossa bondosa justiça.

Então, só me resta repetir a pergunto do gringo numa paráfrase: “Onde o senhor acha que o Brasil estará daqui a 20 dias?”. Eu mesmo não sei responder. Alguém sabe?

quinta-feira, 22 de março de 2018

O silêncio que esse barulho todo esconde





“O silêncio que esse barulho todo esconde

POR FERNÃO LARA MESQUITA

E de repente, ao tombar o quinto milésimo centésimo vigésimo sexto corpo nas ruas onde, se nada piorar, haverão de cair outros 54.864 homens, mulheres e crianças assassinados antes que 2018 acabe, levantou-se o grito: “Mataram um dos nossos”!

E o mundo veio abaixo!

Os arautos do ódio - de classe, de raça, de gênero e o mais - assumem-se. Não pedem soluções, tratam apenas de justificar a guerra. Todos os demais parecem perdidos. Não há mais fronteira entre fato e versão ou relação entre causa e efeito. As “narrativas” são reafirmadas como conclusão da coleção de fatos que as negam. O escrivão da Polícia Federal que “desviou” a munição que matou Marielle, a mesma com que foi perpetrado o maior massacre da história de São Paulo e aparece em mais meia dúzia de outras cenas de crimes hediondos, “foi preso, mas já está solto”. E “nunca foi expulso da corporação”. Frequenta os mesmos locais de trabalho dos heróis da Lava Jato na única polícia centralizada e com alcance nacional do País.

As armas que dispararam as balas que ele forneceu provavelmente têm origem semelhante, mas, ainda que o barulho todo se tenha justificado pela busca de culpados, um valor mais alto se alevanta. O único culpado identificado permanece intocável. Os parentes de suas vítimas continuam pagando os seus especialíssimos “direitos adquiridos”. E não há dado da realidade que abale a fé cega das nossas televisões e seus especialistas amestrados na capacidade das “autoridades” de fazer decretos sonhados se transformarem em realidade. Elas seguem impávidas martelando por minuto que o “controle de armas” e a centralização de todas as polícias são as soluções finais para a epidemia de crimes que insiste em se alastrar desenfreada pelo País com o mais rígido controle de armas e munições do mundo.

Corre paralela uma cruzada furiosa “contra a maledicência”. Exige-se a criminalização da dissonância. “Coletivos” de “especialistas em democracia digital” (?), chancelados como tal pela imprensa profissional, animam-se a publicar índices de pessoas e de sites proibidos. Redes nacionais de televisão promovem diariamente rituais de execração pública de mensagens privadas. Poetas e jornalistas clamam por censura. Tudo está fora de ordem. A mentira e o autopoliciamento já são condições de sobrevivência e as retratações públicas antes das execuções se vão tornando corriqueiras.

“Por minha culpa, minha máxima culpa, pequei por pensamentos, palavras... e obras.” Velhos hábitos demoram para morrer. Cá estamos de volta à fronteira entre a democracia e a heresia. Quantas vezes a humanidade já apagou essa linha e acabou terrivelmente mal?

Os debates nas televisões já começam vencidos. Por trás de cada argumento posto ou omitido esconde-se um privilegiozinho que se quer eterno. O que se propõe nunca é resolver problemas, é, no máximo, impedir que se manifestem os efeitos de não se atacar a causa fundamental que os produz. Vale falar de tudo menos da dispensa da competição, da estabilidade vitalícia no emprego, haja o que houver, dos brasileiros de primeira classe, em plena era da disrupção. A mãe de todos os privilégios. O maior de todos os “foros especiais”. E isso “brifa” todas as tribunas públicas da Nação.

A Constituição de 88 transformou a proteção condicionada às funções de Estado no “direito” de não ser julgado pela qualidade do seu trabalho e a estendeu a todo e qualquer sujeito que, pelo método que for, conseguir enfiar, um dia, um pé dentro das fronteiras do Estado. E, a seguir, “petrificou” sua obra. São 30 anos de impotência absoluta do eleitor e do contribuinte brasileiros antes e depois do ato fugaz de depositar seu voto na urna. São 30 anos de seleção negativa. Tempo bastante para nos acomodarmos, de geração em geração, à discriminação institucionalizada. Tempo bastante para cada casta aprender o seu lugar neste florão da América.

De degrau em degrau, chegamos à beira do último. Já não é o governo quem governa. Ele ousou desafiar os privilégios da privilegiatura e, por isso e não mais que isso, foi desconstruído. Decisões negociadas no Congresso Nacional em nome de 144 milhões de votos? Revoguem-se! É outro que ousou ensaiar um voto contrário aos privilégios da privilegiatura!

Quem de fato governa; quem tem a última palavra sobre tudo são as corporações do Estado aparelhadas pelo “ativismo”, não mais “do Judiciário” como um todo, porque já não é preciso tanto, mas da metade + 1 do STF aparelhado pelo lulismo, que é quanto basta no ponto a que chegamos.

