Davi e Miguel no Troca-Troca (A família que troca figurinha unida, permanece unida) |
Por Zé Carlos
Faz algum tempo que não me travisto de Vovô Zé. Já estava
com saudades dele. E não foi por falta de histórias do Davi e do Miguel. Talvez
o excesso delas é que me tenha mantido feito um asno entre dois arbustos, para
tomar uma decisão de qual comer primeiro. Para não morrer de fome, escolhi,
para este texto, o tema que mais marcou este último mês, para todos os
brasileiros, e para minha família em particular: A Copa do Mundo.
Pelo gosto do Davi pelo futebol (que agora Miguel também já
segue), sempre estamos envolvidos com o velho esporte que era inglês e foi
reinventado pelos brasileiros. E neste ano de Copa, e ainda por cima aqui no
Brasil, não poderia ser diferente. Não dá para parar de pensar em meus tempos
de menino, lá em Bom Conselho, lá pelo ano de 1958, quando descobri que o
futebol existia, e os gringos descobriram que o Brasil existia. Apenas faço
ressonância às palavras do Nelson Rodrigues de que foi em 1958 que o Brasil foi
descoberto pelos europeus. “Eles bailaram
lá na Europa e a Copa veio prá cá...”, dizia uma canção da época, enquanto
eu queria ser ponta-direita no time, camisa 7, e ser chamado de Garrincha.
Não é possível nem comparar aquela minha primeira Copa com a
primeira do Davi e do Miguel. Primeiro porque vivíamos o Brasil do “Rádio” e hoje vivemos o Brasil da “Internet”, e quase já passamos pelo
Brasil da “Televisão”. Segundo porque
o futebol parece que murchou em termos de espetáculo para dar lugar a um espetáculo
não ligado ao esporte que os brasileiros praticavam naquela época. Digo
praticavam, porque já não considero os jogadores brasileiros muito brasileiros.
Seria Neymar brasileiro ou Espanhol? Meus netos, tenho certeza, têm dúvidas.
Mas, deixemos este papo de adulto e voltemos à infância dos
meus netos e também a de Vovô Zé. Descobri que quando nos tornamos avô, a cada
ano, os anos passam ao contrário, como se fosse num galope bem rápido. Cada ano
vale 10, e correm para traz. Hoje tenho uns 15 anos, ou menos. E seria
impossível dizer o contrário, inclusive também para a Vovó Marli, quando vemos
nossas fotos nos troca-trocas de um
álbum de figurinhas da Copa. Quando eu me dirijo a um garoto de 5 anos e
pergunto:
- Você tem figurinhas
para trocar?
Eu sinto-me com a mesma idade dele e a Vovó Marli muito mais
jovem. Já somos conhecidos nas praças de troca-troca,
tanto de Caruaru com nas de Recife. Eu e a Vovó Marli, de lista de duplicatas
na mão, ficamos com a mesma idade de Davi e Miguel.
Em Caruaru, não vamos sozinhos. Vamos todos juntos: Avós,
filhos, e netos, todos na mesma emoção: completar o álbum da Copa. No início, o
pai de Davi pegava aqueles montes de figurinhas que eram duplicatas de outro,
quem sabe, avô (não há muito distinção porque é tudo da mesma idade) e tinha um
trabalho danada para conferir junto com uma lista quais a que o álbum do Davi
já possuía e as que não. Isto até descobrir que o Davi sabe de cor o que ele
tem e não tem no álbum. Eu mesmo duvidei que isto pudesse ser verdade porque
ele já tem mais de 500 figurinhas nele. Aliás, inicialmente ninguém acreditava.
Fui, como um idiota São Tomé, ver para crer. E vi, o Davi cercado de pessoas
pegar um maço de 100 ou 200 figurinhas, seu pai ir passando e ele dizendo:
- Tenho, tenho, tenho,
tenho, tenho, tenho, não tenho....
Neste ponto, ainda cético da capacidade da memória do meu
neto, pedia para parar e ia conferir no álbum: Batata, o álbum não tinha. E
assim foram repetidas vezes ao ponto de hoje não precisarmos mais das listas. A
alegria do Vovô Zé fica incontida, ao ponto de querer chamar o Davi “O menino que sabia demais”, lembrando de
um filme que assisti lá no Cine Rex quando tinha quase a mesma idade que tenho
hoje, 12 anos.
E o Miguel, ainda com menos de 3 anos, já participa da
brincadeira, embora não tenha ainda a expertise do irmão. Não sei quem ensinou
a ele o que ele demonstrou ao olhar o álbum e ouvir o Davi dizer:
- Este é Buffon,
goleiro da Itália!
Ao que Miguel retrucou:
- Davi, não é o
Buffon, é o Peidon!
Há alguém que fique sério com este comentário? E a diversão
continua quando ele se sentindo também o centro das atenções pergunta para Vovó
Marli:
- Eu sou uma “figuraça”, não é Vovó?
É, meus netos são umas “figuraças”.
E ainda não começou nem a Copa do mundo, na qual eles virão aqui para Recife,
para daqui, assistirem aos jogos da Arena Pernambuco. Dizem até que vão levar o
Vovô Zé a um jogo, coisa que eu não iria sozinho de jeito nenhum com medo da “mobilidade” urbana, este monstro que
assusta a todos, e particularmente a pessoas como eu que não são boas no
trânsito, e cujos neurônios já não comportam tantos grandes eventos. Mas..., “eu não vou, vão me levando, e deste jeito,
com os netos tenho que ir”. E, só para concluir, por hoje, e acreditando na
inteligência e vivacidade do Davi, na última vez que conversamos sério, foi
para fazer uma tarefa da escola, onde havia um local para colocar a data. Quase
que ia dizendo a ele porque achava difícil, na idade dele (e também na minha)
ele saber a data correta. Mas, quando lá olhei estava lá a data: 31. Fui olhar
no calendário e estava certíssima. Então perguntei:
- Davi, como é que tu
sabes que é 31?
- Porque ontem foi 30,
Vovô Zé!
Desta vez ele não me chamou de burro, mas, poderia ter feito.
Afinal, temos a mesma idade.
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