“Brasil, Trump e o PCC
Por William Waack
Os americanos não perdem tempo e
sinalizaram em menos de 24 horas ao presidente Jair Bolsonaro qual é a agenda
da preferência deles. O tuíte de Trump para Bolsonaro falava em “military” e
“trade” – em português, defesa e comércio. No dia seguinte o chefe da
diplomacia americana, Mike Pompeo, pôs mais dois itens de caráter, digamos,
“regional”, mas os itens que mais importam na visão americana deste pedaço do
mundo: Venezuela e crime organizado.
Por mais que a campanha de
Bolsonaro tivesse se empolgado com aspectos que a tornavam similar à famosa
vitória de Trump, a recíproca não é verdadeira. Em relação a Obama, que tanto
adora detestar, Trump prossegue a mesma política no tocante ao Brasil:
relativamente bem pouco interesse.
Quando falou do Brasil
recentemente, Trump utilizou uma linguagem ameaçadora. Acabara de encurralar
México e Canadá numa revisão do acordo comercial que engloba os países da
América do Norte. E aproveitou, então, no seu tom triunfalista habitual, que
iria agora “atrás de Índia e Brasil”. Países que, na visão de Trump, tratam de
maneira desleal empresas americanas.
A ameaça deve ser levada a sério:
Trump alimenta profundo desdém por instituições multilaterais, a começar pela
Organização Mundial do Comércio (OMC), tão cara ao Brasil nos últimos anos. E
acredita que ao negociar pactos bilaterais tem melhores condições de barganha.
No curto prazo, assinalam os críticos, a conta faz sentido. A longo prazo terá
como provável consequência a articulação de aliados ou ex-aliados contra o que
consideram bullying por parte do governo americano.
Ainda sob Obama, os americanos
propuseram aos brasileiros uma espécie de “pacto estratégico”, mas o então
assessor de segurança nacional do presidente dos Estados Unidos saiu de
Brasília conjecturando se os brasileiros haviam entendido a proposta. Qualquer
possibilidade foi enterrada pouco depois com a espionagem da NSA sobre Dilma e
outros, e o consequente irrecuperável mau humor da mandatária brasileira (que
enterraria a compra de caças produzidos pela Boeing em favor dos caças suecos,
por exemplo).
As queixas brasileiras sobre
cooperação em defesa e tecnologia de ponta com os americanos são antigas: de
que adianta cooperar e comprar, se na hora de revender produtos desenvolvidos a
partir dessas tecnologias Washington exerce poder de veto. Recentemente, num
seminário organizado pelo Ministério da Defesa brasileiro, a presidente da
Boeing para esta região (e antiga embaixadora americana em Brasília) fez um
reparo interessante: “Esse veto não vale para tecnologias militares
desenvolvidas por parceiros nossos FORA do território americano” (o destaque é
meu). Uma abertura? A conferir se Bolsonaro estará disposto a explorar, e a
qual preço.
As outras questões são ainda mais
espinhosas. Washington há tempos vem dizendo que a crise venezuelana é uma
questão para ser resolvida pelos países próximos, ou seja, pelo Brasil em
primeiro lugar (dado o que seria a “natural”, hoje perdida, liderança
brasileira nesta parte do mundo). Há um plano em Brasília de como lidar com a
ditadura de Maduro? Em articulação com quais outras potências regionais? Ou
organismos multilaterais?
Finalmente, é recorrente a
preocupação americana com “segurança” hemisférica entendida sobretudo como
“segurança pública”: narcotráfico, crime organizado. No começo da semana,
participei de conferência internacional organizada por Paulo Sotero, diretor do
Brazilian Center no Wilson Center (e antigo correspondente deste jornal em
Washington), e de um diplomata do Departamento de Estado veio apenas uma
pergunta.
“Como Bolsonaro vai lidar com o
PCC?” Pelo jeito, Washington já vê esse tipo de organização criminosa como um
flagelo nacional. Aguardamos todos a resposta.
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