Sem a prerrogativa de retomar mandatos e empregos públicos abusados, de rejeitar leis e decretos malcheirosos, de repelir juízes a serviço da injustiça; sem armar o eleitor para empurrar cada ação do “sistema” na direção do interesse coletivo, a conquista de empregos públicos, de mandatos e de governos basta-se a si mesma e tudo o que as urnas decidem é a delimitação de territórios privativos de caça.

Darwin não tem partido nem respeita nível de escolaridade. Só sobrevive quem se adapta. O “concursismo” passa a ser a única alternativa para a servidão e o “aposentadorismo”, o único horizonte para o futuro. Todo brasileiro sabe, até os analfabetos, qual é a diferença entre prender na 2.ª instância ou nunca, entre permitir ou não que ladrões voltem para dentro dos cofres públicos, entre admitir ou não a permanência de criminosos condenados dentro da polícia. A corrupção sistêmica, a servidão tributária, a anemia crônica do Estado, a miséria e a violência de que o Rio de Janeiro é o exemplo paroxístico e Marielle foi mais uma vítima, são mera consequência disso.

A continuação da privilegiatura é insustentável nos limites da democracia e mesmo nos limites muito mais elásticos da nossa pseudodemocracia. Uma das duas terá de acabar, e já. É isso que está em jogo.”

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quarta-feira, 21 de março de 2018

Um tapetão para Lula





“Um tapetão para Lula

POR JOSÉ NÊUMANNE

Uma lenda urbana atormenta o Supremo Tribunal Federal (STF): a de que o País pegará fogo quando o Tribunal Federal Regional da 4.ª Região (TRF-4), em Porto Alegre, mandar executar a pena de 12 anos e um mês a que foi condenado o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na verdade, o criminoso (não levem a mal o autor destas linhas, mas o fato já foi resolvido em definitivo pela instância cabível no Judiciário) foi presidente da República e, a julgar pelas últimas pesquisas, deve ser o mais popular da História. É fato também que Lula lidera as pesquisas de intenção de voto dos institutos de opinião pública para a eleição presidencial de outubro. E daí?

O argumento da paz social é usado para transformar o fundador e principal líder do Partido dos Trabalhadores (PT) em beneficiário de anistia num lance sórdido, conhecido no popular como tapetão. E este pode configurar o STF como um puxadinho da mal afamadíssima justiça desportiva – com as letras mais minúsculas com que seja possível grafar. Pasme, leitor sensato e incauto, as supremas togas nacionais conspiram para evitar a prisão de um criminoso do qual não há presunção, mas, sim, pretensão de inocência, temendo o rugir das ruas contra a execução de sua pena. Suprema ignorância! O anunciado exército de Stédile, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), não impediu o impeachment de sua afilhada Dilma Rousseff nem paralisou o processo em que ele foi submetido a uma condução coercitiva, tida como humilhante, e condenado pelo juiz federal Sergio Moro a nove anos e seis meses. Muito menos: não conseguiram mais do que interromper o trânsito com pneus queimados para protestar contra a confirmação da condenação, o aumento da pena na segunda instância e a negação de seu habeas corpus pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

O carisma do condenado, liberado para fazer campanha, só elegeu seu poste Dilma com ajuda do PMDB e não evitou a catástrofe de seu partido nas eleições municipais de 2014.

A perspectiva de uma convulsão social com a prisão de Lula é um falso pretexto para que os conspiradores togados, dos quais sete foram nomeados por presidentes dos desgovernos petistas Lula e Dilma, dele se aproveitem para substituírem definitivamente o governo das leis pelo governo dos homens. O modus operandi da cúpula do Poder Judiciário está claramente dando um golpe contra o Estado de Direito (o governo das leis). Mas não está isolado nessa ignomínia, como denunciou um artigo, que é uma verdadeira aula de Direito, escrito pelo professor Celso Lafer e publicado neste espaço no domingo passado. O Legislativo, o Executivo, o Ministério Público e a Polícia Federal são cúmplices!

Os conspiradores togados não o fazem por motivos ideológicos, caritativos ou por generoso garantismo, mas por meros interesses pessoais, passando por cima da ética e da honra com um cinismo deslavado. Um ministro do STF concedeu habeas corpus a clientes da banca de seu cônjuge e julga patrocinadores de empresas de que é acionista. Um ex-colega dele, patrono da causa que poderá ser beneficiada pelo tapetão, eleva a chicana à condição de direito pleno de defesa recorrendo à lerdeza dos julgamentos de uma Corte tartaruga. Duplo vexame: no exercício de cargo no topo de suas carreiras, ganhando salários que servem de teto para todo o funcionalismo, incluindo o presidente da República, participam dos lucrativos negócios da educação e da advocacia, pois lhes é permitido e não percebem quebra de decoro.

Se o STF endossar o tapetão para Lula, apenas porque um de seus membros, Gilmar Mendes, mudou de opinião, será responsável por uma grave crise de insegurança jurídica nesta República de réus. Pois um juiz de primeira instância, três da segunda e cinco do STJ, estas últimas por unanimidade, decidiram pela execução da pena que o STF pode a adiar.

