“A desconfiança
social
Por Gustavo
Franco
No Brasil, as
pessoas não confiam umas nas outras, e menos ainda nas instituições. A família
e os amigos se salvam e olhe lá. No governo, então, nem se fala. Deve ser por
isso que somos os líderes mundiais na produção de advogados.
Em avaliações
comparativas com outros países, nossos índices de “confiança social” (“capital
cívico” ou, em inglês, “social trust”) são vergonhosamente baixos, e o surto
recente de corrupção na política certamente piorou as coisas.
É verdade que o
Judiciário funcionou, ainda que não homogeneamente, e qualquer pequena sensação
de impunidade funciona como a janela com vidros quebrados, um mau exemplo que
convida à transgressão.
Mas não se deve
perder de vista que as raízes desse fenômeno de “desconfiança social” se
estendem para bem longe no passado, alcançando a época da “nação
mercantilista”, conforme a expressão de Jorge Caldeira.
A história
parece demonstrar que o Estado coletor de impostos, o maior de todos os
rentistas, surge antes mesmo da Nação e vai sofrendo metamorfoses que apenas
vão reforçando o conceito de que o Estado é um fim em si mesmo, ou uma cabeça
cada vez maior que o corpo, uma criatura permanentemente preocupada em
encontrar novas formas de atuar e crescer, como um parasita buscando ser maior
que seu hospedeiro.
A hipertrofia
do Estado não distingue classes, pois trata de multiplicar atribuições
decorrentes de desconfiança, quando não a hostilidade, relativamente ao capital
e também quanto ao trabalho.
Com relação à
empresa basta lembrar que somos o último colocado, em uma amostra de 190
países, quando se trata do tempo que uma empresa média gasta para cumprir suas
obrigações tributárias, as principais e as acessórias.
É como se o
Estado estivesse dedicado a punir os empreendedores, esses personagens que
teimam em produzir riqueza, pois eles estariam permanentemente empenhados em
ocultá-la do Fisco. O tratamento é duro. O cotidiano da pequena empresa diante
da fiscalização predial, tributária, ambiental ou sanitária é o de quem não
sabe se vai voltar para casa inteiro.
É como se o
Estado estivesse ali, jamais para melhorar o ambiente de negócios e trabalhar
pela comunidade, mas para oprimir empresas privadas que existem apenas para
pagar impostos e obedecer.
Pelo lado do
trabalho a desconfiança se manifesta em outro formato. Parte-se da idealização
de uma sociedade dividida (patrão/empregado) e cria-se o conceito que a “parte
menos favorecida” é incapaz de decidir sua própria vida e precisa ser tutelada.
Para garantir
essas e outras milhares de regras, o Estado cria, então, estruturas gigantescas
que tornam desnecessárias as combinações particulares, pois qualquer contrato
de trabalho sempre poderá ser desfeito e refeito na Justiça do Trabalho.
Para que serve
o contrato e a confiança que as partes depositaram nesse instrumento? Não é
claro que esse sistema fomenta a desconfiança e incentiva a litigância que, por
sua vez, requer mais tribunais para resolver? Em vez disso, a regulação do
trabalho não deveria promover o emprego e a produtividade qualquer que fosse o
caminho escolhido pelas partes?
Esses tribunais
custaram R$ 17 bilhões em 2016 (o equivalente a 0,27% do PIB). O valor é mais
do que toda a Justiça do Reino Unido precisa para funcionar. E pior: o que está
em jogo é bem menos do que custa o mecanismo.
No ano de 2008
tínhamos 16 milhões de ações na Justiça do Trabalho, cujo valor médio era de
cerca de R$ 15 mil. O custo total da própria Justiça naquele ano foi de R$ 9,1
bilhões, ou seja, cerca de R$ 57 mil por processo.
As legislações
tributária e trabalhista parecem guiadas por um contrato social equivocado,
fundado na desconfiança mútua, e que leva a um equilíbrio ruim, pelo qual os
incentivos estão errados (a desconfiança produz transgressão, ambas se
reforçando) e a única lógica discernível é a que leva ao crescimento do número
de funcionários públicos.
Está mais do
que na hora de mudar o paradigma.”
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AGD
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