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sábado, 31 de março de 2012

BOCÃO


Ponte Princesa Isabel (Recife)


Por José Antonio Taveira Belo / Zetinho


Cabisbaixo. Sentado em uma cadeira na calçada do bar na Rua Princesa Isabel. Uma garrafa de cerveja pela metade e um copo na beira de mesa. O tempo quente do meio dia, pelo sol abrasador e a temperatura no asfalto fazia escorrer pela face risco de suor. Nada incomodava. As moscas voam e pousava na beira do copo de cerveja quente saboreando, Um prato de tira gosto de galinha guisada com rodelas de tomate e cebola, com um garfo ao lado. As pessoas no seu vai e vem ignoravam outros olhavam a cena, seguindo em frente, para os seus afazeres.

Ao lado, em outra mesa chegavam os boêmios da tarde, Zeca, Carlinhos, Maguary, e Candinho, todos frequentadores assíduos. Pediram uma cerveja geladíssima e olharam de lado para aquele companheiro ali cabisbaixo, sem notar o tempo passando.  Em outra mesa, sentado com o meu cunhado Clovis, grande amigo e cervejeiro, observa aquela cena de tristeza. O que fazer? Combinamos todos em chamar o Bocão para nossa mesa e, assim o fizemos.

Bocão foi um apelido adquirido no tempo de estudante e morador em pensionato no bairro da Boa Vista, precisamente, na Rua Barão de São Borges, porque falava muito alto e bom som, sempre se agitando por qualquer coisa que acontecesse. Era um moreno alto e magro. Olhos pretos retintos e cabelo lisos onde aplicava brilhantina. Gostava de se vestir bem. Suas roupas sempre bem engomadas pela lavadeira que servia aos pensionistas. Não se descuidava da sua aparência, sempre com um barbear diário e aparas no bigode preto que lhe tomava toda boca. Estudava Engenharia na Federal. Passara no vestibular depois de duas tentativas. Esforçava-se nos estudos, mas, no final de semana se esforçava na vida boêmia, nos bares e nas boates do Recife Antigo, chegando sempre ao pensionato pela madrugada, às vezes acordando alguns pensionistas, que se arretavam com barulho.

Procuramos saber o que estava acontecendo. Chamamos para a nossa mesa, desde que ele pagasse o que já consumira e, assim foi. Bocão veio para nossa mesa arrastando a cerveja e o prato de tira gosto e começou a nos olhar e disse:

Olha bicho estou na merda e sabe por quê?

Olhamos desconfiado para ele.

Vejam vocês que me conhecem há muito tempo. Formei-me em Engenharia Civil e me dei bem, não nego. Mas a vida em casa piorou nestes últimos anos. Só tenho desgosto. São com meus dois filhos, já de maiores mais são irresponsáveis. Não queria dizer isso a vocês, mas tinha que desabar e nada melhor do que numa mesa de bar entre uma cerveja e outra.

Estávamos calados e calados ficamos.

Continuou Bocão, com a sua voz estridente – Olhe quando me formei fui morar na Bahia, o mercado imobiliário estava melhor do que aqui em Recife. Lá encontrei uma bela moça, morena, de olhos pretos e cabelos lisos. Uma joia de mulher. Engracei-me dela e ela de mim. Casamos e deste casamento nasceu um filho homem e outro filha mulher. Foi só alegria. Tratei-os com o maior carinho e talvez por isto tenha errado.

Tomou o gole da cerveja e com o garfo um pedaço da galinha guisada. Enquanto ela fazia isto, olhamos um para o outro admirado daquela conversa em plena sexta feira ao meio dia, mas... Continuou Bocão depois que limpou os dedos em guardanapo de papel e, disse – O rapaz passou no vestibular para o Direito e não é que entrouxou!. Na Universidade em más companhias, ingressou no mundo das drogas, não é danado? Um menino criado a pão de ló dar-me desgosto a cada dia, já não sei o que fazer; a menina moça ficou na Bahia estudando Letras e morando em uma pensão, pois, não queria vir para o Recife e, não é que deu para fazer “programa” pela orla de Salvador, junto com algumas amigas que a colocaram na “vida fácil”. Não é prá se lascar? Dois filhos todos em mau caminho. Não sei mais o que fazer! E embarco nesta melancolia que me atinge nestes últimos tempos!. Fujo da realidade. Ando a esmo. O que fazer, repete! Não, não enfrento com vigor este drama. Já tive várias vezes em Salvador, em busca de uma reconciliação, mas que nada a “vida fácil” leva ela ficar com desdém comigo. O rapaz já se internou duas vezes, mas volta ao vicio. Veja vocês que barco furado eu estou. Tomou mais um gole de cerveja e um taco da galinha e disse – vou passear, levantou-se e seguiu em direção a Ponte Princesa Izabel.

Ficamos atordoados com este desabafo comentando entre nós este drama, que atinge milhares de pessoas, mas a vida continua, pedimos mais uma cerveja, que o garçom trouxe de imediato, abrimos um caixa de fósforos tiramos alguns palitos e começamos os a jogar porrinha.

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