Por Carlos Sena (*)
Zinho era um sujeito sem jeito.
Nada dava certo eu sua vida até que ele decidiu fazer graça com a sua falta de
graça. Desempregado e sem qualificação alguma para nada viu sua vida caindo de
ladeira abaixo. Arrumar um emprego pra ele era coisa de vida ou morte, pois
afinal quem iria lhe sustentar e pagar suas contas? Unindo o fútil ao
agradável, Zinho decide fazer graça, ou seja, ser cômico. O problema é que ele
não sabia mesmo fazer graça, mas tinha graça no seu jeito de não fazê-la – ele
era a própria graça e decidiu ser cômico de si mesmo. Aos poucos ele foi
investindo em sua carreira e, gradativamente, foi aceito pelas pessoas em sua
volta. O primeiro show de Zinho foi num circo mambembe. Quando ele foi
anunciado ninguém apareceu. A plateia ficou sem entender, mas ele adentrou ao
picadeiro por trás. Em silencio, ele começou a mexer com as mulheres em forma
de mímica. Imitava Carlitos, piscava para os homens e fazia medo às crianças.
Certa noite, ele, o cômico Zinho começou a fazer “munganga” e tirar a roupa. As
mulheres ficaram tensas, os homens começaram a vaiar, mas ele retirou a roupa e
por dentro tinha outra roupa. Então veio o riso e muita graça. Zinho tinha um
jeito especial de emocionar, principalmente aquelas pessoas de riso difícil.
Ele descobriu que chorava com facilidade e, dessa maneira, quando a plateia
continuava sisuda, despencava num choro alternando com gargalhadas. Então o
povo ria de viver com Zinho. O cômico Zinho foi ficando famoso nas redondezas e
logo começaram a lhe imitar. Certo dia nos jornais locais da cidadezinha ou ele
se apresentava no circo, uma manchete de um “irmão de Zinho” que também estava
fazendo show cômico. Seu nome? – Cômico Zão! Zinho ficou preocupado, pois nem
bem estava com sua carreira definida, logo aparece outro lhe imitando e se
passando por seu irmão. O cômico Zinho, entretanto, aconselhado por amigos,
preferiu deixar de lado, pois havia plateia e gosto para tudo no meio do mundo.
O diferencial do cômico Zinho é que ele era sensível, o cômico Zão, não; o
cômico Zinho era franzino, com cara de passa-fome, o cômico Zão, não, era alto
e forte e com cara de grã-fino.
Certo dia, a família de Zinho,
diante do seu sucesso, decidiu lhe procurar. Nessa ocasião Zinho já houvera
recebido convite até pra se apresentar em programas de TV. A fama, portanto,
até trouxe para Zinho a família que nos tempos de “vacas magras” o abandonou.
Nessa reaproximação, Zinho descobre que seu irmão Dava também tinha veia cômica
e, quem sabe, não ficaria com ele para neutralizar a ascensão do seu “desafeto”
Zão?
Com esse pensamento, Zinho chama
Dava e começa a incluir ele nas suas apresentações. Enquanto ele, Zinho, fazia
caras e bocas, seu irmão Dava entregava flores, bombons, etc, à plateia. A
estratégia era mesma essa: Zinho trabalhava e o cômico Dava ofertava brindes
simbólicos acerca de cada gesto de Zinho. Se Zinho chorasse, Dava ofertava
lenços de papel e também chorava. Foi uma perfeita sintonia: enquanto o cômico
Zinho descontraia, o cômico Dava se entregava em cada objeto dado como parte do
numero do irmão Zinho...
Certo dia o cômico Zinho
fraquejou. Nessa noite durante seu espetáculo, a vista escureceu e por pouco
ele não caiu no chão. O cômico Dava o socorreu, mas não deixou a peteca cair.
Zinho foi conduzido ao camarim e o cômico Dava fez os dois papéis em pleno
espetáculo: fazia “munganga” (gestos, caretas) e dava os objetos pertinentes a
cada atividade cênica daquela cena muda que tanto riso provocava. Depois do
espetáculo, o cômico Zinho foi aconselhado pelo médico a tirar férias. Foi o
que o cômico Dava precisava para fazer os dois papéis: o seu e o de Zinho.
Nesse caso, o cômico Dava era meio Gilete – cortava nos dois lados, colocando
em risco a vida profissional do seu irmão Zinho.
Certo dia, o cômico Zinho se
afastou de cena. Em pleno pica-deiro ele se despediu de todos. Na plateia o
cômico Zão estava disfarçado, pois não teve muito sucesso com sua farsa, mas
estava ali, esperando ver se sobrava algum espaço para ele fazer o provo rir
sem sua graça. Quando o cômico Zinho se despede, o cômico Dava estreior em alto
estilo e se estabeleceu nessa nova modalidade total flex de fazer rir. Dizem
que o sucesso do cô-me-cu Dava foi por conta da sua versatilidade,
principalmente quando se encontrava no pica-deiro...
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(*) Publicado no Recanto de
Letras em 18/04/2013
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