“#Elanão
POR MERVAL PEREIRA
O empoderamento feminino não anda
fazendo bem aos machos-alfa dessa parte de baixo do Equador, onde não existe
pecado, segundo relato do holandês Barlaeus no século XVII. Nos últimos dias
tivemos exemplos, uns menos, outros mais degradantes desse comportamento
machista, vindos de personalidades que supostamente fazem parte de nossa elite.
Desde o famoso apresentador de
televisão que assediou a cantora ao vivo e a cores, passando pelo ex-presidente
da República que sugeriu que a Juíza que o interrogava, por ser mulher, deveria
entender mais de cozinha do que ele. Sem contar com o presidente eleito do
maior país da América do Sul, que não cansa de parecer homofóbico e misógino.
Estamos falando do Brasil dos
tempos atuais, em que a campanha #Mexeu com ela mexeu comigo, decorrência da
americana #meToo, que alcançou centenas de celebridades e subcelebridades
hollywoodianas por assédio sexual ou moral, conseguiu tirar de cena um famoso
ator global, mas não impedir a repetição de cenas de machismo explícito.
A semana foi marcada pela cena
constrangedora de Silvio Santos declarando-se “excitado” com a roupa de cantora
Claudia Leite, na frente de milhões de pessoas e da própria mulher e filhas na
platéia de seu programa de auditório. Assédio duplo, sexual e moral, já que ele
é o dono do programa e da televisão.
As reações vieram, até mesmo da
cantora que, se no dia o máximo que conseguiu dizer é que seu namorado não ia
gostar, no seguinte tomou coragem para postar um protesto no Facebook. O
comportamento machista ou homofóbico continuou durante os dias seguintes com
líderes políticos de peso, o ex-presidente Lula e o presidente eleito Jair
Bolsonaro.
Ao ser interrogado pela Juíza
Gabriela Hardt, que ficou no lugar de Sérgio Moro, sobre as obras do sítio de
Atibaia e a instalação de uma cozinha moderna, exatamente igual à do
apartamento triplex pelo qual já foi condenado, feitas por empreiteiras para,
segundo a acusação, pagar favores recebidos do ex-presidente, Lula tentou
constranger a Juíza insinuando que, como homem, não entendia nada de cozinha,
assim como o suposto marido da Juíza. Gabriela Hardt foi seca: “Sou divorciada
e não falo de cozinha”.
Lugar de mulher é na cozinha,
parecia querer dizer Lula, em mais uma das muitas vezes em que demonstrou ser
um machista da velha estirpe. Como quando convocou “as mulheres de grelo duro”
do PT para um protesto. Ou quando disse que sua assessora Clara Ant, “dormindo
sozinha”, ao ver vários homens chegarem em sua casa de madrugada, “pensou que
era um presente de Deus”. Eram policiais.
O presidente eleito Bolsonaro
também voltou a repetir piadas homofóbicas, quando disse que o escolhido para o
Ministério das Relações Exteriores poderia ser homem ou mulher, mas também um
gay. E perguntou para o repórter que fizera a pergunta: “Você aceitaria?”.
Lula também já foi flagrado, na gravação de
programa de propaganda eleitoral, comentando com um candidato de Pelotas que a
região era “polo exportador de viados”. São piadas de mau gosto, comuns em
ambientes masculinos como mesas de bar ou na caserna, próprias do espírito
machista que predomina, não apenas por aqui.
Bolsonaro já disse que a deputada
Maria do Rosário não merecia ser estuprada por ser “feia”. E seu espelho, o
presidente Donald Trump, é especialista em tentar desqualificar as mulheres que
o incomodam, desde a atriz pornô que diz ter tido um caso com ele, até a
assessora que pediu demissão.
Ele as chamou de “cara de
cachorra”, de “chorona, vagabunda e louca”, e disse a uma repórter na Casa
Branca que ela “não sabia pensar”. É surpreendente que seja esse o homem que
vai, segundo o futuro chanceler brasileiro, salvar o Ocidente da decadência
moral, resgatando os valores cristãos.
Nos Estados Unidos, o presidente
Trump abusa dessas grosserias, mas é constantemente confrontado por movimentos
feministas. O mesmo se dá com Jair Bolsonaro, que provocou até passeatas
organizada por feministas com o mote #elenão. O ex-presidente Lula, no entanto,
continua passando incólume por essas e outras grosserias. É por isso que,
depois de ter tentado sem sucesso constranger a Juíza Gabriela Hardt, surgiu na
internet o hashtag ironicamente atribuído a petistas temerosos: #Elanão.”
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