Por Carlos Sena (*)
Envelhecer não é problema. Até
porque se houver problema não haverá solução, pois apesar das plásticas e das
terapias alternativa de rejuvenescimento, envelhecer está na “conta” da vida de
todos. Portanto, se não se evita o envelhecimento, é bem melhor envelhecer
assumidamente. Dar um retoque no rosto, fazer um ”reparo ali, outro aqui” nada
fora do contexto. O que fica feio mesmo é envelhecer e olhar no espelho sem se
reconhecer – porque a cara já sofreu tanto refreamento que, belo dia, a própria
pessoa pode se assustar ao não se ver no espelho.
Certamente que, como toda idade,
há também encantos na velhice. Poucos é bem verdade, mas substanciais. Amar-se
talvez seja a melhor regra para ser velho e feliz. Porque há jovens que são
infelizes e, assim, a felicidade não está atrelada à idade. Descobrir-se feliz
dificilmente não é coisa de momento. Normalmente um idoso infeliz o foi mesmo
antes e a reciproca é igualmente verdadeira. Por isso é importante ter
consciência do tempo por dentro e por fora – assim mesmo: o tempo que não passa
por dentro, mas que por fora passa e nos provoca danos em nossa estética. Nessa
lógica, um idoso mal “resolvido” sofre além da conta, pois ele vê a vida lá
fora como sempre viu, mas as pessoas lá de fora não o veem como sempre viram.
Administrar essas contradições não deve ser fácil, porque a velhice
dificilmente vem sozinha: no geral, concomitante com as doenças, com as
limitações, podem vir o abandono e a falta de carinho e de acolhimento dos
familiares. Talvez seja essa a grande dor dos que envelhecem e tem que conviver
com o abandono daqueles que um dia por eles foram criados.
Fato é que envelhecer não
significa envilecer. Envelhecer nos dias de hoje tem infinitas vantagens (se é
que podemos dizer assim) por conta dos avanços da medicina e de tecnologias
importantes que ajudam na melhoria da qualidade de vida. Não obstante, as
pessoas estão apostando mais em si mesmas e, de certa forma, rompendo preconceitos
que no passado provocavam impedimentos no caminho da felicidade. Maitê Proença
fez uma crônica acerca da idade avançada, usando o queijo Gorgonzola como
metáfora. Ficou mesmo linda a sua retórica em cima do citado queijo – porque se
trata de um produto caro e apreciado por muita gente fina, exatamente porque
sua composição é adquirida no fungo envelhecido. O gorgonzola sem aquele fungo
(tipo um mofo) perde seu charme e seu sabor – sabor que o mundo inteiro conhece
e adora, principalmente com um bom vinho tinto seco. E ela conclui sua crônica:
“Saibam: vou envelhecer até o ponto certo, como o Gorgonzola. Se Deus quiser,
morrerei no ponto G da deterioração da matéria. Estou me tornando uma iguaria.
Com vinho tinto sou deliciosa. Aos 50 sou uma mulher para paladares
sofisticados. Não sou mais um queijo Minas Frescal, não sou mais uma Ricota,
não sou um queijo amarelo qualquer para um lanche sem compromisso. Não sou para
qualquer um, nem para qualquer um dou bola, agora tenho status, sou um queijo
Gorgonzola”.
Portanto, acho que envelhecer
acontece. Mas, dependendo de cada pessoa, não acontece como uma manga que cai
do pé e se perde na ramagem. Acontece, como um grão de milho que sabidamente
vira pipoca. Ou como nos dizia o Dom da Paz, “como cana que mesmo moída,
trucidada, só sabe dar doçura”... Acontece como um queijo que não se contenta
sendo de coalho, fescal, de manteiga, mas como um Gorgonzola. Acontece como o
vinho que, quanto mais velho melhor...
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(*) Publicado no Recanto de
Letras em 01/10/2013
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