Por Zé Carlos (*)
Fiquei surpreso no início da semana passada, com um pedido
do meu irmão: “Escreva alguma coisa para publicar num jornalzinho que a UBE
fará circular proximamente”.
Perguntei: O que é
UBE? Ele me disse: É uma associação de estudantes de BOM CONSELHO.
Perguntei a mim mesmo usando uma expressão muito comum em
nossa terrinha (ou terrão) natal. De novo?
Durante minha vida de estudante, e que ainda continua, vi
muitas associações de estudantes de BOM CONSELHO. Aqui no RECIFE, de onde escrevo, e lá para
onde escrevo.
Para mim elas tinham o vício natural de serem compostas de
estudantes; que na maioria das vezes, não serão um dia, necessitando quando
isto ocorre, o aparecimento de novas lideranças para formarem novas associações
e assim sucessivamente desde o tempo que BOM CONSELHO era
A “CIDADE DAS ESCOLAS”.
“CIDADE DAS ESCOLAS”.
Eu sempre imaginei o porquê deste epíteto. Fico pensando: Talvez, seja
porque naquela época tínhamos o Colégio Nossa Senhora do BOM CONSELHO, onde se
internavam os filhos de homens ilustres, com riqueza suficiente para manter as
freiras numa situação, que as permitiam fazer os presépios mais bonitos que os
meus olhos infantis (na época) já viram.
Era bom ter os filhos educados na “CIDADE DA ESCOLAS”.
Também medito sobre o porque de tão decantado título não aparecer mais com a
frequência anterior, a não ser sistematicamente
nos discursos de autoridades no dia 07 de Setembro ou noutras ocasiões solenes.
Que sabe, se isto não ocorreu por culpa quase exclusiva do
professor WALDEMAR GOMES DE SANTANA, (onde está a praça com este nome?), que ao
lutar para que os filhos de pais da classe média e pobre da cidade, pudessem
pelo menos, realizar o seu curso ginasial, fazendo com que BOM CONSELHO despertasse para o fato de ser
paradoxalmente a “CIDADE DAS ESCOLAS” sem escolas para o seu povo?
Será que este, foi o motivo? Ou realmente nunca existiram
escolas para o povo em nossa cidade? Serão estas divagações injustiças
históricas contra nossa amada terra e contra o nosso professor WALDEMAR, que talvez
tenha usado muito o epíteto em seus discursos, sem saber que suas ações
levariam a comunidade a rejeitá-lo?
Para sermos mais injustos, embora não com menos divagações,
pensamos haver o professor descoberto, que aos pais dos alunos, os quais a
partir da atuação do ginásio SÃO GERALDO puderam lá fazerem seus cursos, não
importava se BOM CONSELHO era ou não a
“CIDADE DAS ESCOLAS’, mas que houvesse escola para seus filhos.
Continuo divagando em torno do epíteto e pergunto: O que
esta nova associação de estudantes pensará da época em que ele era muito
utilizado e citado até nas mais sofisticadas reuniões?
Será ele necessário atualmente ou podemos mudá-lo para
“CIDADE DO LEITE”?
Além desta questão em torno de um cognome existem outras,
sobre as quais a UBE poderia refletir com seus jovens associados, além das
atividades de lazer que fatalmente existirão.
Pergunto à UBE, em forma de desafio: Quantas crianças em
idade escolar, realmente não vão à escola em nosso município? Quantos dos
nossos conterrâneos, mesmo depois dos esforços do professor, ainda são
analfabetos e consequentemente alijados do nosso processo político e cultural?
Quantas pessoas temos desempregadas, ou trabalham sendo exploradas por um
salário irrisório nas atividades urbanas e rurais, e cujo fruto desta
exploração permite uma minoria estudar, tanto na “CIDADE DAS ESCOLAS” com
alhures? Quantas têm acesso a serviços médicos e condições de comprarem
remédios para se curarem das doenças provocadas na maioria das vezes, pelas
péssimas condições onde foram criados? Para quantas pessoas do nosso município,
existiu ou existirá a “CIDADE DAS ESCOLAS”?
