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sexta-feira, 29 de junho de 2018

Ciro e o tempo





“Ciro e o tempo

POR MÍRIAM LEITÃO

Ciro Gomes chega à terceira disputa presidencial confirmando certos defeitos e algumas qualidades. Continua sendo um atirador a esmo, como mostrou nos últimos dias quando mirou em um vereador de primeira legislatura. O tempo não conteve seu temperamento. Ele tem se preparado para o cargo e pode mostrar bons trunfos como gestor, mas suas ideias econômicas permanecem com muitos equívocos.

No Ceará, Ciro e depois seu irmão Cid, como governadores, fizeram uma revolução na educação e, curiosamente, ele tem falado pouco disso. Hoje são inúmeras as cidades cearenses que constam entre as mais bem avaliadas nos anos iniciais e finais do ensino médio. Em Sobral, onde ele foi prefeito, há várias escolas com as melhores avaliações. Esse bom desempenho se espalhou pelo estado. No excruciante problema da educação, há um caminho que passa pelo Ceará no fundamental, como há um caminho que passa por Pernambuco no ensino médio. Sei de visitar escolas nos dois estados.

Na economia, o ex-ministro da Fazenda continua confuso e com propostas mal explicadas. A ideia que ele defende de estabelecer um teto para o gasto com a dívida é a mais perigosa das que já defendeu nesta campanha. Segundo ele, seria um mecanismo parecido com o que existe nos Estados Unidos. Lá quando bate no teto, como se viu, ou o Congresso o eleva ou o governo fecha as portas. Mas o que espanta é ele não ter entendido ainda o que é ser emissor da moeda mais desejada do mundo, e da dívida que mais atrai investidores, e ser um país que sequer tem grau de investimento. Ao mesmo tempo que diz que sabe que a dívida é a poupança dos brasileiros, Ciro aproveita as entrevistas para defender a ideia, fácil e errada, de que os juros da dívida pública são pagos apenas aos banqueiros. Foi exatamente desse erro que o PT fugiu quando quis se tornar viável em 2002. Tantos anos depois, Ciro comete o mesmo equívoco. Limite para pagamento do serviço da dívida pode ser o primeiro passo para um calote.

Na Previdência, ele não nega o déficit, mas quase. Usa números para o rombo que não fazem sentido algum. Aliás, Ciro e números são seres que estão sempre em desencontro. Ele os confunde e mistura, mas fala com uma convicção que quem não entende acredita, quem entende se cansa se for discutir um por um.

Há muito tempo ele propõe como solução fazer uma reforma na Previdência que a leve do regime de repartição para o de capitalização. Desta vez, ele já demonstra entender que há “dificuldades monstruosas” para essa transição. Mas seu modelo ainda não ficou de pé.

A sua proposta de política de preços para a Petrobras repete, sem dizer, a mesma prática do governo Dilma. Ele quer que a estatal receba apenas a seguinte quantia: “quanto custa produzir um litro de gasolina, mais a remuneração do investimento, mais a depreciação, mais o lucro em linha com os competidores estrangeiros.” Ou seja, Ciro está propondo aquilo que critica, controle de preços. Quem dirá quanto é cada parcela do preço? O governo?

São inúmeras as confusões que ele tem feito, mas o que é espantoso é o fato de o tempo não ter dado a ele nem um pouco de temperança. O ataque ao vereador Fernando Holiday — a quem chamou de “capitãozinho do mato” e do qual disse que “a pior coisa é um negro que é usado para estigmatizar” — foi absolutamente gratuito. A jornalista da Jovem Pan até alertou que ele falava aquilo “sem ninguém ter perguntado”. Como ele é ex-prefeito, ex-governador, ex-ministro da Fazenda, ex-ministro da Integração, candidato à Presidência pela terceira vez, o que o faz atirar gratuitamente em um iniciante na política e nestes termos?

Há analistas que consideram que Ciro nunca teve tantas condições, como agora, de disputar de forma competitiva a Presidência da República. Outros acham que ele não mudou e continuará sendo o seu maior adversário. Nesta pré-campanha ele tem confirmado a segunda visão. Cid Gomes, cuja principal função é apagar os incêndios do irmão mais velho, disse que o Brasil quer alguém assim “franco e sincero”. É uma versão. A verdade é que a maturidade chegou em vão para Ciro Gomes.”

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quinta-feira, 28 de junho de 2018

O futebol como metáfora





“O futebol como metáfora

POR MERVAL PEREIRA

A seleção de futebol da Rússia está prestes a se classificar para as oitavas de final da Copa do Mundo, o que só aconteceu em 1986, quando ainda existia a União Soviética. E já superou um tabu, pois nunca vencera duas vezes seguidas em uma Copa. A festa pelas ruas de Moscou ou São Petersburgo é muito mais simbólica do que em qualquer outra edição da Copa do Mundo, pois os russos, além de estarem no centro das atenções de bilhões de pessoas pelo mundo, com a realização de uma Copa do Mundo até aqui impecável como organização, reafirmam com a atuação da antes desacreditada seleção de futebol a reconquista do orgulho nacional.

Há uma explicação histórica para tal, a alma russa se impõe nas comemorações. Para o historiador russo Dmitri Trenin, do Carnegie Moscow Center, que antes de se juntar a esse prestigioso think tank serviu por 21 anos no Exército soviético e nas forças terrestres de segurança da Rússia, aposentando-se como coronel, o povo russo sofreu muito ao longo do século XX: “Dificilmente outros povos terão sofrido tanto”, definiu ele em recente palestra no Centro Brasileiro de Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI).

O povo russo, na concepção do especialista, se percebe como “um grande país solitário”. Faz fronteira, de um lado, com a Noruega e de outro com a Coréia, inúmeras etnias e idiomas, é a maior área geográfica do planeta e se sente traído pela União Européia, que atraiu seus ex-satélites.

Trenim resume assim os anos de sofrimento: “Convulsões sociais na alvorada do século, Primeira Guerra, 70 anos de regime comunista, única grande experiência humana no marxismo que naufragou depois de muito sacrifício de seu povo, Stalin, Segunda Guerra com 28 milhões de mortos, mais Stalin, fim da URSS, perda de suas repúblicas”.

Para ele, a ambição original pós-comunismo era uma integração com União Européia, desde a reunificação da Alemanha em 1990. O único pleito russo, feito por Shevardnadze a Kohl, da Alemanha, foi não crescer a OTAN. Apesar do compromisso, com Bush o Tratado do Atlântico Norte (OTAN) cresceu muito. Os russos se sentiram isolados e traídos, ressalta Dmitri Trenin.

A primeira viagem de Putin depois de assumir o governo, em 1999, foi a Berlim, pois tem bom relacionamento com a primeira-ministra Angela Merkel, que fala russo tão bem quanto ele fala alemão, idioma que usou ao discursar no Reichtag. A integração, no entanto, frustrou-se. Europa meio que “roubou suas ex-colônias e abandonou” os russos, avalia Trenin.

A invasão da Criméia, que gerou sanções do Ocidente, é avalizada pelo povo, que na definição de Dmitri Trenin “está adorando” ter voltado ao comando russo; “ O povo russo gosta de um czar, Stalin foi, Putin é”, afirma Trenin. Depois de um século de sofrimento, nos últimos 18 anos, com Putin à frente do governo, “o povo russo respira, vive seu dia a dia com calma. Putin é idolatrado”.

A economia cresceu na media 1,5% desde 1999 com Putin. É pouco, poderia ser mais, mas “dá pro gasto”, embora o investidor internacional tenha dificuldades para investir, para compreender o ambiente de negócios russo, que tem um índice de corrupção ainda muito alto. Esses percalços, que ganham relevância no Ocidente, não parecem afetar os russos de maneira geral.

