“A falsa solução parlamentarista
FERNÃO LARA MESQUITA
Parlamentarismo, com ou sem voto
distrital misto, aquele em que se vota uma vez no representante e outra no
partido, agora virou o santo remédio para tudo.
Como é que dá para discutir a
sério essas firulas mantido este fundo partidário que premia automaticamente
todo bandido que vestir um uniforme de político?! Como entregar seu destino a
“partidos” regados a dinheiro público – e, portanto, fracos e corrompidos desde
o DNA – antes de tomar a providência palmar de fechar essa torneira e deixar
para o eleitor a decisão de sustentar ou não os partidos que lhe sejam úteis?
O Brasil tem de ir à raiz dos
seus problemas. Poder, que corrompe sempre e corrompe absolutamente quando é
absoluto, é concentração. Democracia é dispersão. Muito pior que o poder
econômico, portanto, é ele acrescido do poder político, do poder de polícia e
do poder militar. O monstro onde tudo isso se acumula se chama “Estado”. Cada
grama das prerrogativas de que o eleitor, ÚNICA fonte de legitimação do poder
do Estado, abrir mão em favor dessa entidade é uma tonelada de opressão que
estará contratando.
Não há exemplo histórico de falha
dessa regra. Não demorou dois minutos para seguirmos o padrão assim que
delegamos ao Estado (e ao PT!) a redefinição do custo das eleições que o PT
tinha feito disparar comprando “hegemonia” com dinheiro de “campeões nacionais”
de laboratório e corrompendo sistematicamente as instâncias de representação.
Todo o mundo politicamente adulto aceita o financiamento privado porque as
alternativas são muito piores. Nos EUA, o partido tem cinco dias para registrar
e tornar pública cada doação. O Estado checa, na hora, se ela está dentro da
regra. O eleitor, informado antes de votar, decide se, mesmo estando dentro da
regra, o candidato ou o partido estão ou não se vendendo ao aceitá-la. É claro
que o Estado nunca julgará melhor que ele.
“O problema do financiamento
privado é a ‘contrapartida’ que se compra com as doações?” Sim, é verdade. Mas
estas é impossível esconder. Para isso existe a polícia, que será tanto mais
eficiente e “orientada para o cliente” quanto mais indiscriminado for o império
da lei e o emprego do delegado e do policial dependerem da aprovação da
população que eles servem. Para isso também eles são eleitos e demissíveis por
recall a qualquer momento nas democracias que vão além da aparência, assim como
os políticos e até os juízes. Se cada parte estiver no lado certo desse jogo, portanto,
para cada joesley haverá um sergio moro. Já com financiamento público não,
porque aí a “polícia” e o “ladrão” serão a mesma pessoa e uma face dessa mesma
entidade perdoará os crimes da “outra” com desculpas de boi dormir para
eliminar adversários e levar adiante o esquema de poder comum.
Em “democracia representativa” de
verdade só eleitor elege ou deselege representante, cada um o seu, porque não
tem outro jeito de uma “representação” ser fidedigna. Ninguém dá mole para dono
de partido ficar com metade ou com a sua representação inteira pela simples
razão de que nada sugere que ele saiba melhor que você o que é bom para você.
O parlamentarismo facilita, sim,
desmontar governos, mas não muda necessariamente o jeito de montá-los. Pode-se
seguir comprando “coalizões” como sempre, a cada novo governo formado, reunindo
meia dúzia de pessoas num quartinho de hotel. É fácil demais para não
acontecer. O que esse sistema proporciona, na verdade, é que isso aconteça mais
vezes ao longo do mesmo percurso.