Se, pelo menos, a UBE conseguir discutir e tentar responder
perguntas deste tipo, e outras muitas que imaginação e observação do seus
associados, fatalmente, encontrarão, esta associação poderá ter um futuro
promissor.
Arrisco-me aqui a prever uma pergunta que surgirá destas
discussões: QUEM SERÃO OS CULPADOS? Na tentativa de responder esta pergunta, se
for feita, a associação passará a se integrar e participar dos destinos de sua
comunidade, pois estudantes não existem só para estudar, a não ser para aqueles
que tem medo de que sua participação no processo político e social se reflita
negativamente nos seus próprios interesses.
Indo mais além, à guisa de sugestão, poder-se-ia indagar: O
que fazem os políticos de nossa terra, além de sua óbvia função de tentarem ser
eleitos e eleger seus correligionários? O que faz a Igreja de Bom Conselho, além de
exercer, a tarefa necessária, mas não suficiente, de guia espiritual do nosso
povo? Como agem nossos representantes com as apresentadas? E os nossos
comerciantes, fazendeiros, industriais, serão culpados ou inocentes? E os
estudantes, professores e intelectuais como partidos partidos políticos, as
outras associações de classe, o que fazem e o que deveriam fazer?
Reconheço que não é tão fácil responder a estas perguntas
quanto tentar fazê-las; mas somente a tentativa fará com que a UBE, e o seu
jornal, vejam nossa Cidade com olhos críticos tão necessários para seu real
progresso. BOM CONSELHO precisa de críticas e não de elogios.
Penso que, ao refletir sobre estas questões, a UBE estará
fazendo um grande julgamento dos responsáveis pelo nosso destino.
Todos nós, certamente, estaremos no banco dos réus.
Com certeza eu serei condenado.
----------
(*) Texto publicado no primeiro número de um jornal escrito,
que circulou em Bom Conselho, sob a
responsabilidade do UNIÃO BOMCONSELHENSE [sic] DE ESTUDANTES (UBE), no mês de abril
de 1980. (Vejam a imagem do jornal que ilustra o texto - Clique para ampliar)
Eu agora entendo porque (apesar dele negar o fato) que o
Fernando Henrique Cardoso disse certa vez: “Esqueçam o que eu escrevi”. Talvez,
eu pudesse dizer também que não confiem em coisas escritas há mais de 30 anos e
versam sobre política.
Eu apenas digo que hoje eu não escreveria determinadas
coisas e assinava em baixo de outras que naquela época escrevi. Isto não
significa nem que algumas estão certas e outras erradas, sem verificarmos a
época e o contexto em que coisas são ditas. Por exemplo, quando chamo atenção
para o grau de analfabetismo ou para crianças na escola, ambas as questões
continuam existindo, mas, eram muito mais acentuadas naquela época.
O próprio jornal escrito e elaborado por estudantes da terra
é um fato a meditar. Hoje, penso eu, seria quase impossível, quando os meios de
comunicação são muito mais baratos, principalmente, com a universalização da
internet. O que eu penso que diminuiu mesmo foi o interesse dos estudantes no
processo político, como classe. Eu adoraria ver hoje um Blog chamado Blog dos
Estudantes, em Bom Conselho, engajado no processo político da terra.
De qualquer forma, certo ou errado, verdadeiro ou falso, o
texto revela uma época. Neste mesmo número eu leio, numa nota do Francisco J.
C.:
“BOM CONSELHO , cidade
das Escolas, acaba com mais um Colégio, o saudoso SÃO GERALDO”.
“A Praça da Bandeira,
conhecida atualmente com o nome Praça dos Três MANÉS, ainda não foi concluída”.
“Hospital de BOM
CONSELHO, passa por sérias necessidades”.
Não estou informado o que seria atual ou não nestas notas,
mas, ficam agora no meio eletrônico, para os historiadores.
O texto é muito bom, mas tanto na reprodução do jornal como no seu comentário é faltoso e incompleto, uma vez que esqueceu de citar o sócio de Waldemar, O querido professor multilingual Dr Joaquim Cirilo de Araujo Pereira. Figura que tive a honra de ser seu filho.
ResponderExcluir