“Intolerância
política
POR MERVAL
PEREIRA
O presidente
Jair Bolsonaro deu várias mostras nos últimos dias daquilo que já havia sido
evidenciado desde o início do governo: o que considera lealdade é mais
importante para ele do que competência. E de que não admite diversidade de
pensamentos em qualquer instância do governo.
O que ele fez
com o presidente do BNDES, Joaquim Levy, foi demiti-lo publicamente ontem, ao
anunciar que ele está “com a cabeça a prêmio” há muito tempo, e que já está
“por aqui” com ele, que não estaria cumprindo o que combinara ao ser nomeado.
Isso porque Levy
indicou para uma diretoria do BNDES Marcos Pinto, que trabalhou na gestão de
Lula como chefe de gabinete de Demian Fiocca na Presidência do BNDES, de quem
era assessor quando Fiocca foi vice-presidente.
Fiocca
encaminhou a indicação de Marcos Pinto para a diretoria da CVM em 2012, na
gestão de Guido Mantega. Essa relação de Marcos Pinto com a gestão petista
irritou Bolsonaro, que exigiu publicamente sua demissão, ameaçando demitir Levy
amanhã se não cumprisse sua ordem.
Por trás da
confusão com Marcos Pinto está a irritação de Bolsonaro com o próprio Levy, a
quem aceitou no BNDES por insistência do ministro da Economia Paulo Guedes. A
desconfiança do presidente recai até sobre pessoas que o auxiliaram muito de
perto, como os ex-ministros Gustavo Bebiano e o general Santos Cruz, de quem
era amigo há 40 anos. Faz jus a um conselho que recebeu de seu pai, que dizia
para confiar apenas nele e na sua mãe.
Foram vítimas de intrigas do mesmo grupo, comandado pelo filho Carlos e pelo
guru esotérico Olavo de Carvalho.
O ministro da
Justiça Sérgio Moro também passou pelo mesmo problema que atinge agora o
ministro da Economia Paulo Guedes. Os dois supostamente tiveram carta branca de
Jair Bolsonaro para escolher seus assessores, e foram desautorizados pelo
presidente.
O caso de Moro
foi menos grave do que o de Guedes agora, mas exemplar de uma intolerância
incomum nos governos recentes, com exceção de uma atitude pontual de Michel
Temer, que demitiu um garçom nos primeiros dias de presidente por considerá-lo
um espião petista.
Moro foi
obrigado a cancelar a nomeação da cientista política Ilona Szabó para o
Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. Presidente do Instituto
Igarapé que estuda violência urbana e propõe medidas como desarmamento e
descriminalização das drogas, a ideia da nomeação era justamente colocar uma
voz divergente no Conselho, para que ele exercesse seu papel em plenitude, isto
é, debater teses e sugerir opções ao ministro.
Nos governos
anteriores, Francisco Weffort, fundador do PT, foi ministro da Cultura de
Fernando Henrique por 8 anos; os economistas Marcos Lisboa e Murilo Portugal
foram assessores importantes de Palocci quando era ministro, e o próprio
Joaquim Levy foi ministro da Fazenda de Dilma.
Os petistas
boicotaram os economistas que consideravam tucanos, mas só Levy foi demitido.
Dilma era mais próxima de Bolsonaro em termos de intolerância política do que
Lula, que sabia aceitar assessores que não fossem petistas de carteirinha.
Com a crescente
autonomia do Congresso em relação ao Palácio do Planalto, Bolsonaro parece
estar retomando uma política de contato direto com o eleitor, que tentara no
início de sua gestão. Radicalizando posições para contentar seu núcleo
principal de eleitores
O próprio
ministro Paulo Guedes, que no início do governo disse que daria “uma prensa” no
Congresso e teve que recuar, voltou a tentar pressionar os parlamentares com
críticas duras contra a proposta da Comissão Especial da Previdência.
O mais provável
é que queira passar a ideia de que não gostou da proposta, para que os
deputados tenham a sensação de vitória sobre o governo e não façam novas
alterações.
Também ontem,
Bolsonaro usou o Twitter para pedir que a população pressione os senadores para
manterem seu decreto que flexibiliza o porte de armas.
A Comissão de
Constituição e Justiça do Senado decidiu revogar os decretos que permitem o
porte de armas de fogo a cidadãos e colecionadores, atiradores desportivos e
caçadores.
O presidente,
que já dissera que não acreditava que os senadores fossem votar “contra o
povo”, agora pede que os eleitores os pressionem.”
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