“A clara
encruzilhada
Por William
Waack
Parece bem
distante de nós o Brasil do comecinho de 1975, quando escrevi pela primeira vez
para o Estadão. Mas é fácil voltar no tempo graças às excelentes ferramentas do
Acervo do jornal. E duas manchetes de março daquele ano – quando comecei como
freelancer do jornal na então Alemanha Ocidental – chamaram minha atenção:
“Geisel diz que o Brasil introduziu o planejamento estatal”. E a outra: “Sarney
pede estabilidade institucional”.
Quarenta e três
anos depois, diante de decisivas eleições em outubro de 2018, este é o País que
ainda convive com clãs políticos como o do Sarney, e carrega também a figura
quase mítica da intervenção estatal na economia, simbolizada pelo general
Geisel?
Experimentamos
nestas mais de quatro décadas a tentativa, levada adiante por mais de uma
geração, de democratizar o Brasil, torná-lo menos desigual e construir nele um
Estado de bem-estar social – que quebrou. E, lá fora, no mundo que continua tão
distante para nós, passamos pelo fim da ideia (o fim do fim da História) de que
prevaleceria no planeta a ordem democrática liberal – que está sendo quebrada.
Fui
correspondente internacional em várias fases por 21 anos na Europa e Estados
Unidos e me acostumei a ter de explicar nosso país para públicos estrangeiros.
Acabei sendo surpreendido, semana passada, pela pergunta aparentemente simples
feita por um alto executivo de uma multinacional alemã, que veio pela primeira
vez a São Paulo com a missão, atribuída pela diretoria da empresa dele, de
escrever um relatório sobre megatendências nos países emergentes. “Onde o
senhor acha que o Brasil estará daqui a 20 anos?”, foi a pergunta.
A ouvi-la quase
engasguei com a carne da excelente churrascaria (afinal, somos uma
extraordinária potência agrícola, que a gente adora demonstrar para
estrangeiros). Olhando para os últimos 40 anos, também para os últimos 20, e
tentando enxergar adiante, minha tentação inicial era dizer pro alemão, que
acabara de chegar a São Paulo vindo de Xangai: “Seremos mais do mesmo”. Um país
aquém do que poderia ser, mas com bolsões de excelência. Grande e rico em
recursos, mas pequeno no cenário internacional. Democrático e seguindo mais ou
menos as regras de um estado de direito, mas com instituições sempre sob
ameaça. Cheio de vigor e criatividade, mas sufocado por regulação, burocracia e
corrupção. Já não tão jovem.
“Depende”,
acabei dizendo, “daquilo que os brasileiros decidirem no final do ano”. A
encruzilhada é clara: vamos seguir a trilha rumo a um país mais aberto, mais
justo, que facilita e dá mais oportunidades a qualquer um de empreender,
crescer, prosperar? Ou deixaremos que o corporativismo (não só estatal), o
populismo fiscal irresponsável (não importa a coloração política) continuem
mandando como fizeram particularmente nos últimos anos? O eleitorado entendeu a
gravidade das escolhas – e o apego a ideias erradas – que nos levaram ao
desastre?
Boa parte do
debate no momento está dominada pela selvageria e boçalidade que fizeram de
redes sociais sobretudo o lugar da gritaria organizada. E capenga por conta da
percepção de que faltam lideranças capazes de criar narrativas políticas mais
abrangentes do que o debate circular dentro de tribos de já convertidos. O que
torna as próximas eleições particularmente perigosas é o fato de estarem
abertas e imprevisíveis.
Há, sim,
transformações profundas de cultura política e mentalidades acontecendo no
País, mas não há garantia de que elas progridam simplesmente pelo fato de
cofres públicos vazios imporem claros limites a qualquer projeto populista.
Indignação frente à corrupção também não é suficiente. Não existe inevitável em
História, aprendi como repórter. Mas escolhas trazem consequências.”
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AGD
comenta:
No
texto abaixo o William Waack confessa
que quase engasgou com uma pergunta de um gringo sobre o que ele espera do
Brasil daqui a 20 anos. Ora, se no Brasil não se sabe nem quando Lula será
preso, como encarar o horizonte de 20 anos?
Neste
período, seria de perguntar se o Lula ainda estaria preso, Aécio já teria ido
para prisão ou se o Zé Dirceu já voltou à cadeia.
Digo
isto porque, atualmente, quando acordo, não sei mais o que encontrar nas
manchetes dos jornais, a não ser nas páginas de variedades que mostram a Jojo
Todinho e o Pablo Vittar fazendo sucesso. É realmente triste que isto esteja
ocorrendo.
Vejam
que se cogitou anteontem que a Ministra Cármem Lúcia, presidente do STF poderia
até renunciar, pela pressão exercida sobre ela para que as pessoas só sejam
presas quando, no linguajar jurídico se passar o “trânsito em julgado”, que, para
mim, quase um leigo na matéria, é uma forma de não se prender ninguém que possa
recorrer à nossa bondosa justiça.
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