Por Carlos Sena (*)
Viajar é bom. Ver outros mundos,
respirar outros ares é maravilhoso, inclusive pra gente sentir como é boa nossa
cama, como é bom nosso “travecheiro”, como são inseparáveis nossos amigos, como
insubstituíveis os nossos familiares. Nada como sair de casa para sentir
saudades dela e sentir o seu valor enquanto “canto”, enquanto “cafofo” nosso de
cada dia.
Os lugares são como as pessoas
porque é por elas composto. Não há lugar bonito sem pessoas e talvez por isto
as cidades abandonadas sejam feias. Porque nós quando nos abandonamos ficamos
feios, quando somos abandonados ficamos horrorosos e quando perdemos esse
sentimento ficamos no limbo na constituição do medo. Coisas do ser humano que
há anos se busca e nem sempre se encontra. Coisas de gente que ama a e que
odeia, que se acende e se apaga por nada. Mas que por tudo se encanta mesmo que
em segundos se desencante.
Viajar é bom, mas ficar nem
sempre é melhor. Melhor é ficar em Recife sendo mundo e levando o mundo consigo
ir pra bem longe sem deixar Recife fora de você. Administrar essa construção é
complexo. Mais parece a Sinfonia Dos Dois Mundos de Dom Helder Câmara. Ele
entrou nessa prosa porque hoje, em plena missa no Santuário de Aparecida do
Norte eu me lembrei dele. Quanta riqueza em volta! Será que ele mandaria a
igreja vender aquilo tudo e dar aos pobres como o fez com o Papa Paulo VI? Ele
disse isto a ele, assim, na lata. Mas acho exagero dele, pois apesar dos
pesares a liturgia católica se monta em cima da pompa e, sem ela, não seria
possível liturgia. Já imaginou uma missa cantada sem o aparato solene que ela
congrega em volta?
Viajar talvez seja isto:
revitalizar um pouco nosso ângulo de visão, inclusive vendo a mesma coisa mais
de uma vez. Acho digno. Não deixo de ir a Rua 25 de março sempre que venho a
Sampa. Ao mercado Municipal muito menos. Lá tudo acontece, inclusive nada. Lá
tudo se compra ou não se compra. Acho São Paulo um Estado de Graça,
incomparável ao meu Pernambuco que é um estado de Espírito.
Não gosto de viajar em função do
excepcional. Nem de me cansar em nome de férias ou de passeios turísticos. Se
assim fosse me sentiria burro, principalmente nesta altura da vida quando se
devem buscar muito mais a lógica do CUSTO X BENEFÍCIO de tudo. Por isto gosto
de ser leve, quando os mais jovens dizem light. Sossegado, quando eles dizem
sussa. Mas a gente não estudou na mesma facu e, deste modo, daremos o recíproco
desconto. Como, diante do que vi em plena praça da Sé? Um bando de estudantes,
diante do marco zero da cidade, ficaram sem saber o que era aquilo. Um dizia
uma coisa, outro dizia outra. Eu do lado nada disse, mas tive vontade. Mas se
eu dissesse seria deselegante e isto a gente nunca deve ser. Mas agora eu
escrevo porque eles, amanhã, certamente estarão na Facu, bem sussa: aquilo ali,
nobres universotários é o ponto zero da cidade. Onde tudo começa, onde os
números da ruas são contados e a quilometragem que organiza a polis. O marco
zero é uma instância cultural, como que significando que ali, os antecedentes
sonharam com uma cidade que tivesse a cara deles, etc.
Mas o mundo só é bom por isto. As
idades tem seus encantos. Os cantos tem seus desafinados trinados e afinados
acordes. Neles eu me acordei pra vida, lá na minha pequena terra natal de Bom
Conselho de Papacaça. Fiquem sussa. Eu gosto da moçada boa que freqüenta as
Facu... Viajar é isso? Talvez.
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(*) Publicado no Recanto de
Letras em 29/04/2012
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