“Os desafios de uma nova meta
O Estado de S. Paulo
Será muito difícil o governo
alcançar a meta fiscal deste ano, um déficit primário de no máximo R$ 139
bilhões, se a economia seguir lenta, como no primeiro semestre, e a arrecadação
continuar decepcionante. Reconhecer o problema e escolher um alvo menos
ambicioso poderá ser complicado, política e economicamente, mas talvez seja
inevitável. Ainda neste mês o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, deverá
decidir se uma nova meta para 2017, mais acessível, será submetida ao
Congresso. O assunto está em exame, admitiu o ministro. Será conveniente
resolver o assunto antes do envio, no fim de agosto, da proposta orçamentária
para 2018. Nesse caso, o resultado prometido para o próximo ano também será
revisto. Ficará, então, menos ambicioso que o apontado na Lei de Diretrizes
Orçamentárias (LDO), um saldo negativo de R$ 129 bilhões. As contas primárias
incluem receitas e despesas da administração, mas deixam de lado os juros e a
amortização da dívida pública. Quando o resultado é positivo, o Tesouro
consegue pagar pelo menos uma parte dos juros.
Se optar pela mudança da meta, o
governo terá de enfrentar, como primeira dificuldade, mais uma negociação no
Congresso. Poderá ser um arranjo custoso, especialmente se o novo programa
incluir, como já indicam fontes da Fazenda, aumento de impostos, diminuição de
subsídios e adiamento de reajuste salarial de servidores. Tributar o rendimento
das LCI e LCA poderá ser menos difícil que diminuir o crédito do Reintegra, programa
de estímulo a exportações de manufaturados. Mas o adiamento do reajuste
salarial de funcionários deverá exigir alguma ousadia, embora a medida seja
perfeitamente justificável.
O mercado, pelo menos
internamente, parece preparado para receber a mudança sem grande abalo. Os
economistas do setor financeiro e das consultorias conhecem muito bem as
dificuldades fiscais do governo. Além disso, reconhecem, de modo geral, o
esforço da equipe econômica para ajustar as contas federais e avançar no
programa de reformas.
Falta ver se as agências de
classificação de risco aceitarão uma nova meta, menos ambiciosa, sem rebaixar,
mais uma vez, a nota do crédito brasileiro. Seus analistas têm as informações
necessárias para avaliar os programas do Executivo, mas também conhecem, e este
é o ponto mais complicado, os obstáculos políticos a medidas de austeridade. A
equipe de governo, de toda forma, deverá considerar todos os possíveis custos
de um rebaixamento da meta.
Se o governo renunciar a um
déficit primário igual ou inferior a R$ 139 bilhões, deverá pelo menos buscar
um resultado melhor que o buraco de R$ 159,5 bilhões do ano passado. Da mesma
forma, o déficit programado para 2018 deverá ser menor que o previsto para 2017
no esquema revisto. Esses pontos, adiantados por fontes da equipe econômica,
são mais ou menos óbvios. Ainda será preciso considerar questões mais sérias e
desafiantes.
Pelas previsões ainda em vigor,
as contas primárias só deverão equilibrar-se em 2019 ou 2020. Só a partir daí
sobrará algum dinheiro para os juros. Com isso será possível diminuir o peso da
dívida pública, hoje superior a 70% do Produto Interno Bruto (PIB). Essa
proporção dificilmente passa de 50% em outros países emergentes. O quadro
brasileiro é, portanto, muito ruim tanto pelos critérios internos como pelos
padrões internacionais. Mas falta definir como ficará o horizonte do ajuste, se
as metas deste e do próximo ano forem alteradas. Haverá esforço compensador, a
partir de 2019? Talvez seja possível, se a economia ganhar impulso e a
arrecadação melhorar muito.
Mas em 2019 haverá um novo
governo. Também isso será provavelmente levado em conta, como risco adicional,
pelas agências de classificação. Se escolher novas metas para 2017 e 2018, o
atual governo terá de se contentar com a formulação de um bom programa e com o
melhor encaminhamento possível do ajuste. Tudo ficará muito pior, naturalmente,
se a reforma da Previdência for travada ou desfigurada no Congresso. Não se
deve subestimar o poder da Bancada da Irresponsabilidade Fiscal.”
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AGD comenta:
Escolhi a matéria acima para
comentar por ela trazer o principal problema do Brasil de hoje. Está, como deve
ser, numa linguagem ainda técnica, mas, o que ela diz é muito simples, se
compararmos o Brasil a uma família grande onde um “pai” procura disciplinar seus
gastos, depois que a “mãe”, muito
recentemente, resolveu gastar adoidadamente para não ser expulsa de casa.
É claro que todos já intuíram que
o “pai” e a “mãe” são o Temer e a
Dilma. Eram um casal feliz enquanto o lado feminino dominava as ações, agindo
de forma atabalhoada mas o lado masculino concordando com tudo. Chegou um belo
dia em que o “pai”, não mais
suportando o descalabro da “mãe”,
tomou o poder, e até agora, esta diz que foi um duro golpe.
Li hoje também o seguinte
comentário, saindo da metáfora acima, um resumo jocoso do tema, escrito pela
Eliane Catanhêde:
“O governo Michel Temer repete Dilma Rousseff e passa vexame depois de
mover mundos e fundos para aprovar no Congresso o teto de gastos, contra a
oposição e parte da opinião pública e dos especialistas, mas agora, meses
depois, já descumpre o próprio teto e se vê obrigado a revê-lo, como noticiou
Adriana Fernandes no Estado.
Dilma produziu uma de suas famosas pérolas ao anunciar um programa para
micro e pequenas empresas: “nós não vamos colocar uma meta, vamos deixar a meta
em aberto. E, quando atingirmos a meta, nós dobramos a meta”.
Temer, agora, está na prática dizendo o seguinte: Nós tínhamos um teto,
mas não temos um teto. E, quando atingirmos o teto, nós dividimos o teto.
Com um rombo já estimado em R$ 159 bilhões neste ano, R$ 20 bilhões
acima do teto, ou da meta, é bom o governo já se preparar para nova batalha no
Congresso: a derrubada do seu próprio teto – sem duplo sentido…”
É claro que, jocosidades à parte,
é que depois do descalabro petista, não haveria como governar o país sem um
freio nos gastos que vinham sendo realizados em nome de uma democracia
popularesca que acabou com equilíbrio fiscal do pais.
Voltando à metáfora acima, uma
família não pode viver, todo o tempo além de suas posses, pois se tentar, um
dia vai ter que pagar as dívidas. Ou seja, sempre se volta á estória de que “não há almoço grátis”. Um dia a conta chega, e é muito bom que o garçon ainda cobre
pacificamente.
E agora, diante das lambanças
morais do Temer e da maioria dos políticos, estamos, no dia de hoje, na espera
de julgamento pela Câmera, no qual se dirá se o “pai” deve continuar a gerir os
negócios, ou se se nomeia um “tutor”
para o Brasil até que o imbróglio cesse. Vai ser um longo dia para o Temer e
para todos nós.
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