“Os surrealistas Lula e Temer
Por Flávio Tavares
O termo castiço é contubérnio, ou
a familiaridade para delinquir e enganar. Dele brotaram ou convergiram outros
similares, há muito tempo (e hoje mais do que nunca) em moda no Brasil:
conluio, conjura e tudo o que esconda o crime dentro de si.
Entre nós, o crime está à mostra.
O processamento do presidente Michel Temer pelo Supremo Tribunal e a condenação
do ex-presidente Lula da Silva a nove anos e meio de prisão, por exemplo, têm a
mesma origem e surgem do mesmo sigiloso contubérnio, que até no som já é
explosivo. Tanto o caso de Lula (que se proclama a pessoa “mais honesta do
Brasil”) quanto o de Temer (que se diz “a caravana que passa”) surgem do
conluio que tenta disfarçar ou ocultar o delito.
No caso de Lula, o detalhe
financeiro que levou à condenação é quase insignificante – uns R$ 3 milhões –
diante das centenas de milhões de dólares dos roubos apurados na Lava Jato e
outras estripulias. O apartamento no Guarujá, porém, desponta como o rabo do
gato que surge pela fresta da porta e revela os multimilionários ninhos de rato
gerados no conluio entre grandes empresas e o poder enquanto ele estava no
poder.
Algo similar acontece com Temer.
O amistoso diálogo com Joesley Batista revela uma intimidade em que as frases
ou ideias nem precisam ser concluídas para se entenderem. Basta que um inicie e
o outro já complementa.
Quem imaginaria um presidente da
República, em conversa com velho comparsa na calada da noite, mandando que
continue a entrar, no futuro, pelos fundos do palácio para não ser
identificado?
“Sempre pela garagem, viu?”,
advertiu Temer a Joesley Batista, em sussurro, ao final da conversa daquele mês
de março, hoje estopim de uma explosão inimaginável: o presidente da República
investigado pela Polícia Federal e denunciado ao Supremo Tribunal pelo
procurador-geral, dependendo apenas da licença dos deputados.
Quem imaginaria alguém como Lula,
que há pouco perdeu a esposa, culpando (de fato) a mãe dos próprios filhos pelo
obsessivo (ou mesquinho) interesse num apartamento triplex de frente para o
mar?
Lula condenou-se a si próprio
naquele depoimento ao juiz Sergio Moro, meses atrás. O Lula solto e falastrão
sumiu. Surgiu um reticente, incapaz de ocultar que inventava e que, ao
inventar, mentia. E se viu que tudo aquilo era apenas o rabo do gato pela
fresta da porta...
Lula terá sido tão ausente da
função de presidente da República que o assalto à Petrobrás prosperou de forma
gigantesca em oito anos de seu governo? Ele nunca soube de desvios na maior
empresa estatal, nem desconfiou que o então deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ)
estivesse envolvido em estrondosas falcatruas?
Temer tenta se livrar de ser
julgado pelo Supremo. Compôs com servos fiéis a Comissão de Constituição e
Justiça da Câmara dos Deputados para que, a partir dali, se estanque o
processo. Ora, se nada daquela aparente intimidade criminosa com o mafioso
Joesley for verdadeiro, por que evitar a ampla atuação do Supremo? O execrável
é que a fidelidade tenha raízes em nova orgia de liberação de verbas de
“emendas ao Orçamento” para os currais eleitorais, ou nomeações no Dnit e
noutros setores com polpudas verbas.
Temer continua com todos os
poderes de governança da função presidencial. Mas já não é o chefe de Estado
modelo de sensatez, equilíbrio e serenidade, acima de pequenezes, apto a mediar
as disputas e decidir com isenção. Ao contrário, alinhou-se com o lado nebuloso
e dele não se desgruda. Seus ministros mais íntimos e mais poderosos são réus
na Justiça. E alguns ex-ministros e auxiliares estão presos.
Que bizarro modelo pode ser
alguém que manda um emissário “de estrita confiança” receber uma mala com R$
500 mil?
O jeito ousado e a cara de
atrevida inocência dos políticos, empresários e figurões que desfilam pelas
investigações fazem com que tudo pareça surgir de um romance surrealista de
terror, imaginado por um ficcionista genial, mas doentio.
Os envolvidos (e são centenas)
agem com a desenvoltura e naturalidade de personagens inventados, vestidos com
fantasia grotesca, tal qual uma caricatura fatídica. E tão burlesca e
terrorífica que ninguém se animaria sequer a esboçar um rabisco, por ir além do
razoável, só admissível na literatura fantástica. Agora, porém, a crua
realidade é que soa como fantástica, fruto da imaginação e da fantasia, quando
apenas retrata o cotidiano.
A crise política imita um
terremoto: tudo se abala ou despenca na superfície, mas, em realidade, as
fissuras estão lá no fundo da Terra. Escondidas numa complicada geologia, são
elas que provocam o horror.
Nosso terremoto dos últimos anos
escancara, agora, o criminoso poder dos grandes figurões da política e da
economia. Hoje conhecemos o rosto profundo da própria crise, tão nosso como um
samba do Adoniran Barbosa, mas até aqui oculto e escondido – e que não nos
amimávamos sequer a cantarolar.
Desde 2014 a Lava Jato e outras
lavagens bilionárias, como a do ex-governador do Rio Sérgio Cabral, do PMDB, ou
menores, como a do Metrô paulistano (com o PSDB à frente), revelam o monstro
voraz que domina a área partidária. Quatro ex-presidentes da República vivos
(Sarney, Collor, Lula e Dilma) aparecem envolvidos em algo ou são suspeitos de
operações irregulares, em maior ou menor grau. Lula acaba de ser condenado no
menor dos muitos enredos em que aparece ou aparecerá. As irregularidades do
tempo de Fernando Henrique só não serão avaliadas porque prescreveram
judicialmente.
E falta ainda penetrar no
emaranhado dos mais de 30 partidos, de fato meros grupelhos que se alugam ou se
vendem para ampliar o tempo de rádio e televisão dos candidatos a cargos
majoritários, como se democracia fosse isso – mera contagem de votos!”
------------
AGD comenta:
Eu já tinha lido a palavra “contubérnio”. No entanto, sempre ficava em dúvida sobre seu real significado. O
texto acima transcrito, do jornalista Flávio Tavares, até que enfim me
esclareceu. E só pude concluir que a história contemporânea do Brasil, e isto
abrange a chamada Nova República, é um verdadeiro contubérnio, onde os
políticos vivem na maior mancebia.
Basta ler os jornais e verificar
que esta história é contada por metros de corrupção, que é a palavra da moda. O
que resta perguntar é o porquê das coisas. E sei quanto é difícil explicar a
história quando a vivemos.
Daqui a 200 anos, se o Brasil
continuar existindo, e tivermos um História do Brasil que cubra este período, o
que os livros dirão? Quem seria o maior vilão dela? O Lula ou o Temer? Sem
passar tantos anos assim eu diria que pode haver um empate. Mas, se perguntamos
qual foi o partido político mais corrupto da história do país, todos
responderão, em uníssono: PT.
Afinal de contas o Temer foi um
criação do PT, tanto como a Dilma, que são crias do Lula. Isto é inegável. Mas,
deixo aqui este escrito apenas com reflexões para o futuro e com medo de ter o
empate histórico outra vez entre os mais de 30 partidos que hoje nos habitam.
Então, se leram o texto anterior
reflitam sobre nosso contubérnio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário