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terça-feira, 14 de junho de 2011

CRIADO COM VÓ




Por Carlos Sena (*)

“Ele não é gay. É que foi criado com vó”. Esse clichê popularesco bem ao gosto do Almanaque Biotônico Fontoura é típico de pessoas sem muito conteúdo conceitual sério acerca das diferenças. Ele está inserido num conjunto de outros tais como: “Ele não é gay, mas é fino, bem educado”; “Ele é tímido e, além disto, é filho único”, etc.

De todos, o “CRIADO COM VÓ” é o que mais me simpatiza nesse tear de preconceito disfarçado, muito parecido com o “Negro de alma branca” propalado por pseudo anti racistas de plantão. Um Gay pode até ser criado com vó, como pode ser fino, educado e filho único, não necessariamente nessa ordem. Esquece-se, quase sempre, que os estereótipos que codificam comportamentos sexuais fora dos padrões sociais estabelecidos não têm valor substancial, exceto para aliviar a culpa que o preconceito deixa por falta de embasamento intelectual de muita gente. Qualquer pessoa criada com vó pode ser diferente desse enquadramento cartesiano; qualquer filho único poderá ser extremamente machista inclusive exagerando nesse padrão. Do outro lado dessas “moedas” poucos fazem questão de observar:

a)      Numa família de nove filhos tem um que é gay: onde foi que os pais erraram?
b)      Noutra família com oito filhas mulheres e apenas um filho homem que é hétero, onde está o acerto?
c)       Famílias que só tem filhos homens e um deles é gay, onde entraria a regra geral de que o meio define a sexualidade?
d)      Três meninos foram criados com vó, mas nenhum deles é gay. Por que essa regra geral também não se repete?
e)      Numa família de nove filhos homens, dois deles são gays, onde estaria o duplo erro da criação dos pais?

Outros exemplos poderiam ser elencados, mas os mencionados nos dão bem uma visão de como o preconceito com a sexualidade heterodoxa preocupa muita gente que, sem o devido preparo para compreender as diferenças, preferem se tornarem em “palmatórias do mundo”.

No Recife há um caso que bem se pode referenciar neste sentido, exatamente por ser antológico: uma moça pobre se casa com um rapaz de classe média que era o que chamamos hoje de gay do armário. Moravam num bairro pobre da periferia, exatamente num morro, onde criaram seus três filhos. No decorrer do casamento a esposa descobre que o marido era “do babado”, mas preferiu entender que ele era o “ativo da história”. Desta forma ela encontrava uma justificativa atenuante que a ajudou a manter o casamento. Chegou ao ponto em que a casa do casal se transformou em verdadeiro local de encontro das bichas. Lá cortavam cabelo, se montavam para as festas, cuidavam da maquiagem e das unhas, etc. A coisa positiva disto tudo, dentre outras, é que ele, o marido, não saia sem a sua mulher do lado. O que ele provavelmente fazia é curtir com discrição os seus namorados. Nesse emaranhado de relações afetivas e fraternas tão plurais, todos que freqüentavam a casa do casal eram unânimes em dizer que os filhos seriam gays. Talvez essas elucubrações fossem calcadas em cima da teoria social do homem enquanto produto do meio. Ledo engano: os filhos hoje estão criados. Casados e com filhos, nada têm de gays em seus comportamentos, sequer alguns traços característicos de quem é “criado com vó”. Neste sentido, a avó dos meninos era uma pessoa que dividia a criação dos netos. Atualmente, a viúva vive muito bem com os seus filhos após a morte do marido há anos. Como nós presenciamos um pouco dessa história, podemos reforçar a tese de que a sexualidade poderá até ser apressada em função do meio. Contudo, dificilmente esse meio será o formador de filhos gays como se costuma apregoar por absoluta falta de embasamento teórico conceitual. Por isto, discordamos de uma corrente conceitual ainda utilizada por muitos: “OPÇÃO SEXUAL”. Ninguém faz opção por ser hétero sexual, nem homossexual. Neste sentido, toma força a corrente científica que a sexualidade é definida na formatação genética dos indivíduos. Isto dentro da mesma ótica de que nascemos com olhos pretos, verdes, azuis; nascemos brancos, pretos, altos, magros, inteligentes ou limitados no pensar, etc., sem que se entenda ser isto “doença”, como se pensa acerca da sexualidade homo.

“CRIADO COM VÓ” poderá conter tudo e nada. Tudo na medida em que se agride até a própria vó, como se ela não servisse pra nada, exceto para influenciar na “fabricação” de netos gays. Nada, se a gente não se contenta no conceito fácil, itinerante como os vendedores de raízes das feiras livres de Caruaru. Dizer que um rapaz é delicado porque foi criado com vó, disfarçando para não chamá-lo de gay é ignorância pura; é desfaçatez pura; é preconceito puro; é verdade adulterada como água na gasolina.

A teoria do “armário” está corrente na mídia e até que nós simpatizamos com ela. Essa teoria, embora beirando o popularesco, serve para descaracterizar os estereótipos frontais que servem de pecha para identificar (preconceituosamente) gays, bibas, boiolas, etc. Para quem conhece alguns homens que moram no armário, sabe que eles na sua intimidade “rodam a baiana”, “cantam Babalu em Grego”, mantêm relações paralelas na clandestinidade, etc. Como se vê, a sexualidade pode até está na “cara literalmente”, mas nem sempre servem para generalizações. Neste sentido, uma mulher pudica, que passa imagem de esposa amantíssima, poderá na sua intimidade trair o marido e ser igual a uma prostituta do baixo meretrício. Afinal, a teoria de que “não basta não ser, mas ter que parecer” vale para isto.

Esperamos que um dia nós, habitantes do terceiro milênio, nos resolvamos e optemos pela felicidade acima de qualquer rótulo. Exercitemos a convivência entre os diferentes; denunciemos a exploração do capital, a corrupção dos políticos, a chantagem dos pastores do CU – Cofre Único das igrejas irmanadas na exploração da falsa moral, o efeito estufa, a violência urbana, o tráfico de drogas, etc.

PS.: Em cor de rosa pra não contrariar o estabelecido.
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(*) Publicado no Recanto das Letras em 06/06/2011- Não publicamos em rosa, como no original para manter o padrão de cores do Blog.

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