“O imenso rombo potencial do Fies
POR MÍRIAM LEITÃO
O potencial de perdas de receitas
com o Fies, com os financiamentos concedidos entre 2010 e 2016, é de
impressionantes R$ 116 bilhões. Crédito educativo é bom, mas o programa foi mal
desenhado, sua expansão teve inúmeras distorções e ele foi usado eleitoralmente
em 2014 quando teve o recorde de novos contratos. Em tempos de promessas de
candidatos, e de verdades contadas pela metade, é importante olhar o caso de um
bom projeto que ficou insustentável pelos erros no desenho e gerenciamento.
A forte elevação do programa no
governo Dilma teve relação direta com a campanha da reeleição. Os novos
contratos estavam entre 30 mil ou 70 mil ao ano. Na primeira administração
Dilma entraram numa escalada que levou a dar um salto de 10 vezes. Foi de 76
mil novos contratos no último ano Lula para 733 mil em 2014, ano eleitoral. Em
2015, ainda no governo da ex-presidente, caiu para 287 mil. Em 2017, o governo
Temer o reformulou depois de um amplo estudo feito pelo Ministério da Fazenda
que mostrou os erros.
Em 2010, foi criado o fundo
garantidor e com base nisso o programa cresceu. O problema é que o fundo foi
criado com a premissa errada. De que haveria uma taxa de inadimplência de 10%.
No mundo inteiro é de 30%. No Brasil, se estima que os atrasos nos pagamentos
dos empréstimos, entre 2010 e 2016, estejam entre 40% e 50%. Outro erro é que o
calote era todo bancado pelo governo.
E, de novo, em vez de ser um
programa para os pobres, incluiu não pobres e virou uma fonte garantida de
receita para as universidades privadas. Os grupos maiores passaram a incentivar
os alunos a procurar financiamento, porque achavam que isso reduziria o risco
de não pagamento de mensalidades. Muito mais garantido era tudo ser pago por um
fundo bancado pelo governo. Fizeram mais: aumentaram as mensalidades, cobrando
mais dos beneficiários do programa. Virou uma bola de neve.
O número de alunos era de 200 mil
entre 2002 e 2010. Pulou para quase dois milhões. Desses, 733 mil a mais só em
2014, não por acaso um ano eleitoral, em que este assunto foi objeto da
campanha da reeleição. Os dados mostram que houve uma substituição de alunos
pagantes por alunos financiados.
São vários os custos do Fies. Ele
é 100% financiado com emissão de dívida pública. Quando o financiamento não é
pago, vira despesa primária do Tesouro. E tem o custo financeiro do diferencial
de juros. O orçamento do programa saiu de R$ 1,3 bilhão em 2010 para R$ 19
bilhões. O rombo potencial, se as projeções do calote se confirmarem, dá aquele
valor escrito acima: R$ 116 bilhões.
O estouro do Fies aconteceu no
início do segundo mandato, por isso começou a cair o número de novos
financiados a partir de 2015. Em 2016, já no governo Temer, o Ministério da
Fazenda fez um amplo estudo do programa. O desafio era como manter e fazê-lo
sustentável. Foi criado um grupo de trabalho e durante seis meses foram
chamados representantes das universidades privadas. Em seguida, ele foi
alterado.
O Fundo Garantidor do Crédito
Estudantil agora é bancado pelos dois lados. O governo fará um aporte único de
R$ 2 bilhões, e daí para diante as universidades privadas terão que pôr
dinheiro, e as que tiverem mais taxa de inadimplência farão aportes maiores.
Isso as obriga a melhorar a capacidade de empregabilidade dos estudantes. Na
contratação do empréstimo, a universidade tem que dizer quanto ele vai custar e
qual será o indexador. Isso proíbe o aumento desordenado das mensalidades. E
não poderá cobrar mais do aluno financiado que dos demais alunos. Além disso,
foi colocado um teto no valor que pode ser cobrado A concessão nova caiu para
170 mil em 2017. Ainda há um passivo a ser digerido, mas o programa entrou em
nova rota. A lição que fica é que a demagogia e o uso político transformam um
bom programa numa bomba fiscal.”
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