É comum, em conversas com cidadãos, ouvir respostas que nos soam mal. Como a afirmação de que a liberdade de expressão deveria ser menos importante do que o emprego ou a boa educação. Russos não estudam fora, há boas universidades no país. Questões de gênero também não são temas de preocupação da classe média, que prefere discutir o custo de vida, o sistema de saúde.”

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quarta-feira, 27 de junho de 2018

Calote no BNDES





“Calote no BNDES
        
Por Rubens Barbosa

A política de generosidade que os governos lulopetistas implementaram no Brasil de 2003 a 2016, regada a corrupção, beneficiou empresas nacionais amigas do governo do PT e financiadoras de muitos políticos. E, no exterior, governos autoritários de países ideologicamente afinados. A conta dessa farra com os recursos públicos, em grande parte advinda de fundo de assistência ao trabalhador, está sendo apresentada agora, com os sucessivos calotes sofridos pelo BNDES, obrigando o Tesouro a ressarcir o banco e honrar as garantias oferecidas aos empréstimos.

Estranhamente, em 2012 o então ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio assinou decreto impondo sigilo até 2027 sobre os empréstimos do BNDES, por coincidência, logo após a entrada em vigência da Lei de Acesso à Informação. Com renovadas suspeitas de corrupção cercando os empréstimos internos e externos do banco, em 2015 o Congresso aprovou decreto legislativo que suspendeu o sigilo, vetado de imediato pela presidente Dilma Rousseff. Só em julho desse ano um juiz federal, atendendo a pedido do Ministério Público, suspendeu o decreto de 2012.

Levantada a barreira legal, o Tribunal de Contas da União (TCU) examinou 140 contratos de financiamento negociados com o BNDES para exportação de serviços, na quase totalidade obras de infraestrutura no exterior, sobretudo em países latino-americanos e africanos. Os 140 contratos analisados pelo TCU representavam financiamento de cerca de R$ 50 bilhões, dos quais 87% (R$ 44 bilhões) foram concedidos a cinco países: Angola (R$ 14 bi), Venezuela (R$ 11 bi), República Dominicana (R$ 8 bi), Argentina (R$ 8 bi) e Cuba (R$ 3 bi). Cinco empreiteiras, todas envolvidas na Lava Jato, receberam a quase totalidade (97% dos empréstimos: Odebrecht (R$ 36 bi), Andrade Gutierrez (R$ 8 bi), Queiroz Galvão (R$ 2 bi), Camargo Corrêa (R$ 2bi) e OAS (R$ 1 bi). Os riscos de inadimplência ficaram com o governo brasileiro.

Embora os financiamentos se destinassem só aos itens exportados, o BNDES deixou de levar em conta a questão dos preços, alegando “dificuldade em certificar a compatibilidade dos projetos com os parâmetros e custos internacionais praticados nos países importadores”. A liberdade de fixar os preços ficou com as empresas brasileiras. Imagino que o BNDES tenha fiscalizado a real exportação dos equipamentos e produtos nacionais, mas não me recordo de essa informação ter sido divulgada e comprovada pelas estatísticas de comércio exterior com os países beneficiários. O TCU considerou ilegal desconto de US$ 68,4 milhões dado a Cuba, nos governos petistas, pelo BNDES para a construção do porto de Mariel, em decorrência da extensão por 300 meses da rebaixa de juros, quando para um país estrangeiro, dentro da lei, o período é de apenas 120 meses.

Lula e Dilma renegociaram US$ 1,036 bilhão de dívidas, na quase totalidade, de países africanos. Desse volume, US$ 717 milhões foram perdoados (69,2%) do volume total das operações financeiras. Nos oito anos de governo Lula, foram perdoados US$ 436,7 milhões em dívidas de quatro países: Moçambique (US$ 315,1 milhões), Nigéria (US$ 84,7 milhões) Cabo Verde (US$ 1,2 milhão) e Suriname (US$ 35 milhões). No governo Dilma, US$ 280,3 milhões.

Recentemente, os principais devedores, sem capacidade de pagar os empréstimos, começaram a suspender os pagamentos. Em setembro de 2017 a Venezuela deixou de honrar US$ 262 milhões e Moçambique, US$ 22,5 milhões. O que era esperado aconteceu. O governo, que garantiu os empréstimos pelo Fundo de Garantia à Exportação, teve de pedir ao Congresso um remanejamento de R$ 1,16 bilhão no Orçamento federal para cobrir esses calotes.

As consequências na área política dessa orgia de empréstimos extravasaram nosso território e levaram líderes políticos da região a ser processados, alguns sendo mesmo presos. Somente com as apurações das propinas da Odebrecht foram investigados presidentes de Colômbia, Peru, Equador e Venezuela. Suspeitas existem em relação a governantes de Argentina, Guatemala, República Dominicana, Panamá, México e Chile. Para ficar apenas na América Latina. Se fôssemos incluir países africanos, a lista seguramente aumentaria.

Em paralelo, a política de “campeões nacionais”, executada pelo BNDES, ajudou na internacionalização de algumas empresas nacionais, mas também deixou um rastro de questões mal explicadas e suspeitas. Recente trabalho publicado pela revista Época trata do caso “escandaloso da JBS”. Mensagens da cúpula do BNDES, reveladas na matéria, a partir de investigações da Polícia Federal, lançam suspeitas sobre aportes milionários a grandes empresas. Segundo o TCU, houve uma série de irregularidades nos aportes feitos à JBS. Os auditores contabilizaram ao menos R$ 400 milhões em prejuízo dos cofres públicos por esses negócios. Em 2008 o BNDES, via BNDESPar, emprestou R$ 1 bilhão à JBS para a compra de duas companhias americanas, a National Beef e a Smithfield. Nas investigações da Polícia Federal, a troca de informações entre funcionários graduados do banco revela indícios de suspeita de favorecimento não apenas à JBS, mas também em empréstimos à Odebrecht e à Bertin.

Mesmo se critérios técnicos de exame desses empréstimos tenham sido seguidos, como repete o BNDES, houve, no mínimo, aceitação de pressão externa e política para a concessão desses empréstimos a países cuja saúde financeira era conhecidamente duvidosa.

Está faltando uma comissão da verdade para apurar, com isenção e objetividade, a maneira como todos esses empréstimos foram autorizados pela direção do banco e se as condições incluídas nas cláusulas contratuais das empresas brasileiras foram cumpridas pelos beneficiados com recursos dos trabalhadores.”

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terça-feira, 26 de junho de 2018

Sem política não há solução





“Sem política não há solução
        
O Estado de S.Paulo

Como há muitos anos não se via, as eleições de 2018 serão marcadas por um misto de indignação e desalento em relação à atividade política e aos políticos, um sentimento que parece permear quase todos os estratos sociais. Os sinais deste estado de espírito da sociedade podem ser observados tanto no clamor difuso por algo “novo” na política, ainda que não se saiba exatamente o que isto significa - um novo nome, um novo modo de agir, talvez ambos -, como no número de eleitores que se declaram indecisos, que anularão o voto ou afirmam que não votarão em ninguém no pleito de outubro.

A descrença de uma parte significativa da sociedade em relação aos políticos, tomados assim, genericamente, e à política dita tradicional não é gratuita e tampouco fruto de má vontade ou elucubrações conspiratórias dos brasileiros. Há razões para tanta desconfiança. De um lado, por óbvio, ela advém da traição dos maus políticos à confiança neles depositada por seus eleitores. São poucos os atentados contra a democracia representativa mais graves do que a ruptura do liame entre representantes e representados pela desonra dos primeiros no exercício do múnus público.

