Por Carlos Sena (*)
Tem gente que não sabe fritar um
ovo. Que não sabe passar um café, muito menos fazer um cuscuz. Fazer um bolo?
Fazer um rocambole? Certamente que muita gente igualmente não saberá fazer.
Mas, não saber um bolo ou um rocambole, certamente que há compreensões para
isso, posto que existe muito mais complexidade do que fritar um ovo, passar um
café ou fazer um cuscuz. Tudo bem que tudo tem seu ritual e seu mistério,
digamos assim. O café tem, o ovo frito tem e o cuscuz, esse é que tem.
Fazer um bom café requer
primeiro, um bom pó. Depois não deixar a água borbulhar – só precisa que ao
menor sinal do “borbulhamento” se desligue e a despeje no filtro de papel (é
mais prático, ou no velho coador de pano). Com uma colher pode-se ir
controlando o pó pelas bordas para que ele fique imerso na água que, aos poucos
se vai colocando. Depois, é só fechar a garrafa térmica bem fechada e servir.
Fritar um ovo não tem mistério mas, tem
ritual também e depende de como se quer degusta-lo: se mole, se duro, se
mexido, se com óleo ou margarina, se com uma cebolinha por cima, etc. No geral,
coloca-se a frigideira no fogo com a margarina e, tão logo ela vai se
derretendo quebra-se o ovo dentro e o conduz rumo ao paladar desejado. Tem-se
que ter cuidado para a frigideira não estar molhada ou não cais algum pingo
dágua nela, pois pode provocar acidente. Quem gostar de um ovo com a gema
soltinha, mas inteira, basta deixar o fogo baixo e cobrir a frigideira. Isso
permite que a gema fique soltinha e é só lamber os beiços. Assim, cada tipo de
ovo frito vai requerendo uma certa
habilidade. E o cuscuz? Esse é mais ritualístico. Há quem molhe ele na hora,
mas não é recomendado.
Primeiro deve-se molhar bem a
massa e deixa-la “descansando” (a bichinha) por mais ou menos meia hora. Depois
disso, dá uma misturada ligeira com as mãos para retirar alguma concentração
endurecida e coloca dentro do cuscuzeiro. Em quinze minutos o bicho tá bom.
Mas, pela prática, a gente fica sabendo apenas pelo cheiro – ele invade a
cozinha inteira e vai até a sala. É aquele cheirinho bom que todo mundo no
nordeste baba. Mas, há sempre um “mas”, no quesito cuscuz. Há quem goste dele
mais grudadinho, ou mais sequinho. Há quem goste dele misturado com ervilha e
ovo frito misturado – o chamado cuscuz paulista. Mas não é dele que queremos
expor, mas o nordestino – simples como seu povo, forte como ele em sua formatação
apenas da água e do sal. Pois bem. Há cuscuz que se pode fazer untando as
bordas da cuscuzeira com manteiga para ficar mais fácil de lavá-la depois e,
também, o gosto ficar mais gostoso. Pode-se inclusive, misturar a massa com um
pouquinho de queijo ralado – isso leva a diminuição do sal. Há quem goste
também de, ainda na cuscuzeira, colocar um leite quente e deixa-lo ficar mais
ensopado – isso é uma delícia que pode ser também feita com leite de coco com
açúcar. Tem mais implicâncias no ato de fazer um cuscuz dentro dos vários
matizes que o nosso rico paladar nordestino impõe. Mas, fazer um cuscuz é
simples. Sei não! Eu até pensei que fosse, mas imaginando que alguém nunca o
fez fazê-lo pelas primeiras vezes não será mesmo fácil não. E o café? E o ovo
frito? Prefiro confessar: depois desse complexo descritivo eu mesmo me traio e
me digo que, de fato, não é tão fácil mesmo não. Mas eu os faço muito bem, da
mesma forma que todo o bom nordestino faz.
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(*) Publicado no Recanto de Letras
em 19/09/2013
O meu café da manhã preferido, sem dúvida!
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