“Acima do bem e
do mal
O Estado de S.
Paulo
Não fosse pela
profusão de gravatas e sapatos de salto alto, poder-se-ia dizer que a
aglomeração de pessoas em frente à sede do Supremo Tribunal Federal (STF) na
quinta-feira passada, dia da abertura do Ano Judiciário de 2018, era uma
manifestação convocada por alguma central sindical. Mas os manifestantes que
pediam aumento salarial e erguiam faixas e cartazes contra a aprovação da
reforma da Previdência eram juízes e membros do Ministério Público, servidores
que compõem a elite do funcionalismo público no Brasil.
A julgar pelos
métodos e pela defesa aguerrida de seus interesses estritamente corporativos, a
despeito da realidade do País a que servem, o ato convocado por entidades como
a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Associação Nacional dos
Procuradores da República (ANPR) e Associação dos Juízes Federais do Brasil
(Ajufe), entre outras, em muito se assemelhou a uma manifestação sindical,
ainda que a sindicalização daquelas categorias profissionais seja proibida por
lei.
Travestidas de
clubes recreativos ou centros de estudos e debates, tais associações têm se
prestado muito mais a um papel semelhante ao de um sindicato do que aos
propósitos que lhes deram origem. Não se pode tirar conclusão diversa da
leitura dos recentes manifestos publicados por tais entidades, cujo tom é
eminentemente político e classista.
Os
representantes das associações do Poder Judiciário e do Ministério Público
entregaram uma carta à ministra Cármen Lúcia, presidente do STF, e à
procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pedindo a “valorização” das
carreiras e o reajuste de seus vencimentos. O documento, que contou com 17 mil
assinaturas em apoio, alega uma “defasagem acumulada do poder aquisitivo do
Judiciário e do Ministério Público”, o que, para os signatários, representaria
“um atentado à garantia da irredutibilidade”, além de configurar uma
“injustiça”.
O documento não
aprofunda os cálculos que atestariam a suposta defasagem salarial nem deixa
claro em relação a quem os juízes, promotores e procuradores de Justiça
estariam sendo “injustiçados”.
Na carta, as
associações também defendem a aprovação de uma Proposta de Emenda à
Constituição (PEC) que autoriza o pagamento de adicional por tempo de serviço
para os membros do Poder Judiciário e do Ministério Público. A proposta, que
aguarda votação no plenário do Senado, prevê o pagamento de uma gratificação de
5% do subsídio mensal a cada cinco anos de carreira, até o limite de 35%. Caso
seja aprovada, a PEC irá permitir que os juízes, promotores e procuradores da
República recebam acima do teto constitucional, hoje fixado em R$ 33,7 mil.
De tão
descolados do enorme esforço de recuperação por que passa a Nação após o
desastre da experiência lulopetista, os pedidos dos membros do Poder Judiciário
e do Ministério Público parecem vir de servidores que pensam pairar acima do
bem e do mal tão somente pela natureza elevada de suas atribuições, sobretudo
neste momento em que alguns juízes, procuradores e até ministros de Cortes
Superiores se arvoram em redentores da vida pública nacional. Tanto é assim que
qualquer crítica ou questionamento que lhes sejam feitos são tratados como
críticas ao combate à corrupção ou são associados a uma suposta conivência com
os maus políticos. No entanto, é no Supremo que se arrastam, há quatro anos, os
primeiros processos da Lava Jato em regime privilegiado.
A distância
abissal entre os interesses corporativos e o interesse público não é de hoje.
Tal é a autopropensão à superioridade de classe que parece contaminar alguns
juízes que houve um tempo em que a magistratura paulista não se constrangeu em
ver recolhido 1% de todas as custas judiciais aos cofres da Associação Paulista
de Magistrados (Apamagis), um despautério – em boa hora extinto pela Assembleia
estadual, que criara a extravagância – que transferia recursos públicos, pagos
pelos litigantes, para custear o lazer dos magistrados.
Em seu discurso
de abertura do Ano Judiciário, a ministra Cármen Lúcia disse ser “inadmissível
desacatar a Justiça”. Ela está certa. Inadmissível também é aceitar os termos
da carta das associações de classe e, assim agindo, desacatar os
contribuintes.”
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AGD
comenta:
Esta
semana o Judiciário voltou, o Legislativo voltou e o Executivo continuou nos
seus rame-rame. Pode-se dizer que os três poderes continuam funcionando, embora
não na harmonia que uma república democrática de direito reclama.
O
foco das discussões foi a fala da presidente do STF que tentou dar um basta no
alarido pró Lula, depois da confirmação de sua sentença pelo TRF-4 de Porto
Alegre. Ela, em outras palavras disse: “Estão pensando o que? Que isto é a casa da Mãe Joana?”
Enquanto
isto, pasmem, um monte de juízes punha-se de pé de frente do Supremo, pedindo
dinheiro. Isto mesmo. Parece que eles só pensam naquilo. Neste país virou moda
os “direitos humanos” e se esqueceram dos “deveres humanos”. Como é que a
classe mais nobre do nosso serviço público, com ganhos acima de qualquer dos
outros serviços, ainda quer mais?
Hoje,
nossa Justiça é louvada em prosa e verso porque a Lava Jato deu início a um
processo de saneamento na classe “de
cima” chamada de colarinho branco, mas,
não tão branco assim, porque sujo pela miséria que causa, com a propina
retirado de setores muito mais importantes, para seu bel prazer.
Nesta
empreitada tem que se louvar o juiz Sérgio Moro, e junto com ele outros juízes
que com sua coragem decidiram enfrentar a bandidagem “acima de qualquer suspeita”.
No entanto, esta semana o Sérgio Moro declarou que recebia o auxílio moradia a
que tem direito, e justificava o penduricalho monetário pelo aviltamento dos salários
da classe.
Confesso
que fiquei um pouco chocado, e pela primeira vez tive vontade de dizer: “Por que não te calas?”, imitando um rei do passado recente. E outro juiz, do Rio de Janeiro
e baluarte da Lava Jato, e que já processou o Cabral 21 vezes e o condenou a
alguns anos de prisão, merecidamente, o Marcelo Bretas também se declarou a
favor do auxílio, e que, mais grave ainda, acumula com sua esposa, que também é
juíza, a esmola pública.
Lá em
Bom Conselho, quando eu era criança, não sei agora, diziam que “a justiça para ser boa começa de casa”, e é o suficiente para ficar contra o
auxílio corporativo e terminar este simples comentário parafraseando o César,
imperador romano: “Até tu, oh Moro!”
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