Por outro lado, esta crise de representatividade que põe em xeque a atividade política no País também pode ser entendida como um fenômeno provocado. Desde o sucesso popular alcançado pela Operação Lava Jato - sucesso merecido, diga-se -, alguns setores do Ministério Público Federal (MPF), da Polícia Federal (PF) e do Poder Judiciário, animados pelo calor dos holofotes e dos afagos da opinião pública, autoatribuíram-se uma missão de salvação nacional, uma espécie de plano permanente de combate à corrupção, causa maior de todos os males do País, a fim de resgatar uma sociedade sequestrada por uma “classe política” carcomida. Em nome da batalha épica contra um inimigo tão poderoso, os limites do Estado Democrático de Direito, não poucas vezes, foram solenemente ignorados justamente por aqueles que deveriam ser os primeiros a lhes prestar reverência.

Alvissareira, portanto, é a mensagem da presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, durante a abertura do 2.º Congresso de Direito Eleitoral de Brasília, ocorrido na capital federal na quinta-feira passada. A ministra criticou o que chamou de “demonização” da política, além do “excessivo” número de partidos políticos - atualmente, são 35 legendas registradas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) -, que, segundo Cármen Lúcia, carecem de “objetividade” programática.

“Demonizar a política não faz com que não tenhamos o caos”, disse a presidente do STF. De fato, a democracia, o regime de pleno exercício da atividade política, não está livre de imperfeições e, por si só, não previne crises. Trata-se de um regime em constante processo de autorregulação por meio das instituições do Estado e da participação responsável dos cidadãos em aperfeiçoamento.

Em boa hora, a ministra Cármen Lúcia lembrou que “o País vive uma crise, mas deve melhorar quando a população for comprometida com a ética e a construção da democracia”. De fato, pouca atenção tem sido dada à responsabilidade dos eleitores pela qualidade da representação política e, em última análise, pela saúde institucional do Brasil. Em outras palavras, o País dará um salto no processo de amadurecimento da democracia representativa quando os cidadãos se derem conta da importância de suas escolhas para o destino do País.

“Hoje vivemos um momento particularmente grave onde a maioria acha ruim tudo que está aí, desde a fila do açougue até o governo, e tem o direito de achar. Mas ele (o cidadão) fura a fila do açougue e acha que o secretário (de governo), quando fura a fila da licitação, é que tem de ser punido”, afirmou Cármen Lúcia.

Em outubro, a sociedade tem nas mãos o poder de criar o futuro que deseja para o País. Com este poder há de vir também a responsabilidade. Sem política, não há solução possível para o crescimento de uma nação. E a boa política é uma construção de todos.”

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segunda-feira, 25 de junho de 2018

O belo Antônio e Frankenstein




"O belo Antônio e Frankenstein
        
Por Bolívar Lamounier

Nossa renda anual por habitante está estacionada em torno de US$ 11 mil e por enquanto nada sugere que consigamos aumentá-la a um ritmo superior a 3% ao ano. Nessa toada, levaremos 23 anos para duplicá-la, alcançando o padrão atualmente vigente nos países mais pobres da Europa meridional. Não é preciso um grande esforço de imaginação para compreender que isso será um desastre, acarretando uma elevação intolerável do nível de conflito social, instabilidade política crônica e, no limite, riscos para a própria unidade nacional.

O quadro acima esboçado agravou-se terrivelmente nos últimos anos em decorrência de fatores que ninguém desconhece. O Estado, em tese federativo, é altamente centralizado, sujeito a constantes apertos fiscais e pateticamente ineficiente na condução das políticas públicas. Apesar da centralização, a disputa que lavra entre os grupos corporativos, quase todos incapazes de enxergar um palmo além do nariz, debilita visivelmente a capacidade política do poder central. Ensandecidos na defesa de suas prerrogativas e corroídos internamente pela corrupção, os três Poderes não dão sinais de recuperação. Subjacente a esse quadro lamentável, ou pairando sobre ele, impávido e colosso, temos o demônio histórico do patrimonialismo - o governo orientado pelos e para os “amigos do rei” -, como ficou evidente na facilidade com que o cartel da construção levou todo o sistema à beira da desagregação. Duas questões se impõem, portanto, de maneira inevitável. Como chegamos a tal situação? Que saídas têm sido ou podem ser cogitadas?

A primeira questão pode ser esquematicamente abordada através de um retrospecto da relação entre liberalismo econômico (capitalismo) e político (democracia representativa). Numa ponta, os casos clássicos da Inglaterra e dos Estados Unidos, liberais em ambos os sentidos. Na outra, a URSS e os demais países comunistas, antiliberais em ambos os aspectos, eis que baseados na planificação central, no partido único, na ideologia totalitária e na onipresente polícia secreta. China e Vietnã, para ficarmos nesses dois, inventaram um novo modelo: totalitarismo político e desregulamentação econômica. E onde fica, nessa história, a combinação de liberalismo político sem liberalismo econômico, ou seja, com um mercado distorcido, atrofiado e sujeito a uma sucessão, ao que parece, interminável de intervenções arbitrárias? Fica aqui mesmo, claro: no Brasil.

A diferença fundamental entre o Brasil e a China é que lá a concentração do poder político ainda se dá por meio de um partido ferreamente organizado e orientado por uma ideologia totalitária, enquanto aqui o que temos é um onipresente patrimonialismo, operado por uma classe política e uma burocracia arcaicas. Pelo “Estado cartorial”, como o designava Hélio Jaguaribe, ou o “sistemão”, como concisamente o descrevia Oliveiros Ferreira. Ao contrário do que singelamente pensam alguns, o patrimonialismo não é uma “sobrevivência”, um resto moribundo do colonialismo português, fadado a desaparecer graças apenas à passagem do tempo. A verdade é que ele foi relançado e fortalecido pela ditadura Vargas (1937-1945) e, no pós-guerra, pela tentativa de industrialização acelerada inspirada no nacional-desenvolvimentismo. Hoje, confrontado com um poder central em perceptível debilitação e ao mesmo tempo hostil a uma reforma efetivamente voltada para a descentralização federativa. De um lado, o arcabouço de que se servem os “amigos do rei”; do outro, o poder eunuco, o belo Antônio a que se convencionou chamar de “presidencialismo de coalizão”. Um Frankenstein tributariamente escorchante que não sabe o que fazer com a fatia do PIB que mantém sob seu controle. Considerado esse conjunto de fatores, não é exagero avaliar que o sistema vigente é uma ameaça à própria democracia.

Isso tem conserto?

Descartemos, por óbvio, o modelo chinês. Se não temos tutano para efetivar as raquíticas reformas que estamos discutindo há anos, é óbvio que o verticalismo e a onipresença do PC chinês não é uma alternativa que mereça ser considerada. E que tal a “democracia direta”? Essa, como sabemos, é a nova mania das grandes publicações internacionais. Vários jornais europeus e mesmo publicações de grande prestígio como Foreign Affairs e The Economist não se cansam de flertar com essa hipótese. Observam, corretamente, que as novas tecnologias permitem aos cidadãos se comunicar maciçamente e em alta velocidade entre si e com os governos. Ou seja, transportar a informação tornou-se um problema banal. Mas a operação de governar vai muito além de tomar conhecimento das demandas sociais; seu cerne é a tomada de decisões imperativas que de algum modo as equilibre ou equacione. E quanto a isso a teoria da democracia direta tem muito pouco a dizer.

Suponhamos, porém, tendo em vista o caso brasileiro, que por via de tais teorias cheguemos a formas concretas de “empoderar” (argh!) um grande número de grupos sociais. Estes, evidentemente, não usariam seu poder apenas para tecer loas aos governantes de plantão, mas para pressioná-los, confrontá-los com suas demandas, multiplicando-as até o infinito. Se em sua forma atual, claramente oligárquica, nosso Estado é cronicamente deficitário, como iria ele manejar esse aumento exponencial de exigências e reivindicações?