E a segurança jurídica, segundo Lafer, apoiando-se em sólida literatura, assinada por exegetas do escopo de Theofilo Cavalcanti Filho e Tércio Sampaio Ferraz Jr., e no filósofo italiano Norberto Bobbio, “é algo a ser constantemente buscado no Direito por meio da adequada avaliação dos problemas da prova, da qualificação, da interpretação e da relevância”. O professor emérito da USP concluiu suas lições com uma definitiva: a segurança jurídica é atributo, e não impeditivo do bem-estar nacional.

O tapetão para o cliente do dr. Pertence, que troca a reputação por êxito nessa operação, terá, se não for sustado por ministros comprometidos com a democracia no STF, duas outras consequências graves. Para o golpe ser bem-sucedido, a cúpula do Judiciário anulará decisão que tomou há dois anos, por maioria aritmética simples (ao contrário do que desaprendeu o ministro da Justiça, Torquato Jardim, seis não é igual a cinco, é mais), proibindo a prisão de condenados em segunda instância. Atenderão, assim, ao interesse dos potentados da política assustados com o mensalão, que apelaram para a leitura fundamentalista da Constituição, em 2009, para negar prática adotada desde o Código Penal de 1941, como lembrou o advogado José Paulo Cavalcanti Filho, nomeado por Dilma Rousseff para a Comissão Nacional da Verdade. E René Ariel Dotti, defensor de presos políticos na ditadura, concorda com ele.

E mais: ao arrepio da Lei da Ficha Limpa, de iniciativa popular, o condenado por corrupção e lavagem de dinheiro por nove a zero em duas instâncias e no STJ (agora usado por quem quer ganhar tempo para o culpado) participará da campanha eleitoral de outubro. Isso certamente ocorrerá depois que ele for, como tudo indica que o será, condenado pela Lava Jato a mais 20 anos de cadeia por ocultação do patrimônio no sítio Santa Bárbara. Até o cancelamento do registro de sua candidatura ilícita, o condenado disputará a Presidência. Só nos restará apelar: “Valei-nos, Santa Bárbara!””

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terça-feira, 20 de março de 2018

Crise de autoridade





“Crise de autoridade

Por Denis Lerrer Rosenfield

O Brasil vive uma crise de autoridade, justificada por alguns como se fosse algo próprio da democracia. Há um atropelo de prerrogativas de um Poder constitucional sobre outro, mormente pelo Judiciário, que invade competências alheias (o Ministério Público também o faz). Para os agentes de tais atos, tratar-se-ia de um fortalecimento das instituições, quando estas, na verdade, terminam por se enfraquecer. O desequilíbrio torna-se patente. Não há democracia consolidada que não esteja fundamentada no exercício da autoridade. Sem esta se abre caminho para o esgarçamento das próprias instituições democráticas.

Exemplos particularmente claros dessa invasão de competências se encontram em atos de ministros do Supremo Tribunal e da Procuradoria-Geral da República (PGR), que passam a decidir por si mesmos, muitas vezes à revelia da Constituição. O ministro Barroso, por exemplo, em nome de suposta vontade popular ou clamor da sociedade, decide sobre um indulto do presidente, como se pudesse legislar e tomar o seu lugar. O mesmo ministro decide em ato monocrático abrir o sigilo bancário do presidente, prescindindo da própria opinião do Ministério Público.

A PGR pretende abrir investigação sobre atos do presidente anteriores ao seu mandato, como se investigar não fosse uma forma de responsabilizar uma pessoa. Entramos no terreno do opinar, sem que os argumentos aguentem uma análise mais detida. Juízes e promotores começam a brincar com as palavras, como se, por seus meros atos de linguagem, estivesse em curso uma batalha contra a corrupção. A Constituição, de texto, torna-se um pretexto para atos de “interpretação”, que são, mais simplesmente, de mera opinião.

Diria que a questão é de natureza hobbesiana, isto é, quem decide em última instância os assuntos do Estado. Em termos desse filósofo: quem seria o soberano? O que temos observado nos últimos tempos é um protagonismo do Judiciário, tomando a si essa decisão, como se a ele coubesse a última palavra. Numa exacerbação dessa atitude, ministros do Supremo, em decisões monocráticas, representam-se acima da função presidencial. O problema é de monta, pois juízes, promotores e policiais não são eleitos, mas fruto de concurso público. Não exercem, pois, nenhuma função política de representação. Não são representantes do povo, a quem incumbiria a escolha em eleições.

Há uma suposta normalidade, que é, na verdade, enganadora, por ser expressão de algo extremamente problemático, relativo à arte mesma de governar e às suas condições próprias de exercício. O problema não diz respeito tão só, embora tenha agora essa aparência, ao governo atual, mas concerne a qualquer um que venha a dirigir o País. A questão ganha ainda outra dimensão, pois tal desvirtuamento de competências é amplamente apoiado pela sociedade, que vê no Judiciário e no Ministério Público defensores da moralidade pública.

