Por Zezinho de Caetés
Ontem falei um pouco de Economia,
mostrando o Trumponomics, e hoje
volto ao tema embora seja um pouco misturado entre economia, política e falta
de vergonha. Aos meus leitores eu não diria, como o sempre citado assessor
americano de Bill Clinton: “É a Economia, estúpidos!”, mais diria, “É o Brasil, enganados!”.
Todos que me acompanham sabem que
eu sou fã de um Estado Mínimo á Brasileira, sem querer imitar o General Geisel
quando adotou a Democracia à Brasileira. É porque o Estado aqui inchou tanto,
que se ele se tornar mínimo como poderia ficar num país mais capitalisticamente
desenvolvido, poderia matar o doente.
Pois não que, como escreve abaixo
o Carlos Alberto Sardenberg, hoje no O Globo (“O governo não paga ao governo”), até o governo está dando calote no
governo e com a anuência do nosso Judiciário? Vejam lá e pensem no tamanho de
nossa crise, se pensarmos em consertar nosso país, como pensam todos os
políticos, embora só nas boas intenções ditas nas redes sociais e outros meios
de comunicação, do ponto de vista moral.
E o Estado Mínimo se torna, além
de um sonho, um sonho distante, pois não conseguimos sair do nosso pesadelo. Já
se sabia, e a Lava Jato agora está provando, que há uma correlação positiva e alta
entre corrupção e tamanho do Estado ou governo em todos os níveis. O
capitalismo brasileiro é mais dependente do governo do que na China, dito um
país comunista.
O empresário brasileiro, como as
exceções que justificam a regra, vive como o governo, pelo governo e para o
governo, e a corrupção acompanha. Hoje, vi que o Eike Batista está sendo
procurado pela Polícia Federal, numa operação chamada Operação Eficiência. O
nome deve ter vindo da ineficiência gerada pela corrupção como ela é praticada
no Brasil.
E, como verão abaixo, os
governantes, de prefeitos a presidentes, passando por outros poderes,
encontraram um novo caminho para resolver seus problemas, o governo dá calote
no próprio governo. Ou seja, hoje ninguém paga a ninguém e sobra para o
contribuinte que também não paga por causa da crise.
E podemos dizer hoje que dar
calote é crime? Vejam o que diz o Código Penal:
“Art. 176 - Tomar refeição em restaurante, alojar-se em hotel ou
utilizar-se de meio de transporte sem dispor de recursos para efetuar o
pagamento:
Pena - detenção, de quinze dias a dois meses, ou multa.
Parágrafo único - Somente se procede mediante representação, e o juiz
pode, conforme as circunstâncias, deixar de aplicar a pena.”
Como todos meus leitores sabem,
eu não entendo muito de juridiquês, mas, entendo de calote, pois sofri alguns
durante a vida. E será que um governo deixar de pagar o outro também não seria
crime?
Pensando no que disse e repito
aqui há tempos, junto com o economista John Friedman, que não há almoço grátis, fica mais evidente ainda a relação dos
calotes governamentais com o nosso Código Penal. Mas, quando informa o
Sardenberg que o juiz que deveria aplicar a sentença diz que está tudo bem, e
que o cara não pagou porque comeu demais no dia anterior, voltamos tudo à
estaca zero.
Ou seja, adeus à Lei de
Responsabilidade Fiscal e até aos bons costumes, pois lá no meu interior eu
levava umas palmadas quando não pagava pelas mangas que tirava do pé do nosso
vizinho. E penso que até Dona Lindu fazia o mesmo com o meu conterrâneo o Lula.
Eu aprendi, já ele eu não sei.
Fiquem com Sardenberg e vejam que
o dito citado acima deveria mesmo ser: “É
a vergonha na cara, estúpido!”.
“Tempos atrás, recebi um convite
para dirigir o lançamento de uma publicação de economia. A editora era a
Manchete, e já corriam informações sobre a difícil situação financeira da
empresa. Perguntei sobre isso a um dos diretores, que tratou de me
tranquilizar: está tudo em dia, salários, papel; nós só não pagamos ao governo.
Muitas empresas viviam assim.
Simplesmente não recolhiam impostos, nem pagavam os financiamentos obtidos em
bancos públicos. Seguiam em frente fazendo negociação em cima de negociação,
sempre com base nas boas relações com o governo de plantão.
Hoje ainda tem disso, mas a
novidade está no setor público. Prefeitos e governadores usam cada vez mais a
velha regra: não pagam ao governo. Ok, já faziam isso antes, mas a coisa tomou
um volume insustentável.
