Em manutenção!!!

quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

NECO CATITA!




Por José Antonio Taveira Belo / Zetinho


Toda cidadezinha tem um habitante folclórico que é conhecido em toda região. Neste caso aqui, todos conheciam Nicolau, conhecido por seu Neco. Um homem franzino, pouco mais de um metro e cinquenta, calvo e barba bigode fininho na cara rosada, olhos esverdeados e boca pequena, esse era o tipo. Tinha predileção pelo jogo. Jogava carteado, o bozó e roleta num pequeno casino por trás do cinema em uma sala reservada. Tinha um pequeno negócio no final da Rua do Sossego, vendendo feijão, milho, farinha e açúcar em grosso, nada de venda a varejo dava mais trabalho, pois a cada momento chegaria um freguês, me dê um quilo de feijão, ou de açúcar, ou de milho. O dinheiro apurado muitas das vezes deixava no jogo. Era solteiro. Tinha em vista, mas nunca declarado a ninguém uma loirinha, pequena tanto quanto ele, olhos fascinantes de um castanho claro e boca pequena. Tinha tudo que ele desejava para casar, pois, beirava os quarentas anos. A donzela todos os dias ia para a Matriz de São Bartolomeu, com a sua amiga Marinha, rezava o terço, assistia a missa, era filha de Maria e gozava do apreço do Padre Eurípedes. Depois da reza ia passear na Praça Pedro II dando duas voltas sentando-se depois em banco junto a um canteiro de dálias vermelhas. Ali conversava animadamente com as companheiras, enquanto Seu Neco observava de longe sem ter a coragem de lhe falar namoro. Ele, já tinha a visto olhar para ele, mas desviava o seu olhar desconfiado. E a desconfiança era pela sua estatura pequena. Era bem conceituado na sociedade, frequentava as danças de final de semana no clube “Cisne” aonde todos iam às noites de sábado. Em uma noite de danças, no clube, apareceu um ratinho correndo entre as mesas, todos correram principalmente às senhoras e mocinhas, trepando nas cadeiras enquanto o ratinho corria pelo canto das paredes. Seu Neco para mostrar serviço corria atrás do bichinho, e todos gritavam “Seu Neco a catita foi por ali”, “Seu Neco lá está debaixo das caixas de cervejas” olhe “Seu Neco debaixo da mesa de Dona Carolina” uma velhota solteirona enfeitada com brincos de ouro e um colar com a medalha da Nossa Senhora de Fatima cravejada de brilhante. Olhava para os lados, sem localizar e de um momento para outro deu sorte e a catita raspou seus pés e com um chute golpeou o bichinho e depois esmagou com uma pisada e ai denominaram ele como Neco Catita.  Ele não gostou deste apelido, mas ficou calado em sua mesa sendo parabenizado pelo feito. Nesta noite lá sentada junto aos seis pais, Lucinha a sua predileta. Olhava de vez em quando e ela no seu lugar olhava para o seu lado. Esforçou-se e a foi tirar para dançar. Era a oportunidade, mesmo que levasse um “corte” não teria problema. E foi. Deu sorte ela levantou-se devagarinho, sob os olhares de seus pais e no meio do salão um bolero ecoou com um canto “Beija-me muito” ele abraçado naquele pequeno corpo sonhava, com o seu perfume que vinha da sua face e cabelos. As mãos macias eram apertadas, de vez um sussurro que o leva a sonhar naquele momento não desejava que a música terminasse. Levou a mesa agradeceu e sentou-se no seu lugar tomando uma cerveja. Fechava os olhas a cada instante, parecia sonhar, mas era uma realidade. Pensou – Não tive a coragem de perguntar se poderia conversar com ela no dia seguinte. Que falha! Mas pensou, no outro dia ia passar um filme no cine Boa Vista, um filme que todos não perdiam. Ficou de longe, já com o ingresso na mão esperando que ela chegasse e assim poderia ficar junto dela para assistir o filme e ai tinha a oportunidade, que faltou no baile, de lhe falar sobre outro encontro. E assim aconteceu. Sentado junto dela o coração batia descompassado. Olhou para ela e começou a conversar antes do filme começar. Perguntou nervoso depois se poderia se encontrar com ela em sua casa. Esperou a resposta, ansioso, e recebeu um sim. Quase foi impulsionado da cadeira pela alegria e surpresa. Assistiu ao filme olhando mais para ela do que as cenas que se desenrolava na tela. No dia seguinte, fechou o comercio, tomou um banho e logo às seis e meia foi para a Matriz, onde celebrava a novena e logo que ela chegou foi ao seu encontro e ao termino levou a sua casa. Seus pais estavam à porta esperando-a e Seu Neco Catita, falou que desejaria, com boas intenções, namorar a sua filha frequentando a sua casa. O que foi bem aceito pelo Seu Honório e Dona Filomena. As suas andanças pelo cassino terminaram, se dedicou a ouvir as reclamações da comunidade; Começou entrar na política, nas reuniões da câmara e resolveu disputar a Prefeitura no pleito que ia acontecer brevemente, mais ou menos um ano para eleição. - SOU PEQUENO MAIS SOU GRANDE NAS AÇÕES – CATITA este foi à faixa colocada na porta do seu armazém. Logo, logo, foi encontrando apoio da comunidade e assim seguiu em frente filiado a um partido pequeno o PPL – Partido Popular Livre. No dia da eleição saiu pelas ruas visitando as zonas eleitorais e sendo bastante cumprimentado. Após apuração o seu CATITA tornou-se o Prefeito da cidade. Tomou posse sob os aplausos d população que cercaram o prédio da Câmara Municipal de Sertãozinho.  

terça-feira, 30 de janeiro de 2018

Bravatas e realidade




“Bravatas e realidade

POR MERVAL PEREIRA

 Já entrou para o anedotário da política brasileira a confissão do ex-presidente Lula: "Quando a gente é de oposição, pode fazer bravata porque não vai ter de executar nada mesmo. Agora, quando você é governo tem de fazer, tem que ser responsável, e aí não cabe a bravata". Em outra ocasião, ele confessou, entre risos de seus entrevistadores amigos, que quando era oposição viajava o mundo falando mal do Brasil e ganhava muita atenção no estrangeiro citando dados estatísticos que não exprimiam a verdade.

 Pois foram as bravatas de Lula e seus seguidores que justificaram a decisão do juiz federal de primeira instância Ricardo Leite, de Brasília, de apreender o passaporte do ex-presidente, medida cautelar prevista no Código de Processo Civil para substituir a prisão preventiva, impedindo-o de viajar para a Etiópia, num evento sobre o combate à fome no mundo, onde certamente voltaria a falar mal do Brasil e a contar bravatas sobre si mesmo e seus governos.

Mas o juiz não estava preocupado com o que Lula faria no exterior, mas sim com os indícios de que poderia não retornar, pedindo asilo a “países simpatizantes”. Essa foi uma das bravatas que os aliados de Lula espalharam nos últimos dias. Ao impedir Lula de deixar o país, o juiz Ricardo Leite explicou “É do conhecimento público a divulgação de declarações em que aliados políticos do ex-presidente, visando à politização de processos judiciais, cogitam a solicitação (se necessário) de asilo político em seu favor para países simpatizantes”.

Também a reiteração, por Lula e seus aliados, de que não acatariam a decisão do Tribunal Regional Federal de Porto Alegre (TRF-4), com incitação aos militantes para que resistam a uma eventual prisão de Lula, serviram de base para a decisão do juiz de Brasília.

Um dia depois de ter sido condenado a 12 anos e um mês de prisão, o ex-presidente Lula, em reunião da Executiva Nacional do PT, disse que não respeitaria a decisão da Justiça, e conclamou os militantes a uma ofensiva nas ruas para defendê-lo, pregando o enfrentamento político.

"Esse ser humano simpático que está falando com vocês não tem nenhuma razão para respeitar a decisão de ontem" (...) "Quando as pessoas se comportam como juízes, sempre respeitei, mas quando se comportam como dirigentes de partido político, contando inverdades, realmente não posso respeitar”.

