“O incrível
espectro partidário
Por Almir
Pazzianotto Pinto
O cadastro do
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) revela a existência de 39 partidos
registrados e 76 em processo de fundação. Temos, por enquanto, 115 legendas com
pretensões às delícias do poder, cada qual com proprietários, dirigentes e
filiados virtuais.
Durante o
Império (1822-1889) existiam dois partidos, o Liberal e o Conservador, ambos
poderosos e integrados por homens cujo nome a História perpetua como exemplos
de honestidade e de honradez. Na Primeira, na Segunda e na Terceira Repúblicas
não teria sido muito diferente. Ao longo do regime militar (1964-1985) as
atividades partidárias foram inibidas pela força de atos institucionais e
complementares, que davam ao presidente da República a prerrogativa de
dissolver partidos e controlar a fundação de entidades de caráter partidário.
Assim nasceram a Aliança Renovadora Nacional (Arena) e o Movimento Democrático
Brasileiro (MDB), o primeiro como instrumento de sustentação do governo e o
segundo incumbido de lhe fazer oposição.
O site
Wikipédia relaciona partidos registrados e em processo de regularização.
Relativamente aos primeiros, encontramos singular coluna com a denominação
“espectro político”, que nos permite avaliar o conteúdo programático de cada
legenda. Desconheço as fontes de informações. Reconheço, porém, que os dados
contêm mais acertos do que erros e retratam, de maneira simples e didática, o
perfil dos dirigentes.
Seriam de
centro o PMDB, o PSL, o PV, o PTB e o Avante. Do centro-esquerda à esquerda, o
PDT, o PT e o PSB. De centro-direita, o PR, o PHS, o PRP, o Pros, o DEM. De
centro-esquerda, o PMB, o PMN, o PPS, o SD, a Rede. De extrema esquerda, o PCO,
o PSTU, o PCB. De direita, o PRTB, o PP e o Novo. De direita para a extrema
direita, o PEN. De esquerda e extrema esquerda, o PSOL e o PCdoB. De
centro-esquerda, o PSD. Posição singular é a do PSDB, apontado como versátil
partido de centro, de centro-esquerda e de centro-direita.
Na realidade,
os 35 partidos reconhecidos e os 76 em processo de organização são carecedores
de consistência ideológica. As agremiações que se definem como de extrema
esquerda, esquerda, direita e extrema direita, ao se submeterem ao teste das
urnas, revelam maciça rejeição do eleitorado. Algumas não elegem um único
deputado sequer.
O que temos no
Poder Legislativo é a presença de bancadas evangélicas, da bancada ruralista,
de sindicalistas, de políticos profissionais e da maioria fisiológica na busca
imoral de nomeações para ministérios, de dinheiro e de empregos. Pessoas
jurídicas de direito privado, as legendas agem como empresas a serviço do
acionista controlador, como se dá com o PDT, o PTB, o PRTB e o PSC, cujos
dirigentes são detentores do domínio absoluto da legenda. Poderiam estar
registrados na Junta Comercial.
Os conceitos
políticos de direita, centro e esquerda surgiram na Revolução Francesa, durante
o período conhecido como Terror, conforme registra o historiador
norte-americano Stanley Loomis (1922-1972) em Paris sob o Terror (Ed. Civil.
Bras., 1965). Para o inglês Edward H. Carr (1892-1982), a distinção é fruto da
antítese entre utopia e realidade, teoria e prática, radical e conservador,
embora ressalve que seria imprudente presumir que partidos que carregam esses
rótulos representem tais tendências. Nas palavras do historiador e jurista
inglês, “o radical é necessariamente utópico e o conservador, realista” (Vinte
Anos de Crise: 1919-1939, Ed. Universidade de Brasília, 1981). O filósofo
espanhol Ortega Y Gasset afirmou que “ser da esquerda é, como ser da direita,
uma das infinitas maneiras que o homem pode escolher para ser imbecil” (A
Rebelião das Massas, Livro Ibero-Americano, 1959).
É inútil buscar
agremiações definidas ideologicamente – observe-se a troca de legendas como
garantia de reeleição. Existem, mas nunca alimentadas por ideias e consagradas à
execução de programas permanentes. Sobrevivem financiadas pelo Tesouro
Nacional, provedor do Fundo Partidário. Leiam o número declarado de filiados no
site do TSE. O PMDB, cuja ideologia é o governismo a qualquer preço, aponta 2,4
milhões de filiados. O PT, em acentuada decadência, vem em segundo lugar, com
1,6 milhão. A seguir o PSDB, com 1,45 milhão. O PPS, 481 mil. O PCO, 2.930.
Pela quantidade de inscritos, qualquer deles desenvolveria suas atividades
mediante módicas contribuições mensais de R$ 10, o suficiente para devolver ao
erário o dinheiro retirado da educação, da saúde, da segurança, da
infraestrutura.
Nas
democracias, a rigor, bastariam dois partidos: situação e oposição. Entre os 35
registrados, não mais do que meia dúzia tem presença política. Os demais fazem
número, à espera do momento pré-eleitoral para negociar a legenda, aspirar à
eleição de um ou dois representantes, conseguir cargos e ganhar dinheiro.
As eleições de
outubro confirmarão a fragilidade dos partidos e a falta de limites éticos dos
dirigentes. Para conquistar a Presidência da República, governos estaduais,
cadeiras na Câmara dos Deputados, no Senado e nas Assembleias Legislativas,
todos os recursos serão válidos. O importante, como disse alguém, é juntar. O
lema será: “para vencer faço acordo com o demônio”. Na composição das chapas de
candidatos prevalecerão o requisito popularidade entre as classes C e D, a
posição nas congregações evangélicas, o dinheiro que se dispõem a gastar com
cabos eleitorais, dobradinhas, marqueteiros e demagogia, ao mentir e prometer.
O paradoxo
brasileiro está em a força dos partidos resultar do vácuo ideológico. Nesse
tópico o PMDB é insuperável. Quem desejar vencer dependerá dele como aliado.
Por outro lado, com ele no Palácio do Planalto será impossível governar, tal a
volúpia por ministérios, cargos, estatais, sociedades de economia mista.”
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AGD comenta:
Ontem,
num comentário neste espaço, eu procurava ver como resolver problemas mudando a
maneira de resolvê-los. Hoje, encontrei o texto acima do Almir Pazzianoto que
já foi, um dia Ministro do Trabalho.
O que
me veio à mente, junto com a leitura, foi perguntar se a Cristiane Brasil já
venceu à Justiça e já tem o mesmo posto. Este episódio, de nosso sistema
partidário, apenas comprava os fatos citados no texto.
Para
obter apoio numa votação do Congresso, o presidente (Temer por acaso, poderia
ser outro qualquer) nomeou a jovem filha de um bastante conhecido político, o
Roberto Jefferson, que se enquadraria muito bem no que o Pazzianoto diz que é dono
de uma firma comercial, e registrado seu partido, o PTB, na Junta Comercial. O
Jefferson é o detentor do domínio absoluto da legenda, que se finge de Partido.
Será
que nossa tenra Democracia suportará o quadro acima? Até quando? Estas são
reflexões para o final de semana que deixo aos leitores interessados em
resolver nossas mazelas políticas.
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