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sábado, 13 de outubro de 2012

A "coragem" de Lewandowski e o medo de Lula





Por Zezinho de Caetés

Esta semana, meio a contragosto, num diálogo no Mural desta AGD, acima porque alguém achou que o ministro do STF, foi corajoso ao absolver o José Dirceu e o Genoíno da acusação de corrupção ativa no julgamento do mensalão. É claro que, políticamente, neste país tem espaço para tudo quanto há de asneiras e fuleragens. E eu já presenciei muitas delas. Mas, usar o termo coragem, que deve ser usados quando falamos de heróis para classificar uma atitude totalmente incoerente, até com as dele mesmo é demais.

Naquela ocasião citei o Paulo Guedes que dizia dentro do tema: "Lewandowski admitiu que "houve crimes graves, e quem os cometeu vai ter de pagar". Condenou publicitários, banqueiros e políticos dos demais partidos como corruptos e corruptores. Mas, no Mensalão, o que nos interessa é o julgamento de um atentado contra a independência dos poderes de um regime democrático. Aqui reside a questão fundamental de interesse público: a condenação da compra de apoio parlamentar pelo antigo núcleo político do governo. Os votos de Lewandowski transformam-se, portanto, numa brutal, expiatória e inverossímil acusação ao tesoureiro Delúbio Soares, tornando-o inteiramente responsável por toda a condenável manobra de articulação suprapartidária ora em julgamento. Prevalece a forma sobre o conteúdo. Mas quem vai julgar Lewandowski é a História de uma Grande Sociedade Aberta em construção."  E eu ainda acrescentei que: É preciso ser muito capacho do Lula para dizer que Lewandowski foi corajoso.

Todos sabem que o Lula anda se borrando de medo deste julgamento desde muito antes dele começar tendo feito tudo para que ele fosse adiado e até suspenso definitivamente. E há conversas mais do que suficientes do ministro citado para mostrar sua dependência com o PT, para não usar o termo mais apropriado o “rabo preso”.

Fui além e citei um leitor do Blog do Noblat que se assina Luis Nogueira: “A Marcos Valerio, em troca de "bico calado", já foi acertado: a) Total assistência financeira e proteção à sua afamilia, em especial à sua filha; b) A quantia exigida depositada em um paraíso fiscal; c) Indulto presidencial no final do mandato de Dilma,caso ela nao se reeleja, ou em caso de reeleição, em seu segundo ano do segundo mandato; d) E apoio politico para recomeçar a vida profissional naquilo que ele escolher. Para quem acha que isso tudo não passa de fantasia, basta Marcos Valério colocar em exibição, em rede nacional, apenas uma de suas fitas para que Lula seja apedrejado em praça pública. E Lulinha, paz e amor, sabe muito bem disso. A tempo: viu como pararam os ataques petistas à revista Veja?"

Eu confesso que só prestei atenção depois da pergunta do leitor que os petistas pararam de atacar a Veja, pois isto seria para eles uma atitude de risco. Quem sabe se a revista tocou numa fita dessas?

Mas, o que vi de mais importante sobre o mensalão nos últimos dias foi um texto do Fernando Henrique Cardoso, intitulado “Sinal de vida”,publicado em vários lugares, onde o ex-presidente tece comentários sobre o significado do julgamento do século para a sociedade brasileira. Este mesmo julgamento que será um divisor de águas, se Deus quiser, entre a impunidade do colorinho branco e poderoso e a justiça quando necessária. Fiquem com o texto, que vou continuar vendo o julgamento do século, para verificar quantos ministros estão com o passo errado na marcha do Brasil rumo a uma democracia plena.

“A condenação clara e indignada, por ministros do Supremo Tribunal Federal, do mau uso da máquina pública revigora a crença na democracia

Tenho dito e escrito que o Brasil construiu o arcabouço da democracia, mas falta dar-lhe conteúdo. A arquitetura é vistosa: independência entre os poderes, eleições regulares, alternância no poder, liberdade de imprensa e assim por diante. Falta, entretanto, o essencial: a alma democrática.

A pedra fundamental da cultura democrática, que é a crença e a efetividade de todos sermos iguais perante a lei, ainda está por se completar. Falta-nos o sentimento igualitário que dá fundamento moral à democracia. Esta não transforma de imediato os mais pobres em menos pobres. Mas deve assegurar a todos oportunidades básicas (educação, saúde, emprego) para que possam se beneficiar de melhores condições de vida. Nada de novo sob o sol, mas convém reafirmar.

Dizendo de outra maneira, há um déficit de cidadania entre nós. Nem as pessoas exigem seus direitos e cumprem suas obrigações, nem as instituições têm força para transformar em ato o que é princípio abstrato.

Ainda recentemente um ex-presidente disse sobre outro ex-presidente, em uma frase infeliz, que diante das contribuições que este teria prestado ao país não deveria estar sujeito às regras que se aplicam aos cidadãos comuns... O que é pior é que esta é a percepção da maioria do povo, nem poderia ser diferente, porque é a prática habitual.