 Na mesma reunião, o líder do Movimento dos Sem Terra, João Pedro Stedile, afirmou que os movimentos populares não aceitarão e impedirão a prisão do ex-presidente Lula. Também o líder do PT no Senado, Lindbergh Farias, que, por sua agressividade, subiu no conceito das lideranças petistas, defendeu a "desobediência civil", com ocupação das ruas, contra a condenação de Lula em segunda instância:

 "Não nos peçam passividade nesse momento. Há uma ditadura de toga nesse País. Não podemos mais dizer que vivemos numa democracia, e agora só temos um caminho: a rebelião cidadã e a desobediência civil", afirmou, para desafiar: "Vão fazer o quê? Prender o Lula? Vão ter de prender milhões de brasileiros antes."

O líder do PT foi mais cuidadoso nessa frase do que fora sua presidente partidária, senadora Gleisi Hoffman, que chegou a dizer que para prender Lula teriam que matar “muita gente” antes. As manifestações a favor de Lula não indicam essa disposição de “muita gente” para morrer pelo ex-presidente, e as últimas informações mostram que principalmente não estão dispostos a morrer politicamente.

 Já começam nos bastidores as negociações para apressar a indicação de um candidato substituto, sob pena de o partido sofrer uma derrota fragorosa nas eleições gerais de 2018. Para os membros do partido, uma candidatura de Lula representava a senha mágica para a recuperação do partido nas eleições de governadores, 2/3 do Senado e a totalidade da Câmara, compensando a derrota que o partido sofreu nas eleições municipais de 2016. Agora, insistir nela pode ser a derrocada final.

Com uma perda de 60% das prefeituras que governava, o PT ficou em 10º lugar entre os partidos que mais elegeram prefeitos, deixando que seus adversários mais fortes, como o PMDB e o PSDB, crescessem e tenham hoje uma máquina partidária espalhada pelo país que certamente os ajudará na campanha deste ano.

As bravatas de Lula certamente não ajudarão o partido, pois dificilmente ele conseguirá superar a Lei da Ficha Limpa que torna inelegível os que, como ele, são condenados em segunda instância. Como sói acontecer com os bravateiros, na hora do enfrentamento da realidade eles se curvam a ela. Lula, que incitava à desobediência civil, levando Lindbergh a acreditar na bravata, entregou seu passaporte e vai lutar por ele dentro da legislação vigente.”

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segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Lula e seus clones




“O candidato El Cid
        
Por Eliane Cantanhêde

Ao ratificar Lula para a Presidência da República, a Executiva Nacional do PT está cumprindo uma formalidade, fazendo uma deferência para seu grande líder e acenando com um “El Cid” para as eleições, até que a Justiça siga seu curso e decida não só o destino do candidato Lula, mas também do cidadão Lula. A realidade e a ficção andam juntas e, muitas vezes, a realidade supera a ficção.

El Cid, cavaleiro espanhol, é um misto de personagem real e de ficção, ora endeusado como herói, ora apontado como mercenário. Para compor a lenda, ele foi amarrado a um cavalo depois de morto, com armadura e espada, para, de tão temido e poderoso, afugentar os mouros e vencer a guerra “na moral”.

A guerra fundamental de Lula e do PT agora não é eleitoral nem contra outros partidos e candidatos, mas sim na Justiça, para evitar a prisão de Lula. Por 6 a 5, o Supremo decidiu em 2016 que condenados em segunda instância, como ele, já podem ser presos, mas ministros do próprio Supremo continuaram tomando decisões em contrário e um dos seis votos vitoriosos pode mudar: o do ministro Gilmar Mendes.

Afora a ironia de Gilmar poder ser decisivo para evitar a prisão dele, o debate sobre prender ou não prender El Cid, ops!, Lula, embala radicalismos. Antes mesmo do acórdão do TRF-4 que aumentou a pena de Lula para 12 anos e 1 mês, a senadora Gleisi Hoffmann avisava que, se prenderem Lula, “vai morrer gente”. Agora, o ministro Marco Aurélio adverte que a prisão “poderá incendiar o País”.

Entre lágrimas sinceras e um deboche calculado, Lula conclamou os petistas a não acatarem o resultado do TRF-4: “Esse ser humano simpático que está falando com vocês não tem nenhuma razão para respeitar a decisão”. Pois só se respeita decisão de juízes que “se comportam como juízes, não como dirigentes de partidos políticos”. Assim, liberou a sua tropa para atacar não mais Moro, a Lava Jato e a imprensa, mas também os desembargadores João Pedro Gebran Neto, Leandro Paulsen e Victor Laus – dois deles indicados no governo Dilma.

Lula, porém, dá a sensação de que se diverte falando mais do que deve e sem nenhum compromisso com os fatos. A opinião pública já está acostumada. O problema é quando a presidente de um partido fala em “morrer gente” e um ministro do Supremo vê o risco de uma decisão judicial “incendiar o País”.

Cansa a ameaça de guerra, fogo, mortes, quando isso só ocorre nas nossas cidades pela violência urbana, não por guerra política. Este é um país de centro, avesso a radicalismos e assistiu, sem um tiro, uma gota de sangue, ao fim da ditadura, a dois impeachments em 25 anos e à prisão de ministros, governadores e presidentes de Poderes.

Se Dilma sofresse um “golpe”, incendiariam o País. Se mudassem as regras de Dilma para a (não) exploração do pré-sal, ocupariam as ruas e avenidas. Com a reforma do ensino médio, invadiriam as escolas. Com a trabalhista, parariam tudo em greve geral. Se o TRF-4 mantivesse a condenação de Lula, os sem-terra e os sem-teto explodiriam Porto Alegre e a Avenida Paulista. E daí? Daí, nada.

Há um lado profundamente triste no que Antonio Palocci chamou de “desmonte moral da mais expressiva liderança popular que o País construiu”. Triste e merece reflexão sobre o sistema que “desmonta moralmente” as pessoas, mesmo alguém com a biografia vibrante de Lula, que saiu da intensa pobreza, governou o País num momento de euforia e chegou a 80% de aprovação.

Mas o fato é que as instituições funcionam, o combate à corrupção é inédito e, como citou Moro, “não importa o quão alto você esteja, a lei ainda está acima”. Lula manterá uma candidatura El Cid para se defender ou para pôr fogo e atacar todas essas conquistas do Brasil?”

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AGD comenta:

O que me despertou no texto acima foi a lembrança de El Cid. Gente da minha geração jamais esquecerá o Charlton Heston, garbosamente desfilando no cavalo de El Cid para vencer uma batalha contra os infiéis. Nada mais parecido com o Lula hoje, ou pelo menos como o PT quer vê-lo.

Eu hoje, com uma comparação mais correta, eu prefiro o ator, como Moisés, abrindo o Mar Vermelho, mas, sendo tragado por ele, caso se quisesse compará-lo com o Lula. Infelizmente, o Lula escolheu um péssimo papel, somente para não ir para cadeia.

Ele diz que não se importa com isto pois o Mandela, foi para a cadeia e saiu presidente da África do Sul e louvado em prosa e verso pelo mundo. Só o Lula mesmo para fazer uma comparação como esta. O Mandela deve estar se revirando no túmulo até agora.

E o Getúlio, também motivo de comparação, além de se revirar no túmulo, deve estar chamando atenção de Brizola sobre o que o Sapo Barbudo está falando. E o Antônio Conselheiro? Penso que a única semelhança entre os dois seria a barba, e olhe lá.


Em suma, o que se está vendo no Brasil é uma comédia trágica que passará, pelo menos para mim, um eterno otimista.

sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

Acima de qualquer dúvida





“Acima de qualquer dúvida
        
O Estado de S. Paulo

A 8.ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4), em Porto Alegre, confirmou, por unanimidade, a sentença do juiz federal Sérgio Moro que condenou o ex-presidente Lula da Silva à prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. E aumentou a sentença aplicada em primeira instância de 9 anos e 6 meses para 12 anos e 1 mês. Nas palavras do relator do processo de apelação, desembargador João Pedro Gebran Neto, “há provas acima de dúvida razoável” de que o chefão petista obteve benefícios pessoais da empreiteira OAS em razão do esquema de corrupção na Petrobrás.

A corte recursal rejeitou, assim, o principal argumento da defesa de Lula e dos petistas que viam e ainda veem no processo uma ameaça ao Estado Democrático de Direito por, segundo eles, condenar o ex-presidente “sem provas” – o que caracterizaria o julgamento como político.

