Por José Antonio Taveira Belo / Zetinho
Sentada no terraço da sua grande
casa, nos arredores do bairro Poço da Panela, à tardinha. Cercada por um muro
alto cheio de heras verdinhas aparadas, uma cerca elétrica vigiada por uma
câmara para maior segurança. Bastiana corria os olhos para o pequeno menino que
corria pelo gramado ao redor da casa. Seu neto, Demazinho com o seu coleguinha
de escola que fora passar a tarde brincando. Rolavam na grama aparada pelo Boca
Mole. O sol já baixando no final da tarde e os passarinho voltando para os seus
ninhos nas arvores que circundava a sua bela casa. Não gostava que chamasse
mansão e sim casa mesmo. Mesma afortunada era pessoa simples. Bastião deitado
em sua rede pensando não sabe o quê. De olhos fechados provavelmente sonhando
com a vida que estava levando. Eufrásia, varrendo toda a casa. Zezé arrumando e
passando óleo de Peroba nos moveis e Boca Mole cuidando do jardim. A piscina ao
lado, com varias mesas com sombreiros azuis e cadeiras de descanso ao redor,
era cuidada por uma firma que comparecia de quinze e quinze dias para
higienizar. Era um sonho, mas ao mesmo tempo uma realidade ali a vista. Começo
a recordar do tempo passado. Vivia morando em uma palafita na beira do
Rio Capibaribe do bairro dos Coelhos. A miséria estava em todo recanto. Não
tinha comida, roupa limpa e o que arranjava era batendo de porta em porta
implorando a caridade das pessoas. Muitas das vezes ia até o Box do Seu
Ezequiel pedir ou comprar fiado, quando ele confiava. Nem todas às vezes isto
acontecia. Quando arranjava alguma coisa para fazer, ficava contente,
principalmente, quando limpava alguma residência e ganhava algum dinheiro. Ia
imediatamente para mercearia comprar alguns mantimentos para diminuir o
sofrimento. Neste dia era dia de festa no pequeno espaço que residia, se isso
podia dizer. Bastião recolhia papelão, garrafas, jornais velhos pelas ruas
puxando uma carroça. Ouvia muita pilheria e desaforo dos motoristas, não ligava
estava ali para ganhar algum dinheiro, ninguém sábia o seu sofrimento, era
terrível. Mas dava a todo instante graças a Deus por ter saúde para batalhar
naquele trabalho simples – Deus ajuda a quem madruga, dizia sempre enxugando o
suor que escorria pelo rosto em pleno meio dia, ensolarado. Era um belo
pensamento. Toda semana brigava comigo. Ô Bastiana não tem vergonha de jogar
loteria? Nem todo dia temos dinheiro para comprar o pão? Como é que tu gasta
este dinheirinho? Deixa estar, um dia vou ganhar na loteria e sair deste
aperreio, dizia – Deus consente, mas não para sempre. Fazia um muxoxo e ia para
a janela observar os pescadores nas suas jangadas, no rio já poluído com muito
lixo jogado pela comunidade. Sentia falta de algo que pudesse melhorar a vida,
mas não tinha estudo, o meu marido também iletrado e desta forma tinha que
sofrer com a vida que escolheu. Sempre fora a Igreja do Santíssimo Sacramento,
na Praça Maciel Pinheiro. Não pedia nada a Deus, porque Deus já lhe tinha dado
saúde para a família. A pobreza é uma consequência e por isso devemos agradecer
a Deus por todos os dias. Não vamos nos maldizer, também não vamos nos
acomodar, vamos trabalhar, até quando? Não sei. Como eu fazia, na sexta feira o
ultimo dinheiro para comprar o pão, disse – hoje não vai ter pão, vou jogar e
vou ganhar. Com aquele pensamento positivo e sofredor e sabendo da bronca do
Bastião, saiu e foi até a casa lotérica e marcou os números 13, 17, 35, 44, 50
e 60 o ano de sua idade. Pagou e foi para casa. Apreensiva e com a consciência
pesada, mas não ligou. Bastião neste dia trouxe algum dinheiro para casa fruto
do seu trabalho. Comprou pão, açúcar, café e margarina. Bastiana guardou
escondido o bilhete, no seu pensamento, já premiado, em uma sacola pendurada na
