Por Carlos Sena (*)
Sempre nutri simpatia pelos
animais, principalmente aqueles pouco ortodoxos na linha da criação doméstica.
Normalmente se gosta de gato e de cachorro e eu também gosto. Mas, acho que no
reino dos bichos bicho é bicho, embora no reino dos humanos haja também
ramificações em que bicha é bicha. Misturam-se coisas de lá com coisas de cá. A
relação é muito íntima entre os humanos e o reino animal. Talvez nem seja por
conta do carinho que possam ter um pelo outro, mas porque o raciocínio dos
humanos precisa ser consolidado em símbolos e os animais se prestam bem pra
isso. Os humanos são mesmo assim – cheios de “nós pelas costas” quando querem
se comunicar jocosamente ou com certa dose de seriedade. Mulher melancia: logo
sabemos que é por conta da bunda grande. No mesmo sentido, mulher Pera, Mulher
Melão, Mulher “sexta básica de frutas”... Homem galinha – designativo óbvio do
homem mulherengo. Viado, frutinha, falso a bandeira, frango, etc. Por outro
lado, homem forte é Leão. Mulher namoradeira e “dadeira” é vaca. Mulher nova é
uva e mulher velha é um abacaxi. Mulher nova também é chamada de chuchu. Houve
um tempo que se chamavam também de pão. Nesse caso, pão era o homem ou a mulher
na condição de broto. Agredir uma mulher chamando-a de Anta tem sido
comuníssimo. Mas quando um homem ou uma mulher são falsos, perigosos, gostam de
jogar pessoas contra outras, normalmente dizermos serem cobras. Quando são
pessoas “passadas na casca do alho”, então se chamam cobras criadas. Já as mulheres
experientes quando se referem a elas mesmas pejorativamente, chamam-se de “puta
velha” no assunto ou coisa semelhante. Contudo, há um designativo pejorativo às
mulheres homossexuais muito comuns nalgumas cidades do interior pernambucano:
“pitombas”. Essa expressão se dá porque a fruta pitomba só dá em cacho e as
mulheres gays sempre só andam em grupo – portanto em “cacho”... Nesse mesmo
diapasão, chamá-las de “chupa charque” é muito agressivo, mas é uma expressão
com alguma dimensão nas rodas. Pra não me esquecer, mulher exagerada no vestir
e na “decoração”, além do cabelo loiro é Pirua. Assim mesmo com “i” senão perde
a graça. Homem molengo, daqueles que a mulher chifra e ele abafa, normalmente
são “bananas”, ou mesmo quando não rola chifre, mas o homem é lerdo, cai bem a
pecha de “banana”...
Nesse emaranhado de simbologias
acerca do homem e da mulher, também me peguei imaginando no cágado. Pobre
cágado. Sempre fica lá no fundo do quintal carregando sua “casa nas costas”,
despertando todo tipo de curiosidade. As crianças até gostam dele, mas ele
perde feio para o gato e o cachorro no quesito animal doméstico. Gosto do
cágado – do seu olhar tristinho, do seu caminhar lerdo, dos seus olhinhos
pretos nem sempre vendo tudo. Primeiro porque eu não sabia ainda a diferença
entre cágado e Jabuti. Parei este texto e fui ao Google: “Jabuti - Água não é
com ele. O jabuti é o único entre esses três tipos de quelônio que vive
exclusivamente na terra. Ele também pode ser facilmente identificado pelo casco
alto e pelas patas traseiras em formato cilíndrico, que lembram as de um
elefante. Cágado - distingue-se do jabuti por ser um quelônio de água doce e
não terrestre. Já as diferenças em relação às tartarugas são sutis. Os cágados
possuem casco mais achatado e têm o pescoço mais longo”...
Mais ou menos sabedor das
diferenças, fiquei encafifado com o gênero dele, do cágado. Como será o
masculino e o feminino dele? Cágada? Cágado macho ou Cágado fêmea? Pobre do
cágado, se a gente esquecer o acento agudo ele vira bosta: cagado. Na gramática
parece mesmo ser comum de dois gêneros. Independentes, gosto mesmo de chamar a
fêmea de cágada. Uma cagada minha do ponto de vista gramatical? Pode ser. Fato
é que estou mesmo querendo dar uma boa cagada, com a permissão do cágado.
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(*) Publicado no Recanto de
Letras em 11/03/2013
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