Parlamentarismo não é, portanto,
nem a solução indicada se o que você quer é realmente mandar na sua própria
vida nem, muito menos, um sistema forte o suficiente para deter o tsunami de
corrupção brasileiro. Na velha Europa, funciona mais ou menos bem em países
pequenos, muito ricos e de distribuição homogênea de renda e educação; e bem
pior nos países pequenos com desigualdades maiores. Lá, quem escapou do vórtice
da corrupção escapou contra o sistema parlamentarista e sem nenhuma
contribuição especial dele, porque esse é um tipo de arranjo que, ao antepor a
estrutura dos partidos e suas hierarquias internas entre a vontade do
eleitorado e a máquina pública, dilui responsabilidades, tira-lhe a agilidade e
abre-lhe os flancos à corrupção, favorece o status quo e acomoda o privilégio
contra o império do merecimento. Mantém trancafiada, enfim, a porta para
Silicon Valley, que não está exclusivamente onde está por acaso. Adotá-lo seria
uma traição aos seus filhos.
Já o sistema distrital puro com
ferramentas de democracia semidireta é intrinsecamente avesso à corrupção e à
“privilegiatura”. Sem “listas”, nem suplentes, nem vices, nem qualquer outra
forma de “terceirizar” a representação de cada eleitor, leva à individualização
das responsabilidades e muda necessária e obrigatoriamente o jeito de formar
governos. Caiu alguém, por recall ou “na paz”, o distrito elege outro. Não abre
espaço para conchavos.
Difícil? Nada na vida é fácil. Os
asiáticos têm conseguido ir do zero ao infinito em duas ou três gerações com
eles. Os sistemas estabelecidos têm sempre muita força, mas quando o povo quer
mesmo até governo do PT cai. Só é preciso concentrar o foco. Com a 1.ª
ferramenta obtém-se a 2.ª; acionando-se as duas juntas, consegue-se a 3.ª; e
assim vai. Onde aconteceu, o primeiro passo foi sempre a retomada da
propriedade dos mandatos pelos eleitores. O recall põe polícia na política.
Arma a mão do eleitor para se fazer respeitado. Não existe recall para
presidente porque isso para o país (além de ensejar o golpismo). Mas com o
recall consegue-se, passo a passo, o “referendo”, que dá ao eleitor o poder de
escolher quais leis concorda em seguir, e as “primárias diretas” que abrem as
portas à renovação. Isso muda o país de dono. E, com ele sendo seu, você cerca
o presidente tirando poderes da União de modo a garantir que nem que lhe caia
um Trump sobre a cabeça você será gravemente ferido.
É uma construção. Depois do
primeiro passo, o céu é o limite.”
----------------
AGD comenta:
Vivíamos dormindo no berço
esplêndido do comodismo com o modelo eleitoral vigente. Aí veio a Lava Jato
colocando os pingos nos i,s e mostrando que o sistema era mais sujo do que pau
de galinheiro. Virou salão de festas para falcatruas petistas e de outros
partidos, rumo à perpetuação do poder.
Agora, à beira de um eleição, os
mesmos políticos se juntam para propor novo modelo, que pelo menos pare um
pouco a farra. E aparecem muitos monstros pelo caminho para substituir aquele
que está morrendo.
No texto anterior, o Fernão Lara
Mesquita expõem o modelo americano que, para mim, tem seus méritos incontestes.
Vendo-o funcionar, ele não é o modelo ideal em todos os sentidos pois nenhum o
é. No fundo, no fundo penso que a Democracia não é uma situação normal de
sistema político para seres humanos, que talvez se adaptasse melhor a uma
teocracia violenta.
No entanto, foi o melhor que o
homem inventou, até agora, para evitar, não a violência divina, mas a própria
violência humana.
Não vou aqui entrar em detalhes
do sistema americano, mas, apenas dizer que, se ele aguentou 6 meses do Donald
Trump sem ruir, então deve ser bom mesmo. Aqui, no Brasil, no sistema vigente,
temos 25 anos de sobrevivência, Deus sabe como. E na iminência de entrar em
colapso com os recentes achados da polícia e da Justiça.
Mas, fica a ideia acima, de recall,
como a que mais estimula meus pensamentos. Já pensou um mecanismo para, em um
eleição direta e flexível, a qualquer tempo eleger novos políticos em
substituição àqueles que estão sendo limpos pela Lava Jato? Bem, isto seria ir
além do sistema americano, pois lá não se permite recall do presidente, a qualquer tempo, pelo
povo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário