“Covardes!
Covardes! Covardes!
POR FERNÃO
LARA MESQUITA
O que mais
choca ao ver as tais “instituições funcionando” é constatar o completo abandono
em que vai o brasileiro plebeu.
O
desarmamento mecânico foi só uma das consequências do outro. O pior é o
absoluto desarmamento institucional a que estamos reduzidos. Vem vindo de longe
e num crescendo há tanto tempo que anestesiou o povo e fez do brasileiro uma
massa inerte. Já não se defende nem das mordidas que leva de frente. Reduzido à
sobrevivência até a próxima refeição, foi devolvido à lei da selva. Está muito
aquém do nível em que gestos de dignidade humana podem ser cobrados.
O grau de
alienação da outra ponta é inversamente proporcional. Os predadores-alfa, com
suas lagostas, seus vinhos tetracampeões e seus decretos de 16,32% no Ano da
Grande Fome, rebaixaram Maria Antonieta a um símbolo de austeridade e
promoveram o xerife de Nottingham a um quase mecenas. Para o Brasil de Brasília
o luxo não é só constitutivo, é antes “constitucional”. Exigível por ordem
judicial, é função do Estado impô-lo à favela pela força.
Quando a
sessão de tortura termina, a volta à cela torna-se motivo de comemoração. Mas
esse trilhão, se sobrar tanto, não é desmame. É só um sopro no pulmão do morto.
Está mais para a bruxa engordando o dedinho de Joãozinho e Maria. Quando a
reforma da Previdência foi entregue ao Congresso, em fevereiro, já os
militares, “no poder” após 33 anos de ostracismo, tinham sido (indiretamente) desembarcados
dela. Morto o critério de igualdade, o arbítrio, de que nascem as
privilegiaturas, ganhou salvo-conduto para o futuro do Brasil com o endosso
presidencial à exclusão do sistema de capitalização logo nos primeiros dias dos
dois meses até a CCJ mais 68 dias de Comissão Especial fazerem das palavras
dele lei. No último minuto a agroteta, o alter ego do agronegócio que salva a
Pátria, mordeu os seus 89 bi só pra ninguém esquecer que o privilégio não tem
preconceito de classe. E então lançaram-se ao leilão os Estados e os
municípios, onde se fará o ajuste fino do que sobrar após os dois turnos, no
mínimo, em cada Casa do Congresso, que estão na agenda do “pra já” das nossas
depressões futuras.
Não há
“rachas” na privilegiatura. Só o que continua em disputa é a quem serão
atirados os ossos a cada troca de turno no poder. Aos “movimentos sociais” de
laboratório, à protomilícia da fase terminal das quase democracias, ou às
polícias que já engatilham aquelas “greves” que consistem em sinalizar para o crime
quando estará liberado o próximo comedio em que poderá “tocar o terror”
impunemente. Será, portanto, disputada com o argumento de sempre a questão
filosófica sobre se são ou não são privilégios as vantagens que as polícias
têm: “E então, governador, a quantos plebeus trucidados vosselência resiste?”.
Mortas sem
choro nem vela de tantos observadores da imprensa e seus “especialistas” das
universidades públicas as pretensões revolucionárias da reforma, nada mais
restava “fora da ordem”. Seguiu-se a tradicional disputa dos lobbies, alguns,
como é de lei, patrocinados pelo presidente da República em pessoa, pois, da
“direita” ou da “esquerda”, é de bom tom que eles não se esqueçam “dos seus”
nesta nossa democracia cordial.
A plebe do
favelão nacional foi, como sempre, a única “parte” em prol da qual ninguém
pediu “vantagens”, com exceção do “politicamente inábil” ministro da Economia
que as privilegiaturas “de direita” e “de esquerda” que se substituem no poder,
igualmente virgens de qualquer experiência com as maçantes obrigações da
economia não parasitária, acabam constrangidas a importar do Brasil Real.
Já é outra
vez possível até atacar de frente o combate à corrupção e propor de peito
aberto o restabelecimento da impunidade. Com a promoção dos hackers de aluguel
e do jornalismo de banqueiro “campeão nacional” a interlocutores legítimos do
processo político brasileiro, os “ganchos” para o bombardeio de saturação estão
garantidos. As redações herdadas, com “autonomia” garantida pela sólida
alienação dos seus patrocinadores, podem recuar do primeiro plano e
concentrar-se por um tempo apenas em “repercutir” os ataques de que mesmo
“fatiados” ninguém desconfia, enquanto mantêm a censura para as alternativas
que funcionam no mundo que funciona. Quem, na privilegiatura “de direita” ou
“de esquerda”, “ganhou” ou “perdeu” cada round?
O resumo é
que foi mais uma vez anunciado aos quatro ventos que quem tem lobby monta em
quem não tem, e a polícia, os paladinos dos direitos humanos e os santos de pau
oco montam juntos.
Covardes!
Covardes! Covardes!
É a hora
mais escura do Brasil. Ilusão de noiva acreditar que qualquer coisa vai mudar
antes que o poder mude de mãos. Enquanto não impusermos ao País Oficial o
deslocamento do seu eixo de referências e do ponto de ancoragem dos empregos
públicos, as lealdades continuarão sendo as de hoje, as iniciativas para
“melhorar” isto ou aquilo não passarão de paliativos e qualquer debate em torno
delas, apenas dados de uma autópsia que contribuirão mais para alienar que para
esclarecer o País.
O mundo
está aí para quem quiser conferir. Manda na própria vida e livra-se da miséria
quem tem o poder de contratar E DE DEMITIR políticos (os funcionários tornam-se
demissíveis por consequência) e de dar a última palavra na escolha das leis sob
as quais concorda viver. Só não é escravo quem tem a garantia de que é seu o
resultado do seu trabalho e que só ele tem o poder de dispor sobre o que será
feito dele. Eleições distritais puras com direito a retomada de mandatos,
iniciativa de propor leis combinada com direito de referendo do que vier dos
legislativos e eleições periódicas de retenção de juízes põem você como
referência obrigatória dos políticos, a sua satisfação como única garantia do
emprego deles e, ao mesmo tempo, blinda o País contra golpes e manipulações.
A deus o
que é de deus, portanto. O Brasil não precisa mais que de políticos tementes ao
patrão.
E viva o 9
de julho, que era disso que se tratava desde muito antes de 1932!”
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