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sexta-feira, 15 de julho de 2011

LOUCO DE AMOR




Por José Antonio Taveira Belo / Zetinho

Recife é a cidade dos encontros casuais. Desde 1964 que estou residindo entre o Recife e Olinda. Durante todo este período de vivência nesta cidade cheia de encantos e beleza, conheci uma infinidade de pessoas, principalmente, quando morava nas pensões do querido bairro da Boa Vista. Todo este tempo que vivi nas pensões, convivi com várias pessoas, que depois de algum tempo tornava-se amigo, nas mesas de bares. O apelido era constante nos pensionatos. José de Abreu, um moço afeiçoado, estudante da Faculdade de Economia, de boa índole, de família do interior de Limoeiro, era um moço romântico.  Vivia nas nuvens. Encantava-se por tudo.  Apaixonava-se por qualquer coisa. Apaixonou-se por uma das suas colegas de faculdade. Era “louco” por ela, desde primeiro dia de escola. Ele comentava nas rodas de conversas na pensão.  Ela, a Marina, por quem era apaixonado a “primeira vista”, não correspondia os seus sentimentos. Por mais que se aproximasse, sentia a distância do seu amor, impossível para uns colegas, mas possível para ele que não cansava de pensar nela, mesmo nas horas mais divertidas.

Nas sexta feira, sempre nos reuníamos depois da aula da faculdade, para tomar umas e outras, após um banho e uma troca de roupa, mais elegante, para sexta feira à noite, aboletávamos nas cadeiras do bar Santa Cruz ou da Galega, ambos no Pátio do mesmo nome, antes de fazermos a nossa peregrinação para outros locais, e ali ele despejava toda sua “loucura” pela Marina. Irritava quem estava com ele, pois só falava nela. Colocava de dez a doze fichas na radiola encostada na parede, com suas luzes vermelhas, verdes e amarelas e lá vinha a musica de Paulo Sergio “Esta é a última canção que eu faço prá você / Já cansei de viver iludido só pensando em você...” e depois a vinha à música de Nelson Gonçalves, Marina, Marina você se pintou / Marina, Marina me faça um favor / Não pinte este rosto / que é só meu / Você é bonita com que Deus lhe deu..., bebendo o seu “cuba libre” com Coca Cola, limão e muito gelo mexendo com o dedo o líquido com pensamentos perdidos no tempo e no espaço. Às vezes tínhamos que cutucar para que ele acordasse daquele sonho impossível. irritava-nos e aos outros fregueses do bar, com a repetição destas musicas.

Pois não é que eu encontro “Louco de Amor” em plena e malfada Avenida Guararapes. Um abraço e um aperto de mão apertado e um sorriso largo. Já velho, como eu, puxando os seus sessenta e seis anos. Cabelos brancos e um bigode ralo. Óculos escuros, na mão esquerda uma bengala, vestindo uma bonita camisa de linho azul claro. Olhando para um lado e o outro, disse-me, “como esta decadente esta Avenida. Faz vergonha aos visitantes. Há poucas décadas era o cartão postal do Recife, ai daquele que viesse o Recife e não desfilasse por esta Avenida, dizia-se que não conhecia o Recife. Os casais de mãos dadas passeando pela calçada de pedras portuguesas, muitos se sentavam no Bar Savoy para tomar um refrigerante, as mulheres enquanto os homens tomavam um chope. Outros passavam alegremente, ora para o Cine Moderno, Trianon ou Art. Palácio e outros atravessando a Ponte Duarte Coelho, sobre as águas límpidas do rio Capibaribe em direção ao Cinema São Luis”. Tudo acabou, restam lembranças daqueles que conviveram neste tempo.

Depois de efusivas risadas, fomos matar a saudade na mesa de um bar do Gordo na Praça do Sebo. Sentamos alegremente, pedindo uma cerveja bem gelada, apesar do tempo frio e cinzento prometendo chuvas. Conversamos longamente sobre as nossas vidas e o que fazíamos no momento. Somos dois aposentados. Como trabalho caminho e passeio pelas ruas do Recife, recordando os tempos memoráveis da juventude e dos pensionatos por onde passamos. Ele, “Louco de Amor”, disse que trabalhou em uma firma no Rio de Janeiro, por longos anos e que após se aposentar a família desejou voltar para sua terra natal. Tinha dois filhos casados, que ficaram morando no Rio e que de vez em quando os ia visitar.

 Ai eu perguntei: o Zé e a tua paixão por Marina, como está? Enchendo o copo de uma Antártica bem gelada.

Passou.

Era coisa de menino naquele tempo.

Tudo passou.

A gente quando rapaz sempre tem estas “loucuras” que acabam, mas não nos esquecemos deste passado.

Mas, vê, disse.

 O destino nos prega cada uma. Sou casado há muito tempo com uma linda mulher chamada “Marina”, minha esposa. Vê que coincidência. Jamais pensava em recordar a “Marina” dos meus tempos de faculdade com a “Marina” com quem me casei. Mas deixa isto prá lá. E tu como vais? Casaste? Com certeza filhos e netos? Tais inteiro? Bom aspecto?

Tenho quatro filhos e oito netos, bonitos igual o avô. Riu.

É tenho me cuidado, depois que deixei à boêmia. Não dá mais para a nossa idade. Moro em Jardim Atlântico, em Olinda.

E tu?

Moro em Casa Forte. Comprei um apartamento e lá me “enganchei”

Lembramos dos outros pensionistas, Henrique, Josuel, Mano, Pega Leve, Burrinho e tantos outros que esquecíamos entre uma risada e outra. Alguns já morreram, outros nunca mais apareceram por aqui e assim desconhecemos seus paradeiros.

Levantando, pois, já eram seis horas da noite. Abraçamos-nos e disse: Qualquer dia te visitarei e tu vais a minha casa, ok?

Claro. Vamos marcar o dia.

Saímos eu para Rua do Sol para pegar o ônibus e ele tomou a direção da Avenida Dantas Barreto. 

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