Concluindo, direi, pois, que a saída, se existe, começa por cortar a cabeça do Estado-camarão, privatizando seus penduricalhos empresariais e concentrando suas energias nas áreas sociais. Instaurar, efetivamente, a Federação. E substituir o “presidencialismo de coalizão” por um parlamentarismo racionalizado, como o adotado no segundo pós-guerra pela Alemanha, a fim de impedir a petrificação de impasses que acabou por paralisar a economia brasileira.”

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sexta-feira, 22 de junho de 2018

Chamem o árbitro de vídeo





“Apenas delações
        
O Estado de S.Paulo

A 2.ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou improcedente ação penal contra a senadora Gleisi Hoffmann, o ex-ministro Paulo Bernardo e o empresário Ernesto Kluger. Os ministros da 2.ª Turma entenderam que a Procuradoria-Geral da República (PGR) não apresentou no processo provas que corroborassem a acusação de que os três réus teriam solicitado e recebido R$ 1 milhão desviado da Petrobrás para a campanha ao Senado, em 2010, da atual presidente do PT. No processo havia apenas delações, sem outros elementos de prova a corroborar as informações provenientes das colaborações premiadas.

“Observa-se que toda argumentação (da PGR) tem como fio condutor o depoimento de delatores. Relatos não encontram respaldo em elementos de corroboração”, disse o ministro Dias Toffoli. Até mesmo os documentos que a PGR apresentou no processo, que supostamente corroborariam as delações, tinham sido produzidos pelos delatores, como uma anotação na agenda de Paulo Roberto Costa, que, segundo a promotoria, fazia referência ao valor repassado ao ex-ministro Paulo Bernardo.

A decisão do STF de absolver a senadora Gleisi Hoffmann por falta de provas deve servir de alerta para o Ministério Público. Essa repartição pública presta um desserviço ao País ao apresentar denúncias com base apenas em delações, que, por sua própria natureza, são parciais. O delator, como se sabe, obtém benefícios ao relatar à Justiça aquelas informações.

No processo contra a senadora petista, há ainda outro aspecto preocupante. Ao longo de toda a ação penal a PGR não trouxe nenhum elemento probatório além do que já estava na denúncia, ou seja, as informações oriundas de delatores. Tem-se, assim, um trabalho duplamente mal feito: além de apresentar uma acusação fraca, só com delações, a PGR depois nada acrescenta para provar suas acusações, como se o seu trabalho se encerrasse com a denúncia. Não foi feito trabalho de investigação que prestasse para os fins pretendidos.

Esse modo de proceder da PGR tem graves implicações. Pessoas inocentes podem ser acusadas injustamente, apenas com base em relatos de delatores. Neste caso, a atuação descuidada do Estado contribuiria para destruir a honra dessas pessoas, pois, como se sabe, uma absolvição num processo penal nunca restabelece fama idêntica a que o réu tinha antes de ser denunciado e levado aos tribunais com a pecha de corrupção. Por mais eloquente que seja a sentença absolutória, sempre pairará sobre a biografia do réu a sombra desabonadora.

A instrução probatória, inepta, que se limita a apresentar relatos de delatores, também contribui para a impunidade. Como ocorreu na ação penal contra a senadora Gleisi Hoffmann, a Justiça não diz que não houve crime – apenas que não houve provas suficientes para condenar. É possível, portanto, que, tivesse a PGR mais diligência, o resultado de muitos casos penais fosse diferente, com a condenação de quem agiu criminosamente. Isso denigre tanto o réu como o acusador.

As delações podem ser um início para o trabalho de investigação criminal. Mas para que sejam de fato úteis, elas não podem ser também a conclusão de investigação. Nenhuma colaboração premiada tem o condão de proporcionar um juízo definitivo sobre um crime. A lei processual estabelece que ninguém deve ser condenado só com base em delações. Por isso, é dever da Polícia Federal e do Ministério Público não se limitar a reunir material trazido por delatores.

Têm sido muitos os casos de delações que surgem com grande estardalhaço, destroem a honra das pessoas citadas, mas depois as autoridades não conseguem confirmar as informações que divulgaram, em geral, açodadamente. O resultado de inquéritos abertos a partir dessas colaborações é o arquivamento. Recentemente, por exemplo, foi arquivado um inquérito eleitoral envolvendo o ex-ministro Aloizio Mercadante, que tinha como base uma delação do empreiteiro Ricardo Pessoa. Segundo o promotor Luiz Henrique Cardoso Dal Poz, responsável pelo caso, “os informes de Pessoa, além das referidas divergências e imprecisões de temas nucleares, não foram confirmados por outras circunstâncias”.

Urge um mínimo de cuidado com as delações. A Justiça não pode se tornar o valhacouto de dedos-duros.”

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Mesmo com a pressa em escrever para não perder o jogo da Copa, que os brasileiros, e talvez eu em particular, prezam mais do que a política, não posso deixar sem um simples comentário o texto acima.

Afinal de contas trata-se da Gleisi Hoffman, hoje presidente do PT, e assistente particular do presidiário Lula, e que teve grande importância na política nacional nos últimos tempos. A justiça, através do seu braço supremo, o STF, decidiu que não havia provas de que a ré tivesse cometido o crime. Isto não quer dizer que não cometeu. Apenas ninguém viu com mais clareza ou não encontraram sangue no sutiã da Gleisi.

Se isto fosse decidido pelo Supremo como um todo, a decisão teria mais crédito junto ao povo e junto a mim. Nada impede, penso eu, que hajam outras investigações para descobrir os crimes, se eles existiram. Afinal, no caso do Lula, apesar do cara já ter sido condenado e preso há 3 meses, ainda se continua mexendo no mesmo processo.

E, na próxima semana, teremos mais um julgamento, pela mesma turma do STF, que pode tirar o patrão de Gleisi da cadeia. Será que isto acontecerá em plena Copa do Mundo? E juntando alho com bugalhos, por que não chamar o árbitro de vídeo para atuar? Pelo menos, se soltarem o Lula é possível até que o Brasil acorde para fiscalizar melhor seus governantes e jogadores, tanto dentro do campo quanto fora dele.

quinta-feira, 21 de junho de 2018

O protagonismo dos juízes





“O protagonismo dos juízes
        
POR JOSÉ RENATO NALINI

Uma constatação recorrente na comunidade jurídica é a de que o Poder Judiciário assumiu um protagonismo singular nos últimos tempos. Quem já não ouviu a proclamação bombástica de que o século 19 foi a era do Parlamento, o século 20 o período do Executivo e o século 21 seria o século dos juízes?

Essa profunda mutação no equilíbrio dos Poderes conferiu aparente vantagem ao Judiciário. O peso crescente das lides judiciais na vida de todos fez de um país como o Brasil o campeão universal da litigância – não fora já a nação que mais tem faculdades de Direito, a ponto de suplantar a soma de todas as que existem no restante do mundo.

Também mercê dessa inacreditável circunstância, as carreiras jurídicas proliferaram e os concursos públicos converteram-se em excelente negócio para quem se dispuser a preparar candidatos aos previsíveis e ultrapassados processos seletivos para qualquer função pública na área do Direito. Magistratura, Ministério Público, Defensoria Pública, procuradorias, Polícia Civil, tudo se submete ao mesmo sistema de aferição da capacidade mnemônica. Grande teste de memória para quem se dispuser a decorar o volume enciclopédico de legislação, doutrina e jurisprudência, abundantes e produzidas em escala cada vez mais maior.

Isso leva autores como Pier Paolo Portinaro a falar em “Estado jurisdicional” e “governo dos juízes”. Com o acréscimo de que agora, sempre mais frequentemente, se fala de “democracia judiciária” e de “burocracia guardiã”, quando não, acirrando com populista desenvoltura, de “despotismo” ou “totalitarismo” judiciário, “tirania” ou “ditadura dos juízes”.