O placar de 3 a 0 no TRF-4 deveria ser suficiente para convencer os petistas a finalmente deixar de tratar o corrupto Lula como um mártir da democracia brasileira. Fosse seguido à risca o estatuto do PT, Lula teria de ser expulso, pois lá está claro que o partido não aceitará em seus quadros qualquer condenado “por crime infamante ou por práticas ilícitas”. Mas é evidente que isso não vai acontecer, assim como não aconteceu com outros capas pretas do PT igualmente condenados nos diversos escândalos em que o partido se meteu desde o instante em que chegou ao poder. Vejam-se os casos de Celso Daniel e Toninho do PT. A razão disso é simples: o discurso ético do PT, a exemplo de suas juras de amor à democracia, nunca foi um compromisso real – nem poderia ser, pois, afinal, lulopetismo e respeito aos pilares democráticos provaram-se desde sempre incompatíveis.

Assim, o PT se vê na contingência de, ao menos por algum tempo ainda, continuar a denunciar uma conspiração que jamais existiu. Contudo, se tiverem um mínimo de juízo e estiverem interessados em sua sobrevivência política, os petistas, passado o calor do momento, farão a necessária autocrítica – e, nesse caso, Lula deixará de ter qualquer influência no PT.

A esta altura, apenas os petistas mais fanáticos não estão constrangidos com o fato de que Lula, mesmo tendo exercido plenamente seu direito de defesa, agora é um corrupto condenado em duas instâncias. Já são quatro os juízes que consideram o ex-presidente um criminoso, e seria preciso grande esforço para acreditar que todos estejam mancomunados para condenar Lula e, assim, impedi-lo de disputar novamente a Presidência. Julgados eventuais embargos de declaração, Lula poderá conhecer de perto as agruras da cadeia comum, aquela para onde vão os criminosos.

À campanha sistemática de descrédito do Judiciário que os petistas deflagraram nos últimos tempos para defender seu chefão, os desembargadores responderam com cristalina objetividade em relação às provas. O relator do processo, João Pedro Gebran Neto, detalhou todas as evidências arroladas na sentença do juiz Sérgio Moro – aquela que os petistas diziam carecer de provas. Gebran Neto concluiu que há “culpabilidade extremamente elevada” de Lula. Para o revisor do processo, desembargador Leandro Paulsen, a responsabilidade de Lula é “inequívoca”, pois há “farta prova documental”. Para o desembargador Victor Luiz dos Santos Laus, há provas documentais “para quem quiser ver”.

O aspecto mais importante do julgamento de ontem, contudo, foi a clareza dos desembargadores ao vincular os crimes de Lula ao esquema de corrupção na Petrobrás. Embora tenham enfatizado que o julgamento ali dizia respeito apenas ao pagamento de propinas para o ex-presidente, como um apartamento no Guarujá, os magistrados deixaram registrado que isso aconteceu em conexão com o petrolão. Mais do que isso: os desembargadores consideraram que, sem Lula, não haveria petrolão. Foi ele quem garantiu o funcionamento da organização criminosa, segundo os magistrados. É isso o que importa nesse processo, e em razão disso a Turma decidiu aumentar a pena imposta a Lula, de 9 anos e 6 meses para 12 anos e 1 mês de cadeia.

“A corrupção cometida por um presidente torna vil o exercício da autoridade”, disse o desembargador Leandro Paulsen, com clareza meridiana. Lula, em sua passagem pela Presidência, conspurcou o mais elevado cargo político da República, a ele conferido pelo eleitor. Pagará por isso.”

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quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Os cães ladram e a caravana passa




“Não há mulás em Porto Alegre (há juízes)
  
POR LUIZ ALBERTO WEBER

BRASÍLIA — Marrento, voz de locutor de promoção de supermercado, quase sempre na contramão, o juiz da suprema corte americana Antonin Scalia proferiu em 2009 uma palestra em Brasília intitulada “Mullahs of the West: Judges as Moral Arbiters” (Mulás do Ocidente: Juízes como Árbitros Morais), que entrou em seu livro póstumo Scalia Speaks. Figura maior do conservadorismo dos Estados Unidos, Nino, como era conhecido, criticava juízes que julgavam inebriados pelos vapores da política. Dizia temer a “aristocracia” de uma magistratura porta-estandarte da moralidade ou imbuídos de fazer justiça com as próprias mãos. Seriam os tais mulás, mais líderes religiosos do que magistrados.

Não se tome um Scalia, profeta sofisticado do originalismo (um método de interpretação constitucional) por defensores oportunistas de réus da Lava-Jato. Muito politizado – estratégia exponencializada pela defesa — o julgamento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo TRF-4 atraiu os holofotes para os três desembargadores que nesta tarde condenaram o petista. Após sentenciar Lula, o desembargador João Pedro Gebran Neto, que aumentou a pena do ex-presidente para 12 anos e 1 mês, desabafou: “Nenhum juiz condena ninguém por ódio”.

Mesmo lastreado por um voto de 430 páginas (lidas parcialmente), que demorou três horas para ser proferido e que enfrentou e ponderou todas as provas e indícios levados aos autos, Gebran foi atacado. “O voto do Relator é resultado do compadrio, do entorpecimento do power point e do preconceito político. É um voto militante”, escreveu nas redes sociais a presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann.

Antes disso, o procurador da República, Maurício Gotardo Gerum, na sustentação oral, apontara o real mulá do caso. “Às favas com o que há no processo, mais fácil dizer que não há provas para a condenação, que o julgamento é político, que não é possível a condenação de um inocente. E essas frases foram sendo repetidas como um mantra, a ponto de se transformar em conceitos dogmáticos para aqueles que veem no ex-presidente Lula o redentor de um país que estava dando certo, segundo os mais diversos interesses”.

O imaginário de todo sistema judicial civilizado é sintetizado pelo aforismo “há juízes em Berlim”. Nada mais significa do que a capacidade de resistência do Poder Judiciário ao arbítrio e à força dos governantes. O julgamento do TRF-4, com desembargadores aferrados ao processo, sem estrelismos e discursos de efeitos, mostrou que há juízes em Porto Alegre (não mulás!).”

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AGD comenta:

Foi tanta a alegria pelos 3 x 0 de ontem que nem estou muito propenso a comentar o texto acima sobre atitude do TRF-4. Estava até preferindo falar sobre os outros 3 x 0 do Náutico sobre o Sport, mas, certamente, não teria leitores.

Foi realmente um julgamento exemplar, e mostrou ao mundo que ainda temos juízes, apesar de alguns mulás. Será muito difícil, de agora em diante, o Lula se reerguer politicamente. Chega dá pena!

No entanto, o que dá pena mesmo são os petistas, sem saber o que dizer, vociferando contra o resultado. Seria trágico se não fosse cômico. Mas, alguém esperava outra coisa do PT?


Se fosse diferente a história do partido seria outra, não com base na mentira, mas na vontade de servir ao povo brasileiro. Eles vão continuar embora saibam que os cães ladram e a caravana passa.

quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

SEU GARAPA!




