Por José Antonio Taveira Belo / Zetinho
Na década de 70, quando existiam os cinemas Moderno, Art.
Palácio e Trianon, no Centro do Recife Zé Galego fazia ponto na frente destes
cinemas com o seu tabuleiro pendurado no pescoço vendendo confeitos,
chocolates, chicletes e cigarros em retalho na calçada no inicio das sessões,
revezando e oferecendo aos seus produtos aos espectadores. Ia de um lado para
outro, ora estava no Cine Moderno, outra hora no Trianon ou Art. Palácio. Nunca
fora ao Cinema São Luís, pois tinha que atravessar a Ponte Duarte Coelho que
para ele era desnecessário, e dizia – “quem quer muito fica sem nada” Era alto,
sarara de olhos azuis e cabelo encrespado amarelado. Vivia feliz, demonstrava. O
sol escaldante era a sua cruz. Sentava-se muitas das vezes na Praça Joaquim
Nabuco aos seus pés se amparando do sol que lhe queimava a pele branca e rosada.
O boné vermelho que usava não lhe era confortável, pois o calor fazia escorrer
suor pelo rosto. Percorria a fila oferecendo os seus produtos de entretenimento
dentro do cinema. Esperava abrir a
bilheteria. Era alegre e fanfarrão. Tirava pilheria com muitas pessoas, muitas
não gostava do atrevimento e revidava. As meninas que faziam ponto na esquina do
cinema era o seu xodó. Conhecia todas e seus amores. Pilheriava com todas elas
e as vezes distribuía chicletes com elas. Galego me da um chiclete gritava.
Respondia sorrindo, o que você me dá em troca? O que tenho que dar é mais caro
do que chiclete. Mas se você me der dois chicletes nós vamos ali lhe dou o merecido,
ria e saia rebolando enquanto o Galego comentava com o seu companheiro de
profissão, essa aí é das boas, já fui com ela na pensão aqui na Rua Frei Caneca
é um chuchu. Deixa tua mulher saber que tu vai ver uma coisa. Vai levar uma
camada de pau e enquanto não sarar a ferida tu vai dormir no chão frio na sala
chupado pelas muriçocas. Sabe nada ela
nunca veio aqui tem vergonha do que eu faço. Mais um dia a casa cai e ai tu vai
saber com quantos paus faz uma gangorra. Gostava de se mostrar, mesmo nas
condições que tinha afirmava com todas as letras que era um homem bem de vida
e, ninguém duvidava. Com o seu trabalho cansativo sustentava os filhos matriculados
no colégio do estado no Parque Treze de Maio, à tarde. Nos domingos a tarde
vinham sempre assistir algum filme era o seu divertimento ou ir a praia em
Olinda. Três, dois meninos e uma menina
Florisa. Sabia que mais cedo ou mais tarde o seu esforço era recompensado com a
formatura dos seus filhos. Era o seu orgulho, nunca se misturou com gente de má
qualidade, mesmo morando no morro em uma casinha pobre. Muitas das vezes para
descansar ia tomar uma cerveja no Bar do Mijo, vizinho ao Cinema Moderno. Tirava
o boné vermelho e enxugava com uma toalha que servia para amenizar a dor do
cordão no pescoço e enxugava o rosto. Ali na mesa sentava-se e colocava o
tabuleiro na cadeira e saboreava a sua geladinha. Pedia um tira gosto de
galinha guisada e dizia - este é o meu almoço. Ouvia as musicas de Valdick
Soriano, Agnaldo Timóteo e Nelson Gonçalves, Dalva de Oliveira, somente musica
de roedeira. Para relembra os tempos passados quando a saudade batia do seu
interior Limoeiro. Naquele tempo era um tempo bom. O pai trabalhava no campo. O
sitio tinha de tudo, feijão, milho, mandioca e jerimum. Alguns pés de mangueiras
e goiabeiras e um riacho que cortava todo o terreno onde se plantava verduras,
o coentro, cebolinho, alface, tomate e pimentão, com alguns pés de quiabo. Tudo
era de fartura. Quando o véio morreu cada um tinha que se virar, pois éramos
seis irmãos quatro homens e duas mulheres todos já casadas e com a sua vida
feita, somente eu me meti vir para a capital, sem estudo e muitos menos tempo
para estudar, pois não tinha dinheiro para me alimentar fui morar no morro e lá
ainda estou hoje, com a graça de Deus. Muitas das vezes se atrevia a jogar
porrinha conosco. Perdia e ganhava e dizia - a vida é de ganhos e perdas, saia
e ia para porta do cinema. Morava no Morro da Conceição e todos os dias ao
descer a escadaria rezava aos pés da Santa sua protetora para lhe dar saúde e
paz para exercer o seu trabalho humilde. Benzia-se e descia para apanhar a
condução na Avenida Norte. O ônibus elétrico, que muitas das vezes ficava na
rua por falta de energia elétrica. Diariamente fazia este
pedido e agradecimento à noite quando retorna para sua humilde casa. Os pecados
que eu faço peço perdão todos os dias, mas mesmo assim sou um homem pecador. Ia
para casa descansar após uma jornada de oito horas sob o sol e a chuva nas portas
dos cinemas, chegando a casa por volta das onze horas da noite.
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