A democracia plebiscitária não encontra mais sua contraposição na democracia representativa, mas na democracia judiciária. É comum criticar a politização do Judiciário, tendência irreversível a servir como instrumento jacobino de expurgo dos corruptos ou como vetor de conservação das estruturas constitucionais do Estado social de Direito.

Além da visão tendenciosa de parte da doutrina, é importante também contemplar outras vertentes, até do ponto de vista do juiz, persona a quem velha concepção do que seja a magistratura recomendou contenção, comedimento, reserva e atitude discreta nos autos e na vida coletiva. Mandamento descumprido por muitos, o que levou o CNJ a editar o Provimento 71, de 13/6/2018, com disciplina sobre o uso de e-mail institucional e frequência às redes sociais.

O juiz é obrigado a responder a todas as demandas. Embora não possa agir de ofício, a ele é vedado, quando acionado, deixar de apreciar e conferir solução. Isso não é fácil quando a lei já não resolve todos os problemas contemporâneos. Embora ainda exista o “fetiche da lei”, ela já não exaure o fenômeno jurídico. Este é fato, valor e norma, na visão tridimensional de Miguel Reale.

A lei em sentido estrito é cada vez mais o fruto de compromissos assumidos por integrantes de uma espécie de novo feudalismo, pois elaborada por setores muito específicos, que defendem os próprios interesses, antes de procurar atender às requisições do bem comum. Por isso a matéria-prima com que trabalham os juízes – a rigor, a lei! – é cada vez mais fluida, ambígua, incompleta e contraditória.

Outra característica da lei contemporânea é que ela não enfrenta as questões nevrálgicas e polêmicas. Aparentemente, o Parlamento – que se submete à renovação dos mandatos mediante o periódico exercício do sufrágio – não quer comprometer sua reeleição. E foge do que possa trazer insegurança eleiçoeira.

Tudo resta, então, para apreciação judicial. O juiz é uma espécie de “factótum institucional”. Não se limita mais a dirimir controvérsias, mas resolve problemas que outros órgãos públicos ou instituições sociais não percebem na sua gravidade ou não são capazes de enfrentar de modo satisfatório. Ou não querem, de verdade, encarar, pois poderiam render desconforto quanto à obtenção de consenso entre os destinatários.

Além do mais, o Judiciário é gratuito para a maior parte das pessoas. Até empresários conseguem os favores da Justiça sem custos, para isso bastando declaração de que não podem arcar com tal dispêndio sem comprometimento de sua renda. O que é muito relativo.

Contribui para esse clima a vigência de uma Constituição ora balzaquiana – completa 30 anos em outubro – pródiga em direitos. Tudo é direito fundamental, tudo merece a tutela jurisdicional, sempre haverá quem postule e esteja certo de encontrar o beneplácito da função encarregada pelo sistema de fazer valer os bens da vida.

Expande-se, portanto, o Poder Judiciário. Cresce e se burocratiza. Há quem se orgulhe dos 100 milhões de processos em curso nos vários tribunais brasileiros, pois isso seria um termômetro da democracia plena que se vivencia desde 5/10/1988.

Invoca-se a tese do fortalecimento da independência da magistratura, a consolidação da cultura dos direitos invioláveis, a revolução das expectativas crescentes. Tudo isso seria o aspecto ufanista. Entre os fatores patológicos desencadeadores dessa corrida ao Judiciário, estão a também crescente corrupção das classes políticas, a ineficiência dos governos e a fragilidade das oposições, que obrigam a magistratura a desempenhar um papel substitutivo.

Os juízes não querem assumir o papel dos legisladores. Atuam no vácuo político. Nem querem administrar. Foram formados à luz do dogma da preservação da discricionariedade administrativa. O mérito da atuação da administração pública foi, até há pouco, inexpugnável.

A continuar essa política de recorrer ao Judiciário para todo e qualquer problema, incluídos os que poderiam ser solucionados com boa dose de talento para o diálogo, o sistema sucumbirá. Os juízes estão preocupados com isso. Mas quem deve ficar ainda mais preocupada é a sociedade brasileira.”

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quarta-feira, 20 de junho de 2018

Melhor Brasil de todos os tempos





“Melhor Brasil de todos os tempos
        
Por Celso Ming

Mesmo que o Brasil conquiste o hexa, é altamente improvável que alguma das atuais feras do Tite componha a melhor seleção brasileira de todos os tempos. Sempre haverá quem diga que escalar uma seleção ideal seria um despropósito, porque tudo depende da estratégia de jogo, da geometria dos atletas distribuídos em campo, desde o antigo WM até as atuais variações do 4-3-3, e da qualidade do rival. Mas se for por aí, não se chegará nunca fechar uma proposta dessas a partir da qual se poderiam discutir outras escalações.

Comecemos pelos goleiros. O Brasil não teve até agora nenhum craque nessa posição com a qualidade dos grandes do mundo, como o soviético Lev Yashin, o inglês Gordon Banks, o belga Michel Preud’Homme e o argentino Pato Fillol. Os três melhores do Brasil foram Gylmar (o dos Santos Neves), Carlos e Taffarel - que faz parte da comissão técnica de Tite na Rússia. Os três operaram defesas milagrosas, mas nem sempre foram regulares. Fico com Gylmar e sua tranquilidade, mais a elasticidade e a capacidade de passar confiança à defesa, mesmo quando falhava.

Há três laterais-direitos notáveis: Djalma Santos, Carlos Alberto e Cafu. O capitão Carlos Alberto foi o mais completo - e mais líder também. É ele o cara.

Beque central. Melhores que Bellini e Brito, foram Mauro e Oscar. Há quem sempre se lembre de uma lenda do passado: Domingos da Guia. Mas não há registros suficientes para uma comparação e, ademais, o propósito aqui é começar da Copa do Mundo de 1950, no Brasil. Oscar vai para a lista.

Na posição de quarto-zagueiro só há um absoluto, qualquer que seja o critério de escolha: Nílton Santos, aquele que dizia para o Mané Garrincha: “você é mais rápido, mas eu chego primeiro”. E como chegava! E, além de chegar sempre na cobertura, também participava do ataque, das jogadas ofensivas.

Na lateral-esquerda, três destacam-se entre os demais: Júnior, Branco e Roberto Carlos. Os três atuaram como laterais tanto ofensivos quanto defensivos.

Algumas vezes, acabaram por comprometer o resultado da partida. Mas, bem ponderadas qualidades e falhas, o melhor deles foi Roberto Carlos.

Foram muitos os grandes craques no meio de campo, hoje considerados volantes: Clodoaldo, Dino, Zito, Toninho Cerezo, Sócrates, Rivaldo. Ficamos com Falcão pela direita e Zico, pela esquerda.

Ponta-direita foi o Garrincha. Quando comparados com ele, os demais, como Júlio Botelho e Jairzinho, ficam à sombra.

Grandes armadores, houve pelo menos meia dúzia deles. Três são os finalistas nesta minha escolha: Zizinho, Didi e Gérson. O mais completo foi o Didi, que, além de tudo, transmitia confiança ao resto do time nas adversidades, como no primeiro gol da Suécia na final da Copa de 1958. E ainda detinha a nunca imitada técnica da “folha seca”, efeito incrível na bola nas cobranças de falta.

O Brasil teve grandes centroavantes. E nessa lista não figuram nem Romário nem Tostão nem Ronaldinho Gaúcho, que foram grandes atacantes, mas não centroavantes clássicos. Dois sobressaíram: Careca e Ronaldo Fenômeno. Mas ninguém foi tão grande como o Fenômeno, apesar das convulsões às portas da final da competição de 1998.

