Por Carlos Sena. (*)
O mundo moderno sofistica muita
coisa sem necessidade. Talvez pela lógica consumista do capitalismo. As
gerações mais novas ficam maravilhadas com certas coisas repaginadas, refeitas
com novos rótulos e vendidas pelos "olhos da cara" como se novidades
fossem. Nada contra novidades, nem contra certas coisas boas que a sociedade de
consumo nos apresenta. Mas, tudo a favor da simplicidade, do valor das pequenas
coisas e dos pequenos gestos.
Por melhor que seja um café
solúvel, nunca substituirá um café fresquinho passado no coador. Já imaginou
juntar a família num fim de tarde pra um café e trazer para a mesa um vidro de
Nescafé e uma garrafa de água quente? Geralmente nas mesas super fartas dos
hotéis a gente percebe que não aguentaria muito tempo degustando aquilo tudo. O
velho feijão com arroz feito em casa faz falta. Já imaginou que os pudins
sofisticados não substituem o velho pudim de leite Moça? E o pão com manteiga
no café da manhã com um bom cafezinho coado no coador? Tudo bem que os iogurtes
são bons e vaiados, mas eles não passam de uma derivação da nossa tradicional
coalhada. Tem gente que adora falar nomes sofisticados para comidas idênticas. Há
até uma brincadeira vernacular para comidas que a gente guarda de um dia para o
outro na geladeira: "restodontê". Quando falamos isso logo as pessoas
se interessam em saber de que comida estamos falando. Mas, de fato, estamos
falando de "restos de ontem" -
restodontê. Lembra o casulè - tradicional iguaria francesa que nada mais é do
que uma versão diferenciada da nossa dobradinha.
No rol gastronômico, a sociedade
de consumo tem avançado no que pode e não pode para modificar a natureza.
Adoçante que não é açúcar, sal sem sódio, gordura que não é gordura, leite em
pó, café sem cafeína, etc. No tom poético da vida, estimula mãos sem prática de
afeto, dedos para apertar gatilho, lábios para sustentar cigarro de maconha,
bocas para palavras loucas, sexo para as ficagens! Quando a questão é a música
os jovens deliram quando ouvem uma música dos anos cinqüenta em arranjos
modernos interpretados por um ídolo da moda.
O melhor de tudo isso é que,
gradativamente, os jovens vão se "tocando" acerca das verdades e dos
mitos da sociedade de consumo. Que há muita coisa boa não se duvida. Mas que há
muita baboseira, também não se questiona.
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(*) Publicado no Recanto de
Letras em 22/03/2014
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