Por José Antonio Taveira Belo / Zetinho


Pórfiro era um homem de grandes posses na cidade de Maracangalha, dono de uma grande fazenda onde passava tempo indo somente a cidade nos dias de sábado e domingo. A casa grande, rodeada de um terraço, com janelas pintadas de branco, alguns bancos corrediços e redes pendurada para o descanso a tardezinha. Gostava deste pequeno, quando o seu pai era avicultor, ele se apaixonou pelas abelhas e criava em oito cortiços onde as abelhas deposita o mel. Deitado numa rede quadriculada de azul e branca observava com alegria a chegava e a saída das abelhas. Era um vai e vem. O zum-zum era melodia para ouvidos. Era um homem calmo e prestativo, porém energético.  Tudo dele era doce, até agua levava açúcar para beber, levando o apelido Seu Garapa.. O homem era respeitado na comunidade, sua palavra era uma ordem. Muitas pessoas não gostavam daquela atitude. Sempre estava ele com a razão. O prefeito e vereadores sempre consultavam quando necessitava de alguma opinião. Apesar de ser desta forma Seu Porfirio ajudava aos pobres, aos necessitados e defendia aqueles que eram insultados e maltratados. Mas, em toda cidadezinha tem alguém que não gostam de receber ordem. Seu Liberato era um deles. Não gostava do jeito que o Seu Porfirio se dirigia a ele e aos outros. Queria mandar e ele, um homem do comercio não aceitava aquela arrogância. Esta atitude causava mal estar ente alguns daqueles homens que residam na cidade. O mel colhido na fazenda era vendido nos arredores. As garrafas de vidro branquinho recebia o mel dourado, que era tampado com uma rolha de cortiça. Os favos do mel era guardado em uma vasilha de alumínio, para pessoas que encomendava com antecipação. Certo dia, seu Garapa estava sentado na venda de Seu Eurico, um português que se engraçou pela cidade e ali ficou. Montou uma bodega onde se vendia de tudo na cidade. Sentado no seu lugar de costume, fumando o seu cigarrinho da palha, apesar de ter dinheiro para comprar um maço de cigarros Continental, porém não gostava e sim deste de rolo de fumo comprado na barraca do Seu Euclides na feira, A fumaça e o cheiro incomodava a aqueles que ali estavam, mas ninguém ousava falar por respeito. Tomava vinho de jurubeba e com o tempo ficava alegre, prestativo e contando causos que muitas das vezes era ignorado por aqueles que ouviam.. Os sábados eram dia de feira e todos os agricultores e moradores iam comprar os seus mantimentos da semana e no domingo dia de descanso, eram de prosa. Pórfiro muitas das vezes juntavam moradores ilustres em sua fazendo para saborear um “pirão” ou uma “rabada” ao longo do dia. A festa era uma beleza sem confusão apenas conversando sobre o destino da cidade, principalmente, a política. Não gostava de falar de religião, todos tinham sua preferência, pois Deus é de todos e não de uma pequena parcela da população.  Seu Liberato e começou a cochichar com outros fregueses, sempre olhando para ele. Não gostou e já um pouco embriagado se dirigiu para outra ponta do balcão onde se encontrava Liberato. Outro começou a rir e ele perguntava se estava vendo algum palhaço. Vejo o Senhor! Exclamou em alta voz e todos ouviram e ficaram em silencio. Seu Porfirio nunca tinha sido desafiado ficou corado que um camarão. Repita! Repita! Disse ele enfiando o dedo riste em seu rosto. Encolheu-se seu Liberato e encostou-se na parede e quando ia colocar a mão no bolso foi golpeado com três facada afiada que se encontrava pregada num maço de charques no balcão. A correria foi grande. Caído no chão seu Liberato ia fechado os olhos enquanto o sangue saía dos ferimentos manchando a sua camisa azul e a sua calça branca. Seu Pórfiro correu entrando em uma casa do seu amigo Pedro indo pela porta da cozinha e ganhando a rua dirigindo para a sua fazenda. A notícia se espalhou por toda a cidade. Muitos foram até a bodega para ver já sem vida seu Liberato. O delegado se deslocou até a fazenda, mas não encontrou o seu Porfirio. Três dias depois seu Pórfiro foi à delegacia, se apresentou ao delegado Simão e contou a sua estória indicando testemunha que matou em legitima defesa depois de ser ofendido e com ameaça por parte da vítima quando colocou a mão na cintura. Ficou em liberdade e não mais foi à cidade ficando na fazenda até morrer depois de três anos do acontecido.  

terça-feira, 23 de janeiro de 2018

Está chegando a hora...




“A batalha de Porto Alegre
        
Por Denis Lerrer Rosenfield

Longínqua é a época em que o PT se vestia de defensor de outra forma de participação política, procurando seduzir não somente os incautos do Brasil, mas também os do mundo. A soberba já naquele então desconhecia limites, mas apresentava-se com as sandálias da humildade.

Era o mundo da dita “democracia participativa” e da mensagem, no Fórum Social Mundial, de que um “outro mundo era possível”. Porto Alegre tornou-se o símbolo que irradiava para todo o País, e para além dele, transmitindo a imagem de uma grande solidariedade, de uma paz que o partido encarnaria.

Para todo observador atento, contudo, a farsa era visível. Porém foi eficaz: levou o partido a conquistar três vezes a Presidência da República. Mas deixando um rastro de destruição, com queda acentuada do PIB, inflação acima de dois dígitos, mais de 12 milhões de desempregados e corrupção generalizada. Dirigentes partidários foram condenados e presos a partir do “mensalão” e do “petrolão”. Antes, o partido tinha um currículo baseado na ética na política; hoje, uma folha corrida.

No dito orçamento participativo das administrações petistas de Porto Alegre já se apresentavam o engodo, a enganação e, sobretudo, o desrespeito à democracia representativa, tão ao gosto dos petistas atuais. Reuniões de 500 pessoas em bairros da cidade, nas quais um terço dos participantes era constituído por militantes, decidiam por regiões inteiras de mais de 150 mil ou mesmo 200 mil habitantes. Impunham uma representação inexistente, numa espécie de autodelegação de poder. O partido tudo instrumentava, arvorando-se em detentor do bem, o bem partidário confundido com o público.

Num Fórum Social Mundial, os narcoterroristas das Farc foram recepcionados no Palácio Piratini, sob o governo petista de Olívio Dutra. Lá, numa das sacadas do prédio, em outra ocasião, discursou, com sua arenga esquerdizante, Hugo Chávez, líder do processo que está levando a Venezuela a um verdadeiro banho de sangue, com a miséria e a desnutrição vicejando como uma praga – a praga, na verdade, do socialismo do século 21.

Eis o “outro mundo possível”, louvado pelos atuais dirigentes do PT. A vantagem hoje é a de que a máscara caiu. O partido, pelo menos, tem o benefício da coerência.

A máscara caindo mostra com mais nitidez que a democracia representativa nada vale e que a violência é o seu significante. A mensagem de paz tornou-se mensagem de sangue. A presidente do partido não hesitou em afirmar que a prisão de Lula levaria a “prender” e a “matar gente”. A tentativa de conserto posterior nada mais foi do que um arremedo.

Conta o fato de ter ela expressado uma longa tradição marxista-leninista de utilização da violência, da morte, acompanhada, segundo essa mesma tradição, de menosprezo pelas instituições democráticas e representativas, na ocorrência atual, sob a forma de desrespeito aos tribunais. A democracia, para eles, só tem valor quando os favorece. Desfavorecendo-os, deve ser liminarmente deixada de lado. Mesmo que seja sob a forma jurídica de pedidos de liminares, para que a luta continue.

Não sem razão, contudo, o PT e seus ditos movimentos sociais consideram este dia 24 como decisivo, o de seu julgamento. Para eles, tal confronto se exibe como uma espécie de luta de vida e morte. Nela, ao jogar-se a candidatura de Lula à Presidência da República e caindo, em sua condenação, o ex-presidente na Lei da Ficha Lima, está em questão a “vida” do candidato e do seu partido. Este, aliás, escolheu identificar-se completamente com seu demiurgo, selando com ele o seu próprio destino. O resultado é uma batalha encarniçada, o seu desenlace constituindo-se numa questão propriamente existencial.

A imagem da “morte”, segundo a qual os militantes fariam sacrifício por seu líder, por não suportarem a prisão dele, nada mais faz do que revelar o profundo divórcio entre o partido e a democracia representativa, com as leis e suas instituições republicanas. Pretendem sujar a Lei da Ficha Limpa com o sangue de seus seguidores.

Assim foi na tradição leninista: os líderes mandavam os seguidores para o combate e a morte, permanecendo eles vivos; e depois, uma vez conquistado o poder, usufruindo suas benesses. O sangue do ataque ao Palácio de Inverno e a vitória da revolução bolchevique levaram aos privilégios da Nomenklatura, dominando com terror um povo que veio a ser assim subjugado.

Segundo essa mesma lógica “política”, sob a égide da violência, Lula e os seus dividem apoiadores e críticos nomeando os primeiros como “amigos” e os segundos, “inimigos”. Sua versão coloquial é a luta do “nós” contra “eles”, dos “bons” contra os “maus”, dos “virtuosos” do socialismo contra os “viciados” pelo capitalismo. Ora, tal distinção, elaborada por um teórico do nazismo, Carl Schmitt, é retomada por esse setor majoritário da esquerda, expondo uma faceta propriamente totalitária. Lá também a morte, o sangue e a violência eram os seus significantes.

O desfecho do julgamento do dia 24, estruturante da narrativa petista, será vital para o destino do partido. Em caso de condenação, o que é o mais provável, o partido continuará correndo contra o tempo, numa corrida desenfreada por meio de recursos jurídicos, procurando esgotar os meios à sua disposição do Estado Democrático de Direito.

Assim fazendo, tem como objetivo produzir uma instabilidade institucional que venha a propiciar-lhe a reconquista do poder, produzindo um fato consumado numa eventual eleição sub judice. Seria consumar a morte da democracia representativa, solapando seus próprios fundamentos.

