Por Zezinho de Caetés
Trago hoje um problema, que foi levantado pelo jornalista
Carlos Alberto Sardenberg (O Globo: “A
falta que nos faz o patriotismo”), em texto que abaixo transcrevo. É algo
que podemos chamar de “patrimonialismo
branco”, porque o “preto” é
aquele nosso conhecido de querer tratar a coisa pública com se privada fosse, e
que tanto prejudicou nosso amado país, seguindo o jargão patriota do título, já
dizendo aos politicamente corretos que não me processem pela Lei Afonso Arinos,
porque também tenho um pé na cozinha.
É o caso dos funcionários públicos, quando comparados com
aqueles da iniciativa privada, que estão hoje, quase literalmente na privada,
enquanto os primeiros tem aumentos diante da situação política de Temer que não
quer, por causa deles, que a ex-presidenta volte. O que é justo muito justo,
justíssimo.
Fui funcionário público e hoje não tenho medo do desemprego
porque sou aposentado. No entanto, sei que, se a situação continuar ruim como
está, vai sobrar para mim e para os meus companheiros, que jogam dominó na
praça comigo, e que um dia contribuíram para que o país andasse. Sei que não
foram todos os companheiros de aposentadoria que assim o fizeram, e que, por
alguns dos seus atos, deveriam estar era pagando à previdência pelo mal que
fizeram. Espero que seja um pequeno grupo.
No entanto, estamos numa crise danada e o Temer não pode
escolher muito. O medo é muito grande de que voltemos aos tempos petistas e que
tenhamos de inchar cada vez mais o Estado, como se isto fosse a grande solução.
Eu acredito mais no Ronald Reagan que dizia ser o Estado o problema, e não a
solução. Ou como estamos comprovando a sabedoria da Margareth Tatcher quando
dizia: “O socialismo acaba quando acaba o
dinheiro dos outros”.
O que o Sardenberg diz nas entrelinhas, e eu concordo, é que
se houvesse mais patriotismo tudo seria melhor. Por outro lado, seguindo a linha
Samuel Johnson de que “o patriotismo é o
refúgio dos canalhas”, só podemos vislumbrar que o novo governo terá uma
vida dura pela frente, de um jeito ou de outro. Fiquem com ele e meditem.
“Depois de alguma resistência, o governo Temer capitulou e resolveu
mandar ao Congresso Nacional projeto de lei que reajusta os vencimentos dos
auditores da Receita e agentes da Polícia Federal. Oficialmente, ministros
disseram que os acordos já haviam sido negociados com o governo anterior, que
se trata apenas de uma reposição da inflação etc.
Tudo desculpa — e que não pegou, aliás. Todo mundo sabe que o governo
ficou com medo de uma greve ou do corpo mole ou da tal operação padrão daquelas
duas categorias. Um medo compreensível. Auditores e policiais federais podem
paralisar os aeroportos ou, mesmo sem greve, impor uma confusão embaraçosa no
momento em que começam a chegar atletas e turistas da Olimpíada.
Em termos diretos: aquelas categorias simplesmente aproveitaram o
momento para colocar a faca no pescoço do governo.
É verdade que todo trabalhador tem o direito de lutar pelo seu salário,
indo até a greve. Mas há muita desigualdade entre os trabalhadores do setor
público e do privado. O que indica que deveria haver diferenças nos direitos e
deveres de cada grupo.
Em números: o salário médio do trabalhador brasileiro foi de R$ 1.982
em maio último, uma perda de R$ 55 em relação ao mesmo mês do ano passado. Tudo
em termos reais, já descontada a inflação. No mesmo período, o desemprego subiu
de 8,1% para 11,2% — ou 11,4 milhões de brasileiros que querem trabalhar e não
encontram vaga.
Não há desemprego no setor público. Funcionários têm estabilidade. E
todas as categorias que receberam reajustes recentes, ou estão para receber,
têm salários maiores do que aqueles R$ 1.982 do trabalhador médio.
Na Polícia Federal, o salario inicial mais baixo, de agente
administrativo, sem curso superior, é de R$ 4.000 — o dobro do rendimento médio
no país. Já o policial, com diploma superior, começa com R$ 9.132. Para
delegados, com exigência de diploma de Direito, a carreira começa com R$ 17.288
— o equivalente a nove meses de salário do trabalhador médio.
E isso antes dos aumentos agora propostos. Aliás, com o novo reajuste,
o vencimento básico do auditor da Receita, sem os benefícios pessoais, saltará
de R$ 15 mil para R$ 19 mil — ou dez vezes o salário real médio pago em maio
último.
Não há qualquer dúvida sobre a importância da Polícia Federal e da
Receita. Se não fosse pelo conjunto da obra, o que os funcionários dessas duas
instituições fizeram na Lava-Jato já garantiria um diploma de competência.
Mas, francamente, faz sentido elevar os salários dos funcionários mais
bem pagos do país neste momento de crise econômica, em que o setor público está
literalmente quebrado? O maior problema do país é o déficit nas contas
públicas. De novo, está correto alargar esse déficit com salários de um
funcionalismo que ganha muito, mas muito mais que os demais?
Está correto, dizem lideranças sindicais dos auditores fiscais. Seu
argumento: o trabalho de fiscalizar receitas e arrecadar impostos é o mais
importante de todos, simplesmente porque o governo não funcionaria sem
dinheiro.
Parece razoável, mas não tem cabimento. Pensem pelo avesso: se o SUS
tivesse muito dinheiro mas não contasse com os médicos nos seus hospitais, o
governo também não estaria funcionando — e num setor crucial.
Então, qual a função mais importante, a do auditor que recolhe o
dinheiro ou do médico que salva vidas?
O absurdo da pergunta mostra que essa questão não tem sentido. Há no
Estado atividades fim e atividades meio, isso compondo o conjunto do serviço
público.
Claro que deve haver diferenças salariais, conforme a função, a carga
de trabalho, formação, mérito e produtividade. Mas não é isso que acontece no
Brasil.
Os salários maiores vão para as categorias que estão mais perto do
centro do poder — como funcionários do Congresso — e que têm maior capacidade
de pressão. Os salários caem quanto mais o funcionário está perto do
público-cliente, como o médico no pronto-socorro.
E por falar nisso: a carreira de funcionário público exige ou deveria
exigir um sentido de serviço público. Seria demais pedir algum patriotismo?
Algo assim: bom pessoal, vamos fazer uma Olimpíada de primeira,
trabalhar mais que o exigido, dar o sangue para mostrar um país com um serviço
público de qualidade — e depois vamos discutir salários.
É verdade que, diante da lambança feita pelos dirigentes políticos,
fica difícil pedir patriotismo e sentimento de dever. Mas o que queremos? Um
vale-tudo, cada um por si?
Convém lembrar: o povo brasileiro, aquele trabalhador médio, que rala
todo dia, o sujeito que financia o governo pagando impostos e é o cliente final
do serviço público, essa gente não é igual aos ladrões da Lava-Jato.
E querem saber? Há servidores de verdade, tanto funcionários de
carreira quanto profissionais do setor privado que vão para o governo cumprir
uma missão. Que apareçam mais.”
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