O titular absoluto da camisa 10 é ele, Pelé. Não houve ninguém como ele.

Seria um alívio se, além desses 11, pudesse ser incorporado mais um, não propriamente um ponta-esquerda, mas um craque que jogou pela esquerda. Seriam eles: Zagallo, Rivellino e Romário. Neymar ainda é uma hipótese. Mas, se fosse para escolher hoje esse número 12, seria Rivellino.

Então, o melhor conjunto de onze jogadores brasileiros de todos os tempos (e, como ficou dito, não dá para falar de alguns deuses de um passado quase sem registros, como Friedenreich e Domingos da Guia), são, os já mencionados: Gylmar dos Santos Neves, Carlos Alberto, Oscar, Nílton Santos e Roberto Carlos; Falcão e Zico; Garrincha, Didi, Ronaldo Fenômeno e Pelé.

Você pode eleger seus onze desde que opte por outros critérios. Mas não dá para negar, os nomes que integram esta escolha sempre farão parte de qualquer discussão séria.”

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terça-feira, 19 de junho de 2018

Essa crise econômica eterna é ecológica





“Essa crise econômica eterna é ecológica
        
POR FERNÃO LARA MESQUITA

O Brasil não se desinteressou da política propriamente. A política é que se desinteressou do Brasil. Não precisa mais dele. Ainda faz um pouquinho de cerimônia, mas é mais pra disfarçar.

O debate ideológico acabou, aliás, no mundo inteiro. Ninguém mais precisa ser convencido de nada. Não há mais sistemas concorrentes. Nem Kim Jong-un nem o Castro que resta acreditam “na revolução”. A diferença que subsiste diz respeito tão somente a quem tem o direito de se apropriar de que parcela do resultado, e por quais critérios: o da força ou o do esforço. E onde o Estado gasta mais de 100% do que arrecada com “pagamento de pessoal” e não investe um tostão furado no que interessa à coletividade deixa de haver qualquer dúvida sobre qual a escolha feita.

Só o que há aqui é um jogo de força entre fanções pelo comando do butim. A “privilegiatura” nos impõe sua rapina na porrada falsificando cada vez mais ostensivamente os processos de “legitimação” da sua brutalidade. Desmancha nos tribunais o que os representantes eleitos do povo eventualmente decidem a favor do povo. Fecha cada vez mais a porta da mudança com o “financiamento público” de campanhas e com as regras de tempo de comunicação entre candidatos e eleitores na televisão. E ao impor, agora, a proibição (!!) da produção de provas materiais contra a falsificação do voto assume-se oficialmente como o que quer vir a ser.

Houve uma aposta forte o suficiente para deter a marcha à ré e colocar o País andando para a frente na altura da instalação do governo Temer apenas porque, apesar de todos os pesares, ele assumiu com o tipo de discurso consequente que precede obrigatoriamente as ações consequentes. Ninguém tinha ilusões sobre a dificuldade de transformar aquelas palavras em atos, mas o preço é função da escassez e nem esse tanto pouco nós jamais tínhamos tido. O mercado reagiu mais por saudade que por esperança...

Atingido abaixo da linha d’água por intenso canhoneio por ter ousado tanto – e tão somente por ter ousado tanto – o governo Temer teve o discurso da reforma de que até então não se ousava dizer o nome enfiado goela abaixo de volta com todas as suas escamas e espinhos apontados na direção de machucar. Cada vez que tentou ressuscitá-lo o bombardeio recrudesceu na forma de dossiês vazados para uma imprensa fácil diretamente pelas corporações que se apossaram do Estado para construir uma “privilegiatura”. Uns apontam o herege e fornecem a lenha, os outros encenam os autos de fé. Como todo mundo se elegeu do jeito que a lei mandava, quem ataca a “privilegiatura” tem os contatos de mucosas com os financiadores de campanha que todos tiveram escancarados com escândalo na televisão, tão certo quanto que o sol vai nascer amanhã. Para qualquer grau de obscenidades outras há recurso ... e disposição para o silêncio. A aposta é, portanto, em Darwin. Sobrevivência dos mais adaptados. A lei só se impõe pela certeza do castigo e o País está sendo ensinado a duras penas que a do crime é a única que não falha.

Esgotado o discurso das reformas o governo Temer – como qualquer outro presidindo o colapso de uma nação esgotada por um sistema de privilégios – não tem mais nada a dizer. Tenta resistir vendendo a memória das “conquistas” que decorreram da antecipação pelo mercado de uma até então impensável reforma da previdência pública escondida no bojo de um mero ajuste da outra, mas é tarde. Paga – e nós junto – pela covardia de não ter enfrentado o leão de frente. A condição descamba para o desespero, porém, a cada centímetro que o discurso dos candidatos a substituí-lo se afasta da reforma da previdência pública. E não há exceções. Quem não é assumidamente covarde é omisso.

Excluída a discussão da cura possível, tudo o que subsiste é a destilação de bílis dos que se dispõem a isso, discurso que uma parcela do eleitorado compra ao menos como vingança. E então cai-se no pior dos mundos. Não há reserva de moeda forte que aguente...

A economia é só uma medida do Estado de sanidade do ecossistema institucional onde uma sociedade vive e tenta progredir. E o nosso entorta a partir da raiz. Nossa eterna crise econômica é efeito, não é causa.

Todo sistema de governo é uma hierarquia. Estabelece quem manda em quem. Democracia é a forma de governo em que os representados mandam nos representantes e aqui o que acontece é o contrário. A essência da tapeação que nos impingem é que, desamarrado o representante dos seus representados, todos os outros mecanismos macaqueados de sistemas democráticos para proteger os representados protegendo os seus representantes passam a jogar para inverter essa relação. Ficam eles armados para jogar só para si e contra nós e invocar as “instituições democráticas” para defender a sua moeda falsa.

Desentortar o Brasil é, portanto, muito mais simples do que parece. Basta amarrar firmemente cada representante eleito à parcela exata do eleitorado que ele representa, e dar a esses eleitores poder de vida ou morte sobre o mandato dele antes e, principalmente, depois da eleição. Isso se consegue com eleições distritais puras, direito de retomada de mandatos e referendo de leis pervertidas por iniciativa popular a qualquer momento. Armados assim os representados, ficam os representantes permanentemente sob mira e impotentes para nos meter em caminhos sem volta. E isso abre o País à reforma permanente que é a condição natural de qualquer organismo vivo com pretensões a manter-se vivo num ambiente em permanente mudança.

O resto acontece sozinho. Todo mundo acaba indo em direção à felicidade se lhe for dado escolher em que direção quer andar.

Quanto a como instalar esse processo, também é simples. Encham-se de povo as principais praças públicas das principais cidades do País com metade dos manifestantes segurando o mesmo cartaz duas ou três vezes ao longo de um ano e a coisa acontece. Exatamente do mesmo jeito que conquistamos a nossa última façanha “impossível”.”

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segunda-feira, 18 de junho de 2018

Neymar, a "calopicita"!





‘A diferença que um bom time faz
        
Por Zeina Latif

Não há como saber onde estaria o País se Dilma fosse presidente. Precipício talvez seja uma boa imagem. Afastar o risco de uma crise mais prolongada foi importante conquista. E apesar do quadro econômico ainda frágil, a confiança, aos poucos, melhora.

É provável que eventos recentes, como a greve dos caminhoneiros, limitem transitoriamente a recuperação da confiança da sociedade. Importante, porém, registrar que as ruas estão calmas. E assim ficaram mesmo com a paralisação. A inflação baixa e a geração de empregos com carteira, mesmo modesta, provavelmente explicam esse quadro. O nervosismo é do mercado financeiro, não da sociedade.