Resta saber se o partido conseguirá, para a concretização de seu projeto, realizar grandes manifestações de rua. Se lograr, a democracia representativa correrá sério risco. Se malograr, o partido estará fadado a divorciar-se ainda mais da sociedade. A narrativa soçobraria na falta de eco.”

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AGD comenta:

Se o Brasil conseguiu alguma coisa de bom, depois de ter sido descoberto, isto foi, à duras penas e com alguns percalços, ter como regime de governo, nos tempos modernos uma Democracia Representativa.

Mesmo com algumas iniciativas na antiguidade e alguns engodos modernamente, não sei nem se poderia haver outro tipo de Democracia, senão aquela, na qual somos representados por quem elegemos. A Democracia Direta, em suas tentativas, nunca deu resultados, a não ser com um partido único que  fingia representar o povo.

E, vejo no texto acima, além dos fatos lidos alhures, que o PT sempre quis destruir o que nos resta de Democracia e nos levando para um regime totalitário, como na Venezuela, e até como em Cuba, antes deste já se passar para os americanos, como brevemente o fará.

E o que sei é que, hoje, o PT é o Lula e Lula é o PT. Um não viverá sem o outro. E por isso o texto anterior fala na “batalha de Porto Alegre”, que é o julgamento de um recurso de Lula que pede, por todos os santos, para não ir para a cadeia.


Eu só posso dizer que está chegando a hora, nesta quarta-feira, de o PT prestar contas ao Brasil de tudo que ele fez de ruim ao país e à sua, ainda incipiente, Democracia, com a confirmação da condenação de Lula.

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Os valores na Política





“Pior para os fatos, pior para a política


Por Eugênio Bucci


Fatos não pensam. Logo, não podem ser tomados como critério definitivo da verdade. Na conduta humana, ao lado do juízo de fato (da constatação empírica e racional dos dados verificados na realidade), há de ter lugar também o juízo de valor (que envolve interpretações e escolhas inspiradas por noções éticas), seja na vida prática de todo dia, seja na política.

Nada mais óbvio, certo? Sim, nada mais óbvio. Não obstante, para que fique mais nítida a adversidade presente, o óbvio vai cumprir aqui uma função de esclarecimento. Sigamos, então, um pouco mais com o nosso óbvio.

Os que proclamam pautar suas decisões nos fatos, apenas nos fatos, fazendo parecer que suas conclusões são decorrências matemáticas, necessárias e inevitáveis de uma leitura objetiva dos eventos da natureza e da vida social, flertam com uma forma rebuscada de fraude, mesmo que não tenham a intenção de trair a confiança do interlocutor. As decisões que podemos tomar no plano da consciência – por mais frágil e instável que seja a membrana da consciência a revestir as deliberações de que somos capazes – implicam obrigatoriamente aspirações, desejos, identificações inconscientes, crenças e princípios morais dos quais mal nos damos conta. Em suma, os caminhos que cada um elege para si e para a comunidade encerram compromissos que, além da constatação dos fatos, guardam em si a pretensão de interferir na sucessão desses mesmos fatos. O óbvio, nada mais que o óbvio: a ambição (ou direito legítimo) de alterar a ordem dos fatos (ou de mudar o mundo) tem, portanto, parte com o imponderável, com a incerteza, de tal forma que quem escolhe aposta. Se os fatos não pensam, precisam do sujeito que pense para sobre eles agir.

Ponto. Fim das obviedades. Prossigamos agora com a adversidade.

Como os observadores mais atentos vêm apontando, vivemos um agravamento agudo da desvinculação entre o discurso político (incluído aí o agir) e o domínio dos fatos. Paixões como o ódio, a inveja, o ressentimento (e suas manifestações mais superficiais, como a xenofobia, o sexismo, o preconceito de classe, o racismo) subiram um ou dois degraus na hierarquia das configurações partidárias e no ordenamento do poder. A idolatria e a fúria tomam espaços que até outro dia contavam com a presença de alguma forma de discernimento crítico, ainda que rudimentar, de tal forma que comportamentos políticos assumem o aspecto de fervor religioso.

É a era do “pós-fato”, caracterizada pelo recrudescimento dos chamados “populismos”. Há exemplos profusos à esquerda e à direita: chavismos, trumpismos, bolsomitos, etc. Não é na coloração ideológica que essas novas e múltiplas formas de populismo se distinguem. O que as distingue é o abandono deliberado da modestíssima verdade factual como lastro da retórica. O populismo contemporâneo constrói-se em ataque permanente contra o domínio dos fatos: não se trata apenas de substituir o juízo de fato pelas crenças abiloladas, mas de substituir a lógica interna da política pela lógica interna das seitas fanáticas, mantendo mais ou menos intacto o invólucro de aparência política.

Não é por acaso que os papéis de igrejas e partidos se embaralham em tantos níveis no Brasil. Não é por acaso que o princípio democrático da separação entre Igreja e Estado se tenha perdido numa esquina da nossa História recente. Temos hoje no País líderes religiosos que encabeçam projetos explícitos de poder, assim como temos líderes políticos que se acreditam predestinados e ungidos por forças divinas. Durante muito tempo os analistas tratavam de encontrar explicações políticas para fenômenos religiosos. Agora, os mesmos analistas recorrem à anatomia das religiões – que não têm base nos fatos, mas na fé – em busca de analogias para o modo de proceder de siglas partidárias.

Quando uma dirigente partidária afirma que “para prender Lula (a Justiça) vai ter que matar muita gente”, deixa ver as fibras do fanatismo. De outro lado, a diferença de tratamento judicial que mereceram Dilma Rousseff e Michel Temer desvela um aparente descompromisso da política e da Justiça com o domínio dos fatos: Dilma foi destituída em função de uma acusação que transitava do barroquismo jurídico às abstrações mais intangíveis, condenada por um crime de responsabilidade que era difícil de entender e mais difícil ainda de explicar; quanto a Temer, flagrado numa gravação para lá de comprometedora, com ex-ministros e ministros que fazem fila para se sentar no banco dos réus, voa, incólume como um anjo, acima do alcance do Judiciário, sem que ninguém se preocupe em entender e muito menos em explicar o que quer que seja. A sensação de que os tribunais se permitem golfadas de partidarismo se adensa, enquanto o cenário político se inflama.

Há outros sinais de cisão entre a política e os fatos. O furor com que os seguidores fiéis do ex-presidente Lula se apressam a dizer que não há provas cabais contra ele no caso do triplex – e, em se tratando de um processo ainda não transitado em julgado, não está descartada a hipótese de que tenham razão – obscurece o fato (outra vez o fato) de que as evidências políticas e práticas de que ele usufruiu favores de empreiteiras para custear seu conforto pessoal (no famigerado sítio de Atibaia, por exemplo) constituem um embaraço ético de todo tamanho. Por que ninguém entre os seguidores fiéis se incomoda com isso? Por que seguem seguidores fiéis mesmo depois de tantos e tão graves sinais expostos de conflitos de interesse? Será que, para os seguidores, ainda que venha a se provar juridicamente inocente, Lula ainda é politicamente impoluto?

Enquanto uns e outros, de um lado e de outro, dissolvem o nexo entre política e fato, a regra do jogo democrático perde consistência, os extremismos se aprofundam e o debate público perde fertilidade.

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AGD comenta:

Quando terminei a leitura do texto acima, fiquei pensando se deveria comentá-lo ou não. Que ele tem muitas obviedades, é óbvio. Quem ele não é simplório, também é óbvio. O que me deixa quase sem assunto, se não aceitasse isto.

E é aceitando que digo ser o PT e sua ideologia maluca de fazer deste país uma grande Cuba, e agora, mais uma grande Venezuela, pois Cuba já está quase se tornando capitalista, que deu origem a esta bagunça recente. E a luta continua “companheiros”, como continua a dizer o Lula, a Dilma e Gleisi Hoffmann.

Esta última deveria já está presa se a Justiça levasse em conta todos os fatos. E agora mais um de terrível importância: Incentivo a uma quase guerra civil entre os ignorantes dos fatos e os que querem justiça.

Ela simplesmente disse que “vai ter que matar gente”. Pode isto, Arnaldo?

Todos concordam que a política tem suas nuances que envolvem valores, e muitos valores, além dos fatos. Mas, como dizia o Einstein, o físico relativista: “Se os fatos não se encaixam na teoria, modifique os fatos.” Substitua-se teoria por “valores” e teremos o quadro correto do Brasil de hoje.


