“Não faça o que faço
POR MERVAL PEREIRA
A reação dos petistas à recomendação do Comitê de Direitos
Humanos da ONU relativa à candidatura de Lula nas próximas eleições é exemplar
do dito popular “faça o que eu digo, não faça o que eu faço”.
Enquanto neste momento há um movimento articulado para
espalhar que o governo brasileiro é obrigado a cumpri-la, liberando Lula para
ser candidato à presidência da República, em outros o governo petista agiu
justamente ao contrário, alegando que comitês tanto da ONU quanto da OEA não
têm capacidade de intervenção em questões internas do país.
Assim como hoje, chefiado pelo tucano Aloysio Nunes
Ferreira, o Itamaraty no tempo de Lula ou Dilma afirmava que “as conclusões do
comitê têm caráter de recomendação e não possuem efeito juridicamente
vinculante”.
Em 2011, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos
(CIDH) recomendou a suspensão imediata da Hidrelétrica de Belo Monte, no Pará,
alegando irregularidades no processo de licenciamento ambiental, atendendo a
uma medida cautelar de entidades indígenas que questionaram o empreendimento.
O então ministro da Defesa, Nelson Jobim, criticou a
solicitação, e sugeriu que a Organização dos Estados Americanos (OEA) fosse
“cuidar de outro assunto”. Mais, o governo da presidente Dilma, em retaliação
ao que considerou uma intromissão em assuntos internos, suspendeu o repasse de
verba à entidade, de US$ 800 mil.
A diplomacia
brasileira classificou a medida de “precipitada e injustificável”, e ainda
chamou o embaixador brasileiro de volta, o que, em linguagem diplomática,
significa um protesto em nível máximo.
Em outra ocasião, a Corte Interamericana de Direitos Humanos
condenou o estado brasileiro pelos “graves crimes” cometidos no regime militar,
e declarou sem efeitos jurídicos a Lei de Anistia. Embora petistas tenham
gostado da decisão, inclusive o então ministro dos Direitos Humanos Paulo
Vanucchi, nada foi feito, por impossibilidade jurídica.
A recomendação de organismos internacionais sobre direitos
humanos, base da recomendação atual sobre a candidatura de Lula, sempre foi
desprezada pelos governos petistas, que chegaram a fazer uma proposta oficial
para que a ONU passasse a tratar os países que violam os direitos humanos com
mais condescendência, evitando críticas públicas aos regimes autoritários.
Muito mais que decisões pragmáticas, se abster em votações
contra Cuba com relação à violação dos direitos humanos, ou mesmo votar contra
uma condenação do governo do Sudão sobre Darfur, onde um conflito étnico matou
mais de 200 mil pessoas, fazia parte de uma política de Estado que o governo
Lula adotou.
A ONG Conectas Direitos Humanos denunciou na ocasião a
alteração no padrão de votação do governo brasileiro no Conselho de Direitos
Humanos da ONU, seguindo geralmente interesses políticos e comerciais. Da
abstenção em 2001 e 2002, o governo brasileiro passou a votar explicitamente
contra a condenação da Rússia em 2003 e 2004. O padrão de votação parecia
seguir o interesse geopolítico e comercial do governo brasileiro, e não tem
relação direta com o conceito de direitos humanos em si.
Além de criticar a conduta como ineficaz, o governo
brasileiro considerava, embora informalmente, que o Conselho de Direitos
Humanos da ONU estava muito politizado, controlado pelos EUA.
A nota da ONU, destacada por Carlos Alberto Sardenberg em
artigo, ressalva que “é importante notar que esta informação, embora seja
emitida pelo Escritório das Nações Unidas para Direitos Humanos, é uma decisão
do Comitê de Direitos Humanos, formado por especialistas independentes. (Logo)
esta informação deve ser atribuída ao Comitê de Direitos Humanos”. Por isso, o
Itamaraty do governo Temer, assim como os dos governos Lula e Dilma, considera
o comitê que supervisiona o Pacto de Direitos Civis e Políticos, simplesmente
isso, um órgão que não tem poder de sanção.”
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