A Lava Jato tornou-se, nesse aspecto, um símbolo nacional. Há, evidentemente, razões de sobra para essa atitude da sociedade, na medida em que políticos e partidos, no Executivo e no Legislativo, se tornaram agentes da corrupção e do desvio de recursos públicos. A imagem desses dois Poderes é muito ruim, por obra do que eles mesmos fizeram. Há, todavia, em curso uma deformação de caráter institucional, visto que Judiciário e Ministério Público se apresentam como a encarnação da ética, mesmo quando assumem posições nitidamente imorais, como na defesa dos seus privilégios, quando da abortada reforma da Previdência ou, agora, numa greve para a manutenção de um substancial auxílio-moradia. Os benefícios particulares surgem velados sob a máscara da luta contra a corrupção.

Reitere-se, aqui, uma condição própria das sociedades democráticas. Os membros do Poder Legislativo e os titulares do Executivo são eleitos, escolhidos pelos cidadãos. Eis um fato da soberania popular, por mais perniciosos que possam vir a ser os resultados dessa escolha. Há outras vias, como a autoritária, em que não há escolhas eleitorais, mas a designação pura e simples dos governantes pelos que detêm o uso da força. Se o Judiciário e o Ministério Público, não escolhidos pelos cidadãos em processos eleitorais, estiverem enveredando pelo caminho de serem eles os “governantes”, estariam entrando num processo de tipo autoritário, embora com o apoio da sociedade, farta dos políticos.

Uma forma de resgate do equilíbrio entre os Poderes e, mesmo, da soberania popular por intermédio de seus representantes seria, por exemplo, a Câmara dos Deputados promulgar decretos legislativos anulando atos excessivos tanto do Ministério Público quanto de ministros do Supremo. Seria uma sinalização de que há limites no que diz respeito à competência da Suprema Corte, cabendo ao Legislativo exercer sua função própria de representante do povo. Atos monocráticos de ministros não são atos de representação popular, que só podem ser exercidos por aqueles que se submeteram a processos eleitorais.

O resultado de todo esse processo é um nítido enfraquecimento da posição do presidente, com este nem podendo exercer convenientemente a sua autoridade estatal. Vê-se obrigado a dar explicações todo o tempo, descuidando-se, em consequência, das atividades propriamente governamentais. Justifica-se incessantemente, quando o País tem urgências que não vão merecer, então, o tratamento adequado. O presidente, na verdade, encontra-se encurralado, como se os artífices desse processo de cunho político tivessem como único objetivo enfraquecê-lo. Para além de uma questão eleitoral, há o problema do exercício mesmo da autoridade. Aparentemente, trata-se do presidente Michel Temer, quando a questão diz respeito não somente a qualquer presidente que venha a ocupar o seu lugar, mas ao destino da democracia brasileira.”

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segunda-feira, 19 de março de 2018

O salto no escuro do STF





“Cartada final do STF
        
Por Eliane Cantanhêde

Avançam as articulações de ministros do Supremo para, em tratativas com a defesa do ex-presidente Lula, acabar com a prisão após condenação em segunda instância e mudar os rumos da Lava Jato. Como a presidente Cármen Lúcia mantém firmemente sua palavra de não colocar a questão em pauta, a solução que emerge é criativa e sofisticada.

Habeas corpus (HC) só pode ser posto “em pauta” pela presidência ou “em mesa” por um deles, o que já não é usual, mas embargos de declaração em liminares podem ir ao plenário e os ministros foram buscar uma liminar de outubro de 2016 para ancorar toda a estratégia: justamente a liminar que permitiu a prisão após a segunda instância, confirmada pelo plenário em dezembro daquele ano por 6 a 5.

A defesa de Lula descobriu, e soprou aos ouvidos de ministros, que o acórdão da liminar nunca tinha sido publicado e isso abria uma brecha para a revisão. Ora, ora, o acórdão acaba de ser publicado agora, em 7 de março, abrindo prazo de cinco dias úteis para a apresentação de recursos. E, ora, ora, o Instituto Ibero Americano de Direito Público entrou com embargo de declaração no último dia do prazo, 14 de março, quarta-feira passada.

Um embargo de declaração numa liminar de um ano e meio atrás, que gerou dois meses depois uma decisão em plenário? Tudo soa muito estranho, muito nebuloso, mas faz um sentido enorme para aqueles que articulam o fim da prisão em segunda instância não apenas para Lula, mas para todos os poderosos que estão ou estarão no mesmo caso.

Lembram que escrevi, neste espaço, que havia um acordão dentro do Supremo para combinar o fim da prisão em segunda instância e do foro privilegiado? A base é uma equação: quem é contra Lula salva a pele dele para salvar a de todos os demais; quem é a favor de Lula salva a pele de todos os demais para salvar a de Lula.

Houve uma sequência de tentativas que acabaram batendo num muro intransponível: a opinião pública, que não consegue digerir a mudança de uma decisão – que já passou por três julgamentos no STF – com o objetivo óbvio, gritante, de evitar que Lula vá para a cadeia.

A primeira tentativa foi convencer Cármen Lúcia de por o habeas corpus preventivo de Lula em pauta, mas ela declarou que mudar uma jurisprudência para beneficiar um réu seria “apequenar” o Supremo. Depois, veio a sugestão de levar ao plenário os HCs de outros condenados, não especificamente Lula, mas ela divulgou a pauta de abril sem incluir a questão.