parede. Esqueci-me de conferir no dia. Passado alguns dias eu tirei a sacola da
parede e vi o bilhete, e deu-me vontade de conferir. Larguei tudo e fui à casa
lotérica, sem nenhum apostador. Corri os olhos na tabuleta com o resultado e
fui pouco a pouco pronunciando – treze, dezessete, trinta e cinco, quarenta e
quatro, minhas mãos tremia e o suor frio descia pelo rosto, cinquenta eu já não
me controlava dava-me uma dor tão grande no peito que quase desmaiei quando
pronunciei sessenta. Ganhei. Segurei-me no balcão e voltei para casa sem saber
o que fazer. Esperar por Bastião para lhe contar que tinha ganhado na loteria. Nesta
noite não dormimos. Logo ao amanhecer estávamos acordados, ansiosa para irmos a
loteria reconfirmar os números sorteados. Às oito horas, logo que a casa lotérica
abriu, fomos direto para o mural e conferirmos repetindo os números que ali
estavam. Saímos loucos de alegria. Não sabíamos o que fazer se caminhava ou
corríamos. Vestimos o nosso melhor vestuário pobre e seguimos para a Caixa Econômica,
na Avenida Guararapes. Muita gente. Logo na entrada fomos barrados pelo guarda,
pela nossa aparência. Que é que vocês querem, pergunta o guarda. Quero falar
com o gerente. De que se trata? Somente ele pode resolver o nosso assunto.
Desconfiado o guarda mandou sentar em uma cadeira azul fofinha coisa que muito
não fazia. Esperamos uma hora e meia. Ninguém atendia. Uma moça perguntou o que
vocês desejam? Queremos falar com o gerente. Ele está ocupado e vai demorar lhe
atender, espera? Espero sim senhora. Perto de meio dia, um senhor engravatado
nos chamou. O que deseja? Doutor nós ganhamos na loteria. Veja! Estava
acompanhado do filho mais velho que chegou para lhe ajudar. O gerente pegou o
bilhete e conferiu na tela do computador. Olhou para eles e sorriu. Grande
sorte. Vocês estão ricos. O premio milionário chegou suas mãos. Vou lhe
aconselhar e vou abrir uma conta em seu nome para depositar este valor
milionário. Oitenta e cinco milhões de reais. Ela ficou pálida, o Bastião acompanhou
a palidez da esposa e tomaram um copo d’água. A partir daquele momento fomos
tratados como rei e rainha. Vocês vão ter uma renda mensal mais ou menos de
cinco a dez milhões por mês. O que vocês desejam agora, neste momento? Queremos
comprar uma casa. A Caixa vai procurar uma boa casa para a senhora e seu
marido. Trouxeram alguns papeis e foi difícil assinar, somente sabia o meu nome
devagarinho. Adiantaram-me alguns dinheiros para comprar o necessário,
compramos roupas e sapatos decentes no shopping onde nunca tínhamos entrado.
Lojas bonitas com roupas e sapatos na vitrine. Almoçamos como nunca num
restaurante com a família, meu filho, sua mulher e meu neto. E agora vamos comprar uma casa e mobilha-la e
viver o resto da nossa vida, sem muito aperreio. Muita gente soube do
acontecido na comunidade quando me mudei, mas antes fomos realizar uma viagem
ao Rio de Janeiro para abaixar a poeira. Hotel de luxo e muitas vezes os
recepcionista olhavam com desdém para a nossa aparência, não sabiam eles que
agora nós éramos ricos e podíamos nos dar ao luxo, de viver o que nunca
vivemos, sem alarde. Ajudei muitas
pessoas quando voltei deste passeio, não somente no Rio mais em outras capitais
do Brasil. Eu continuo a ajudar, pois Deus me deu a graça de estar bem de
vida, milionária. As pessoas vizinhas ricas quando soubera, começaram se aproximar principalmente com
convites para isto ou para aquilo, nada me comoveu. A sociedade só dá valor a
quem tem, agora que eu tenho todos se aproximam com mimos e risos falsos. Sofri
muito, hoje tenho tudo que eu quero, mais principalmente, o que desejo é muita
saúde. Saiu para tomar o café com a mesa farta junto com os seus auxiliares,
pois todos comiam na mesma mesa.
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