Por exemplo: em 2005, o governo
federal negociou dívidas das prefeituras com o INSS. Administrações não
recolhiam a contribuição patronal e não repassavam ao INSS a contribuição
recolhida dos empregados celetistas.
Quatro anos depois, o governo
federal topou renegociar as dívidas antigas e as novas. Naquele ano, com dados
mais precisos, a Receita Federal calculava que as prefeituras deviam R$ 14
bilhões à Previdência.
Pois sabem qual é a dívida hoje?
R$ 100 bilhões.
E claro, as prefeituras não
querem pagar. Em vez disso, começam a adotar a tática iniciada pelo governo do
Rio, um decreto de calamidade pública financeira.
Isso tem se tornado tão comum que
a gente nem repara mais no absurdo da situação. Mas deveria.
Calamidade pública, todo mundo
sabe o que é. Chuvas, secas, uma baita epidemia. Nesses casos, os governos
“decretam” a calamidade, instrumento que permite usar dinheiro não previsto no
orçamento, podendo descumprir momentaneamente as regras de responsabilidade
fiscal, que preveem punições para quem gastar além de determinados limites.
Já esse decreto de calamidade
financeira é uma invenção nacional. As finanças podem estar de fato em situação
calamitosa, mas como se chegou a isso? Com a má gestão, com gastos em contínua
elevação mesmo quando as receitas estavam em queda. Ou seja, total
descumprimento das regras legais.
Ora, o que pretende o decreto de
calamidade financeira? Permitir que a prefeitura ou o governo estadual não
cumpram justamente a Lei de Responsabilidade Fiscal. É um decreto para
legalizar um crime já praticado.
Administradores alegam que foram
apanhados de surpresa pela crise econômica nacional, que derrubou a arrecadação
de impostos. Como se fosse uma chuvarada repentina.
Ora, se já dá para prever e,
pois, se prevenir do mau tempo, é muito mais fácil perceber que uma crise se
aproxima e tratar de economizar nos gastos.
Não fazem isso. Continuam
gastando e quando chegam ao limite, sem dinheiro para mais nada, decretam que
não podem mesmo pagar. O primeiro a não receber é sempre o próprio governo: o
INSS, a Receita Federal, os bancos públicos.
Assim, caímos numa farra fiscal,
sequência de ilegalidades. Grave, pois a onda chegou ao STF. A própria
presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia, suspendeu o cumprimento de
cláusulas contratuais entre a União e o Estado do Rio, proibindo que o governo
federal bloqueasse R$ 370 milhões das contas estaduais. O dinheiro era para
cobrir prestações de dívida que o Rio não pagara. O bloqueio está expressamente
previsto na lei e nos contratos de renegociação de dívidas. Mais: a União não
pode financiar os estados — financiamento que acontece quando perdoa pagamentos
de prestações de dívida e concede empréstimo novo para unidade da Federação que
não cumpre a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Ou seja, a ministra endossou uma
ilegalidade. OK, a situação do Rio é calamitosa, mas se vale a regra de que o
governo não precisa pagar ao governo, a calamidade vai se espalhar.
Aliás, a renegociação da dívida
fluminense está travada exatamente por isso: falta base legal para a União
suspender pagamento de dívidas antigas e fazer empréstimos novos.
Estão tentando dar um jeito — é
complicado. Será preciso que o Congresso aprove uma lei complementar, criando
um “regime de recuperação fiscal”, que permitiria financiamentos federais, da
União e dos bancos, em troca de contrapartidas fiscais dos estados. Sem essa
lei, a renegociação será crime contra a responsabilidade fiscal — algo que
derrubou Dilma.
Se os diretores do Banco do
Brasil, por exemplo, autorizarem empréstimos a estados falidos, sem a nova lei,
cairão nas malhas do Ministério Público.
De todo modo, o mais importante,
se algum acordo legal for conseguido, está não no refinanciamento, mas em como
os governos estaduais e municipais vão fazer os ajustes. São as contrapartidas,
as medidas efetivas de redução de gastos e ganhos de eficiência.
E um bom começo para ajeitar isso
de modo legal e correto seria a ministra revogar aquela decisão. Pois se um
estado pode não cumprir a lei e o contrato, os outros também podem, não é
mesmo? E aí, caímos numa calamidade de verdade, quando os governos não pagam a
mais ninguém, com decreto ou sem decreto.”
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