A terceira tentativa foi escalar um dos outros dez ministros para, driblando a decisão da presidente, colocar a questão em mesa e forçar a revisão. Mas quem? Gilmar Mendes já tinha o seu papel definido no script: inverter o voto e o resultado. O relator da Lava Jato, Edson Fachin, foi categórico ao dizer que não aprovava mais um julgamento sobre o mesmo assunto. Lewandowski, Marco Aurélio e Toffoli avisaram que não entrariam nessa bola dividida.

Criou-se até uma torcida para o decano Celso de Melo assumir o papel e foi aí que surgiu a solução – atribuída a Sepúlveda Pertence, ex-STF e atual advogado de Lula – de publicar a liminar de 2016, gerar um embargo de declaração e levá-lo ao plenário, criando a oportunidade para Gilmar Mendes mudar o seu voto e acabar com a prisão após a segunda instância.

Cármen Lúcia foi chamada para uma reunião na próxima terça-feira, provavelmente para discutir a ideia de, em vez da segunda instância, o plenário autorizar o cumprimento da pena após condenação no Superior Tribunal de Justiça (STJ). A prisão de Lula seria adiada por muitos meses, caso mantida; os presos após a segunda instância entrariam com HC; os futuros condenados respirariam aliviados. E a Lava Jato? O que fez, fez; o que não fez, só fará em parte.”

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AGD comenta:

O Brasil parece está virando um grande programa humorístico, e começo aqui citando uma fala que se tornou refrão na Escolinha do Professor Raimundo do saudoso Chico Anísio: “Estava eu lá em Barbacena...” . Lembram?

Então eu digo: Estava eu a procura de texto para comentar e ofertar aos meus parcos leitores e encontrei o acima transcrito da Eliane Cantanhêde. É uma pena que não seja um especialista em “juridiquês” para comentar com mais rigor o que ela escreveu.

No entanto, como fazendo parte da opinião pública que ela cita, eu só posso dizer o que entendi dele: Se o STF for vencedor nesta última cartada descrita, a justiça brasileira, parafraseando mais uma vez um personagem das comédias (parece do Jô Soares), tenho vontade de fugir e dizendo à justiça brasileira: “....você não quer que eu volte”.

Pois, depois desta, como viver no Brasil, como sociedade civilizada?

Alguns até dirão que estas “conversas” entre os sábios do Direito são normais em uma democracia. Mas, eu, dentro de minha ignorância jurídica, perguntaria: Ora, se são normais, elas podem ir até aonde? Na resposta, estará, talvez, a justificativa para condenar a Princesa Isabel por abolir a escravidão, pois o Estado não pagou aos proprietários de escravos.

Penso que neste caso do Lula, chegamos ao limite das manobras jurídicas, sob pena de ficarmos esperando a revogação da Lei Áurea. Seria um salto no escuro de nossa Suprema Corte.

sexta-feira, 16 de março de 2018

Mais uma do Trump, o menino buchudo





“Guerra comercial ou isolamento?
        
Por Zeina Latif

O presidente dos EUA, Donald Trump, coerente com seu discurso de campanha, anunciou o aumento de tarifas de importação de aço e alumínio. A Europa reagiu mal, ameaçando com uma guerra comercial. Trump, que é do tipo que quer ficar com a última palavra, retrucou dizendo que esta guerra ele ganha.

O assunto começou mal, mas poderá acabar bem.

O caminho para a agenda protecionista de Trump não está tão livre como parece.

Impor tarifas é normalmente uma prerrogativa do Legislativo. A iniciativa de Trump só foi possível, porque ele alegou ser uma questão da segurança nacional, cabendo a decisão, neste caso, exclusivamente ao presidente.

Há oposição de parte da equipe econômica e de seu próprio partido. Gary Cohn, importante conselheiro, renunciou e membros do Partido Republicano, incluindo o presidente da Câmara, Paul Ryan, vieram a público para se opor ao anúncio.

Coube à China ser o adulto da relação, colocando-se contra uma guerra comercial. O ministro do Comércio, Zhong Shan, afirmou que “não há vencedores em uma guerra comercial. Apenas causará desastre à China, aos EUA e ao mundo”. Na mesma linha seguiu a chanceler alemã, Angela Merkel.

Com visão míope e parcial – vício comum de populistas –, Trump aposta nos empregos gerados no setor, desconsiderando os custos futuros para todos. A agenda econômica de Trump é inconsistente. Porém, assim como os erros de Dilma não ficaram evidentes tão cedo, os de Trump também poderão tardar a se materializar.

Corretamente, os republicanos temem o aumento de custos de produção das indústrias que dependem desses insumos (esse efeito tende a ser mais rápido) e de preços ao consumidor em algum momento. Além disso, o fechamento da economia reduz o potencial de crescimento do país.

Outro efeito perverso é nas relações externas. Não existe vácuo de poder. Enquanto os EUA se isolam, a China avança, ampliando sua influência com investimento nos países e reforço de laços comerciais e financeiros com seus parceiros (“soft power”). Por essas e outras, uma nova ordem mundial vai se moldando, com menor protagonismo norte-americano.

