Estação da Luz |
Por Zé Carlos
Ainda na grande metrópole brasileira, São Paulo, que não
para de me surpreender. E quando tenho um tempo, venho aqui registrar minhas
surpresas, na esperança de ser útil a outros curiosos por coisas estranhas.
Começo por simples notícias do dia a dia. Um cara atropelou
15 pessoas num ponto de ônibus. Seria uma rotina nesta cidade se não fosse um
número tão elevado para uma vez só. E o inusitado é que as 15 pessoas
atropeladas vinham de uma igreja evangélica, e entre eles estava o pastor. Mil
coisas me passam à cabeça e tenho vontade de filosofar, o que nunca foi meu
hábito, apesar de admirar quem o faça. Não seria mais oportuno que estas
pessoas viessem de um festa de orgia, para que pudéssemos dizer que Deus os
puniu por seus deslizes? Ou será que aquele seria seu dia de sofrimento, pela
vontade de Deus? Sei lá! Que Deus os proteja, e proteja São Paulo, inclusive
falando com o São Pedro para que mande chuva, que ainda não chegou.
E noutra notícia simples, vejo a poesia da caça a uma Arara
Azul que se perdeu e foi parar numa árvore. No momento da captura houve palmas
e um alarido maior do que o da torcida do Corínthians no Itaquerão, em que
ainda não fui, mas pretendo ir. Ah, se só houvesse notícias sobre Ararinhas
Azuis!
E neste contraste, vou levando, em São Paulo, dentro do seu
aparente caos.
No último final de semana usei os meios de transportes
disponíveis para ir aos pontos turísticos, como convém a qualquer visitante de
primeira viagem. Tudo aqui é história do Brasil. E a importância de São Paulo
se mede assim. Praça da República, foi o primeiro lugar. Conhecer a história?
Que nada! Ver a feirinha que lá se realiza semanalmente onde senti saudade da
Feira de Caruaru, mais pelos bonecos de tipo Vitalino que estavam à venda, do
que pelo seu formato, que é bastante diferente. Eu diria com nosso bardo maior,
o Luiz Gonzaga, também, “de tudo que há no mundo lá tem prá vender...”.
Gostei, e talvez volte lá para comprar alguma coisa, de preferência, vinda de
Caruaru.
Para chegar à Praça da República, pegamos um ônibus, um
trem, e o metrô. Aproveitei outra vez minha condição de velho, que os
politicamente corretos chamam de idoso ou que está na boa idade. Pelo menos
nisto ela, a idade, é boa mesmo. Na qualidade de velho ainda não paguei um
tostão no transporte coletivo daqui. E como bom nordestino, quase emigrante,
para se aproveitar desta terra que era da “garoa”
e agora é da “seca”, já deixei
crescer a barba para não precisar nem mostrar os documentos aos motoristas. Quando
algum incauto ainda me cobra a “comprovação
de velhice”, eu o elogio muito, por ele me achar jovem. Como normalmente é
um nordestino que pede, talvez pelo sotaque, ele libera imediatamente a
catraca. E lá vamos nós, eu e minha “velha”
a percorrer São Paulo.
Depois da Praça da República partimos para a Estação da Luz.
Um conjunto arquitetônico que além de ser uma estação de trem bastante
movimentada, contém dois pontos importantes que ninguém pode deixar de ver: A
Pinacoteca do Estado e o Museu da Língua Portuguesa. Ambos imperdíveis, até
mais do que a feirinha da Praça da República.
Eu já andei um pouco por este mundo de meu Deus. E onde eu
vi os banheiros (também chamados de “toillete”,
mictório, sanitário, cagador, etc.) mais limpos foi em Londres. Eu sempre dizia
que neles poderíamos abrir a marmita e comer sem problema. Agora fiquei em
dúvida, quando fui ao sanitário da Pinacoteca. Eu já ia dizendo, “coisa de primeiro mundo”, mas
refreio-me, porque preciso ir lá mais vezes. É a boca torta pelo hábito de ter
um dia estudado Estatística. Mas, valeu pela primeira vez. Fora isto o acervo é
de primeira e poderíamos passar um dia inteiro, ou talvez dois, por lá.
No entanto, havia ainda o Museu da Língua Portuguesa que me
chamava atenção por nunca ter visitado um museu de uma língua, viva ou morta. Para
mim foi uma surpresa como aquilo que fazemos no dia a dia, falar português,
pode ser organizado de uma forma tão prazerosa. Eu fiquei sabendo, por exemplo,
de onde vêm o português que hoje falamos e me senti voltando no tempo, e vendo
Cícero discursar, no que posso falar de português arcaico, como qualquer
patriota falaria do Latim, além de vê que o Grego para nós é uma língua que
nosso povo deixou de falar porque encontramos algo melhor. Foi um deleite.
Mas, quando pensei ter terminado aquele agradável dia, veio
algo mais agradável ainda que foi uma sessão onde quase todos os autores
portugueses recitavam seus trechos literários ou suas poesias. No rol entravam
portugueses e brasileiros que nos deixavam em quase estado de graça, como se
estivéssemos em outro mundo. Entre todos como Fernando Pessoa e seus
pseudônimos, Chico Buarque, Vinícius de Moraes, Carlos Drummond de Andrade,
Machado de Assis e tantos outros, recitando seus próprios textos ou narrados
por atores e atrizes de primeira linha, o que já era um desbunde, ao final,
tudo termina ao som de dois dos grandes artistas: Caju e Castanha. Seria
possível não terminar dançando?
E no solo do teatro onde tudo isto aconteceu, podíamos ler
tudo o que ouvimos nos 30 minutos mais agradáveis que já passei, até aqui,
nesta cidade, lá estavam todas os textos mostrados durante a exibição. De um
deles eu tirei uma foto e copio aqui para vocês:
"Canto de regresso à pátria
Minha terra tem palmares
Onde gorjeia o mar
Os passarinhos daqui
Não cantam como os de lá
Minha terra tem mais rosas
E quase que mais amores
Minha terra tem mais ouro
Minha terra tem mais terra
Ouro terra amor e rosas
Eu quero tudo de lá
Não permita Deus que eu morra
Sem que volte para lá
Não permita Deus que eu morra
Sem que volte pra São Paulo
Sem que veja a Rua 15
E o progresso de São Paulo."
Este poema é de Oswald de Andrade, onde ele tenta
parafrasear o Gonçalves Dias em seu também famoso poema “Canção do Exílio”, eu
o transcrevo aqui pelas estrofes “Não permita Deus que eu morra / Sem que volte
prá São Paulo”, pois sei que há ainda muitas coisas para conhecer e aprender
nesta terra.
P.S.: Quando este texto tiver sendo lido já estou de volta
para Pernambuco, pois também, “não permita Deus que eu morra sem que volte para
lá.
Nenhum comentário:
Postar um comentário