“Envelhecer é uma conquista
Por Ana Carla Abrão
O Brasil está envelhecendo. Em
2050, mais de 30% da população terá mais de 65 anos, num processo de
envelhecimento acelerado e bem mais acentuado do que o dos nossos pares na
América Latina ou no conjunto de países emergentes. Paralelamente, temos um
sistema previdenciário injusto. Transferimos bilhões de reais, de forma
continua, para as camadas mais ricas da população, que se aposentam cedo, e
recebem valores que são, em média, muitas vezes superiores ao da grande maioria
da população, que recebe apenas um salário mínimo de aposentadoria.
Se isso já não fosse suficiente
para motivar uma reforma da Previdência, haja visto sermos o 3.º país mais
desigual do mundo, ainda pressionamos todos os outros gastos com um déficit
que, em 2017, consumiu R$ 268,8 bilhões. Outros R$ 192 bilhões serão consumidos
até o final deste ano, só no Regime Geral. Na peça orçamentária de 2019, os
gastos com Previdência superam em 3 vezes o total de gastos em educação, saúde
e segurança juntos. Ou seja, temos um sistema previdenciário que reforça a
desigualdade de renda e consome recursos que deveriam ser alocados de forma a
garantir melhores condições de vida para toda a população, principalmente a
menos favorecida.
Mas há quem não acredite nisso.
Um relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito da Previdência concluiu, de
forma surpreendente, que o déficit é uma ficção contábil. Essa também é a opinião
de economistas heterodoxos que fazem contas igualmente heterodoxas – e erradas.
Outros acreditam que, apesar de ser um problema e mesmo consumindo hoje mais do
que o governo gasta nos serviços públicos básicos, a reforma da Previdência não
seria uma prioridade e a solução viria com a retomada do crescimento econômico.
Felizmente há, por outro lado,
aqueles que estudam o assunto a sério. Alertam para a gravidade do problema,
fazem conta e apresentam soluções concretas e estruturais. Esse é o caso da
proposta de Reforma da Previdência que Paulo Tafner e Armínio Fraga nos
ofereceram na última semana. As premissas basilares do trabalho são claras:
equilíbrio e justiça.
A começar pela idade mínima,
progressiva e igual para todos ao término do período de transição, a proposta
Armínio -Tafner corrige os fatores que levam às injustiças inaceitáveis e aos
privilégios injustificáveis do sistema atual. Ao final do período de transição,
os 65 anos de idade mínima, aliados a outros aspectos da reforma, devem gerar
impacto significativo de redução da desigualdade de renda. A expectativa é que
o índice de Gini diminua em cerca de 16%, redução comparável à que tivemos nos
últimos 20 anos, período a concentração de renda no Brasil declinou de forma
significativa.
O impacto fiscal da proposta
também é expressivo e supera em 58% a economia esperada pela reforma original
apresentada pelo governo Temer. Reduz a trajetória da despesa previdenciária em
5 pontos porcentuais do PIB; reduz a despesa dos Regimes Próprios dos três
entes federativos e faz a transição suave para um regime de capitalização.
Há vários outros aspectos
relevantes na proposta. Desde à inclusão de Estados e municípios e do ajuste
nos regimes especiais, a proposta institui ainda um benefício universal para os
idosos e um tratamento particular para as mulheres que são mães. Ao igualar a
idade mínima para homens e mulheres, propõe-se a garantia de um ano adicional
de contribuição para as mulheres que têm filhos. Corrige-se assim a atual
distorção vinculada a uma idade mínima inferior para mulheres – que
desconsidera nossa expectativa de vida maior e reforça o conceito de dupla
jornada, mas reconhece-se a importância de tratamento diferenciado para
mulheres que são, ao mesmo tempo, trabalhadoras e mães.
Como afirma o texto de
apresentação da proposta, “a mudança demográfica reflete mudanças culturais e
avanços a comemorar. Todos estão vivendo mais.” Sim, nossa população está
envelhecendo graças a conquistas sociais importantes que garantiram o aumento
na expectativa de vida, em particular para os brasileiros que atingem 65 anos.
Mas esses avanços precisam ser acompanhados de uma reforma que, como essa,
garanta que juntamente com a conquista do envelhecimento, venha também a de uma
maior justiça social.”
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