Pois bem, parece que as coisas começam a mudar. Os debates travados no Supremo Tribunal Federal e as decisões tomadas até agora (não prejulgo resultados, nem é preciso para argumentar) indicam uma guinada nessa questão essencial. O veredicto valerá por si, mas valerá muito mais pela força de sua exemplaridade.

Condenem-se ou não os réus, o modo como a argumentação se está desenrolando é mais importante do que tudo. A repulsa aos desvios do bom cumprimento da gestão democrática expressada com veemência por Celso de Mello e com suavidade, mas igual vigor, por Ayres Britto e Cármen Lúcia, são páginas luminosas sobre o alcance do julgamento do que se chamou de “mensalão”.

Ele abrange um juízo não político-partidário, mas dos valores que mantêm viva a trama democrática. A condenação clara e indignada do mau uso da máquina pública revigora a crença na democracia. Assim como a independência de opinião dos juízes mostra o vigor de uma instituição em pleno funcionamento.

É esse, aliás, o significado mais importante do processo do mensalão. O Congresso levantou a questão com as CPIs, a Polícia Federal investigou, o Ministério Público controlou o inquérito e formulou as acusações, e o Supremo, depois de anos de dificultoso trabalho, está julgando.

A sociedade estava tão desabituada e descrente de tais procedimentos quando eles atingem gente poderosa que seu julgamento — coisa banal nas democracias avançadas — transformou-se em atrativo de TV e do noticiário, quase paralisando o país em pleno período eleitoral. Sinal de vida. Alvíssaras!

Não é a única novidade. Também nas eleições municipais o eleitorado está mandando recados aos dirigentes políticos. Antes da campanha acreditava-se que o “fator Lula” propiciaria ao PT uma oportunidade única para massacrar os adversários. Confundia-se a avaliação positiva do ex-presidente e da atual com submissão do eleitor a tudo que “seu mestre” mandar.

É cedo para dizer que não foi assim, pois as urnas serão abertas esta noite. Mas, ao que tudo indica, o recado está dado: foi preciso que os líderes aos quais se atribuía a capacidade milagrosa de eleger um poste suassem a camisa para tentar colocar seu candidato no segundo turno em São Paulo. Até agora o candidato do PT não ultrapassou nas prévias os minguados 20%.

No Nordeste, onde o lulismo com as bolsas-família parecia inexpugnável, a oposição leva a melhor em várias capitais. São poucos os candidatos petistas competitivos. Sejam o PSDB, o DEM, o PPS, sejam legendas que formam parte “da base”, mas que se chocam nestas eleições com o PT, são os opositores eleitorais deste que estão a levar vantagem.

No mesmo andamento, em Belo Horizonte, sob as vestes do PSB (partido que cresce), e em Curitiba são os governadores e líderes peessedebistas, Aécio Neves e Beto Richa, que estão por trás dos candidatos à frente. Em um caso podem vencer no primeiro turno, noutro no segundo.

Não digo isso para cantar vitória antecipadamente, nem para defender as cores de um partido em particular, mas para chamar a atenção para o fato de que há algo de novo no ar. Se os partidos não perceberem as mudanças de sentimento dos cidadãos e não forem capazes de expressá-las, essa possível onda se desfará na praia.

O conformismo vigente até agora, que aceitava os desmandos e corrupções em troca de bem-estar, parece encontrar seus limites. Recordo-me de quando Ulysses Guimarães e João Pacheco Chaves me procuraram em 1974, na instituição de pesquisas onde eu trabalhava, o Cebrap, pedindo ajuda para a elaboração de um novo programa de campanha para o partido que se opunha ao autoritarismo.

Àquela altura, com a economia crescendo a 8% ao ano, com o governo trombeteando projetos de impacto e com a censura à mídia, pareceria descabido sonhar com vitória. Pois bem, das 22 cadeiras em disputa para o Senado, o MDB ganhou 17. Os líderes democráticos da época sintonizaram com um sentimento ainda difuso, mas já presente, de repulsa ao arbítrio.

Faz falta agora, mirando 2014, que os partidos que poderão eventualmente se beneficiar do sentimento contrário ao oportunismo corruptor prevalecente, especialmente PSDB e PSB, disponham-se cada um a seu modo ou aliando-se a sacudir a poeira que até agora embaçou o olhar de segmentos importantes da população brasileira.

Há uma enorme massa que recém alcançou os níveis iniciais da sociedade de consumo que pode ser atraída por valores novos. Por ora atuam como “radicais livres” flutuando entre o apoio a candidatos desligados dos partidos mais tradicionais e os candidatos daqueles dois partidos.

Quem quiser acelerar a renovação terá de mostrar que decência, democracia e bem-estar social podem novamente andar juntos. Para isso, mais importante do que palavras são atos e gestos. Há um grito parado no ar. É hora de dar-lhe consequência.”

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