Por Carlos Sena (*)
Cadê as velas das nossas igrejas?
Terão sumido com a fé que não rumoreja? Cadê as velas nossas acesas? Será que
se escondem em nossas mentes apagadas?
Refleti assim quando estive em
Bom Conselho assistindo a uma missa na capela de N.S. do Bom Conselho. Explico:
quando criança, eu adorava ir a missa e ver o sacristão acendendo as velas de
uma forma bem original. Ele “tocava” as velinhas mais altas do altar com uma
vara que na sua extremidade continha uma chama que as acendia. No final da
missa ele, de novo, vinha com a mesma varinha cuja extremidade tinha um “cone”
e as apagava. Eu achava o máximo. Como costumo dizer, achava digno demais
aquela coisa tão simples, mas tão simbólica.
De repente, chego à mesma
capelinha e vejo que não tem mais velas, nem vara, nem cone, nem sequer
sacristão! Então me pergunto: haverá cristão? Haverá fiéis? Haverá o quê? Certo
que tudo pode haver, mas ai a gente fica se perguntando: estará havendo uma
modernização da fé? Quando as pessoas dizem que vão “acender uma vela para as
almas” elas (as almas) irão gostar sabendo que a vela é uma imitação de vela,
ou seja, uma lâmpada comum? Poderão dizer: o que vale é a intenção. Também
acho, mas só que a igreja, a fé e a religião em si, no geral, são canalizadas
por uma simbologia secular que nos leva a ficar meio que incomodado. Nesse
caso, não seria melhor no lugar da chama da vela colocar um dizer: “imagine que
aqui é uma vela acesa!”. Assim por diante: “imagine que aqui é uma igreja”,
“imagine que aqui é uma hóstia”; “imagine que aqui não é aqui”, etc., etc.
Da mesma forma, acontece com a
lamparina de azeite que ficava acesa o tempo todo: é uma luz elétrica que faz a
vez dela, da mesma forma que imita as velas dos altares. Dever-se-ia mudar a
denominação: ao invés de se dizer acender uma vela para as almas, “acender uma
lâmpada” e, deste modo, encher de luzinhas as igrejas que, certamente, loucas
por dinheiro como são, logo estariam concorrendo com a Philips e outras do
gênero.
Preocupa-me sobremaneira as
almas. E os santos, e os querubins e os serafins. Será que eles entenderão a
mensagem? Será que o Papa acendeu uma vela e fez uma promessa para eles
entenderem essas mudanças via tecnologia modernosa? Pode ser que sim, pode ser
que não. Pelo sim, pelo não, prefiro mais as velas “em pessoa” nos altares das
igrejas e nas lamparinas que anunciam a presença de Deus e nos conduzem ao
silêncio, à reflexão. Até aquele cheirinho de vela apagada eu gostava e, como
disse, achava digno.
Os argumentos de que evitam
incêndio nas igrejas são fajutos. Afinal, os padres não têm tanto o que fazer
nos monastérios. As freiras, muito menos. Os sacristãos, menos ainda. Os
garotos? – Deixa pra lá. Bastaria tão
somente entenderem que há coisas que a modernidade tem que se curvar a
determinados hábitos e costumes seculares: as velas acesas das igrejas são umas
delas. Exagero? Pode ser. Espero que a modernidade dos homens tenha chegado a
modernidade dos Santos; que a modernidade da terra tenha chegado aos céus...
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(*) Publicado no Recanto de
Letras em 03/05/2012
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