Eu, usando meus valores e os fatos, acho que o Lula, já condenado e com justiça, continuará condenado e será preso. Se isto não acontecer, que se modifiquem os fatos, pois os meus valores estão corretos.

sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Mantendo a virgindade




“Mantendo a virgindade

Por Fernão Lara Mesquita

O Secretário da Previdência Social, Marcelo Caetano disse ao Valor do fim de semana que são 29,8 milhões os aposentados do INSS mas que se a reforma for aprovada nos termos a que está reduzida apenas 9,5% – entre eles o grosso daquela fatia do funcionalismo federal que segue o padrão salarial de Wall Street – “teriam a sua renda afetada em mais de 1%”. A regra de transição é escandalosamente lenta para o tamanho do incêndio que se propõe amainar. A idade mínima de 65 anos para homens e 62 para mulheres só começaria a se alterar a partir de 2020 e só estaria valendo plenamente em 2038. Quase nenhum dos privilegiados vivos (posto que só a “nobreza” que tem 100% dos proventos da ativa realmente se aposenta no limite de idade de hoje) seria afetado. E, por consequência, nenhum miserável também. Permaneceria praticamente intacto do começo ao fim desse caminho, portanto, o vasto favelão nacional cuja raiz é diretamente irrigada por essa sangria desatada.

Mas esse pormenor não diminui um milímetro a intransigência da nossa privilegiatura. “Sacrifício” e “contribuição” para o esforço de salvação nacional são palavras que não constam dos dicionários do Planalto Central mas esses 1% num prazo de 20 anos não se enquadram nessas categorias. A questão, aqui, não é de perda de qualidade de vida nem muito menos de sacrifício. É de perda de virgindade. É a criação do precedente que os aterroriza. Ceder a migalha que for da montanha de “direitos adquiridos” empilhados em cima da qual se refestela a fera pode expor o tigre de papel que devora o Brasil como o que é.

Vai que o país acorda!

De todos os aposentados do Brasil, lembra o secretário, 60% recebem 1 salário mínimo. Os “direitos” dessa ralé e de todo o resto da sub-ralé que, multiplicada por 29,8 milhões de vezes custa o que custam as 980 mil “excelências” para a previdência, podem ser alterados por lei ordinária ou até por Medida Provisória. A presente reforma só tem de passar por Projeto de Emenda Constitucional (PEC), que requer quórum especial, para poder incluir esse milhãozinho de funcionários cujos direitos previdenciários estão inscritos nessa constituição que só por exclusão é a “dos Miseráveis” deste país onde, em pleno Terceiro Milênio nada, das prisões para cima, é igual para nobres e para plebeus.

Mesmo assim, fato é fato, até o providencial evento estrelado pela dupla Janot & Joesley da véspera da votação de 18 de maio de 2017, a reforma da previdência, por todas as contagens, ia passar no Congresso Nacional. E isso depois que uma maioria de deputados e senadores, um por um declinando seu nome e suas razões diante das câmeras da rede de televisão que os ameaçava de fuzilamento sumário, votou a favor da reforma trabalhista no primeiro horário nobre sem novela de que ha memória neste país. E o mesmo estava marcado para acontecer com a previdenciária. É tão negra a alma que se requer para continuar indiferente à chuva de balas perdidas e balas acertadas que implica não abrir mão desse 1% que já nem no Congresso Nacional, onde todos fazem jus aos privilégios visados, é possível encontrá-las em numero suficiente.

Junto com o outro poder eleito, o Legislativo é sempre quem acaba recebendo toda a carga da cobrança pela desgraça nacional. Mas relevadas as figuras teratológicas que lhe fazem a fama e considerada apenas e tão somente a sequência dos acontecimentos desde a aprovação no voto da cláusula de barreira (1995) depois também derrubada pelo STF(2006), não se sustenta a acusação de que é ele quem barra as reformas sem as quais o Brasil não sai dessa sua anacrônica idade média. Sistematicamente, tem havido quem faça e quem desfaça para impedir todo e qualquer avanço institucional. E eles estão sempre nos mesmos lugares.

O fato presente em todas as mentes mas que os brasileiros dificilmente trazem à boca ainda é que nós estamos em plena vigência de uma forma mal camuflada do “excesso de democracia” bolivariano onde a vontade expressa do povo pode ser anulada e cassados os seus representantes eleitos ao arrepio da lei ao bel-prazer de meia dúzia de tiranetes. A terceirização das culpas para as próprias vítimas, o povo que “não sabe votar” basicamente porque não permitem que mudem as regras que o obrigam a votar como vota, só se torna possível pelo viés sistemático com que trata esses acontecimentos a parcela das mídias de massa mais claramente embarcada nesse jogo de interesses inconfessáveis.

Alimentar qualquer ilusão a esta altura é suicídio. A festejada “recuperação da economia” não passa, por enquanto, de especulação em cima de uma expectativa de mudança cuja probabilidade real foi mais exatamente medida pela desclassificação do Brasil pela Standard & Poor’s que pela fervura da bolsa de valores, de resto doentia nesse paroxismo cheirando a Baile da Ilha Fiscal em que anda. Cinco estados não conseguiram pagar o 13.º salário de 2017 e a maioria dos demais está na ponta da prancha para o mergulho. A pré-estreia do que vem vindo foi dada pelas polícias sem soldo deixando o crime rolar. Está caindo a última barreira antes do nada enquanto os “camisas pardas” do PT e profundezas são abertamente atiçados contra a parte sã do poder judiciário que, de Curitiba para cima, se tem mantido, por assim dizer, em claro “desafio atitudinal” à outra.

O Brasil só se começará a curar quando armar os eleitores dos instrumentos necessários para fazer com que finalmente se imponha a regra da maioria. A receita é conhecida: despartidarização das eleições municipais e eleições primárias para a remoção dos velhos caciques políticos, iniciativa para a apropriação da pauta nacional por quem tem o direito legítimo de defini-la, recall e referendo para impor a vontade dos eleitores aos seus representantes eleitos. Mas para que se torne possível sonhar com esse futuro é preciso antes impor a lei a quem a desafia com a força que se mostrar necessária e restabelecer os limites dos três poderes, sem o que naufragamos já.”

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AGD comenta:


Sem comentários

quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

A Constituição cidadã e o desperdício





“A ineficiência da vinculação
         
O Estado de S. Paulo

O legislador brasileiro tem recorrido, nas últimas décadas, com desastrosa frequência, à prática de vincular o destino de um porcentual dos recursos públicos a um uso específico. Por exemplo, a Emenda Constitucional 86/2015 determinou que a União deve aplicar ao menos 15% de sua receita corrente líquida anual em ações e serviços públicos de saúde.

No caso da área de educação, o limite mínimo é ainda maior. O art. 212 da Constituição diz que "a União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino".

À primeira vista, esse tipo de regra parece oportuno, já que significaria dar prioridade orçamentária ao que realmente deve ser prioritário no País. Em 2014, por exemplo, foi comemorado por amplos setores da sociedade o Plano Nacional de Educação, que destina, até 2024, ao menos 10% do Produto Interno Bruto (PIB) para a educação pública. Seria o passo definitivo para que o Brasil tivesse uma educação pública de qualidade.

O problema, no entanto, é que as coisas não são tão simples como parecem. Não basta destinar mais dinheiro para que um hospital público funcione melhor ou para que alunos aprendam mais Matemática e Português. É, aliás, mais provável que ocorra o oposto. É o que verificou o Banco Mundial no caso da educação pública brasileira, num recente estudo sobre a qualidade dos gastos públicos no País. "A vinculação constitucional dos gastos em educação a 25% das receitas dos municípios também contribui para a ineficiência dos gastos. Municípios mais ricos, com altas taxas de receita corrente líquida por aluno, tendem a ser bem menos eficientes que municípios mais pobres", disse o estudo.

A causa para tal ineficiência não é difícil de ser encontrada. "É provável que, para cumprir as regras constitucionais, muitos municípios ricos sejam obrigados a gastar em itens que não necessariamente aumentam o aprendizado." Ou seja, quando determinados recursos são vinculados a um determinado uso, como faz frequentemente o legislador brasileiro, há uma ruptura entre destinação e necessidade. Mesmo que não sejam necessários, os recursos serão destinados a uma área por força de regra legal.

