POR CARLOS SENA (*)
Desconfie de gente que é otimista
demais. Todos esses que vivem fazendo de qualquer coisa motivo para ser
exemplo, para ser referência, para ser o “lado cheio do meio copo d’água”, para
ser a “limonada do limão”, desconfie. Levar a vida com otimismo é um exercício
salutar que ajuda a vencer dificuldades. Mas, isso é diferente de quem vive
sempre encontrando o lado bom de tudo quando, na maioria das ocasiões, as
coisas precisam ser vistas e sentidas com todos os percalços; com todos os seus
matizes de dificuldades; com todos os seus escopos intempestivos. Viver a vida
achando graça em tudo é mesmo um viver atormentado. Porque o bom da vida é
também saber enfrentar as dificuldades e, após elas passarem, comemorar o seu
crescimento interior. O jogo do “CONTENTE” é um pouco disso. Mas, jogar
“CONTENTE” não modifica, por exemplo, a morte de um grande amor. Porque quando
um grande amor se vai por morte física ou por morte afetiva, há dor para todos
os lados. O ser humano precisa sentir rupturas e com elas tirar as lições que
delas precisar para ser maior e mais humano e mais experiente. Levar a vida
achando que em tudo há o lado bom é verdade. Mas, há também o lado ruim e
aquele lado indefinido que nos machuca e nos maltrata e a gente tem vontade de
sumir, até mesmo de morrer. Nas histórias da humanidade os grandes homes foram
os que passaram, com perseverança, por grandes dificuldades, por grandes
provas. Jesus, Buda, Gandhi, e tantos outros souberam sofrer e tiveram fé. Talvez
o exagero dos que vivem pra tudo achando motivos de sobra para ser otimistas,
tenham mesmo falta de fé. Não a minha nem talvez a sua fé. Mas a fé que cada um
encontra pra se manter vivo e feliz. Porque neste mundo os momentos felizes são
o que conta. Viver na logica do “FELIZ PRA SEMPRE” é fantasioso, mas é desse
verbo que se nutrem os pastores e algumas autoridades do comportamento social
que ganham dinheiro escrevendo MANUAIS de otimismo, sabendo que isso não existe
na realidade concreta. Por isso, neste caso, prefiro o entendimento de que a
vida carece ser compreendida em suas reentrâncias mais naturais. Primeiro
porque não se tem vida eterna. Segundo porque este, em sendo um planeta
atrasado espiritualmente, tem no seu componente básico as provações todas que
passamos. Por isso fica difícil conviver com esse tipo de gente exageradamente
OTIMISTA e que não passam de fajutos jogadores do jogo do CONTENTE. Acho mesmo
que o jogo mais legítimo da vida é o que a gente joga com o destino – porque
vocação de destino é nos dizer que sim quando é não e que é não quando seria
sim... Compreender essa lógica é estar vivo e feliz; é achar graça no que graça
tiver; ou não achando graça em nada... Pelo poder que cada um tem que ter de
dispor de si mesmo em sua vida.
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(*) Publicado no Recanto de
Letras em 31/08/2013
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