“As políticas públicas assumidas
por Bolsonaro
Por Modesto Carvalhosa
O discurso formal proferido pelo
presidente eleito na noite de 28 de outubro promete um governo decente e assume
uma série de compromissos institucionais, revelando algumas nítidas linhas de
melhoria das estruturas do Estado. Suas palavras trazem uma profissão de fé
neoliberal, reafirmando a liberdade de empreender, para cujo melhor desempenho
Jair Bolsonaro promete a redução da burocracia paralisante.
Fala também da supressão de
privilégios. Invoca a participação efetiva da sociedade na implementação de
políticas públicas. Aponta para o equilíbrio fiscal por meio de uma política de
juros mais baixos. Toca nas inadiáveis reformas da previdenciária e tributária.
E no setor externo propugna por uma diplomacia pragmática, e não ideológica.
Bolsonaro culmina a sua fala com a declaração de que vai governar para as
futuras gerações, e não para as próximas eleições.
Esses compromissos demandam
medidas efetivas para dar concretude aos salutares princípios de governança
pública. Algumas providências acarretam profunda alteração constitucional,
Outras, apenas leis ou simples decretos administrativos. Mas todas devem visar
à eliminação de privilégios, mediante a igualdade de direitos, obrigações e
responsabilidades entre o setor público e o privado.
Comecemos pela proposta de um
governo decente, que deve ser entendido como um combate permanente à corrupção
sistêmica e aos privilégios que corroem o Estado. A proibição de despesas
tributárias, representadas pelas exonerações fiscais e trabalhistas a setores
privilegiados, é indispensável para a restauração do equilíbrio fiscal, assim
como a eliminação das verbas indenizatórias para a elite dos servidores
públicos.
No combate efetivo à corrupção,
impõe-se o regime de performance bonds - obrigatório nos EUA desde 1894 - nas
obras públicas e contratadas pelas estatais, o qual incluiu uma seguradora nos
contratos de empreitada, tornando possível quebrar a interlocução entre a
construtora e os agentes públicos, garantindo para o Estado o preço, o prazo e
a qualidade da obra. No caso de inadimplemento da empreiteira, a seguradora
indica outra, ou assume a obra, ou ainda financia a primeira para que prossiga.
Na esfera dos congressistas e de
seus partidos, impõe-se a extinção das emendas parlamentares ao Orçamento,
assim como a eliminação do Fundo Partidário e do fundo eleitoral, que são todos
focos estruturais de corrupção.
Quanto ao compromisso de governar
para as futuras gerações, e não para as próximas eleições, impõe-se a não
reeleição ou a eleição para cargo ou mandato na legislatura seguinte, bem como
instituir o voto distrital, de preferência puro ou misto, para que os eleitores
fiscalizem os seus mandatários e possam, se for o caso, destituí-los, mediante
recall.
Também devem ser reconhecidas as
candidaturas independentes, como existem nas demais democracias, a fim de que
se restabeleça o princípio constitucional de que todo o poder emana do povo, e
não dos partidos políticos.
Quanto à participação da
sociedade, precisa ser exponencialmente melhorado o vigente regime legal de
transparência, adotando-se o sistema de open government, mediante a robotização
e a aplicação interativa da inteligência artificial, possibilitando a leitura
dos dados integrados em tempo real, em linguagem e gráficos comparativos compreensíveis.
Devem também ser adotados o
referendo e o plebiscito bienais, em eleições gerais e municipais, para a
aprovação de medidas relevantes e leis, como ocorre nos EUA e na Europa
democrática. Igualmente precisa ser construída uma ação integrada e
compartilhada entre a sociedade e o Estado nas áreas da educação, da cultura,
da saúde, da habitação e da melhoria da vida urbana.
Quanto à redução da estrutura do
Estado, pela eliminação de uma dezena de ministérios, requer-se a nomeação,
como ministros, de técnicos e especialistas de cada área.
Por fim, é necessário quebrar a
mais nefasta das estruturas, que é a estabilidade generalizada dos servidores
públicos, extinguindo esse fator originário da ineficiência, improdutividade,
privilégios e corrupção.
Deve o Estado extinguir os cargos
em comissão e de confiança, contratando no mercado de trabalho um mínimo de
especialistas e técnicos que possam auxiliar os ministros nas suas tarefas de
desburocratização, combate ao corporativismo e implantação de políticas
públicas.
Também é crucial a não aplicação
do instituto do direito adquirido aos titulares de cargos públicos. O Banco
Mundial, em relatório de 2017, aponta o uso abusivo desse preceito, pelo qual
os servidores do Estado consolidam e expandem todos os seus privilégios.
Quanto à redução da burocracia,
cabe investir fortemente na automação dos serviços públicos, por meio da
robotização e da inteligência artificial, no conceito open data, eliminar
centenas de órgãos e entes públicos inúteis e dispendiosos e, principalmente,
adotar o regime de declaração, no lugar do atual sistema de autorização, para a
maior parte das atividades empresariais e civis, hoje emperradas e sujeitas às
delongas autorizatórias que proporcionam a corrupção e bloqueiam os direitos
comuns dos cidadãos de exercício da atividade produtiva.
No tocante à Federação, é
preciso, de um lado, extinguir a guerra fiscal e, de outro, instituir a
autonomia legislativa dos Estados em matéria de processo civil, penal e
trabalhista. Os prefeitos devem retornar à sua função histórica de gestores, e
não mais de “chefes do Poder Executivo municipal”. Os vereadores não devem
receber remuneração e os municípios devem instituir a democracia participativa,
e não apenas representativa, com uma atuação e fiscalização dos seus
habitantes, como nos países democraticamente avançados.
São esses alguns pontos de
ruptura, que dariam efetiva consistência ao discurso do presidente eleito no
tocante à estrutura do Estado e suas relações com a Nação.”
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