Apesar do temor de guerra comercial, esse não parece o cenário mais provável, a julgar pelas reações dos países às decisões polêmicas de Trump. O risco é de isolamento dos EUA. Aqui alguns exemplos.

Primeiro, o recém assinado Acordo Transpacífico (TPP), que teve a liderança de Barack Obama. O agora chamado Tratado Integral e Progressista de Associação Transpacífico (CPTPP) engloba relações comerciais e também serviços e acordos de cooperação em várias áreas. Os EUA se retiraram, mas os demais onze países envolvidos seguiram seus planos. Juntos, representam 15% do comércio mundial. Outros países demonstram interesse em aderir: Tailândia, Indonésia, Coreia, Filipinas e Taiwan. A ausência dos EUA deixa o caminho livre para a China fazer acordos.

Segundo, o Acordo de Paris sobre o Clima, com adesão de 196 países. O acordo havia sido assinado por Obama, mas Trump voltou atrás por considerá-lo prejudicial aos interesses dos EUA, mesmo sendo o segundo maior emissor mundial de gases de efeito estufa. A Casa Branca está sozinha.

Terceiro, apesar da oposição do governo americano desde a época de Obama, o Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura foi criado como alternativa ao Banco Mundial. São atualmente 61 países membros.

Para o Brasil, o impacto do aumento das tarifas de importação do aço e do alumínio é setorial, e não no nível macroeconômico, pelo reduzido peso no PIB. As lições, no entanto, são claras. O Brasil deve responder não com retaliações, mas com aceleração de acordos comerciais com o resto do mundo.

O Brasil é demasiadamente fechado, mesmo levando em consideração seu isolamento geográfico e o tamanho do mercado interno. Isso implica menor estímulo à inovação e menor acesso a tecnologias, insumos e serviços mais sofisticados. A decisão de Trump deve ser estímulo para a abertura e não desculpa para maior fechamento do País.”

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AGD comenta:

Sempre que o Donald Trump (chamado por meu neto de Pato Donald) abre a boca ou usa a caneta eu me lembro daqueles meninos ricos, gordos e chatos do tempo de colégio. Tudo que o “cara” quer é melhorar sua situação junto à turma, mesmo que isto cause problemas para todos.

Pode-se alegar que ele está apenas cumprindo as promessas de sua campanha e que foi aceito pela Democracia americana. No entanto, chega-se a certo ponto que se tem que descobrir em que ele estava errado em suas promessas.

A questão das tarifas sobre importação de aço e alumínio, comentada pela Zeina Latif, no texto acima transcrito, é uma daquelas medidas que no longo prazo, fará com que o menino rico e buchodo Trump ficará sozinho, porque não pensou no futuro.

A economista lembrou bem da campanha de Dilma Roussef no segundo mandato, que foi o maior engodo pelo qual passou o povo brasileiro. Quando já se sabia que o modelo adotado pelo PT estava entrando água por todos os lados e ela insistia nas promessas anteriores para não perder as eleições.

E o que vimos? A economia brasileira foi à breca, com 3 anos de recessão que ainda nos desespera. O que espero é que as instituições americanas saibam lidar com as loucuras do Trump, como aqui se começou a fazer com a Dilma, cassando seu mandato, embora pela metade, pela intervenção do Lewandowski deixando-a com seus direitos políticos para ainda vir aporrinhar os brasileiros nestas eleições.

Sei que é muito difícil limpar o cocô feito por um presidente em matéria econômica mas, não está faltando papel higiênico nos Estados Unidos, como falta na Venezuela. No Brasil, foi preciso muito papel para nos livrar do PT, e agora, concordo com a economista Zeina quando diz que temos é, ao invés de brigar com menino buchudo, aproveitar a oportunidade para melhorar a situação brasileira.

quinta-feira, 15 de março de 2018

Educação e democracia. O que vem primeiro?





“Educação e democracia. O que vem primeiro?
        
POR FERNÃO LARA MESQUITA

Há no YouTube a gravação de um debate sobre a decadência da qualidade da educação nos Estados Unidos de que já recebi cópias pelo menos uma dezena de vezes. Nele Michio Kaku, um divulgador da ciência célebre naquele país, adverte que “ela é o motor da prosperidade que só não entrou em colapso nos Estados Unidos ainda porque o país dispõe de uma arma secreta, o H-1b”, que vem a ser o “visto especial para gênios” que o governo concede (ou concedia até Trump) com largueza suficiente para fazer do país um “ímã que suga todos os cérebros do mundo”.

Isso é menos de metade da verdade. Se transformar-se num “ímã” de cérebros privilegiados fosse apenas uma questão de conceder vistos facilitados, ninguém teria problemas em conseguir o mesmo efeito. Os Estados Unidos atraem os cérebros mais brilhantes do mundo pela mesma razão pela qual o dólar é a moeda de referência e sustentação de todas as outras. Porque o seu sistema de governo é o único onde a vontade de um presidente sozinho não pode nada e a vontade popular realmente impera. É porque o país dispõe de instituições montadas para permitir que a vontade dos representados seja imposta aos seus representantes (a saber: voto distrital puro, eleições primárias diretas, recall, referendo, iniciativa, e eleições de retenção de juízes), que o sistema se torna disposto a e capaz de corrigir erros. E isso porque “erros” persistentes nunca são função de enganos genuínos, mas sim da condição dada a uma oligarquia para criar e manter privilégios manipulando instituições calculadamente entortadas para lhe dar esse poder.

