“O Fim da Idade
da Pedra
Por Silvio Meira
O fundo soberano
da Noruega é o maior do mundo e gerencia US$1,03 trilhões. Depois de anunciar
sua saída da indústria carvoeira, avisa que vai desinvestir os US$37 bilhões
que estão em petróleo e gás. É importante notar que o setor responde por 22% no
PIB do país e 67% de suas exportações; a Noruega é um dos cinco maiores
exportadores de petróleo. Cerca de metade de todo petróleo do planeta se torna
gasolina e é queimado em carros. Hoje, são perto de 100 mil litros por segundo.
Aqui entra outro detalhe: a Noruega é o quinto mercado para veículos elétricos,
com mais de 300 mil em circulação; a China é o primeiro, com mais de 2,2
milhões. Considerando veículos elétricos por mil pessoas, a Noruega lidera o
mundo, com 56, e a China é o quinto, com 1,6.
A função
essencial de um fundo soberano é estabilizar a economia de seu país frente às
oscilações e crises locais e globais, ao mesmo tempo em que gera riqueza para
as futuras gerações. Os fundos soberanos não são uma inovação recente; o
primeiro foi o do Kuwait, em 1953, quarto maior do planeta, hoje. Até o Brasil
já teve um, criado em 2008 e encerrado o ano passado. Mas isso é uma outra
história, longa e confusa.
Quando um destes
fundos desiste de um tipo de investimento é porque deixa de ver, nele, seu
futuro. Essa é a mensagem que os noruegueses passam. Petróleo ainda tem um
presente, que pode até ser longo, de décadas, mas não tem um futuro de muitas
décadas ou séculos. E por muitas razões. A principal delas é que nosso uso de
energias fósseis não é sustentável. Nunca foi, e é cada vez menos. Mas não só:
agora, há alternativas.
Até dezembro de
2017, Shenzhen [12,5 milhões de habitantes] eletrificou todos os seus
16.359 ônibus. Dos mais de 21 mil táxis,
99% são elétricos, deixando de emitir 856 mil toneladas de CO2 por ano. É claro
que não aconteceu de repente, Shenzhen começou em a tratar disso em 2010. No
Brasil, perdemos uma inovação que já tivemos, o tempo para projetos de longo
prazo e alto impacto.
A China viu o
tempo e a oportunidade, está liderando a eletrificação da mobilidade e tem 99%
dos 385 mil ônibus elétricos do planeta. A cada 2 meses, adiciona uma São Paulo
inteira (mais de 15 mil ônibus) só de elétricos. A frota global de ônibus
elétricos economizou 233 mil barris de petróleo por dia em 2018.
Mas não é só a
China: enquanto continuamos a marchar ao tom do brado retumbante do
"petróleo é nosso" a BP, oitava maior do petróleo, apostando que o
número de veículos elétricos no Reino Unido sairá dos 135 mil de 2018 para 12
milhões em 2040 e 26 milhões em 2050, comprou a maior rede de recarga de
veículos elétricos do país, a ChargeMaster. Em 2017, a Shell. sexta maior do
setor, havia comprado outra rede de recarga, a NewMotion, que opera em 25 países
na Europa.
Claro que
petróleo tem outros -e muito mais nobres- usos além de combustível. Mas a falta
de demanda de petróleo para mobilidade decretará o fim da era do petróleo,
quase nos mesmos termos que o Sheik Ahmed Zaki Yamani previu: “assim como a
Idade da Pedra não terminou por falta de pedra, a Idade do Petróleo não acabará
por falta dele”. E a vasta maioria das reservas continuará onde está,
enterrada. Ainda bem.”
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AGD
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