Por Carlos Sena (*)
Se alguém se interessasse em
saber da minha idade e eu fosse daqueles para quem dizer a idade é um
sacrilégio, poderia dar algumas dicas:
1 – Sou do tempo em que a gente estudava
começando pelo curso Primário;
2 – Depois do Primário, a gente
passava (se a nota das provas permitisse) para o Ginasial;
3 – Depois do Ginasial, então a
gente escolhia no “cardápio escolar” qual curso a gente seguiria: Magistério,
Científico, Clássico, etc.
Só que havia entre o Primário e
Ginasial, o EXAME DE ADMISSÃO, ou seja, a gente só cursava o Ginasial se
passasse numa prova tipo “vestibular”. Havia cursinhos fora da escola com esse
fim, mas a gente estudava em casa e ficávamos tensos, pois ai de quem não
passasse no “ADMISSÃO”...
No bojo do processo educacional
daquela época, havia outras ações interessantes que marcavam a nossa vida.
Caderno de caligrafia! Eu adorava. Leituras em voz alta, eu também amava. Levar
pra casa o dever de casa que hoje se chama tarefa era coisa muito a séria e a gente o fazia com
cara bonita ou feia, senão... Ora senão, senão o safanão nas orelhas a gente
levava, graças a Deus! Ah, mas eu adorava mesmo era levar pra casa, como dever
de casa, uma COMPOSIÇÃO, ou DISSERTAÇÃO. A geste escrevia e no dia seguinte a
entregava ao professor que levava pra sua casa e, no outro dia, ele nos
devolvia com uma nota. Os erros ele grifava em vermelho e nos mandava repetir
trocentas vezes... E a gente fazia. Lembro que um dia em sala de aula eu
escrevi a palavra “NECESSÁRIO” assim: neScessário. A professora passou com
olhar de soslaio e viu. Chamou-me e disse como era que se escrevia e me mandou
escrever 500 vezes a palavra N E C E S S Á R I O. Eu não só nunca mais errei
como me lembro da "fessora" e do seu nome e sobrenome, estado civil
até hoje. Naquela época professora tinha
nome e sobrenome, hoje virou "tia".
Nesse bojo de coisas simples e
efetivas de uma educação que muitos hoje a chamam de "ultrapassada",
lembrei que a gente lia muitos textos. Como o livro didático era difícil e
muito mais raros eram os de leitura propriamente dita, havia uma coletânea chamada
de NOVA SELETA. Nela estavam os textos dos melhores autores brasileiros. A
gente deitava e rolava e interpretava e reescrevia sobre aqueles textos
clássicos e belos. Posso dizer que essa “Nova Seleta” foi quem me salvou e a
ela devo um pouco do que sei ler, escrevere e pensar hoje. Outra parte eu
credito a revista O CRUZEIRO que meu pai era assinante. Eu ficava orgulhoso,
pois meu pai era dos poucos que tinhas assinatura dessa que era a VEJA de
antigamente, mal comparando, claro. Conheci Raquel de Queiroz nessa revista -
ela escrevia numa coluna voltada para as mulheres, mas os homens sempre liam.
No quesito disciplina, as escolas
eram tampa. Se a gente fosse suspenso de aula, o mundo se acabava dentrode nós.
Os pais iam logo ao colégio saber o porquê daquela suspensão. Se a professora
mandasse um bilhete para os nossos pais e a gente não o entregasse, o pau
cantava. No mínimo as nossas orelhas eram responsabilizadas. Outra coisa: se a
gente não passasse numa única matéria, perdia o ano todo. Com isso, passar de
ano dava até um certo glamour! Não havia essa esculhambação de hoje que os
alunos não assistem às aulas, somem e, no final do ano aparecem e a legislação
da pedagogia moderna o manda fazer um trabalho e ele passa... Não só passam de
ano, mas passam com louvor para o mundo das drogas, passam para a falta de
respeito. Passam a surrar os professores, passam a currar as alunas no
banheiro, passam a praticar o buling, e, não raro, passam os pais pra trás. Os
pais, por sua vez, só se sentem passados pra trás quando a polícia bate na porta e eles (os
pais) ficam se perguntando “onde foi que eu errei”? Pois é. Falar em educação é
difícil, mas a educação é processo e, como processo requer regras, rigores,
limites. Isso, a escola moderna esqueceu faz tempo, bem como também muitos
pais. Disso tudo, uma certeza, ou muitas: se essa escola fajuta que está ai
montada no ufanismo de uma pedagogia dita moderna (usam e abusam de Paulo
Freire) não tem dado conta do seu recado, precisamos rever tudo isso. Devemos
acabar com essa irresponsabilidade de ver o aluno como os olhos do pedagogismo
e do psicologismo. Aluno precisa ser reprovado quando essa for a sua resposta
ao processo educacional. Aluno precisa respeitar professores, pais, colegas.
Aluno precisa do limite que os pais nunca deram em casa. Precisa, acima de
tudo, estudar e professor ensinar. Ora, se a nossa educação está uma bosta,
certamente é porque os bons professores que são em quantidade reduzidas estão
sendo vencidos por aqueles que fazem da educação um bico; e por alguns pais que
entregam suas responsabilidades à escola porque não sabem ser pais e, talvez,
botaram filhos no mundo por ignorância ou porque não sabiam usar camisinha.
Porque certas qualidade de crianças que vemos hoje por aí não merecem ser dignas
de terem nascido do ventre de mulher, mas de onça, com todo respeito às onças.
Por isso as chamo de crionças e quem quiser que se prove em contrário, pois que
nós outros já temos essa prova em nosso redor.
Assim, se você quiser saber a
minha idade, pode. Mas não se assuste que eu sou da geração dos que já chegaram
aos sessenta anos. Detalhe: sabendo ler e escrever e contar. Sabendo respeitar
os mais velhos e tendo ética na vida e tendo respeito aos diferentes. Melhor:
sabendo elaborar, falar em público e respeitar o próximo. Se a minha escola é
considerada ultrapassada, graças a Deus que ela assim foi! De uma coisa eu
tenho certeza: se eu tivesse filho não saberia o que fazer com ele diante dessa
educação frouxa, que, grosso modo, leva nada a lugar nenhum. Pior: tem valido
menos do que sulfato de pó de peido.
Ainda bem que existem alguns pais
responsáveis que salvam a pele dos seus filhos com educação doméstica dura, mas
sem falatar com o amor que eles precisam como gente.
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(*) Publicado no Recanto de
Letras em 08/04/2013
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