Por Carlos Sena (*)
Do que me dizem, ouço. Minha
escuta será sempre seletiva e, por isso, do que me dizem só ouço. Porque ouvir
é próprio dos que tem ouvidos, mas escutar vai, além disso, e requer de nós processo de confiabilidade e perspicácia
no sentir. Porque há quem diga sem sentir e há, certamente os que sentem, mas
não nos dizem. No jogo da sedução, muitos são os que falam, prometem e juram
amor eterno nos ouvidos dos amantes, mas
não se garantem dessa fala a posteriori.
Emprenhar pelos ouvidos é
complexo, mas há quem disso se nutra por absoluta falta de segurança própria.
Prefiro emprestar os ouvidos a uma boa música, ou até mesmo a uma boa “cantada”
sob o abajur lilás... Nas questões do sexo, o tato fala mais alto do que as
palavras e estas, quando proferidas nem sempre nos dão garantias para nossos
exagerados modos de criar ilusões... Senão não seriam ilusões!
No trajeto existencial a escuta
nos garante mais do que a oitiva. Porque muitos são os que dizem “Senhor,
Senhor, mas poucos entrarão no reino dos
céus”... Assim tem sido os jogos que os
humanos gostam de executar muito mais do que o futebol. No futebol se bate na
bola com os pés, mas nas relações se batem nas pessoas com as palavras nem
sempre acalentadoras. Nos estádios as torcidas uivam, vociferam, brigam, matam.
No final do espetáculo, as luzes se apagam e o silencio das arquibancadas fala
sem palavra como que a dizer: os dois tempos do jogo não são como os tempos da
vida. Porque a vida só tem um tempo e os homens é que inventaram de dividi-la
em infância, adolescência, maturidade, velhice ou terceira idade ou boa
idade... Escutar a vida é melhor do que
simplesmente ouvi-la. Suas lições estão por todos os lados e só não aprende
quem não quer... A grande contradição é que nós, no geral, queremos aprender
coisas eternas dentro de uma vida passageira. Muitos vivem nos dizendo isso,
mas escutar acerca só se a alma, de fato, não for pequena para valer a galinha
toda, não só a pena.
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(*) Publicado no Recanto de
Letras em 08/12/2013
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