Houve geração líquida de quase 197 mil empregos com carteira nos últimos 12 meses terminados em abril, pelos dados do Caged (curiosamente não capturada pela Pnad do IBGE). Como reflexo, a confiança dos consumidores segue tendência de alta, bem como as vendas do varejo. As dívidas em atraso dos consumidores e o comprometimento da renda com pagamento de dívida bancária recuam.

O quadro geral continuará sendo de recuperação, ainda que o impacto da greve seja bastante relevante e a pressão cambial tenha efeito contracionista na atividade no curto e médio prazos. Há muito efeito de corte de juros ainda a se materializar, cujo impacto máximo na economia ocorre depois de um ano.

Certamente, a recuperação poderia estar sendo mais rápida. Se, por um lado, a política propiciou a reorientação da política econômica e a aprovação de importantes reformas, com autonomia do time econômico, por outro, o enfraquecimento do governo, desde as denúncias contra Temer, cobra seu preço.

Grupos de interesse aproveitam a situação para bloquear a agenda de reformas e maximizar seus ganhos. Isso ajuda a explicar a não aprovação da reforma da Previdência, que sofreu resistência da elite do funcionalismo. O governo também sofreu derrotas, como, por exemplo, a derrubada de vetos do presidente ao Funrural e ao Refis para empresas do Simples pelo Congresso, dentre muitas outras. Essas derrotas dão uma noção da pressão de todos os lados, do setor privado e de políticos, sobre a Fazenda, que não mais conta com a mesma linha de defesa do governo.

Curioso que alguns analistas, como Fernando Limongi, equivocadamente afirmam que a agenda reformista não encontrou resistências no Congresso.

Felizmente, há restrições legais que limitam o poder discricionário para aumentar gastos e renúncias tributárias. E o Tribunal de Contas da União está atento. Exemplos recentes foram o alerta do ministro da Fazenda sobre os limites para o subsídio ao diesel, em função da Lei de Responsabilidade Fiscal, e a decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) de cobrar do governo que se manifeste sobre os riscos que a derrubada dos vetos citados acima acarretam sobre as contas públicas.

As amarras legais que disciplinam o Orçamento público devem ser vistas como aliadas do governo, dada a necessidade urgente de se ajustar as contas públicas, e não como restrições a serem eliminadas.

Se o próximo presidente tentar flexibilizar a regra do teto, sem antes aprovar uma boa reforma da Previdência e conquistar reputação reformista, poderá estar cometendo um grande equívoco. Seria um mau uso do capital político o próximo presidente inverter a ordem de prioridade de reformas. Pode correr o risco de pouco entregar.

Nesse sentido, as manifestações de alguns candidatos preocupam. Ciro tem dado ênfase na proposta de flexibilização da regra do teto e no aumento de impostos, e, curiosamente, não no corte de despesas e na reforma tributária. Bolsonaro não se manifesta. Marina não diz o que fará, mas critica a regra do teto, sem entendê-la aparentemente, pois afirma equivocadamente que a regra congela os gastos públicos por 20 anos. Alckmin faz restrições à regra, mas não pretende alterá-la.

Vamos torcer para o próximo presidente ter um time econômico tão bom quanto o atual.”

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Não, como vocês viram, não se trata de futebol o texto da excelente economista Zeina Latif. Entretanto, ele tem tudo a ver com o nosso futebol lá na Rússia. Ontem, fomos dormir com um empate com a Suíça, o que nos leva a ser menos otimista, mesmo contando com nossa “calopicita” Neymar.

Então, vejam que falta faz um bom time. Tite que o diga. Espero que a seleção brasileira se corrija e leve o Brasil a alguma alegria, pois de outros setores, não tem vindo muitas ultimamente.

E eu volto a curtir a Copa pedindo desculpas pelo atraso na publicação de hoje, e já me desculpando por outros atrasos. Mas, a culpada é Seleção!

sexta-feira, 15 de junho de 2018

O acordo com o menino do foguetinho...




                                              
“Primeiro passo
        
O Estado de S.Paulo

O clima de hostilidade que marca a Península Coreana há 65 anos não será dissipado totalmente de uma hora para outra. No entanto, a histórica reunião entre o presidente americano, Donald Trump, e o líder norte-coreano, Kim Jong-un, ocorrida na Ilha Sentosa, em Cingapura, foi o primeiro passo concreto, e o mais promissor até agora, para a distensão de uma das mais militarizadas e conflituosas regiões do mundo. Foi a primeira vez que os líderes em exercício dos Estados Unidos e da Coreia do Norte se reuniram pessoalmente.

“Só há dois homens que podem tomar decisões de tamanha importância (que levem à paz na Península Coreana). E estes dois homens estarão sentados na mesma sala”, disse Mike Pompeo, secretário de Estado dos EUA, pouco antes do início da reunião.

Após o aguardado aperto de mãos, ocorrido às 9h05 de terça-feira (22h05 de segunda-feira no horário de Brasília), Kim Jong-un afirmou que o encontro era “um bom prelúdio para a paz”. Donald Trump concordou, dizendo ser “uma honra” participar das negociações para a completa desnuclearização da Península Coreana com Kim Jong-un, “um negociador digno, que negocia em nome de seu povo”.

Ao final da reunião, Donald Trump e Kim Jong-un assinaram uma declaração conjunta. No documento, os dois manifestaram “profunda e sincera” disposição para reconstruir as relações entre seus países de modo a levar à “construção de um regime de paz duradouro e robusto na Península Coreana”. Tal disposição, por si só, já representa um enorme salto qualitativo nas relações diplomáticas entre EUA e Coreia do Norte, marcadas por profunda animosidade desde o fim da 2.ª Guerra.

Além do estabelecimento de novas relações diplomáticas entre os dois países, Donald Trump e Kim Jong-un se comprometeram a “unir esforços para construir um regime de paz duradouro e estável na Península Coreana” e “recuperar os restos mortais de prisioneiros de guerra e desaparecidos em combate, incluindo o repatriamento imediato daqueles que já foram identificados”. Além disso, a Coreia do Norte se comprometeu a “trabalhar pela desnuclearização completa da Península Coreana”, reafirmando a Declaração de Panmunjon, de 27 de abril de 2018.

Embora não conste do documento divulgado ao final da cúpula de Cingapura, Donald Trump assumiu o compromisso de interromper os “jogos de guerra”, como ele se referiu aos exercícios militares que as Forças Armadas americanas realizam todos os anos em conjunto com as tropas da Coreia do Sul.

Evidentemente, as declarações dos dois líderes são gestos de boa vontade. Por ora, estão no campo das grandes diretrizes estratégicas para a região e, portanto, deverão ser seguidas de ações concretas tomadas por autoridades dos dois países para produzir os resultados esperados da cúpula. Donald Trump e Kim Jong-un assumiram o compromisso de realizar, “na data mais próxima possível”, negociações subsequentes, lideradas por Mike Pompeo, do lado americano, e “um funcionário relevante de alto escalão”, pela Coreia do Norte, “para implementar os resultados da cúpula”.

O governo da Coreia do Sul, interessado direto no sucesso das negociações com o vizinho do norte, celebrou o encontro. “O acordo de Sentosa de 12 de junho ficará registrado como um evento histórico que ajudou a derrubar o último legado que restava da guerra fria na Terra”, afirmou Moon Jae-in, presidente sul-coreano. Wang Yi, ministro das Relações Exteriores da China, maior aliado de Pyongyang, afirmou que seu país “celebra e dá seu apoio” ao encontro.

Embora um olhar de cautela se imponha dado o histórico das relações entre os EUA e a Coreia do Norte, a cúpula tem grande chance de produzir os resultados esperados porque os dois países parecem ter atingido seus objetivos imediatos. Para os EUA, interessa eliminar a maior ameaça à paz na região da Península Coreana. E à Coreia do Norte interessa ser reconhecida pela comunidade internacional e ver suspensas as pesadas sanções econômicas impostas ao país. Muito ainda há de ser feito, mas o primeiro passo foi dado.”