O cidadão exerce a sua liberdade, na prática, na sua dimensão de produtor e consumidor na medida em que possa escolher entre patrões e fornecedores competindo entre si por sua preferência. O resto é poesia. Já os déspotas, depois do surgimento das armas de extinção em massa, deram-se conta de que entrar no jogo econômico é o único modo de projetar poder internacionalmente e continuar vivo. A diferença essencial entre os capitalismos de estado e o capitalismo democrático está, portanto, nos objetivos que se propõem. O primeiro visa o bem-estar do indivíduo que depende do estado impor limites ao capital em nome da preservação da concorrência que garante a liberdade individual. O outro requer a concentração dos poderes do capital e do estado nas mesmas mãos e a sujeição de tudo o mais ao objetivo de projetar internacionalmente a hegemonia que o ditador e seu grupo já exercem internamente. Um só pode avançar com benefício de todos pelos acrescentamentos da inovação que depende da garantia da propriedade intelectual pelo estado. Os outros impõem-se pela lógica do monopólio que tem no pirateamento das invenções alheias e na exploração pelo estado da sua condição de único empregador a vantagem competitiva que lhes permite esmagar concorrentes pelo mundo afora.

Quando, porém, esses expedientes ou outra causa qualquer produzem turbulências na economia mundial, as chinas todas, para proteger os lucros acumulados que são a munição da sua guerra pela hegemonia econômica, correm para abrigar-se... nos títulos do governo americano. Por quê? Porque ele é o único do mundo que não tem o poder de calotear seus credores internos, que contam com instituições que os fazem mais fortes que o próprio governo, o que redunda na extensão dessa mesma garantia aos credores externos. As explicações conspiratórias e “imperialistas” para a força do dólar são mentirosas. Ele é o que é em função da qualidade das instituições do país que o emite.

Assim também os “gênios” do mundo. É para os Estados Unidos que eles afluem não porque seja fácil conseguir um visto, mas para fugir de governos como os das chinas do mundo onde os ditadores da hora podem fazer de seus súditos o que bem entenderem quando bem entenderem, o que torna impossível a liberdade, a estabilidade e a continuidade que a pesquisa pura e a verdadeira inovação requerem.

No Brasil é voz corrente que instituições de qualidade são produto de uma boa educação e que como não temos uma boa educação jamais teremos instituições de qualidade. Historicamente, entretanto, a ordem desses fatores tem sido a inversa. A boa educação é que é consequência da conquista de boas instituições. A “educação” patrocinada pelos regimes estabelecidos está sempre casada com a religião, vale dizer, com o dogma oficialmente aceito, o único livre de repressão. E sua função é reproduzir o sistema instituído. Lutero primeiro denuncia o dogma que sustenta as instituições anteriores. E para se compor com os príncipes que queriam se livrar do papa, exige educação gratuita e obrigatória para todos. Na Inglaterra seiscentista, igualmente, é só depois que a volúpia de Henrique VIII institui a liberdade religiosa e “legaliza” a convivência com a diversidade de crenças que se abre o espaço que vai ensejar o nascimento da ciência moderna. Nas experiências asiáticas, mais recentes, é sempre o déspota esclarecido que denuncia o dogma anterior (o socialismo). Só então abre-se o caminho para a reforma da educação que, mais adiante, consolida a mudança.

O Brasil mantém “petrificada” a sua miséria medieval muito mais graças ao desconhecimento meticulosamente construído das curas disponíveis mediante um controle estrito da educação e da mídia que por uma recusa consciente da população a tomar os “antibióticos institucionais” que poderiam facilmente curá-la. E essa afirmação de que “estudar medicina” seria um requisito prévio para que esses remédios façam efeito aqui faz parte da mentira de quem nos quer para sempre doentes. Eles curam quem quer que os tome, independentemente do que lhe tenham “ensinado” na vida.

Uma boa educação requer, de qualquer maneira, no mínimo duas ou três gerações. O atalho obrigatório, que é o que abre caminho para ela, é ousar na reforma das instituições.”

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quarta-feira, 14 de março de 2018

Não há plano, faz-se um plano





“Não há plano, faz-se um plano
        
POR FERNANDO GABEIRA

Planejava escrever mais um artigo sobre política de segurança nacional, tal como espero que seja discutida em 2018. Celso Rocha de Barros, em sua coluna na Folha, me fez uma pergunta pertinente: afinal, qual a intervenção que apoio? Já tratei parcialmente do tema em artigos anteriores. Mas não gostaria de parecer vago a respeito do lugar onde vivo, sobretudo diante de um interlocutor qualificado.

