Por José Antonio Taveira Belo / Zetinho
Chico Venâncio era um sapateiro afamado na comunidade de Alto
de José Bonifácio. Pelo seu trabalho caprichado o seu nome atravessou
fronteiras do seu bairro. Muitos eram seus fregueses. A sua tenda/oficina era
em pequeno quarto na sua casa. Diariamente recebia para conserto sapatos para troca
de solado, sandálias para colar, e o que chegava avariado saia novinha em folha.
De manhã colocava o seu avental de couro e em suas pernas colocava o ferro de
formas onde martelava a sola e pregava com taxas pequenas nos solados. Muitos
eram colados com a cola de sapateiro. Às
oito horas estava ele já fazendo zoada. O pequeno radio na prateleira ligado na
Radio Jornal ouvindo o programa Bandeira 2 com informe sobre os crimes e roubos
ocorridos na cidade e depois na Rádio Tamandaré, com as suas musicas prediletas de antigamente. De
vez em quando chegava um vizinho para trocar ideias. Não gostava, pois lugar de
trabalho é de trabalho muitas das vezes incomodava, pois tirava ele da atenção
do serviço. Conhecemo-nos na mesa do Bar Savoy, em plena Avenida Guararapes, em
uma manhã de sábado. Achegou-se a nós quando começamos falar de futebol, ele
apaixonado pelo Santa Cruz. Pouco a pouco todo sábado lá estava ele sentado já com
uma dose de Rum e uma garrafa de Coca Cola. A convite em um sábado pela manhã fomos ao
Mercado de Casa Amarela no boxe de Seu Xavier tomar uns aperitivos e como tira
gosto um sarapatel que era afamado no bairro de Casa Amarela. As mesas estavam
lotadas. Conseguimos através da amizade do dono do bar duas mesas que nos
acomodamos e saímos por volta das 18 horas. As musicas de Nelson Gonçalves,
Timóteo, Altemar Dutra, Ângela Maria, Nelson Ned e tantas outras nos levavam ao
gole de cerveja e comentários sobre o tempo de namoricos. Certa vez estávamos no bar da Portuguesa na
Rua Diário de Pernambuco, e o Chico se engraçou com uma garçonete novata. As brincadeiras
e os olhares e as cantadas sempre em tom de brincadeira tornou-se realidade.
Todos nós fomos contra quando ele disse que ia alugar uma casinha em Casa Amarela
para vivenciar algum tempo com ela. E assim o fez. O tempo passou sem que o
Chico aparecesse no Savoy. O nosso comentário é que poderia estar doente, ou
mesmo mudar de local para tomar os seus aperitivos. Ledo engano. Um companheiro
nosso, o Nilo, soube que a mulher descobrira este caso e o colocou de casa pra
fora, em um domingo a tarde quando ele chegou da casa da sua “filial”. Foi
aquele desespero. Mas dona Rita não afastou a sua decisão. A lojinha onde
consertava os sapatos de sua clientela estava fechada. Foi aquele Deus nos
acuda. Dona Gertrudes, vizinha há bastante tempo, interviu, mostrando que o
Chico merecia o castigo, mas ele tinha que entregar as encomendadas aos seus
fregueses, que nada tinha a ver com aquele episódio triste que ela mesma
repudiava, dizia – todo homem é safado, não merece o nosso perdão. Se fosse uma
de nós, queria colocar agente pra fora de casa e quem sabe até matar. Mas deixa
pra lá. Dona Rita acatou a ideia, com uma condição que ele não ocupasse a casa,
apenas o quartinho de trabalho. E assim foi aceito pelo Chico mesmo a contra
gosto. O tempo passa é o Chico aparece, no Savoy como de costume no sábado. Foi
aquela alegria na mesa, onde jogávamos “porrinha”. Dezenas de perguntas foram
feitas sobre o que aconteceu. Contou que estava voltando para casa. Dona Rita
se apiedou depois que ele foi acometido de uma doença grave no intestino. A
“cabrita” do Bar A Portuguesa deixou na rua da amargura – dizendo – tu achas
que eu vou cuidar de tu? Claro que não, tenho que trabalhar, não nasci para ser
enfermeira. Saiu e somente voltou para pegar as suas tralhas e deixando um
bilhete – Até logo amor. E assim aqui
estou sem fazer nenhuma extravagancia. Voltei ao meu trabalho. A clientela
aumentou. E assim todos os dias a tardezinha quando fecho o meu “escritório” e
guardo “a minhas canetas” tomo banho e vou até bodega de Seu Felinto, perto de
casa tomo duas cervejas, o Rum foi proibido de tomar, volto para casa com o pãozinho
quentinho para o café. A vida voltou ao normal e nunca
mais vou me meter com estas “putinhas” que aparecem e, dou um conselho a vocês
não se metam, pois a coisa é feia. Até breve!
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