A vinculação de receitas tem ainda outro grave efeito sobre a eficiência. Algumas áreas não precisarão realizar bons projetos para que recebam recursos. Ou seja, além do risco de o dinheiro ir para locais que não precisam tanto, dissemina-se, na esfera pública, a cultura de que não é preciso ter um bom projeto para receber recursos. A vinculação de receita prejudica, assim, a qualidade da aplicação dos recursos públicos também naquelas áreas em que, a princípio, poderia haver necessidade.

Também não se pode esquecer que uma distribuição de recursos públicos que não esteja baseada nas necessidades reais é sempre um estímulo à corrupção. Por pior que seja o déficit fiscal do País, com esse sistema de vinculação de receitas, haverá áreas com dinheiro sobrando.

O Banco Mundial aponta ainda que os efeitos da vinculação de receitas na área de educação tendem a piorar, em razão da transição demográfica pela qual passa o País, com a diminuição do número de alunos. "Para cumprir a lei, muitos municípios serão obrigados a gastar mais e mais por aluno, mesmo quando a receita se mantenha constante. (...) A consequência é um aumento ainda maior da ineficiência."

Como é lógico, esses problemas não estão restritos à área de educação, dado que as regras de vinculação engessam quase 80% do dinheiro arrecadado pelo governo. Com urgência, é preciso tornar o Orçamento mais flexível. Seja por força de equilíbrio fiscal, para que o governo tenha capacidade de administrar de fato as despesas, seja para melhorar a eficiência pública. É injusto e irracional gastar mal quando se tem tão pouco e as necessidades são tão grandes.”

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AGD comenta:

Ontem, neste mesmo espaço, comentei sobre o excesso de Estado na resolução do problema da fome. Hoje, encontro este editorial do Estadão como uma espécie de corroboração ao que escrevi, agora quanto aos gastos obrigatórios em alguns setores, que engessam as despesas públicas.

No caso do texto se fala na vinculação de algumas despesas que levam fatalmente ao desperdício. Ou seja, nossa “Constituição cidadã”, talvez, colabore mais para agravamento dos problemas do que sua solução.

Já se sabe, há muito tempo, que a intervenção legislativa, quando desprovida de senso de realidade, é um mal e não um bem em todos os setores. Não adianta dizer que todos deverão comer meio quilo de caviar por dia se não há caviar suficiente. No final, alguns terminarão sem a iguaria, fatalmente.

Mas, não é preciso falar em caviar. Basta lembrar do programa, tão badalado no início do governo Lula: o Fome Zero, que como vimos no texto de ontem, está longe de chegar ao “zero”, pois nunca foi implementado, e, se o tivesse sido não faria diferença, como aconteceu com o Bolsa Família.


Voltamos ao ponto que o problema do Brasil não é a falta de ações governamentais na resolução dos problemas e sim seu excesso, que gera as distorções acima exemplificadas. A vinculação das despesas em Educação, Saúde e Segurança, deve estar na cabeça dos indivíduos e não na Constituição.

quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

A "geografia da fome" e o Lula




“Geografia da fome
        
Por Almir Pazzianotto Pinto

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou em 15/12 a pesquisa Síntese dos Indicadores Sociais 2017, documento arrasador, conquanto não surpreendente ou inesperado. Mostra a fome no Brasil. Confirma que o País é pobre – é rico apenas na visão alienada de bilionários, corruptos e privilegiados.

Graciliano Ramos descreveu-a em Vidas Secas. Euclides da Cunha dela falou em Os Sertões. Ninguém, entretanto, o fez com mais profundidade do que Josué de Castro (5/9/1908-24/9/1973), o médico pernambucano reconhecido mundialmente, autor de vasta bibliografia sobre a matéria, em que se projetam Geopolítica da Fome, Geografia da Fome, Sete Palmos de Terra e um Caixão. Duas vezes deputado federal, embaixador do Brasil na ONU, presidente do Conselho Executivo da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), professor honorário de universidades estrangeiras, Josué de Castro foi vítima do alto comando revolucionário em abril de 1964, quando teve cassados os seus direitos políticos. Injustiçado, passou a residir em Paris, onde faleceu.

Em Geopolítica da Fome Josué de Castro observa que “a fome constitui um fenômeno de extrema variabilidade. No emaranhado e policrômico desenho da fome universal, podemos divisar surpreendentes matizes; desde os mais negros e impressionantes, da fome total, da completa inanição, transformando suas vítimas em verdadeiros espectros vivos, até os tipos mais discretos das fomes ocultas ou específicas, atuando sorrateiramente, quase sem sinais aparentes” (página 79).

O menino faminto de 8 anos de idade que desmaiou em escola pública de Brasília – fato minimizado pelo governador Rodrigo Rollemberg – é apenas um entre milhões de casos semelhantes. São crianças nascidas de famílias esquecidas, às quais falta o mínimo necessário para a subsistência. Se sobreviverem, crescerão subnutridas e analfabetas, até alcançarem a maturidade, carentes de recursos para a difícil disputa de espaço no exigente mercado de trabalho.

O cenário desnudado pela Síntese dos Indicadores Sociais 2017 revela que “mais de 25 milhões de brasileiros, o equivalente a 25,4% da população, vivem na linha de pobreza e possuem renda familiar equivalente a R$ 387,07 – ou US$ 5,5 por dia, valor adotado pelo Banco Mundial para definir se uma pessoa é pobre”. Prossegue a notícia: “A situação é ainda mais grave se levadas em conta as estatísticas do IBGE envolvendo crianças de 0 a 14 anos de idade. No país, 42% das crianças se enquadram nestas condições e sobrevivem com US$ 5,5 por dia. As pesquisas de indicadores sociais revelam uma realidade: o Brasil é um país profundamente desigual e a desigualdade gritante se dá em todos os níveis”.

Informações publicadas no Relatório de Atividades da Associação Brasileira do Agronegócio relativo a 2016 revelam que em 2015 foram colhidas 97.043.705 toneladas de soja, 12.312.315 de arroz, 85.707.796 de milho, 3.107.911 de feijão, 22.756.807 de mandioca, 5.425.856 de trigo, 351.453 de amendoim; e que a produção de carne bovina foi da ordem de 7.613.163.153 quilos, 3.354.699.150 a de suínos, 12.990.348.875 a de frangos, de 24 bilhões de litros a de leite e de quase 3 bilhões de dúzias a de ovos. A fome não decorre da falta de alimentos, mas da injusta distribuição de rendas, da falência da educação, do colapso do ensino público, da ausência de trabalho para 13 milhões de desempregados e outros tantos subocupados em tarefas ocasionais ou intermitentes.

Geografia da Fome é de 1948 e Geopolítica da Fome, de 1951. Desde então duas medidas foram tomadas: a instituição do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), pela Lei n.º 6.321/1976; e do Bolsa Família, mediante a Lei 10.836, de 2004. Ambos, contudo, não foram a fundo no combate à pobreza e à fome, como revelam os indicadores do IBGE.

É elevado o número de programas de televisão dedicados à alta culinária. Renomados cozinheiros esmeram-se na preparação de pratos fora do alcance da maioria da população, constituída por pobres, cujos filhos, subnutridos e doentes, tomam água açucarada pela manhã e comem um prato de angu no almoço.

A fome registrada por Euclides da Cunha em Os Sertões, mapeada e denunciada por Josué de Castro, permaneceu ignorada por sucessivos governos do PSDB, PT e (P)MDB, para me limitar aos últimos 30 anos. O dinheiro que vai para o ralo do desperdício e as malas da corrupção falta para enfrentar a miséria.

O trabalho infantil está relacionado ao nível de pobreza. Registra o IBGE: “Os dados do estudo indicam que, quanto menos escolaridade, mais cedo o jovem ingressa no mercado de trabalho. A pesquisa revela que 39,9% dos trabalhadores ingressaram no mercado de trabalho com até 14 anos”. Não surpreende a constatação de que a fome é mais grave nas Regiões Norte e Nordeste. Sempre foi assim. No mapa alimentar do Brasil, Josué de Castro coloca a Região Amazônica e o litoral nordestino como áreas de fome endêmica, o agreste nordestino como área de epidemias de fome, o Centro-Oeste, o Sudeste e o Sul como regiões de subnutrição.

A situação pouco se alterou. Segundo o IBGE, quando se avaliam “os níveis de pobreza no país por estados e capitais ganham destaque, sob o ponto de vista negativo, as Regiões Norte e Nordeste, com os maiores valores sendo observados no Maranhão (54,4% da população), Amazonas (49,2%) e Alagoas (47,4%)”.

