Bom Conselho - PE |
Por José Antonio Taveira Belo / Zetinho
Filha de Mestre Véu e Ana da Silveira, quarta da prole de
oito filhos. Nascida em Bom Conselho, morou na querida Rua Caborje, na casa de
nº 84, onde Hélio Belo de Oliveira seu sobrinho habitou. Remexendo os meus
bagulhos antigos, deparei-me com a fotografia da bela moça Carlinda. Sentada em
uma poltrona cinza, com vestido branco com flores azuis, uma laço na cabeça,
pulseiras, e colar de ouro. Sapato de salto baixo, branco. Um buque de rosas
brancas pousado no colo. Olhar sério, sem nenhum sinal de alegria, impassível. Semblante
duro e inflexível. Raramente ria. Não gostava de elogios, dizia logo vai pra lá
com tuas conversas e saia para casa onde estivesse. Evitava este tipo de
comentário, se escusava a acata-lo. Vivia para a casa onde morava ela e a minha
avó Ana. Seus objetos de estimação eram guardados a sete chaves. Tudo
arrumadinho era o seu guarda roupa, passado a ferro e engomada, suspenso por
cabides comprado na loja de Gabriel, no quadro, à tarde quando saia raras vezes.
Quarto fechado à chave para ninguém entrar. Não gostava de se pintar, com batom o que
usava era o pó de arroz e um leve tom de ruge no rosto, para diminuir a palidez
da sombra. Cabelos lisos sempre penteados, curtos. Os namoros que arranjavam
não davam certo, pois o seu gênio não era compatível com dela. À tarde depois
da reza do rosário, sempre ia para minha casa na mesma rua ao numero 120,
tomando café com biscoito canela. À noitinha, ouvia no alto falante a Ave Maria
das seis horas. Abria o seu adoremos recitava as orações e depois rezava o
terço, novamente. Depois do café voltava para nossa casa, sentava-se em uma
poltrona para contar estórias de Trancoso para nós. Deitávamos no seu colo e dormíamos
a ouvindo falando e fazendo gestos – a Gata Borralheira, o Príncipe Encantando,
Chapeuzinho Vermelho, que ficamos com medo e encolhíamos quando falava do lobo
mau engolindo a vovozinha, o Saci Pererê, pulando em uma perna só no mato e
fazendo medo as crianças. Ninguém nesta noite dormia no escuro, mamãe acendia
um candeeiro. Cobríamos até o rosto e adormecia. Todos os dias uma novidade e
muitas das vezes reprise das estórias contadas na noite anterior. Ajudava nas noites sentada na mesa a debulhar
feijão verde trazido do Sitio Terra Preta. Descaçava o milho verde colocando-as
em uma urupemba, onde meu pai ralava para fazer canjica e pamonha. Saia às pressas para casa nas noites escuras,
com chuva e a rua enlameado com uma sobrinha se aparando, sem luz elétrica e
depois com a chegada da luz da usina ficava ouvindo o radio. Íamos todos para
ouvir a novela o Direito de Nascer, na casa de Dona Zefinha, sentados em
tamboretes e na poltrona, vibrando uma vez outra com o desenrolar dos ruídos.
Ouvíamos também a novela de Jerônimo o herói do sertão, terminando todos íamos
deitar. Quando papai chegava ela dizia – Se Antonio começar a falar “nomes”
feios como “peste”, “bubônica”, “gota serena” eu me retiro vou para a minha
casa. Não gosto e ninguém vai me fazer gostar. Cada um com os seus defeitos.
Muitas das vezes falava estes nomes abjurados por Tia Carlinda de proposito,
somente para aperreá-la. Abria a porta e saia às pressas atravessando a rua
empoeirada. Papai ria, e dizia esta Carlinda não tem jeito não, tem que
arranjar um marido. O tempo passa e
assim ficou solteirona. Era católica fervorosa, assistia as missas celebradas
pelo Padre Alfredo. Pertencia a Apostolado do Coração de Jesus e filha de
Maria. A Semana Santa para ela era Semana Santa, principalmente na Quinta e
Sexta feira da Paixão. Obedecias rigorosamente o que a Igreja dizia, ou se
contentava com os comentários – não tomava banho, não varria a casa, ficava o
dia inteiro em silencio e na escuridão do seu quarto, somente saindo para a
procissão do Senhor Morto que percorria as ruas. Fazia jejum durante toda a
semana. Gostava de frequentar a nossa
casa, ajudando mamãe a cuidar dos filhos e ajudava a família. Somente a nossa
casa. Não gostava de frequentar casa de ninguém, ficava sempre na sua casa. Às
vezes muito raro ficava, debruçada na janela no final da tarde. Tornou-se
ranzinza e não gostava de piadas, de liberdade com nenhuma pesoa, era rechaçado
na hora com indiferença. Nomes “feios” eram para ela um suplicio tapava logo os
ouvidos e saia do recinto. Mudou-se para Garanhuns,
quando vovó morreu. Pertinho da nossa casa, junto com Tia Inácia. Ali na Rua
Sargento Silvino Macedo. Ali cultivou a sua maneira de viver não modificando em
nada o seu comportamento. Morreu em janeiro de 1992. Os seus restos mortais se
encontram no Cemitério São Miguel em Garanhuns juntos aos meus pais Antonio
Taveira Zuza e Nedi Taveira Belo.
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