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quinta-feira, 24 de agosto de 2017

O poder do povo e a Democracia Totalitária




“A democracia totalitária bolivariana

Por Denis Lerrer Rosenfield

Nada do que está hoje acontecendo na Venezuela deveria surpreender. Presenciamos o desenvolvimento lógico-político de instauração do socialismo naquele país, tendo começado com Chávez e encontrando o seu desfecho na abolição da democracia e no assassinato de mais de uma centena de pessoas nas ruas em poucas semanas.

Espanta, contudo, o cinismo de alguns políticos que teimam em dissociar a “democracia” de Chávez da “ditadura” de Maduro, como se fosse possível separar as premissas da conclusão. Nesse sentido, o elogio do indefectível Lula a Chávez quando considerou que aquele país tinha “excesso de democracia”, e não falta, acompanhado de apoio financeiro do contribuinte brasileiro por meio do BNDES, mostrou coerência com sua sustentação do ditador Maduro. O apoio atual do PT a este, com manifestações de sua presidente no Foro de São Paulo, segue uma mesma lógica, cuja única virtude consiste em expor a faceta totalitária do partido.

Qual democracia está em questão: a democracia representativa, com todas as suas limitações e contrapesos, ou a democracia totalitária, com sua ilimitação e projeto de destruição do próprio sistema representativo?

A democracia totalitária é um conceito elaborado por um célebre cientista político, J. L. Talmon, em sua obra Origens da democracia totalitária. Recorrendo aos filósofos do século 18, mas atento ao fenômeno totalitário comunista do século 20, destaca ele o surgimento de uma ideia democrática, fundada na soberania do povo, entendida como guia de uma atividade política que desconhece limites. Em nome da vontade popular, tudo seria possível, inclusive o desrespeito à lei e à Constituição ou, mesmo, a abolição das duas.

Em nosso país, por exemplo, quando políticos de esquerda procuram cancelar os seus crimes dizendo que as eleições absolvem os que violaram as leis, estão dizendo com isso que processos eleitorais são os únicos capazes de julgar os políticos, por mais criminosos que sejam. Não seriam os tribunais os juízes, mas as eleições, na medida em que seriam expressões da vontade popular. É o mesmo argumento que está sendo utilizado por Lula e os seus apoiadores, forçando de qualquer jeito a sua candidatura, para, uma vez eleito, escapar de qualquer condenação em curso. É a faceta totalitária.

Em sua vertente totalitária, a democracia é reduzida a eleições, como se estas fossem os únicos processos decisórios válidos. Constituição, separação de Poderes e respeito às leis são desconsiderados como se não fizessem parte, senão subsidiária e aparentemente, do conceito mesmo de democracia. O que fez Chávez?

Conquista o poder por intermédio de eleições e nele permaneceu por meio de referendos que o legitimavam. A esquerda latino-americana e a brasileira, em particular, ressaltaram continuamente este aspecto com o intuito de mostrar a reconciliação do socialismo com a democracia. A imagem socialista-totalitária seria coisa do passado.

Uma vez no poder, Chávez começou a enfraquecer, senão a abolir, as instituições representativas. Primeiro, o Judiciário foi manipulado, com a substituição de juízes por ideólogos e militantes que obedeciam às orientações do líder máximo. Ministros foram presos por não seguirem a nova linha de conduta. O Supremo, porém, continuou funcionando em sua nova roupagem totalitária, tendo como função referendar as orientações governamentais. A esquerda clamava, então, que as leis estavam sendo respeitadas por decisão da mais alta Corte do país. A pantomima era total.

Segundo, o Poder Legislativo foi completamente investido pelos “socialistas”, passando a ser um mero referendador das ordens de Chávez. Transferiu a ele, inclusive, o poder de legislar, investindo-o de “leis delegadas”, de tal maneira que, por atos administrativos, poderia editar e promulgar leis.

Assim, concentrou em sua pessoa o poder de julgar, legislar e governar, abolindo, de fato, a separação de Poderes. Fingiu respeitar a democracia, pervertendo-a completamente. Na verdade, aproveitou-se de instrumentos democráticos, como eleições, para subverter a democracia. Eis a novidade do “socialismo do século 21”.

Para bem assegurar o seu poder, tomou conta das Forças Armadas pelo seu aparelhamento por oficiais submissos ao novo regime. A ideologia se apoderou dos militares, obrigados a jurar “socialismo ou morte”. A bem da verdade, o socialismo está levando à morte de jovens nas ruas de Maduro. Não satisfeito, usou a expertise totalitária de Fidel Castro e seu irmão Raul importando especialistas cubanos para, com seus serviços de inteligência, fortalecer os laços “socialistas” das Forças Armadas.

Como se não fosse ainda suficiente, pois o controle deveria ser total, lançou mão da criação das milícias bolivarianas, corpo paraestatal, diretamente armado e controlado por ele, tendo como função aterrorizar a população. Seguiu o exemplo das SA de Hitler, disseminando o medo e a violência entre os cidadãos. Ora, são essas mesmas milícias que estão agora, sob a direção de Maduro, assassinando os manifestantes e os opositores venezuelanos.

O que faz Maduro? Segue os ensinamentos de seu mentor. Ele é apenas um novo elo da mesma lógica totalitária. A diferenciação reside em que a violência se tornou explícita. A farsa de uma Assembleia Constituinte suprime o Poder Legislativo ainda vigente, que se tinha revigorado por eleições ainda permitidas. A população está na miséria, os supermercados estão desabastecidos, o PIB cai vertiginosamente, a inflação está nas alturas e o novo governante agora o que mais teme é um processo eleitoral, um referendo. Uma vez tendo sido a democracia subvertida, até o véu cai, com eleições não sendo mais necessárias para a conservação do poder.

A democracia representativa está morta. Maduro prestou homenagens a Fidel em sua tumba. Foi coerente com o assassinato que perpetua de manifestantes. Em seus féretros jaz o socialismo.

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AGD comenta:

Lendo o texto anterior não há como fugir da pergunta: Será que o Socialismo do Século XXI poderá ainda se instalar no Brasil? A pergunta não é retórica porque ele já esteve bem perto e quase chegamos lá, se não fosse o impeachment de Dilma Roussef.

Não seria hora de louvar o Eduardo Cunha, daquela época, que, por linhas tortas, aceitou o projeto de impeachment da “presidenta”, que nada mais era do que o projeto de transformar o Brasil numa “democracia totalitária”, cujo conceito vimos acima.

A hora passou e até o Cunha já dançou, e espera-se junto com o Lula, a Dilma e outros que estavam quase certo do sucesso da famigerada doutrina chavista, aqui no país. No entanto, mesmo depois de condenado, o Lula ainda persiste na ideia de ser candidato, e pelas pesquisas 30% ainda acreditam nele.

Eu sei que o problema de uma democracia como a nossa é o grau de desigualdade não só econômica, mas de informação. E grande parte das pessoas que votam não tem o mínimo de interesse de serem informadas. Porém, é um obrigação dos que observam os fatos tentar por todos os meios informar a população, como o faz o Professor Rosenfield no texto anterior.


Eu mesmo, que não sou um expert em política, me informei quanto se pode enganar com o conceito de Democracia direta, ou seja, o que chamam o “poder do povo”. Como estamos vendo na Venezuela, este poder pode se voltar contra o próprio povo.

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