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AGD comenta:

Diziam lá em Bom Conselho que “seguro morreu de velho e desconfiado está vivo”. Não há uma frase melhor aplicável ao meu sentimento em relação a este encontro entre o “baixinho” Kim Jong-un, e o “altinho” Donald Trump. Aliás suas alturas refletem bem o desenvolvimento de seus respectivos países. Dizem que na Coreia do Norte o povo come uma vez por dia, e nos Estados Unidos o povo come quando quer comer, e comem até demais, e por isso há tantos gordinhos e obesos.

Então que não se confunda a gordurinha do ditador Kim, com o tanto de comida que come seu povo e nem se confunda a magreza de Trump com o tanto que os americanos comem de hambúrgueres. Para mim, este acordo, se sair, vai ser muito bom para a humanidade, no entanto, não vejo como dar certo um acordo entre os dois, pelos seus históricos, principalmente o “baixinho”, cuja ditadura dizem ser das piores, se há ditadura pior ou melhor.

Então devemos ter a prudência de evitar cantar vitória antes que haja algo de concreto a mostrar, inclusive, levando o menino atômico para passear na Disney montado em seus foguetinhos. Quanto ao Trump, ainda não se pode dizer muito. Nem mesmo os norte americanos sabem quem está presidindo o seu país. Mas, este é o preço que se paga pelo bem maior que é de viver num regime Democrático.

quinta-feira, 14 de junho de 2018

País sequestrado por um condenado preso





“País sequestrado por um condenado preso
        
POR JOSÉ NÊUMANNE

Os resultados da última pesquisa Datafolha, publicada domingo pela Folha de S.Paulo, não podem ser considerados definitivos para prenunciar a apuração da eleição de daqui a quatro meses porque representam um retrato atual, como sempre, nunca uma profecia exata. E também porque revelam agora uma decisão que muitos cidadãos ainda estão por tomar. Configuram, contudo, e ao que parece de forma cristalizada, tendências que dificilmente mudarão, pois refletem uma situação antiga, crônica, lógica e irrefutável.

Os 30% de preferência pelo soit-disant presidenciável do Partido dos Trabalhadores (PT), Luiz Inácio Lula da Silva, impressionam por dois motivos. Antes de tudo, porque ele foi condenado em segunda instância pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, em Porto Alegre, a 12 anos e 1 mês por corrupção e lavagem de dinheiro. E é inelegível. Em segundo lugar, por cumprir pena em Curitiba e, portanto, não ser disponível para participar de comícios, carreatas e até, conforme presume quem tem bom senso, gravar pronunciamentos para a propaganda nada gratuita no rádio e na televisão. O comportamento inusitado da Justiça, permitindo-lhe um dia a dia não vivido por outro preso comum – e ele é apenas mais um –, pode pôr em questão a segunda afirmativa. Mas, por enquanto, prever a continuação dessa anomalia, vencidos os prazos legais para o registro de candidaturas, não é realista.

A fidelidade de quase um terço do eleitorado brasileiro ao carisma do mais popular líder político e mais famoso presidiário do País, a esta altura do campeonato, confirma uma evidência e nega uma lenda urbana. O primeiro lugar no ranking atesta que a emoção é decisiva no ato de digitar o número do pretendente na máquina de votar. E o petista é, disparado, o único dos que se apresentaram à liça a despertar a paixão do cidadão, seja por afeto, seja por repulsa. Mas também, por paradoxal que pareça, o voto em quaisquer nível social e escolaridade é decidido pelo estômago e pelo bolso.

“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo, perdeste o senso”, resmungará o leitor aflito, citando o repetido verso de Olavo Bilac. Afinal, além de condenado, Lula responde na Justiça a mais seis processos criminais, que, juntos, o desmascaram na chefia de uma organização criminosa que levou a Petrobrás à falência, quebrou as contas públicas, esfolou a economia a ponto de gerar 24 milhões de desempregados e desiludidos, conforme o confiável IBGE, e indicou os dois presidentes mais desastrados e, por isso mesmo, mais impopulares da História: a companheira petista Dilma Rousseff e o cúmplice Michel Temer, do PMDB. Sem Temer, Dilma não teria sido eleita. Sem os votos do PT, Temer não seria presidente.

É aí que entra neste raciocínio a negação de que o brasileiro não tem memória, uma lenda antiga e frágil. Os apressadinhos, que, conforme ensinava vovó, comem cru ou sapecado, arguirão que, ao desprezarem os dados da realidade que fazem de Lula um réprobo, e não os quindins de iaiá, os brasileiros que vegetam abaixo da linha da pobreza não têm memória mesmo e ponto final. Alto lá! História é uma coisa, memória é outra. A História é objetiva, relata fatos indesmentíveis, questiona mitos aparentemente indestrutíveis. A memória é subjetiva. Cada um tem a sua. A lembrança dos fatos ao redor é sempre imprecisa e traiçoeira. A recordação dos benefícios pessoais é permanente. Os que asseguram que votarão em Lula têm a memória gostosa dos tempos de ouro do crédito fácil e do acesso à proteína barata sobre a mesa da família.

A História revela que a inflação acabou, o poder de compra da moeda permitiu o acesso das famílias pobres ao consumo inatingível, por obra e graça do Plano Real, do câmbio flutuante e da Lei de Responsabilidade Fiscal, sob a égide do tucano Fernando Henrique. Mas a memória ressuscita o crédito farto e fácil e é isso que segura Lula no topo das pesquisas.

Detratores de institutos de opinião poderão até constatar que os índices recentes não se confirmarão. Mas dificilmente as tendências serão desmentidas. A principal delas é a novidade que ameaça surgir do panorama visto da pinguela sobre a fossa: a disseminação generalizada de que político nenhum presta mesmo e, então, o melhor é escolher um entre tantos condenados que no passado mais recente lhes “encheram o bucho”, como se diz em meu Nordeste de origem, região tida como baluarte lulista. Sabe o “rouba, mas faz”? Pois...

Em 2013, a população foi à rua protestar contra tudo e no ano seguinte reelegeu Dilma e Temer, dois precipícios para a tragédia. Em 2016 o eleitor surrou o PT porque a Lava Jato levou o partido aos tribunais e às prisões. Presos em Curitiba estão todos os chefões petistas: o próprio Lula, Zé Dirceu e Palocci. E, pior de tudo, três ex-tesoureiros – Delúbio, Vaccari e Paulo Ferreira – tiveram o mesmo destino. Há quem lembre diante desse fato que a organização criminosa, vulgo quadrilha, se afigura na forma da lei com a reunião de mais de quatro membros. Ou seja...

Em 2014 o PSDB fez de Aécio Neves a esperança anti-PT para pelo menos metade da sociedade, que não cai na lábia do profeta de Vila Euclides. O neto de Tancredo Neves, ilusão da Nova República abatida pela septicemia, contudo, protagonizou a maior frustração política da nossa História. Denunciado por um suspeito de ter enriquecido pelo compadrio de Lula e asseclas, gravado anunciando a morte do primo, caso este o delatasse, o mineiro poderia ter passado em branco pela inutilidade que protagonizou em seu mandato de senador pelo Estado mais habilidoso do Brasil. Mas fez muito pior, ao mostrar que seu adversário-mor comprou até a oposição fajuta em que ele mandava.

Lula nem precisará candidatar-se para encarnar o paradoxo deste país surreal, que mantém sob sequestro em sua cela de preso comum: beneficia-se por ter escolhido sucessores que quebraram o Brasil e pagou à oposição para anulá-la.”

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