Uma reforma constitucional. A PEC dos Sem Nomes

Por Zé Carlos

(continuação e final, ufa!)


Uma reforma constitucional

Quem aguentou acompanhar este texto desde o início, e penso serem poucos, pois o assunto é difícil de ser tratado de maneira simples, a não ser que queiramos apelar para os raciocínios simplistas daqueles que se borram de medo do anonimato, quando dizem que é um ato de covardia, já devem saber agora que o anonimato não é um mal em si.

Como qualquer atitude do ser humano, o anonimato possui cargas positivas e negativas. Tal qual outras atitudes corriqueiras, sejam elas “assinadas” ou não. O que defendo é o direito da pessoa dizer ou agir de forma anônima, se assim ela achar conveniente. Vejam que não defendo aqui que sempre se aja de forma anônima, ou que, assim fazendo, sempre se faça o mal ou críticas negativas. Muitas vezes, o anonimato deve ser usado para fazer o bem e fazer elogios dos mais rasgados. Isto é um princípio cristão. Aquele que faz o bem e sai do templo alardeando o tamanho do óbolo que deu é um fariseu. E aquele que faz elogios rasgados a alguém pode ser apenas um “baba ovo”, como existem tantos.

O que propomos aqui, aproveitando este importante evento do II Encontro de Blogueiros de Bom Conselho, é a sugestão de uma emenda constitucional que proponha o seguinte:

“O item IV do Art. 5 da Constituição Federal terá a seguinte redação:

IV - é livre a manifestação do pensamento;”

Tenho certeza de que daríamos mais clareza a nossas leis e aos nossos juízes, que teriam seu tempo mais livre para procurar os verdadeiros criminosos, sejam eles anônimos ou não. Como agora ocorre, apenas aqueles que declaram CPF e RG, tem o direito de falsificá-los para praticarem seus crimes anonimamente, sem nenhum temor.

Além disto, evitar-se-ia que os nossos legisladores perdessem seu tempo na elaboração de leis, na maioria da vezes inúteis, para obrigar as pessoas a dizerem seus nomes na internet, tirando um grande potencial do nosso sistema político para ser uma verdadeira democracia.

Em relação a isso, eu não poderia deixar de citar aqui, o desperdício de assessores parlamentares do deputado pernambucano Eduardo da Fonte (PP), num projeto de lei (O projeto de lei nº 7311/2010) de sua autoria que começa dizendo:

"Art. 1° - É vedado o anonimato em sítios da Internet no Brasil.

§1º. Os sítios da Internet no Brasil devem indicar obrigatoriamente na sua página principal informações que identifiquem o jornalista responsável e o endereço completo para o recebimento de correspondências, citações, intimações ou notificações judiciais."

Vejam bem meus senhores, a que chegamos. Eu não sei o endereço do deputado e não quero saber, pois nem pensaria, depois desta, em conhecê-lo ou votar nele, mas poderia obtê-lo tão facilmente? Este Blog já é conhecido do Blogger e outros órgãos da internet, que podem me localizar facilmente. O Deputado quer que eu estampe meu endereço na frente do blog para evitar o anonimato. Mas, senhores, vejam quantas pessoas escrevem neste blog. Deveria eu publicar o endereço de todos ou só de alguns? Se a lei passa, cuidem-se Carlos Sena, Zetinho, Lucinha Peixoto, Maria Caliel, Zé Pelintra, Zé Povoas, Pedro Ramos, Gardênia, e tantos outros que aqui se manifestaram, se manifestam ou se manifestarão.

Eu até não sou contra a que se regulamente o uso da internet no Brasil, mas, isto deve ser feito por pessoas que entendam o que é a internet, o que ela significa em termos técnicos, políticos e sociais. E que nesta regulamentação não conste nem uma vez o termo “anonimato” e nem seja preciso publicar CPF e RG para dizer asneiras a seu respeito. Pelo meu Método Econômico, pela mais pura hermenêutica constitucional, algum juiz eleitoral deveria impugnar uma nova candidatura do deputado, por ser prejudicial à liberdade de expressão, e portanto contra a Democracia em nosso país.

Outras tentativas mais idosas de regulamentar a internet já chegaram, como o famoso Projeto Azeredo, que foi alcunhado como o AI-5 da informática e que penso e desejo tenha caducado nas comissões do congresso. Há ainda uma promessa do Marco Civil da Internet, que melhora o tom mas, ainda não encontrou o certo. Quando tiver mais algum tempo comentarei estes e outros esforços.

Só para terminar devo dizer, e talvez repetir, que mesmo não me utilizando do recurso do anonimato,  e nem o defendendo para fazer o mal, DEFENDO O DIREITO DE PRIVACIDADE E DE LIBERDADE DE EXPRESSÃO, MESMO QUE PARA ISTO ALGUÉM TENHA QUE USAR DO ANONIMATO. Enquanto, nossa Constituição mantiver o princípio e ao mesmo tempo negá-lo, eu fico com a parte que deixa as pessoas livres para se expressarem como quiserem, mesmo que não tenham RG ou CPF, verdadeiros ou falsificados.

DATA VENIA dos doutos da lei e dos profetas do apocalipse, não se deve temer o anonimato e sim aqueles que fazem o mal, anônimos ou não. Covarde não é quem se expressa anomimamente, e sim aquele que tem medo do que o anônimo pode dizer, e por isso o condena. A PEC dos Sem Nomes só melhorará nossa Constituição, nossas leis, e nossa sociedade.