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terça-feira, 30 de julho de 2013

FAFÁ, a mandona.




Por Carlos Sena. (*)

 Lembro-me de uma colega chamada Fafá. Fafá era dessas pessoas muito queridas pela sua capacidade de mandar. Mandava em tudo e em todos, inclusive tomar no “fiofó” se fosse o caso. Diziam que Fafá não se casara porque macho nenhum se submetia aos seus mandos... E desmandos. A última história de Fafá que eu me lembro se deu quando ela mandou sua empregada doméstica olhar se ela estava no barzinho da esquina. Pior: a empregada foi e teve a pachorra de dizer a sua patroa: “a senhora não tava lá”. E não tava mesmo, porque Fafá queria ver até onde não ia a capacidade de sua empregada para não entender muita coisa. Essa empregada lembrava MACABÉIA – um personagem de “A Hora da Estrela” – livro de Clarice Lispector. Não que Macabéia fosse assim meio burrinha, mas era tão desligada quanto, pois foi pra vida sem sequer saber que vivia, digamos assim. Pois bem. A vida de Fafá existia entre o mandar e mandar. Ela adorava dizer que nasceu pra isso e, como se não bastasse, desmandava como que se “achando a rainha da cocada preta”. O pior desse vício de mandar é que ela sempre se dava bem. Mas ela sabia “qual a formiga que come o raçado”, como se diz na gíria. Ou seja, quando a pessoa era graúda, tinha cargo importante, ela mandava com mais discrição, mas quando pegava um coitadinho então ela deitava e rolava. Mais rolava do que deitava, porque parece que não tinha homem para deitar com ela, pois todos fugiam na primeira conversa.

Na repartição onde trabalhava – isso nos anos setenta – Fafá cismou com um funcionário novato que cuidava da limpeza. O problema não estava no que o rapaz fazia em seu trabalho, mas o que ele deixava de fazer com Fafá. Acontece que Fafá se sentiu atraída pelo novo funcionário – terceirizado é bem verdade, mas bonitão e meio bronco em que pese ter forma sensível de se dirigir às pessoas. O grande dilema de Fafá era se sentir atraída por uma pessoa meio “macabeia”, mas extremamente bela e que já estava provocando frisson em algumas dondocas importantes do setor, inclusive médicas. Quando dava a hora do novo funcionário largar do trabalho, sempre Fafá inventava uma sujeira aqui outra ali para que o rapaz demorasse mais no local de trabalho. Com isso, imaginava ela, aumentava as possibilidades de ficar mais próxima ao rapaz sem que os demais servidores presenciassem, pois seria o fim que soubessem estar ela apaixonada por um, digamos assim, serviçal. O rapaz, por outro lado, logo se apercebeu qual era a da sua “chefa”.  Pensava ele: “ela me massacra me mandando fazer tudo e até fora do meu horário de trabalho, mas eu vou dar um troco nessa puta pra ela aprender”... E não demorou muito. Certo dia no final do expediente, eis que Fafá suja um ambiente limpo só para ver o rapaz fazer tudo novamente. Ele foi lá e limpou. Ela novamente sujou. Quando ele estava no meio da terceira limpeza inventada por Fafá ela entra na sala e diz que vai embora, mas quer que no dia seguinte tudo esteja um “brinco”. Bateu a porta e nem sequer deu até logo ao pobre rapaz. Já tinha passado das seis da tarde e o prédio estava meio vazio. Os elevadores já velhos sempre enguiçavam e foi aí que o simplório rapaz fez sua vingança “malígrina”: sua chefa ficou presa no elevador! Atonita, Fafá ligou a sirena do elevador, mas já não tinha mais ninguém da guarda do prédio por perto para socorrê-la. Imediatamente ela se lembrou de que seu “algoz” estava lá, coitado, retrabalhando a seu mando e sob suas ordens. Ligou pra ele pelo telefone convencional e foi logo dizendo: “venha até o oitavo andar e tente abrir a porta do elevador que eu estou presa”... – Quem está falando, perguntou o rapaz. – Sou eu, sua chefa, tá esquecido? – Que chefa? – Eu estou lhe dando uma ordem, você não está entendendo? – Tô, mas não vou não senhora. Agora quem vai lhe dar as ordens sou eu: fique aí quietinha. Deite e durma tranquilamente que amanhã, assim que eu chegar chamarei a segurança para lhe tirar daí, pois não sou pago para ser bombeiro nem socorrista de madame metida a bosta. Fafá entrou em desespero. Gritou o quanto pode, mas nada pode fazer, pois nessa época não havia celular e ela ficou presinha da silva no elevador. Passou a noite toda até que no dia seguinte a guarda do prédio quando percebeu foi lá e a soltou. Ela pegou um táxi e foi pra casa se recuperar da lição. O empregado da limpeza foi a sua firma e pediu para ser transferido daquela instituição pública.

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(*) Publicado no Recanto de Letras em 17/06/2013

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