Em 2018 o salário mínimo será de R$ 954. A Bolsa Família, de R$ 85. O Brasil ocupa a 7.ª posição no ranking do desenvolvimento econômico e o 79.º no Índice de Desenvolvimento Humano, abaixo do Chile, do Uruguai, da Argentina.

O que dizem os candidatos ao governo da República?”

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AGD comenta:

O texto acima me chamou atenção pelo título “Geogradia da Fome”, o mesmo de um livro  que eu li em minha adolescência. Lembrei através dele que este livro do Josué de Castro é da minha idade. Então eu poderia dizer que nasci ouvindo falar em fome, no Brasil.

Não me lembro de ter passado fome algum dia, a não ser por iniciativa própria nos regimes que nos aconselham para não ir para a obesidade. Mas, que ela existia, existia! Não era difícil de vê-la em algumas áreas de minha cidade, revelada através da mendicância.

Desde lá entraram e saíram governo de todos os matizes e que tiveram como objetivo acabar com ela, a fome, de uma forma aberta ou declarada. Pelo que li acima, foi tudo em vão. E o que vimos e vemos nos últimos tempos é a exploração da “fome” com fins políticos eleitorais.

Como Lula pode hoje se candidatar diante de tal quadro de fome no país, quando seu discurso político em campanhas anteriores foi o da “extinção da pobreza”? No mínimo, é muita cara de pau.

Eu sei e acredito que não deve ser só do governo soluções para os problemas da fome. Muito pelo contrário, o excesso de governo é que piora o problema, pela ganância dos governantes em roubarem os programas de ajuda, como estamos vendo no mensalão e com Operação Lava Jato.

O que o Brasil tem que fazer é enxugar o Estado, e deixar que os indivíduos cuidem de suas próprias vidas. E isto inclui a revolta pela existência da fome. Governo é para fazer coisas fundamentais como tentar orientar os indivíduos para os problemas que existem na Educação, Saúde, Segurança, e que Deus nos livre, nos defender de ataques externos. O resto, os indivíduos cuidarão e lutarão pela sua sobrevivência.

Mas, agora, nesta simples reflexão me volto para pergunta final do texto do Pazzionoto (que foi Ministro do Trabalho, no tempo em que aqueles que poderia assumir o posto não eram condenados pela Justiça do Trabalho como hoje): “O que dizem os candidatos ao governo da República?”.


Eu não sei o que todos dizem, mas, o único que não pode falar sobre combate à fome é o Lula, pois ele disse em alto e bom som que depois do seu governo não existia mais fome no Brasil. E se  tomarmos como fato que o Lula governa este país há 15 anos (contando com Dilma e Temer, seu vice), ele apenas mostrará a quem entende de que é um mentiroso contumaz.

terça-feira, 16 de janeiro de 2018

A quinta morte da democracia




“A quinta morte da democracia
        
 Por Bolívar Lamounier

Examinando as condições de atraso econômico e assustadora pobreza na virada do século 19 para o 20, Euclides da Cunha escreveu que o Brasil era um país “condenado à civilização”. Não tínhamos como ficar parados, nem como andar devagar. Precisávamos andar rápido e a direção só poderia ser a do progresso e da paciente edificação de instituições.

Adepto da filosofia positivista, à qual não faltava certo viés autoritário, Euclides não percebeu que uma parte do problema já estava encaminhada desde 1824. É mais que óbvio: insistir no absolutismo herdado do período colonial ou resvalar para o caudilhismo hispânico seria o caminho mais curto para recairmos na fragmentação e na desordem. O Estado constitucional e seu corolário, o sistema representativo de governo, amenizavam as tensões e delineavam um futuro – esse a que hoje denominamos democracia. Na última década daquele século, não fora o gênio de Rui Barbosa, é muito possível que tivéssemos sucumbido a um cenário extremamente destrutivo.

Num breve apanhado retrospectivo, podemos dizer que a morte da democracia representativa foi anunciada pelo menos cinco vezes desde o início da República, e apresso-me a esclarecer que os respectivos argumentos ocorreram em muitos países, inclusive no sul da Europa, e que não os subestimo: não é minha intenção caricaturá-los.

A primeira morte foi concebida como um caso de mortalidade infantil. Os mecanismos institucionais da democracia – eleições, partidos, parlamentos – não se conseguiriam “desprender” do poder privado dos fazendeiros, chefes e mestres da política de campanário. A proveniência desse argumento era basicamente protofascista, mas o próprio Sérgio Buarque de Holanda o situou entre as principais “raízes do Brasil”. Para os povos latinos, ele escreveu, é difícil imaginar normas gerais pairando sobre nossa cabeça. A hidra do passado colonial deglutiria as nascentes democracias tão facilmente como uma sucuri deglute um cachorrinho poodle.

O segundo atestado de óbito veio nos anos 30, agora com uma nítida declaração de origem fascista. A democracia liberal, dizia-se, era plausível enquanto se restringia a rusgas entre partidos – que, afinal, não passavam de pequenos grupos de notáveis provincianos – para decidir quem nomeava o agente local dos correios. Naquela quadra, escreveu Francisco Campos, o solitário autor da Constituição ditatorial de 1937, o liberalismo concebeu o mundo político segundo a imagem da esgrima forense. Mas o advento do capitalismo industrial elevou dramaticamente o nível dos conflitos, transformando-os em enfrentamentos mortais entre o capital e o trabalho. Nessa nova sociedade, sentenciou, só haveria lugar para “governos fortes”.

Depois da 2.ª Guerra Mundial, em todo o mundo a palavra-chave passou a ser “desenvolvimento”. O problema com a democracia seria sua incapacidade de cumprir certos “pré-requisitos”. Ela só seria possível em sociedades que previamente se houvessem adiantado economicamente, que contassem com uma população homogênea e altamente escolarizada, e assentadas sobre um robusto consenso nacional. Pior ainda, a democracia seria incompatível com o “planejamento”, a nova panaceia econômica. Hoje é fácil perceber que essa nova elucubração se esquecia de um pequeno detalhe. A democracia não foi inventada para as sociedades desfrutarem condições ideais após haverem superado cabalmente os seus conflitos, mas para que pudessem (e possam) equacioná-los com o mínimo possível de violência, dentro de um marco institucional justo e acessível a todos os grupos relevantes.

A quarta morte da democracia foi atestada no contexto do conflito Leste-Oeste, principalmente pela voz dos ideólogos marxistas. Sua sentença de morte estaria embutida na rápida ascensão e na superioridade tecnológica da economia planificada de tipo soviético. Até Isaac Deutscher, um homem culto, chegou a escrever isso. Antonio Gramsci fez um arranjo dessa peça para soprano ligeiro: o socialismo triunfará no campo da cultura, sem necessidade de recorrer a uma revolução sangrenta.

Mais complicada, até porque ainda se apresenta de uma forma nebulosa, é a quinta morte. O que se diz atualmente é que a democracia representativa é incompatível com a sociedade de hoje, na qual já não se discernem classes sociais, mas sim uma infinidade ameboide de grupos, movimentos, conselhos, etc. O caos passou a ser a norma. Nesse quadro, o representante não sabe a quem representa e a própria noção de representação perde o sentido.

Ou seja, o mundo atual é um caos permanente, indefinível, cujos contornos ninguém se atreve a tentar descrever. Que tipo de governo conseguirá mantê-lo sob controle? O chinês, no qual o Partido Comunista controla com mão de ferro um capitalismo selvagem? A democracia dita direta, reminiscente do anarquismo, em que a bondade humana substitui a “mão invisível” de Adam Smith? Uma Venezuela em escala cósmica? Ou, quem sabe, uma regressão ao pretorianismo romano, como no reinado de Cômodo, no qual mercenários leiloavam seu apoio ao imperador? Claro, com uma pequena diferença: os mercenários de hoje não portariam precárias adagas como as daquele tempo, e sim vistosos AK-47.

Não subestimo nenhuma dessas hipóteses, mas penso que o problema é bem outro. Na história das democracias, o fator preponderante nos retrocessos e rupturas sempre foi a falta de convicção das elites, sua falta do mais elementar bom senso e sua covardia quando o exercício da autoridade governamental se fez necessário. A República de Weimar e o Brasil de 1961-64 são bons exemplos. Por tudo isso, dói constatar que o Brasil ainda não se livrou em definitivo do populismo e de uma classe política virtualmente desprovida de responsabilidade pública.”

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