Por Carlos Sena (*)
Houve um tempo em que a gente
diferenciava uma consulta do SUS de outra com o medico particular ou de
convênio. Hoje, no quesito “espera” nada ganha para o SUS, mas os conveniados
chegam perto. Por isso é que diante das demoras as pessoas se viram quanto
podem para passar o tempo. Na “conversa vai e conversa vem” cria-se um
verdadeiro placar de doenças e males e, muitas vezes, isso se converte numa
terapia de apoio. Uma pessoa que tem uma doencinha conversa com outra que tem
uma “doençona” e tudo fica mais ou menos quite. Foi numa dessas que, por não
ter doença pra trocar, enquanto esperava o médico para uma urgência, eis que
uma senhora saiu com essa: “a velhice é uma desgraça, pois nos dá três coisas
horríveis: a feiura, as doenças e o desprezo”... E explicou: a doença porque a
gente fica administrando tudo que nos aparece em forma de dor; a feiura porque
a gente fica feia com tudo caindo – o que é duro amolece e o que é mole
endurece, o sangue fica doce e o que era doce fica amargo; mas o que mais dói,
segundo a senhora, é o desprezo. Porque a gente fica velha e começa a sumir.
Ninguém nos vê mais, nem filho, nem nora, nem genro, todos vão, aos poucos
esquecendo que a gente existe.
Saí da minha consulta meio
combalido, mas ainda refletindo no que a senhora disse pra todo mundo ouvir. E
ela acrescentou: “estava vendo uma foto minha com 32 anos e quase que nem eu
mesma acreditei que fosse eu, pois eu era bonita, corpulenta, cheia de viço e
hoje”... E continuou: “Hoje, deixa pra lá. Mas, o que me dói mesmo é o
desprezo, porque o resto eu já esperava, mas o desprezo eu só ouvia dizer que
seria, mas não imaginava que acontecesse comigo também”...
No bojo da minha reflexão, fiquei
encantado com a lucidez daquela senhora. Pena que eu não pude levar um papo com
ela, pois tudo indicava ser boa de prosa e de inteligência. Porque eu,
certamente iria lhe dizer que a inteligência não é vencida pela idade e que a
lucidez pode ajudar a superar o desprezo dos que acham que não envelhecem.
Certamente eu também lhe diria que é melhor envelhecer do que envilecer como
esses que roubem nossos sonhos disfarçados de parlamentar. Diria também: que
quem de novo não morre de velho não escapa e, em sendo velho, certamente irão
pagar na mesma moeda que um dia eles utilizaram para desprezar os que tiveram a
ventura de terem vida longa.
Pois é. Conversa de antessala de
consultório médico tem essas coisas boas. Sabendo aprender elas funcionam como
professor. Sabendo ensinar elas funcionam como terapia de apoio e ajudam muitos
a se sentirem menos doentes do que realmente sejam. Mas que a velhice dói não
resta dúvidas. E onde ela mais dói é no quesito “desprezo” que tão bem aquela
senhora, feita sábia, ressaltou... Pena que os jovens de hoje pensam que não
envelhecem.
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(*) Publicado no Recanto de
Letras em 25/06/2013
Para os descontentes com a velhice, continuo sabendo que é melhor ficar velho do que morrer novo! - A propósito, seguem estes versinhos que publiquei no facebook: - "Eu quero seguir fazendo / querendo sempre fazer / notem que estou dizendo: / o primeiro passo é querer. / Exercite seu saber / procure mais conhecer / o seu poder de memória / que pode fazer história / por deixar acontecer. / É seguir e perseguir / mas este no bom sentido / perseguir objetivos / senão tudo está perdido / pois se perdem bons motivos. / A outra perseguição / é coisa de ressentido / e você perde a razão / por ficar diminuído. / Com a mão pego a caneta / com a outra teclo os dados / nisso desgrudo da pena / pra não perder os riscados / sem abandonar a cena. / Riscados ou rabiscados / saídos da minha mente / são coisas que reanimam / o cérebro fica eloquente." - Uma boa dica pra não lastimar a velhice é exercitar mente e corpo!! - É ISSO./.
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