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quarta-feira, 16 de maio de 2012

Testemunhos do Vovô Zé - O primeiro assalto



Miguel mostrando como ficou na hora do assalto.


Por Zé Carlos

Esta semana que passou não foi fácil para o coração do Vovô Zé. Quando eu falo de coração, quero dizer todos os órgãos do corpo, que é um pacote que não vem com data de validade escrita nele.  Quem o fez era mais do que um sábio, talvez, um Deus, pois, neste caso sim, muita transparência, seria burrice. Como um dia estudei um pouco de Estatística prefiro acreditar que o prazo de validade, na média, está aumentando. Quando eu nasci era, mais ou menos de 50 anos, hoje é de 70, para nossa vida, às vezes “Severina”.

Como sempre, esta minha coluna é escrita para ser lida no futuro pelos meus netos, ou, por alguns parentes próximos e alguns avós desavisados. Por isso tenho que ser um narrador e não um escritor. E vamos aos fatos.

Miguel (já recuperado) com Davi, Mamãe e Vovó.


Quarta-feira passada, minha filha se deslocava do interior, onde mora, para o Recife, quando aconteceu o esperado, um engarrafamento danado na Abdias de Carvalho, prenunciando que, dentro em pouco, ninguém poderá chegar ao Recife por aquela via. E aconteceu algo, que apesar de esperado por todos que habitam esta cidade, era inesperado por minha filha, que vinha dirigindo, e por uma acompanhante que cuidava do meu neto Miguel, na poltrona de trás do veículo.

Um cidadão, dos muitos que vivem e convivem em nossa cidade, bateu no vidro da janela do carro, com um revólver e anunciou um assalto. Nestas horas não se pode descrever o que sente alguém envolvido. E não vou tentar fazê-lo aqui. Segundo minha filha o meliante estava de bicicleta, queria dinheiro e o celular. Mesmo nesta situação ela, ao implorar que não levasse o seu celular pois poderia precisar para se comunicar com a médica do seu filho, para onde iria, o nobre cidadão acedeu e levou só o dinheiro.

Miguel relaxando na piscina de bola.


Vejam a que ponto chegamos. Temos que dizer que os ladrões que nos fazem um mal menor, são bondosos e merecem nosso perdão. No entanto, mesmo depois do caso passado, ao ouvir o que aconteceu, aflorou em mim os mais baixos instintos do ser humano. Se naquela hora estivesse eu votando num plebiscito eu votaria pela pena de morte, e de preferência com requintes de crueldade. Por nem um momento me passou pela cabeça todas as teorias que um dia aprendi (e algumas já esqueci) sobre a não culpabilidade dos seres humanos individualmente, sendo eles um produto do seu meio, ou mesmo o vice-versa.

Lembrei várias outras situações onde me contavam que as teorias são boas quando estão longe de nós em sua realização, quando elas preveem catástrofes. Ou seja, quando os fatos acontecem com os outros os consolamos e pedimos perdão para seus algozes, mas, quando se passa conosco, nem queremos perdoar e nem ligamos mais para as teorias. Eu só pensei no que poderia ter acontecido se meu neto tivesse sofrido algum dano, e nem por um momento, pensei no grande número de netos dos outros que já sofreram.

Miguel já totalmente recuperado.


Alguns fatos apenas foram me passando pela testa ou pela nuca da vida pouco violenta que levei, mesmo aqui em Recife. Sai de casa aos 15 anos, no ônibus das 5 horas, em janeiro de 1964. Vivi aqui durante 7 anos e nunca fui vítima de um assalto. Passei por outras cidades, inclusive uma que sempre me disseram violenta, o Rio de Janeiro, e continuei virgem de assalto. Vivi alguns anos no exterior e a única violência contra o meu patrimônio aconteceu na cidade (e por isso para mim, a mais violenta do mundo) de Paris, num metrô, onde me bateram a carteira, mas, só notei tempos depois. E por isso eu me considero ainda virgem de assalto. Já o meu neto Miguel, aos 10 meses de idade, já sofreu o seu primeiro.

É óbvio que ele só vai lembrar deste fato quando ele conseguir ler este blog e este testemunho de um avô que agora teme pelos seus netos e pelo neto dos outros. Sinceramente, não sei, pelo andar da carruagem, se ele vai se lembrar disto como uma coisa do passado ou se vai ainda continuar dizendo como eu, que isto é uma rotina em nossas cidades. No entanto, eu me apego ao dito que diz que “tudo está bem quando acaba bem”, pelo menos para não ficar mais indignado com o que aconteceu a ele.

Miguel já voltando a dirigir, sem nenhum medo.


Por isso, no meio daquele nervosa situação enquanto ouvia o relato de minha filha, tentei transformar aquele limão terrivelmente azedo, numa limonada, regada a adoçante, dizendo para o meu neto, em tom de brincadeira:

- Eta, o Miquelito já sofreu o seu primeiro assalto, aos 10 meses, e o Vovô ainda é virgem deles.

Só resta perguntar: até quando. E ao mesmo, tempo, brincar com uma situação que foge ao nosso controle. A foto que ilustra esta postagem foi feita, quando o Miguel, já na delegacia para prestar queixa do assalto de que foi vítima, obedecia ao delegado, na reconstituição do crime, lhe pediu para mostrar sua reação naquela hora. Vejam que ele parecia tranquilo e corajoso, o que o Vovô Zé está longe de ser, tendo com certeza borrado a fralda se o evento fosse com ele.

Porém, depois da tempestade veio a bonança do Dia das Mães, data em que foram tiradas as outras fotos que permeiam esta postagem mostrando que o Miguel está bem, graças a Deus, mas, não podemos, com o que se faz com este país em termos políticos, dizer que ele não estará esperando o próximo assalto.

Um comentário:

  1. GRAÇAS A DEUS ZÉ CARLOS, SUA FILHA E NETO SAÍRAM ILESOS SÓ SOFRENDO O CONSTRANGIMENTO DE UM TERRÍVEL MOMENTO QUE NUNCA SERÁ ESQUECIDO;FICA UMA PERGUNTA: "QUEM SERÁ A PRÓXIMA VITIMA"?SIM, POIS SEMPRE HAVERÁ DELINQUENTES A SOLTA, E CIDADÃOS PRESOS E ASSUSTADOS, GRAÇAS A UM CÓDIGO PENAL ARCAICO,MAIS ANTIGO QUE NÓS, E COM BRECHAS QUE AJUDAM OS MARGINAIS.UM FORTE ABRAÇO E UM BEIJÃO NO PEQUENINO MIGUEL,E QUE DEUS NOS PROTEJA.

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