Por Zezinho de Caetés
Continuando meu sofrido semi recesso, hoje descobri que “A
gente somos inútil”, que é o título do texto do Carlos Alberto Sardenberg, no O
Globo, que transcrevo abaixo. O que ele diz pode ser resumido assim: Não
podemos mais conviver com uma legislação trabalhista fascista como a nossa, que
é do ditador Getúlio Vargas, o imitador mirim do Benito Mussolini.
Já chegou a hora da classe trabalhadora brasileira deixar os
pelegos sindicais que a dirigem e partir para negociação com os patrões. E até
agora só posso dizer: Viva o Temer, apesar dos pesares, que está tentando meter
o dedo nesta ferida braba. Mas, sabendo o Congresso que temos teremos muita
luta pela frente.
Leiam o Sardenberg e descubram porque achamos que hoje além
de privilegiarmos o Estado para resolver tudo, e ver no que deu, ainda
resistimos a crer que é o Estado que é inútil, pelo menos neste caso.
“Acontecem situações assim: os trabalhadores perdem horas no transporte
público. A empresa resolve oferecer o conhecido fretado. O trabalhador chega a
tempo e mais disposto.
Acontece em seguida: trabalhadores demitidos pedem nas indenizações as
horas extras passadas nos fretados. Alegam que estão à disposição da empresa
desde o momento em que apanham o ônibus, logo, é hora extra, dormindo.
Outra situação: a empresa resolve oferecer um café da manhã. Claro que
o sujeito, para pegar o lanchão, tem que chegar meia hora antes de bater o
ponto. É optativo, o funcionário pode comer em casa. Mas não. Em qualquer
conflito, o trabalhador alega que a hora do lanche matinal é hora extra.
A tese, claro, é invenção de advogados trabalhistas. É argumento
jurídico, sustentam, mas, vamos falar francamente: é um truque que não resiste
ao bom senso.
Mas o leitor já desconfia. Não raro, a tese vence na Justiça do
Trabalho. E quando esse tipo de processo começa a prosperar, a empresa resolve
cancelar o fretado e o café da manhã.
Aí voltam os advogados para dizer que o benefício não pode mais ser
retirado, porque já havia se incorporado aos vencimentos. Fica, pois, a empresa
obrigada a oferecer o fretado e o lanche e a pagar horas extras nos dois casos.
Que os advogados formulem essas teses, vá lá, é da profissão, embora
não pareça, digamos, ético.
Mas por que muitos juízes concedem as vantagens?
Aqui é mais ideologia. A seguinte: o papel do juiz não é interpretar e
aplicar a lei, mas fazer justiça. E quem decide onde está a justiça? O juiz,
claro. Mas se ele não precisa e não deve, alegam, observar a letra e o espírito
da lei, a decisão torna-se subjetiva. Com critério: a decisão a favor do
suposto mais fraco.
Quem é o mais fraco? O empregado, o segurado de um plano de saúde, o
cidadão comum que demanda contra o banco ou qualquer grande empresa. Resumindo:
qualquer demanda contra o capital é boa.
Em debates, já dividi mesas com juízes que garantiam: “Toda vez que
tenho um caso entre o segurado e o plano de saúde, eu decido a favor do
segurado, não importa se o procedimento está ou não está previsto no contrato;
a vida não tem preço”.
Ora, a vida tem preço: quanto custa uma sala de UTI? Médicos e
enfermeiros não trabalham de graça. O remédio custa dinheiro, mesmo sendo
fornecido pelo Estado.
Neste caso, o juiz está apenas transferindo a conta para outras pessoas
— outros segurados do plano, cujo preço sobe, ou os contribuintes, que pagam um
pouco mais de imposto. Ou pacientes do SUS que ficam sem o seu medicamento
porque o dinheiro foi aplicado em outros procedimentos mais caros, por decisão
judicial.
Instala-se a confusão, e tudo funciona mal. Empresas não concedem
benefícios porque estes podem gerar custos trabalhistas. A Justiça do Trabalho
fica entupida com três milhões de processos por ano, gerando custos para o
contribuinte (na forma de impostos para sustentar a instituição), para as
empresas e para os trabalhadores.
Por trás de tudo, há uma visão autoritária, pela qual o Estado tem que
tomar conta e proteger o trabalhador, o cidadão comum, ambos considerados
incapazes. Isso é cultural.
O caso da Justiça do Trabalho é o mais evidente. E ali está também a
evidência do equívoco. Leis e contratos existem para que a justiça seja feita
de modo tão objetivo quanto possível. Está suposto que o legislador escreve
leis para regular e organizar as relações sociais e os direitos individuais.
Sempre há situações em que o juiz tem que interpretar qual lei e como se aplica
ali.
Mas se o juiz entende que não precisa da lei para fazer justiça,
instala-se a insegurança jurídica para todos — o que atrasa o país e trava
negócios.
A ideia de que o trabalhador é incapaz de saber quais são seus direitos
faz parte dessa visão autoritária. Assim como, por exemplo, a ideia de que o
governo é que deve administrar a poupança do trabalhador, caso óbvio do FGTS. O
dinheiro é da pessoa, mas quem dá a taxa de correção e decide sobre a aplicação
são os tecnocratas e os políticos.
Aliás, basta ver a situação do FGTS para se verificar que o Estado é
justamente o mais incompetente para gerir essas contas. Para não dizer
corrupto.
Também faz parte dessa visão autoritária a lei que proibia que
comerciantes e fregueses negociassem. O preço deveria ser sempre o mesmo, quer
o pagamento fosse em dinheiro ou cartão, à vista ou dez vezes. Uma estupidez.
Mas tinha e ainda tem muita gente dizendo que isso protegia o consumidor.
Obrigando um a pagar mais para aliviar a conta do outro? E quem mesmo o Estado
estava protegendo, o consumidor ou a empresa de cartão de crédito?
Tudo considerado, está correta essa proposta de reforma trabalhista.
Diz que trabalhadores e empresas podem resolver livremente diversas questões.
Também está correta essa MP que permite “a diferenciação” de preços e
condições de pagamento. Até acharam um jeito de escapar do ridículo que seria
uma lei dizendo: é permitida a negociação de preços.
Também foi uma boa ideia liberar uma parte do FGTS. Mas ainda falta: o
titular da conta deveria ter o direito de dizer onde vai ser aplicada.
“A gente não somos inútil”.”
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