Defendo uma intervenção completa num governo em ruínas. Mas já que se deu apenas no campo da segurança e tem como instrumento o Exército, ela deve deixar bem claro o momento de terminar. Esse marco final não é definido pela rigidez do calendário, mas pela execução da tarefa: reduzir, ainda que modestamente, os índices de criminalidade e reestruturar a polícia para que possa cumprir sua tarefa. Nesse campo, dois pontos são essenciais: o combate à corrupção, pois ela enfraquece as chances de reduzir a criminalidade; e dotá-la de equipamentos, treino e meios técnico-científicos de investigação.

Desde repórter policial, ainda garoto, percebia que a polícia estava atrás de seu tempo. Foi uma opção da sociedade brasileira, que subestimou sua importância. Essa escolha é uma fonte de violência, pois sem inteligência e métodos de investigação a busca de alguma eficácia induz à tortura e à intimidação. No caso da polícia do Rio de Janeiro, existe ainda uma questão elementar: pagar os salários em dia.

Quanto aos métodos, defendo uma intervenção que não veja as favelas como território hostil, mas como território amigo controlado por forças hostis. Isso implica o compromisso de respeitar as pessoas, algo que alguns já percebem também como o desejo dos militares.

E quais são as forças hostis? Os grupos armados ocupando territórios: traficantes de drogas, que se desdobram em ladrões de cargas, e as milícias, que vendem segurança, gás e transporte alternativo.

Sou contra a ocupação militar das comunidades. Há anos afirmo que nem o Exército chinês exerceria folgadamente essa tarefa. São mais de 800 só na capital, sem contar a Baixada Fluminense e cidades médias, como Campos e Macaé.

Como combater esses grupos sem ocupar? Essa é uma questão que inteligência e meios técnicos podem responder ao menos parcialmente. A tática de ocupar as comunidades leva os grupos armados a utilizar, instintivamente, um princípio da guerrilha: dispersar quando o inimigo se concentra, concentrar-se quando ele se dispersa.

Em 2010, no contexto da campanha política, traçamos um mapa da ocupação armada no território do Rio, indicando quem a dominava. Esta semana recebi um esboço que mostra como a mancha de território ocupado se expandiu.

Defendo também uma intervenção que estimule, por sua presença, o avanço da Lava Jato sobre o mundo político do Rio. Há muita coisa a fazer, até porque o atual governo era parte do esquema criminoso de Sérgio Cabral.

Finalmente, afirmei que a sociedade, que já se movimenta, via aplicativos como Onde Tem Tiroteio e Fogo Cruzado, poderia ajudar as forças de intervenção. Mas precisaria conhecer seu plano.

Os militares foram convocados de surpresa e precisam estudar melhor o quadro. E de mais treino no contato com a imprensa, que não é de seu cotidiano

Tenho consciência de que o governo Temer é impopular e terá grandes problemas com a Justiça quando perder o foro privilegiado. Mas sinto que vivemos no Rio uma situação emergencial. Outros Estados também sofrem com a violência. Constatei isso no Amazonas, no Maranhão, em Alagoas e pretendo mostrar os casos do Ceará e do Rio Grande do Norte.

Mas em nenhum ponto do País perdemos tanto território para grupos armados.

Os números sobre mortes no Brasil, superando os de muitos países em guerra, já eram um argumento para o tema subir ao topo da agenda nacional. Temer é o presidente que existe, o único capaz de convocar as Forças Armadas. Se alguém acha isso um golpe de mestre político, é porque tem visão curta.

O próprio Exército, com alta credibilidade, não se lançaria numa tarefa dessas para salvar um governo com alguns já na cadeia e outros arrumando a mala. Se Temer não cumprir as condições mínimas para a execução da tarefa, espero que isso fique claro no balanço dos interventores e o desgaste caia nas mãos de quem merece.

Em linhas gerais, essa é a intervenção que defendo. Posso alterar minha visão diante de argumentos contrários.

O mais difícil, entretanto, é convencer as pessoas que, como todos nós, acreditam que a segurança é limitada, que é preciso melhorar as condições sociais, a educação. Não percebem a emergência. Como chegar com serviços sociais a uma favela ocupada? Como ter eleições livres em áreas onde só podem entrar alguns candidatos?

Arruinado, o Rio não consegue sozinho ocupar seu território. Mesmo com ajuda federal e a presença do Exército é uma tarefa de longo prazo. Quem vê os militares se preparando para combater os grupos armados vê também um horizonte para a libertação territorial da cidade.

Defendi apenas alguns princípios da intervenção. Não explicitei planos porque isso é tarefa dos militares. Admito até que não tinham nenhum. O que fazer? Foram convocados para uma emergência. Não temos plano? Faz-se um. Visto com seriedade, para quem foi convocado de surpresa isso leva tempo.

O atraso na aceitação da segurança pública na agenda nacional atravessou a redemocratização. Entre nossos presidentes, havia um desprezo aristocrático pelo tema.

Com todas as críticas que faço ao governo Temer, procuro ter uma visão política; não reclamar quando o outro chega atrasado às evidências, mas simplesmente afirmar: é bom que, finalmente, tenha chegado.

Não vejo alternativa melhor para o Rio. Prefiro ajudá-la, contra os ventos e marés da esquerda. Não é a primeira vez que discordamos. Já estamos acostumados.”

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